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BIOQUÍMICA CLÍNICA
SAÚDE EM DIABETES E
RENAL
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104p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-8241-376-0
CDD 574.19285
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................4
2 CATEGORIAS DE DIABÉTICOS ...............................................................................................5
3 EXAMES LABORATORIAIS PARA O DIABETES ....................................................................6 2
3.1 Regulação da glicemia .............................................................................................................6
3.2 Métodos de determinação da glicemia ...................................................................................7
3.3 Métodos bioquímicos ...............................................................................................................8
3.4 Métodos de tiras reagentes .....................................................................................................9
3.5 Teste de tolerância à glicose ..................................................................................................10
3.6 Padronização do teste.............................................................................................................10
3.7 Fatores que afetam o teste de tolerância à glicose ..............................................................11
3.8 Teste de tolerância à glicose oral ( TTGO ) ...........................................................................12
3.9 Protocolo do NDDG para o teste ............................................................................................13
3.10 Teste de tolerância à glicose oral achatado ..........................................................................14
3.11 Interpretação do teste de tolerância à glicose oral ..............................................................14
3.12 Tolerância à glicose alterada ..................................................................................................15
3.13 Critérios do teste de tolerância à glicose oral em crianças .................................................16
4 DIABETES GESTACIONAL ............................................................................................................17
5 TESTES DE TRIAGEM PARA DIABETES ......................................................................................19
6 TOLERÂNCIA À GLICOSE EM OUTRAS DOENÇAS ....................................................................21
7 CONTROVÉRSIAS SOBRE A IMPORTÂNCIA CLÍNICA DO TESTE DE TOLERÂNCIA À
GLICOSE ORAL ..............................................................................................................................26
8 TESTE E TOLERÂNCIA À GLICOSE INTRAVENOSA ...................................................................27
9 DETERMINAÇÃO DA INSULINA NO PLASMA OU SORO ............................................................28
10 DOSAGEM DA HEMOGLOBINA GLICOSILADA ....................................................................29
11 MÉTODOS LABORATORIAIS ..................................................................................................31
12 DETERMINAÇÃO DA FRUTOSAMINA NO SORO ..................................................................33
13 AUTO-ANTICORPOS ASSOCIADOS AO DIABETES .............................................................34
14 GLICOSÚRIA ............................................................................................................................35
15 PROTEINÚRIA DIABÉTICA .....................................................................................................37
16 DIAGNÓSTICO DO COMA DIABÉTICO ..................................................................................40
17 HIPOGLICEMIA ........................................................................................................................42
17.1 Hipoglicemia de jejum .............................................................................................................42
18 RELAÇÃO INSULINA/GLICOSE CORRIGIDA PARA O DIAGNÓSTICO DE
INSULINOMA ...................................................................................................................................46
19 TESTE DE TOLERÂNCIA À TOLBUTAMIDA ..........................................................................47
20 DETERMINAÇÃO DA PRÓ-INSULINA ....................................................................................49 3
21 DETERMINAÇÃO DO PEPTÍDEO C NO SORO.......................................................................50
22 HIPOGLICEMIA PÓS-PRANDIAL ............................................................................................53
23 TESTES LABORATORIAIS ......................................................................................................55
24 HIPOGLICEMIA NEONATAL E DA INFÂNCIA ........................................................................57
25 FÉRIAS E FESTAS: O QUE FAZER? ......................................................................................60
26 ATIVIDADE FÍSICA E DIABETES NO BRASIL: NECESSIDADE X RISCOS ..........................63
27 EPIDEMIOLOGIA DO DIABETES TIPO 2 NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA .......................65
28 TRATAMENTO DO DIABETES TIPO II ....................................................................................67
29 NOVAS TERAPIAS NO DIABETES TIPO 2 .............................................................................74
30 PROVAS PREDOMINANTEMENTE DE FUNÇÃO GLOMERULAR ........................................77
31 PROVAS QUE REFLETEM LESAO GLOMERULAR GRAVE, LESAO TUBULAR OU
MBAS............ ...................................................................................................................................82
32 PROVAS DE FUNÇÃO PREDOMINANTEMENTE TUBULAR .................................................87
33 UREMIA (ELEVAÇÃO DO NÍVEL DE NITROGÊNIO URÉICO DO SANGUE) E
INSUFICIÊNCIA RENAL ..................................................................................................................94
34 O PROBLEMA DA PROTEINURIA...........................................................................................98
35 O PROBLEMA DA HEMATURIA .............................................................................................101
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................103
1 INTRODUÇÃO
Os dois tipos de anormalidades idiopáticas da insulina das células das ilhotas estão
associados a duas das categorias clínicas mais importantes de diabéticos. A primeira categoria é
o tipo I ou insulino-dependente do National Diabetes Data Group (NDDG). Em geral, mas nem
sempre, o diabetes tipo I começa numa fase relativamente precoce da vida e exibe maior 5
gravidade. Os pacientes necessitam de insulina para o seu tratamento e apresentam grave
deficiência insulínica demonstrada pela determinação do hormônio no sangue. O segundo tipo
de diabetes melito é o tipo II do NDDG ou diabetes insulino-independente, que afeta cerca de
80% dos diabéticos. Em geral, mas nem sempre, o diabetes tipo II começa na meia-idade ou
depois, está quase sempre associado com obesidade e anormalidades menos graves da
glicemia e pode ser tratado através de dieta apenas, de medicação oral ou com pequenas doses
de insulina. Os indivíduos com diabetes tipo 2 apresentam uma produção normal ou
significativamente elevada de insulina de acordo com a determinação dos níveis sanguíneos do
hormônio, mas exibem uma redução na utilização da insulina pelo fígado e tecidos periféricos
(resistência à insulina). Outros apresentam graus variáveis de produção diminuída de insulina,
embora geralmente não tão grave quanto à deficiência de insulina descrita pelos livros no
diabetes tipo 1.
A maioria dos exames laboratoriais para o diabetes visa demonstrar uma disfunção das
células das ilhotas pancreáticas (produção deficiente ou liberação anormal de insulina), pela
determinação direta ou indireta dos níveis sanguíneos de insulina. Durante muitos anos, a
determinação direta da insulina no sangue era tecnicamente muito difícil para todos os
6
laboratórios, à exceção de alguns laboratórios de pesquisa. Por conseguinte, a medicina clínica
dava ênfase aos métodos indiretos, que geralmente demonstravam a ação da insulina sobre
uma substância relativamente acessível e de fácil determinação: a glicose do sangue. Na
atualidade, os métodos de imunoensaio para determinação da insulina são comercialmente
disponíveis. Todavia, na maioria dos casos, a dosagem direta da insulina não tem sido mais útil
do que a determinação da glicemia para o diagnóstico do diabetes, visto que, em geral, o
resultado quantitativo e o padrão dos valores da glicemia permitem separar com razoável grau
de precisão os diabéticos nos dois grupos principais: tipo I e tipo II. Além disso, a determinação
da glicemia é de tipo bem menor, facilmente acessível e, do ponto de vista técnico, menos
exigente do que os métodos atuais de imunoensaio.
O nível de glicemia depende primariamente do fígado, que exerce seus efeitos sobre a
homeostasia da glicose sanguínea através da conversão reversível da glicose pela glicogênese,
bem como através da gliconeogênese a partir da gordura e da proteína. Segue-se, por ordem de
importância, a utilização da glicose pelos tecidos, que é mediada pela insulina pancreática mas
afetada por numerosos outros fatores.
O fígado é afetado por três hormônios importantes, pelo menos: adrenalina, glucagon e
hidrocortisona (cortisol). A adrenalina da medula supra-renal estimula a degradação do
glicogênio em glicose ao converter a fosforilase inativa da célula hepática em sua forma ativa,
que atua na conversão do glicogênio em glicose-1-fosfato. Além disso, há evidência de que a
gliconeogênese a partir do lactato seja intensificada pela ação da enzima adenosina-3,5-
monofosfato. O glucagon é o hormônio produzido pelas células alfa do pâncreas e liberado pelo
estímulo da hipoglicemia. Acredita-se que esse hormônio atue sobre o fígado de modo
semelhante à adrenalina. O cortisol, a cortisona e corticosteróides supra-renais 11-oxigenados
semelhantes também influenciam o fígado, porém de modo diferente. A via metabólica bem
documentada consiste na síntese aumentada de glicogênio a partir dos aminoácidos. Esta via
aumenta a reserva de carboidratos disponível para elevar os níveis de glicemia. Por conseguinte,
os esteróides semelhantes ao cortisol estimulam essencialmente a gliconeogênese. Ademais, a
deficiência de cortisol resulta em anorexia e também afeta a absorção de carboidratos pelo
intestino delgado.
Outro teste para glicose consiste num rápido método quantitativo que utiliza tiras de
papel distribuídas por vários fabricantes. Parte da tira é impregnada com glicose-oxidade, uma
enzima específica da glicose, e com um reagente de cor. Coloca-se uma gota de sangue total,
de plasma ou soro sobre a área do reagente e compara-se a cor que aparece com uma tabela 9
de cores de referência. Existem pequenos medidores eletrônicos de leitura para várias das tiras
de papel comercializadas. Em geral, foi constatado que estes medidores resultam em melhora
significativa da precisão. As avaliações dos vários métodos de tiras de papel fornecem um
consenso segundo o qual, com a experiência do uso de um medidor de leitura, os experimentos
que utilizam material de controle de qualidade ou soluções de glicose geralmente estão de
acordo com os métodos laboratoriais padrões dentro de aproximadamente 5% para mais ou para
menos. Ao utilizar amostras de sangue capilar obtido de punção digital, os níveis situados entre
40 e 130 mg/dL geralmente estão de acordo dentro de aproximadamente 15% para mais ou para
menos com os valores obtidos através dos métodos laboratoriais padrões. As pessoas pouco
familiarizadas com a técnica podem obter resultados mais erráticos. Estes métodos com tira de
papel reagente têm sido utilizados com sangue venoso total ou com sangue obtido de punção
digital como maneira rápida de se fazer o diagnóstico da hipoglicemia e da hiperglicemia em
pacientes comatosos ou gravemente enfermos, bem como para orientar o auto-ajustamento da
dose de insulina apelo paciente em casa, o que é bem mais comum hoje em dia.
Alguns cuidados incluem possíveis diferenças entre os valores obtidos com sangue
capilar (punção digital) e sangue venoso, citadas anteriormente, e os efeitos do hematócrito
sobre os resultados, uma vez que o sangue com baixo hematócrito (menor que 35 %) produz
resultados mais elevados (de cerca de 10 a 15 %), enquanto o sangue com hematócrito alto
(maior que 55 %) produz resultados mais baixos. Isto cria um problema especial com o recém-
nascido que normalmente apresenta um alto valor de hematócrito em comparação com o do
adulto. Além disso, o controle de qualidade ou a avaliação dos diferentes produtos do fabricante
ao utilizar soluções de glicose podem não prever de modo acurado os resultados quando se
utilizam amostras de sangue do paciente. A presença de níveis séricos muito elevados de ácido
ascórbico (vitamina C) ou a ocorrência de lipemia visível podem interferir nos resultados. Os
pacientes com hiperglicemia hiperosmolar, com ou sem cetose, podem apresentar resultados
com tiras de papel reagentes inferiores aos valores verdadeiros. As amostras de sangue capilar
de áreas cianóticas ou de pacientes em estado de choque podem produzir resultados falsamente
baixos, já que pouco sangue há nesses locais. Em um estudo de pacientes em estado de
choque, 64% dos casos cujas amostras foram obtidas de punção digital apresentaram níveis de
mais de 20% abaixo daqueles observados com sangue venoso, e 32% apresentaram viveis de
mais de 50% a menos dos resultados obtidos com sangue venoso.
10
Os testes de tolerância à glicose (TTG) são provas provocativas nas quais se administra
uma dose relativamente grande de glicose para estimular os mecanismos homeostáticos do
organismo. Se todas as demais variáveis estiverem normais, admite-se que a elevação e a
queda subseqüentes da glicemia sejam principalmente devidas à produção de insulina em
resposta à hiperglicemia, e que o grau de resposta à insulina seja refletido no comportamento da
glicemia. A alta de compreensão de que esta hipótese está baseada na normalidade de todas as
demais variáveis explica grande parte da confusão existente na literatura e na prática clínica.
Foi observado que a inatividade exerce uma influência significativa sobre o TTG, com
tendência novamente para níveis diabéticos. Em um estudo, verificou-se quase 50% mais de
respostas diabéticas ao TTG em pacientes acamados, quando comparados com pacientes
ambulatoriais idênticos na maioria dos outros aspectos. O efeito da obesidade é um tanto quanto
controvertido. Alguns acreditam que a obesidade em si tenha pouca influência sobre o TTG.
Outros são de opinião que ela diminui a tolerância sobre o teste. Outros são de opinião que ela
diminui a tolerância aos carboidratos; observou-se diferenças significativas após a redução do
peso corporal, pelo menos em indivíduos obesos com diabetes leve. A febre tende a produzir
uma resposta de tipo diabético ao TTG; esta resposta é observada independentemente da
etiologia, porém é mais acentuada na presença de infecções. Registrou-se uma variação diurna
na tolerância à glicose, com diminuição significativa da tolerância aos carboidratos à tarde em
muitos indivíduos cujas curvas de TTG foram normais pela manhã. Isso indica que os testes para
o diagnóstico de diabetes devem ser efetuados pela manhã, o que já é feito em quase todos os
laboratórios, seja por conhecimento de causa ou pela tradição de se realizar as coletas sempre
de manhã. O estresse, quando intenso, resulta na liberação de vários hormônios (por exemplo,
adrenalina e, possivelmente, cortisol e glucagon), com conseqüente redução da tolerância à
glicose, o que afeta o teste. O infarto agudo do miocárdio, o traumatismo, as queimaduras e
outras condições quase sempre estão associados à hiperglicemia pós-prandial transitória e, em
certas ocasiões, a uma hiperglicemia leve em jejum. Este efeito pode persistir por algum tempo.
Recomendou-se que os testes laboratoriais definitivos para o diagnóstico do diabetes sejam
adiados por pelo menos seis semanas. Todavia, se a glicemia em jejum estiver
consideravelmente elevada, e se houver evidências clínicas significativas de diabetes, pode-se
12
estabelecer o diagnóstico sem demora.
Existe uma tendência bem conhecida à redução da tolerância aos carboidratos com a
idade avançada. Para cada década depois dos 30 anos de idade, a glicose em jejum aumenta de
1 a 2 mg/dL. Existem três tipos de opiniões no que concerne à interpretação deste fato. Um dos
grupos acredita que os efeitos do envelhecimento desmascaram o diabetes latente ou
representam um diabetes verdadeiro, devido ao comprometimento da função das células das
ilhotas, de modo análogo à diminuição da função renal subclínica em conseqüência de
arteriosclerose. Outro grupo aplica fórmulas de correção arbitrárias para reduzir o número de
anormalidades a um valor predeterminado, baseado em estimativas da incidência do diabetes na
população em questão. O terceiro grupo, de defende o ponto de vista mais amplamente aceito,
considera essas alterações mais como mecanismos fisiológicos do que patológicos. Para evitar
que muitos indivíduos idosos sem qualquer evidência de diabetes sejam considerados
diabéticos, alguns especialistas estendem deliberadamente os níveis superiores da faixa de
referência do TTG oral. Os critérios do NDDG discutidos adiante incorporam parte deste desvio
da faixa da referência.
Em certas ocasiões, após atingir o nível de jejum, pode haver uma depressão transitória,
abaixo deste nível, que não costuma ser acentuada e que, posteriormente, aumenta para os
valores de jejum. Acredita-se que esta fase hipoglicêmica relativa da curva (quando presente) se
deva a uma demora na capacidade do fígado de interromper a conversão da glicose em
glicogênio (em resposta à hiperglicemia anterior) e passar para a sua outra atividade de fornecer
glicose a partir do glicogênio. Em alguns casos, a presença de insulina residual também pode
constituir um fator considerável. Quando presente, esta “fase hipoglicêmica” ocorre geralmente
entre 2 e 4 horas. Vários estudos indicam que a denominada hipoglicemia terminal, que
representa uma forma um tanto exagerada desse fenômeno, ocorre numa percentagem bastante
grande de pacientes com resposta ao TTG sugestiva de diabetes leve. Acreditam que surge
quase sempre uma depressão hipoglicêmica anormalmente acentuada em indivíduos com
diabetes leve dentro de 3 a 5 horas após as refeições ou após uma dose de teste de
carboidratos, podendo constituir uma das primeiras manifestações clínicas da doença.
14
Trata-sede um TTGO cujo pico é variado, definido em menos de 40 mg, 25mg ou 20mg
/dL acima do valor da GJ. A definição mais comumente utilizada é de 25mg/mL. A situação
clínica mais freqüentemente associada a um TTGO achatado é a mal absorção de carboidratos a
nível do intestino delgado devido ao espru ou à doença celíaca, observando-se um menor
número de casos no mixedema e alguns casos na insuficiência hipofisária. O TTGO achatado
também pode ocorrer em indivíduos clinicamente normais. Quando foi utilizada a definição de 40
mg/dL, um estudo relatou a ocorrência de TTGO achatado em 90% dos pacientes com espru e
em até 40 % dos indivíduos clinicamente normais. Quando foi utilizada a definição de 25mg/dL,
outro estudo obteve um TTGO achatado em cerca de 60% dos pacientes com espru. Ao utilizar a
definição de 20 ou 25mg/dL, vários pesquisadores constataram um TTGO achatado em cerca de
20% dos indivíduos normais.
Por outro lado, o trânsito gástrico muito rápido ou o fornecimento de uma quantidade
total normal de glicose ao intestino delgado dentro de uma período de tempo acentuadamente
reduzido determinam a absorção de quantidades anormalmente grandes de glicose durante as
fases iniciais do teste de tolerância. Como os mecanismos homeostáticos não são instantâneos,
os valores máximos da curva de tolerância alcançam níveis anormalmente altos antes de a
hiperglicemia ser controlada. Verifica-se um exemplo extremo desta situação na síndrome pós-
gastrectomia produzida por gastrojejunostomia.
Além dos fatores intrínsecos e extrínsecos que modificam a resposta a TTGO, outras
doenças além do diabetes melito produzem regularmente padrões ou curvas de tipo diabético no
TTG. Dentre estas doenças, destacam-se anormalidades dos hormônios supra-renais, tireóideos
e hipofisários, que influenciam a resposta do fígado ou dos tecidos aos níveis de glicemia. A 21
síndrome de Cushing é produzida pela hipersecreção de hidrocortisona. Como este hormônio
estimula a gliconeogênese, entre outras ações, 70-80% dos pacientes com síndrome de Cushing
exibem uma tolerância aos carboidratos, enquanto 25% apresentam diabetes manifesto. Em um
estudo, foi sugerido que as pacientes com diabetes gestacional que estão no terceiro trimestre
de gravidez apresentam níveis plasmáticos de cortisol em jejum mais elevados do que os
observados em mulheres não grávidas. Registrou-se que os feocromocitomas da medula supra-
renal (ou de outras regiões) produzem hiperglicemia em quase 60% dos pacientes afetados, bem
como glicosúria numa percentagem menor. Estes tumores produzem noradrenalina ou
adrenalina de modo contínuo ou intermitente. Os efeitos diabetogênicos da adrenalina foram
mencionados anteriormente, e foi constatado que os feocromocitomas secretores de
noradrenalina, mas não de adrenalina, não estão associados a anormalidades do metabolismo
dos carboidratos. O aldosteronismo primário resulta na superprodução de aldosterona, o
principal hormônio córtico-supra-renal que regula os eletrólitos. Por conseguinte, verifica-se um
aumento na excreção tubular renal de potássio, com retenção de sódio. Os pacientes com
aldosteronismo primário quase sempre desenvolvem uma tolerância diminuída aos carboidratos.
De acordo com Conn, este efeito é mais provavelmente devido à depleção de potássio que, de
algum modo, afeta adversamente a capacidade das células beta do pâncreas de responder
normalmente a um estímulo hiperglicêmico. Além disso, pode haver certa analogia nos relatos
segundo os quais os diuréticos clorotiazídicos podem provocar uma redução adicional da
tolerância aos carboidratos. Algumas autoridades afirmam que este efeito não existe na ausência
de certo grau de anormalidade preexistente da tolerância à glicose, enquanto outras sustentam
que ele pode ocorrer em alguns indivíduos clinicamente normais. As clorotiazidas quase sempre
provocam depleção de potássio como efeito colateral; de fato, em um estudo, foi constatado que
o uso de suplementos de potássio reverte o efeito diabetogênico. Todavia, foram postulados
outros mecanismos.
O hormônio tireoideano possui vários efeitos sobre o metabolismo dos carboidratos. Em
primeiro lugar, a tiroxina atua de alguma maneira sobre as células da mucosa do intestino
delgado, aumentando a adsorção de hexoses. No fígado, a tiroxina produz aumento da
gliconeogênese a partir das proteínas, bem como degradação aumentada do glicogênio em
glicose. A taxa metabólica dos tecidos periféricos apresenta-se aumentada, resultando em maior
velocidade na utilização da glicose. Ocorre depleção do glicogênio nos tecidos periféricos.
22
Todavia, o efeito do hipertireoidismo sobre o TTG é variável. Aparentemente, a curva
hipertireóidea característica é aquela cujo pico atinge um valor extremamente alto, por vezes
com glicosúria, mas que retorna à sua faixa normal dentro de 2 horas. Todavia, em um estudo
extenso, verificou-se que até 7% dos pacientes hipertireóideos apresentam curvas diabéticas,
enquanto 2% possuem diabetes melito. Surpreendentemente, o tipo de curva observada em
todos os pacientes não estava relacionado com a gravidade do hipertireoidismo. No mixedema, é
comum a obtenção de uma curva achatada no TTGO (definida como uma elevação máxima
menor que 25mg/dL acima do valor da GJ). Todavia, como os defeitos de absorção variam
quanto à sua intensidade e são compensados com a diminuição do metabolismo tecidual, foi
relatado que 50% dos pacientes hipotireóideos avaliados apresentaram uma curva de tipo
diabético no TTGO, com valor da GJ geralmente normal.
A acromegalia produz elevação dos níveis de GJ em 25% dos casos e curva diabética
no TTGO em 50% dos casos. Acredita-se que o hormônio do crescimento (somatotropina) seja
capaz de estimular a gliconeogênese de modo independente. Na verdade, a influência da
hipófise sobre o metabolismo dos carboidratos tem sido principalmente estudado em condições
de hipofunção hipofisária. No hipopituitarismo, verificou-se que o defeito da gliconeogênese era
devido mais a uma combinação de deficiência de hormônios tireoideanos e
adrenocorticosteróides do que a uma deficiência isolada de um destes hormônios.
A hepatopatia afeta quase sempre a resposta ao TTGO. Este efeito não é surpreendente
considerando-se a importância do fígado na hemostasia dos carboidratos. Com mais freqüência,
ocorrem anormalidades na cirrose, cujo grau exibe uma correlação geral (ainda que não exata)
com o grau de lesão hepática. Na cirrose bem estabelecida, o nível de glicemia pós-prandial de 2
horas é habitualmente anormal. O nível de GJ mostra-se variável, porém está mais
freqüentemente normal. O fígado gorduroso pode produzir uma anormalidade no TTG
semelhante àquela observada na cirrose. Na hepatite viral, a anormalidade observada é menor
que a da cirrose; os resultados tornam-se normais durante a convalescença e podem ser
normais durante todo o curso da doença leve.
A diferenciação da acidose diabética pode ser efetuada através de exames simples para
salicilato no plasma ou na urina. O teste com tiras reagentes é muito útil para finalidades de
triagem. A obtenção de uma reação positiva para o salicilato plasmático constitui uma boa
evidência de intoxicação por esta droga. Os resultados positivos na urina não são concludentes,
visto que este método detecta a presença de níveis urinários não-tóxicos de salicilato, enquanto
os resultados negativos constituem uma forte evidência contra o diagnóstico. Existem provas
químicas quantitativas ou semiquantitativas definitivas para a determinação dos níveis
sanguíneos de salicilato. É importante obter uma história de medicamentos administrados ao
25
paciente, ou considerar a possibilidade de ingestão acidental em crianças com sintomas clínicos
suspeitos.
A intoxicação por salicilatos não é freqüente em adultos. Quando ela ocorre, há menor
tendência ao desenvolvimento de uma síndrome de acidose pseudodiabética. Com efeito, nos
adultos, o salicilato em doses não tóxicas produz algumas vezes hipoglicemia, que tende a surgir
dentro de 2 a 4 horas pós-prandiais.
A discussão completa do TTGO deve incluir referências de vários estudos que criticam a
utilidade clínica do método. Consistem em relatórios de grandes séries de indivíduos normais
que apresentam 20% de resultados do TTG com curva achatada, estudos que revelam 26
diferentes curvas em determinações repetidas depois de um certo intervalo de tempo, bem como
outros em que foram obtidos vários tipos de curvas em exames repetidos no mesmo indivíduo.
Com base nos critérios utilizados antes das recomendações do NDDG, alguns pesquisadores
acreditam que há evidências inadequadas relativas ao fato de as anormalidades do TTG
indicarem realmente a presença de diabetes melito verdadeiro, visto que muitos indivíduos com
resposta anormal à TTG não progridem para o diabetes clínico, e a incidência de diabetes na
população é menor que a prevista pela triagem com TTG. Como os critérios do NDDG exigem
um grau um tanto maior de anormalidade do que os critérios anteriores para o estabelecimento
do diagnóstico de diabetes melito, esses problemas foram parcialmente solucionados. Mesmo
assim, nem todas as desvantagens do TTGO foram resolvidas no que diz respeito à
sensibilidade, especificidade, reprodutibilidade e relevância clínica, mesmo quando o teste é
efetuado em condições ótimas. Todavia, no momento atual, o TTG continua sendo o teste
padrão de tolerância aos carboidratos, bem como a base laboratorial para o diagnóstico de
diabetes melito.
8 TESTE E TOLERÂNCIA À GLICOSE INTRAVENOSA
O teste de tolerância à glicose intravenosa (TTGIV) foi planejado para eliminar algumas
das objeções feitas contra o TTGO. O método padrão do TTGIV é o seguinte: o paciente é
submetido a uma dieta preparatória de três dias, rica em carboidratos. Após a determinação do
nível de glicose em jejum, injeta-se uma solução padrão de glicose a 50% por via intravenosa, 27
durante um período de 3 a 4 minutos, 0,33g/kg de peso corporal. São obtidas amostras de
sangue dentro de 30 minutos, 1, 2 e 3 horas, embora pareça ser mais conveniente omitir a
amostra de 30 minutos e substituí-la por uma de uma hora e meia. A curva atinge um pico
imediatamente após a injeção (300 a 400 mg/dL, acompanhada de glicosúria) e, a seguir, cai
uniformemente, mas não de modo linear, para os níveis de jejum.
Os critérios utilizados para interpretação não são uniformes. Todavia, a maioria acredita
que uma resposta normal seja indicada pelo retorno a níveis de jejum dentro de 60 a 80 minutos.
A altura da curva não é importante. A maioria das autoridades é de opinião que a resposta do
TTGIV seja adequadamente reproduzível. No diabetes, não há retorno aos níveis de jejum em
duas horas e, freqüentemente, estes retorno tampouco é observado dentro de 3 horas. Na
hepatopatia, a curva normaliza-se tipicamente em 80 a 120 minutos; todavia, alguns pacientes
com cirrose exibem uma curva de tipo diabético. Muitos dos mesmos fatores que exercem efeito
diabetogênico sobre o TTGO também o fazem no TTGIV; incluem privação de carboidrato,
inatividade, idade avançada, febre, uremia, estresse, neoplasias e várias doenças endócrinas
produtoras de esteróides. Todavia, existem várias diferenças em relação ao TTGO. Os
problemas alimentares são eliminados. Admite-se que o TTGIV seja normal durante a gravidez,
bem como no hipertireoidismo, embora tenha sido registrada alguma anormalidade ocasional na
tireotoxicose. O TTGIV é considerado um pouco menos sensível do que o TTGO, embora seja
um pouco mais específico, conforme assinalado antes.
9 DETERMINAÇÃO DA INSULINA NO PLASMA OU SORO
A insulina foi o primeiro hormônio a ser determinado com êxito através de imunoensaio
radioisotópico. Na atualidade, a determinação da insulina é efetuada na maioria dos laboratórios
de referência de porte relativamente grande. A insulina é excretada primariamente pelos rins. Em
geral, o diabetes juvenil apresenta baixos níveis de insulina em jejum, e o TTGO que utiliza as
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determinações de insulina produz, em geral, uma curva achatada. Os pacientes com diabetes
leve apresentam níveis normais de insulina em jejum, bem como uma curva de TTG que exibe
elevação tardia numa altura normal, ou, inclusive, para nível moderadamente acima do normal;
em ambos os casos, a curva sofre posteriormente um declínio normal. A redução da tolerância
produzida por numerosas outras condições resulta em curvas semelhantes; o TTGO com
insulina não tem sido mais eficiente do que o TTGO da glicemia para a detecção de diabetes
subclínico.
Este grau de redução súbita e espontânea da glicemia não é comum, de modo que, na
maioria das circunstâncias, a obtenção de um nível normal de hemoglobina glicosilada constitui
uma boa indicação de glicemia média relativamente normal nas quatro semanas anteriores. A
maioria dos problemas clínicos com o componente de ligação lábil ocorre quando produz falsas
elevações nos níveis de hemoglobina glicada. Em síntese, a elevação do nível de hemoglobina
glicosilada é devia mais freqüentemente a um aumento médio e prolongado da glicemia nos dois
a três meses anteriores; todavia, existe a possibilidade de que a elevação seja devia a um
aumento pronunciado e a curto prazo da glicemia, mesmo quando se utiliza um método de
determinação inespecífico para a ligação estável.
Os kits baseados em resina trocadora de íons não diferenciam, em sua maioria, entre
ligação da glicose lábil e estável à hemoglobina. Existem certas técnicas que permitem eliminar a
fração lábil antes de testar o soro do paciente. Muitas hemoglobinas podem formar, em certo
grau, hemoglobina glicada. Todavia, com alguns métodos de resina trocadora de íons para A 1 ou
A1c, as hemoglobinas não-A de carga positiva não sofrem eluição da resina com hemoglobina A1
ou A1c, porém permanecem sobre a resina com a hemoglobina A não glicosilada. Estas
hemoglobinas (como hemoglobinas S e C) podem produzir valores da hemoglobina glicada que
são inferiores aos verdadeiros níveis, visto que estas hemoglobinas anormais possuem um
componente glicosilado que não é medido juntamente com a A1. Por conseguinte, o aumento
dos níveis de hemoglobina F ou a presença de hemoglobina H podem aumentar falsamente os
valores da A1 ou A1c, uma vez que estão incluídas na determinação da A 1. O nível de
hemoglobina F pode estar aumentado em lactentes de pouca idade, em até 17 % das mulheres
grávidas e em pacientes com algumas das hemoglobinopatias. Portanto, pode ser vantajoso
utilizar um método, como a hemoglobina glicada total por afinidade com ácido borônico, quando
existem números significativos de pacientes que não descendem de europeus setentrionais.
Alguns métodos que utilizam resina são afetados por mudanças de temperatura, e, em alguns,
foi constatado que a insuficiência renal crônica produz resultados falsamente elevados. Alguns
registros descreveram a ocorrência de aumentos falsos com aspirina, alcoolismo e intoxicação
por chumbo. É necessário detectar as situações que irão falsamente aumentar ou diminuir
qualquer método de dosagem de A1 ou A1c. A determinação da hemoglobina glicada total por
cromatografia por ácido borônico inclui os resultados da glicosilação da hemoglobina anormal,
bem como a da hemoglobina A, não sendo afetada por insuficiência renal, aspirina ou mudanças
da temperatura. A anemia hemolítica pode produzir valores falsamente baixos da hemoglobina
32
glicosilada com qualquer método, uma vez que a hemólise resulta em sobrevida diminuída dos
eritrócitos que, dessa maneira, não são tão expostos à glicose quanto os eritrócitos normais.
Este quadro é acentuado pela resposta reticulocitária da medula óssea, uma vez que os
reticulócitos são células jovens que não foram expostas à glicose. A ocorrência de episódios
freqüentes de hipoglicemia pode diminuir ligeiramente os níveis de hemoglobina glicada. Por fim,
há certa dificuldade na calibração dos kits, devido à falta de disponibilidade de padrões primários
(ou seja, material com valores conhecidos com absoluta certeza).
12 DETERMINAÇÃO DA FRUTOSAMINA NO SORO
Além disso, foi demonstrado que os níveis de glicemia no sangue arterial estão mais
bem relacionados com a glicosúria que a glicemia do sangue venoso. Todavia, o exame de urina
de rotina constitui um método utilizado para a prevenção da cetoacidose, bem como para a
monitorização ambulatorial contínua da terapia. Este aspecto fornece outro argumento para o
maior uso rotineiro do TTG completo, visto que a glicosúria pode estar correlacionada com o
grau de hiperglicemia. A propósito, numerosos pacientes diabéticos e muitos dos que foram
submetidos a exames de triagem fazem a determinação da glicose urinária antes do desjejum,
que é o momento menos provável de ocorrer glicosúria.
Para finalizar, serão mencionados aqui apenas dois tipos principais de testes de glicose 36
urinária: os testes de sulfato de cobre para substâncias redutoras e os papéis com enzima
glicose-oxidase.
15 PROTEINÚRIA DIABÉTICA
Quando ocorre albuminúria manifesta, a maioria dos pacientes com diabetes tipo I
progride eventualmente para a insuficiência renal (65 a 75 %, faixa de 50 a 100 %), a não ser
que ocorra morte por coronariopatia ou por alguma outra causa. Verifica-se o desenvolvimento
de insuficiência renal em cerca de 30 % (faixa de 22 a 40 %) de todos os pacientes com diabetes
tipo I. De modo global, em 1987, os diabéticos representavam 30 % de todos os pacientes com
doença renal terminal; dentre ao diabéticos, foram constatados números iguais de pacientes com
diabetes tipo I e tipo II (o tipo I tem maior tendência a progredir para a insuficiência renal;
todavia, o tipo II é quase 10 vezes mais freqüente do que o tipo I). Todas essas estatísticas por
vezes divergentes são influenciadas por numerosos fatores, como idade do paciente na época
do diagnóstico, número de anos de acompanhamento, tipo de método utilizado para
determinação da microalbumina e grupo racial dos pacientes. Os negros, os americanos nativos
38
e hispânicos apresentam maiores taxas de doença renal diabética progressiva do que os
europeus. A base racional para a detecção de microalbuminúria consiste em detectar a doença
num estágio em que certas terapias são capazes de retardar ou até mesmo impedir qualquer
comprometimento adicional. No momento em que se desenvolve a albuminúria franca, não
existe nenhuma maneira de evitar a sua progressão.
Por fim, alguns pesquisadores recomendam uma amostra obtida pela manhã para
finalidades de triagem (microalbuminúria na faixa de 20 a 30 mg/L). A despeito de todas essas
técnicas, verifica-se uma alta percentagem de variabilidade (30 a 45 %) na excreção diária de
albumina em diabéticos, com ou sem microalbuminúria. Existe também uma variação técnica
significativa que pode atingir 20 a 40 %, dependendo do método analítico, da quantidade de
albumina e do laboratório. Por conseguinte, recomenda-se fortemente que pelo menos duas de
três amostras no decorrer de um período de seis meses sejam anormais para se estabelecer o
diagnóstico de microalbuminúria.
Por fim, é preciso lembrar que várias condições além do diabetes (como por exemplo:
aterosclerose, hipertensão, infecção, doenças do colágeno e glomerulonefrite) podem aumentar
a albumina urinária como componente da proteinúria induzida por lesão renal aguda ou crônica,
focal ou difusa. Teoricamente, estas condições produzem proteinúria detectável em provas de
triagem para proteínas com tiras reagentes.
Pode ocorrer coma diabético sem história clínica de diabetes ou em circunstâncias nas
quais não se pode obter nenhuma história clínica. Outras etiologias importantes do coma devem
ser consideradas, incluindo hipoglicemia insulínica, meningite ou acidente vascular cerebral,
40
choque, uremia e superdosagem de barbitúricos. É possível estabelecer rapidamente um
diagnóstico definitivo de coma diabético através de um teste para cetonas plasmáticas. Obtém-
se uma amostra de sangue sem anticoagulante; parte desta amostra é centrifugada durante dois
a três minutos, sendo o plasma testado para a presença de cetonas. A acidose diabética
suficientemente grave para produzir coma é definitivamente positiva (à exceção dos raros casos
de acidose láctica ou de coma hiperosmolar). As demais etiologias do coma são negativas, visto
que raramente produzem o grau de acidose observado no coma diabético. O achado de
glicosúria e de cetonúria sugere fortemente a presença de diabetes, embora possam ocorrer em
outras situações. Estes achados não excluem por completo a possibilidade de superdosagem de
insulina (que deve ser sempre considerada no diabético), visto que a urina pode ter sido
produzida entes da superdosagem. A observação de níveis elevados de glicemia também
constitui uma forte evidência de coma diabético, sobretudo se o grau de elevação for
pronunciado.
Outras condições que poderiam associar coma com hiperglicemia (acidente vascular
cerebral, infarto agudo do miocárdio) só apresentam hiperglicemia leve ou moderada nos casos
em que esta última ocorre. Além da determinação da glicemia, uma prova empírica simples para
excluir a presença de hiperglicemia consiste em injetar uma solução de glicose por via
intravenosa. A possibilidade de lesão cerebral é investigada através do exame do líquido
cefalorraquidiano ou de tomografia computadorizada. A uremia é determinada através do nível
de uréia no sangue, embora outras etiologias do coma, além da doença renal primária, possam
estar associadas a níveis elevados de uréia no sangue. Estabelece-se a ingestão de drogas
através de uma cuidadosa história clínica, análise do conteúdo gástrico e identificação da droga
em amostras de sangue ou de urina. O diagnóstico de choque é estabelecido com base na
pressão arterial; outros exames laboratoriais irão depender da provável etiologia.
O coma hiperosmolar não-cetótico é raro, embora seja registrado com crescente
freqüência. O critério utilizado para o seu diagnóstico consiste em níveis muito altos de glicemia (
geralmente superiores a 500 mg/dL ) na ausência de cetonas no plasma ou na urina. Em geral,
os pacientes tornam-se gravemente desidratados. A osmolaridade plasmática apresenta-se
elevada devido à desidratação e hiperglicemia. Indivíduos com diabetes leve de inicio na
maturidade são a maioria dos pacientes, embora indivíduos não-diabéticos possam ser afetados.
41
Os fatores precipitantes associados incluem infecções, queimaduras graves, corticoterapia em
altas doses e diálise renal. Foram registrados casos ocasionais provocados pela fenitoína e pela
administração de glicose durante a hipotermia.
A síndrome da acidose láctica é rara e pode apresentar várias etiologias. Com mais
freqüência, a sua presença é observada durante a terapia do diabético com fenformina, embora
atualmente ocorra como forma não cetótica da acidose diabética. A causa mais comum da
elevação dos níveis sanguíneos de lactato consiste na hipóxia tecidual do choque. Afirma-se que
o sangue arterial é mais confiável do que o venoso para a determinação do ácido lático. É
preciso evitar a estagnação do sangue produzida pelo uso do torniquete, e a amostra deve ser
mantida em gelo até ser analisada.
17 HIPOGLICEMIA
Das duas categorias clínicas, a hipoglicemia de jejum é, sem dúvida alguma, a de menor
complexidade. Os dois mecanismos principais envolvidos consistem no excesso de insulina
(quer absoluto ou relativo) e nos efeitos da privação de carboidratos. As condições que atuam
através desses mecanismos incluem:
44
EXAMES LABORATORIAIS
Além disso, a maioria dos endocrinologistas exige a observação de níveis séricos elevados
de insulina durante a hipoglicemia.
48
20 DETERMINAÇÃO DA PRÓ-INSULINA
A insulina deriva do pâncreas de animais (todavia, existe uma insulina humana sintética,
embora esta forma ainda não seja amplamente utilizada). O uso do hormônio estranho pode
resultar na produção de anticorpos antiinsulina. A insulina de porco é menos antigênica do que a
bovina. Os anticorpos antiinsulina provocam elevação falsa dos valores de insulina na maioria
dos kits comerciais (embora os valores estejam diminuídos em alguns sistemas). Os kits para
determinação do peptídeo C na reagem com insulina de origem animal e, por conseguinte, só
refletem a verdadeira produção de insulina do paciente, não sendo afetados pela presença de
anticorpos antiinsulina.
No passado o teste de tolerância à glicose oral de 5 horas após uma noite de jejum era
amplamente utilizado para a detecção de insulinoma. Tipicamente, os pacientes apresentavam
níveis baixos ou normais baixos de glicose em jejum e elevação aguda, porém, normal após a
administração de glicose (com valor máximo dentro dos limites normais do TTGO); a seguir,
verificava-se uma queda mais lenta para níveis hipoglicêmicos que não retornavam rapidamente
à faixa de referência. Todavia, o TTGO foi praticamente abandonado para o diagnóstico de
insulinoma, visto que uma minoria considerável de insulinomas apresenta uma curva achatada
ou, algumas vezes, uma curva de tipo diabético ou até mesmo uma curva normal. Entretanto, o
TTGO de 5 horas é algumas vezes utilizado em pacientes com hipoglicemia do tipo pós-prandial.
Foram descritos testes provocativos com leucina e glucagon para o insulinoma. Todavia, são
raramente utilizados, porquanto são ligeiramente menos sensíveis do que o teste da tolbutamida
e acentuadamente menos sensíveis do que a relação insulina imunorreativa e glicose após jejum
prolongado.
Na atualidade, a maioria dos pesquisadores utiliza a tríade de Whipple e o jejum prolongado
(com determinação da insulina ou da relação insulina imunorreativa e glicose) como principais
testes de triagem para o insulinoma, recorrendo ao teste de tolbutamida nos casos equívocos ou
problemáticos. O diagnóstico diferencial de níveis diminuídos de glicose e níveis elevados de
insulina inclui insulinoma, hipoglicemia factícia e a presença de anticorpos antiinsulina estão
associadas a níveis normais ou diminuídos de peptídeo C.
52
22 HIPOGLICEMIA PÓS-PRANDIAL
A seguir, são apresentadas algumas das etiologias mais comuns da hipoglicemia pós-
prandial (também conhecida como hipoglicemia reativa).
54
23 TESTES LABORATORIAIS
Foi relatado que até 10 % de todos os recém-nascidos apresentam pelo menos um valor 57
baixo de glicemia. Os níveis de referência no período neonatal são inferiores à faixa de
referência para adultos, e existe certa divergência quanto ao nível considerado hipoglicêmico. Os
valores considerados hipoglicêmicos na literatura situam-se na faixa de 20 a 40 mg/dL. O valor
de referência mais amplamente aceito para limites inferiores é de 20 mg/dL para prematuros ou
recém-nascidos a termo com peso normal durante o primeiro dia de vida. Esses valores foram
originalmente derivados de determinações efetuadas em amostras de sangue total. A conversão
para valores da glicose no soro ou no plasma eleva o limite inferior em amostras de soro para
cerca de 25 mg/dL no prematuro e para cerca de 35 mg/dL no lactente a termo. A outra faixa de
referência freqüentemente utilizada consiste num limite inferior de 30 mg/dL para prematuros em
amostra de soro e de 40 mg/dL para lactentes a termo durante o primeiro dia de vida. O uso
destes valores de referência resulta em pelo menos 10 % a mais de diagnóstico de hipoglicemia
em comparação com o uso de limites de referência mais baixos. Como um número significativo
desses lactentes é assintomático, os valores mais baixos são utilizados com mais freqüência.
Em ambos os sistemas, o limite inferior da glicose sérica depois do primeiro dia de vida é de 40
mg/dL. A hipoglicemia neonatal idiopática é mais comum em lactentes do sexo masculino com
baixo peso ao nascer e em prematuros. Em alguns casos, a condição é agravada por um atraso
no aleitamento. Os sintomas clínicos, que surgem dentro de 72 horas após o nascimento,
incluem alguma combinação de tremores, contrações musculares, cianose, dificuldade
respiratória, choro de timbre agudo ou fraco, recusa em se alimentar, fraqueza, apnéia e
convulsões. Estes sintomas não são específicos e podem ser devidos a uma grande variedade
de doenças neonatais graves ou potencialmente fatais.
Acredita-se que a hipoglicemia neonatal seja causada, pelo menos em parte, por baixos
níveis de glicogênio hepático. A condição é habitualmente transitória e tratada com leite e glicose
oral ( quando leve ) ou glicose parenteral ( quando grave ). Se o lactente não apresentar nenhum
problema clínico até o início da alimentação Láctea, e se o problema prosseguir, deve-se
considerar a possibilidade de sensibilidade à leucina.
Em geral, os sintomas de sensibilidade à leucina surgem nos primeiros dois anos de vida e
desaparecem espontaneamente aos cinco ou seis anos de idade. A ingestão de alimentos ricos
no aminoácido leucina ( por exemplo, leite de vaca ) estimula aparentemente a superprodução
de insulina pelas células beta do pâncreas, em vez de se mostrar semelhante ao efeito da
tolbutamida. Tipicamente, os pacientes apresentam baixos níveis de glicose em jejum e exibem 58
acentuada hipoglicemia após a administração de leucina. O diagnóstico é estabelecido através
de um teste de tolerância à leucina, semelhante ao TTGO, mas que utiliza leucina por via oral.
Como a leucina também estimula 50 a 70 % dos insulinomas, é preciso considerar também a
possibilidade de tumor produtor de insulina ou nesidioblastose.
Em certas ocasiões, as crianças com hipoglicemia apresentam hiperplasia difusa das células
das ilhotas pancreáticas, conhecida como nesidioblastose. Além disso, ocorre insulinoma,
embora esta situação seja rara. O diagnóstico é o mesmo daquele para o insulinoma e baseia-se
na demonstração de uma elevação inapropriada da insulina quando os níveis de glicemia estão
baixos.
A hipoglicemia pode estar associada com toxemia da gravidez, diabetes melito mal
controlado, hipóxia neonatal grave ou infecção neonatal. O diagnóstico baseia-se na
identificação dessas condições.
59
25 FÉRIAS E FESTAS: O QUE FAZER?
Uma das grandes preocupações dos pais e dos pacientes com diabetes mellitus tipo 1
60
(DM1) refere-se às questões relacionadas com as modificações decorrentes de viagens, festas e
férias. O que fazer: modificar a dosagem de insulina? Diminuir ou aumentar o número de testes
de glicemia? Aumentar o número de aplicações durante a viagem ou suprimir a insulina NPH?
Como conservar a insulina? É necessário algum cuidado especial no seu transporte? Aonde
deve ser transportada a insulina? E se viajar para o exterior como fazer com o fuso horário?
São perguntas complexas e que podem gerar um certo embaraço aos clientes e aos
profissionais de saúde.
Com o controle intensivo (bomba de infusão ou esquema de múltiplas doses), todas
estas questões foram facilitadas. A auto-monitorização facilitou imensamente as mudanças
relacionadas às viagens e ao fuso horário. É importante lembrar que um maior número de testes
de glicemia capilar será fundamental.
A primeira conduta é realizar exame clínico e laboratorial antes das viagens, para
assegurar uma maior tranqüilidade devendo consultar o seu médico e nutricionista previamente.
0 ideal é que o paciente sempre carregue uma quantidade maior de tiras de teste, devido às
possíveis eventualidades.
É muito importante recolher informações acerca do local para onde se pretende ir antes
de planejar a viagem, principalmente quanto às precauções em relação a baixos níveis de
glicemia! Levar sempre uma declaração com atestado médico. Este documento
preferencialmente em idioma inglês, e se possível traduzido para o idioma do país visitado, deve
conter: duração do diabetes e atestar para a necessidade de transportar sistemas de
administração de insulina, tipo e dose de insulina utilizados, equipamento de teste de glicemia,
etc., facilitando a passagem na alfândega. Além disso o atestado garante igualmente a
aprovação médica para viajar, para efeitos de seguros de viagem.
Durante uma viagem os padrões de esforço físico e hábitos de alimentação podem variar
bastante em relação aos hábitos do dia a dia. Poderá ser necessário testar a glicemia com maior
freqüência de modo a ajustar corretamente a dose de insulina. É particularmente importante
testar a glicemia ao deitar, minimizando os riscos de hipoglicemia noturna. Informar os
companheiros de viagem sobre sintomas e cuidados com a hipoglicemia.
Quanto aos alimentos, serão provavelmente bastante diferentes da dieta habitual. O
horário das refeições também tende a ser modificado. O paciente deve procurar agir com
precaução e sempre que tiver dúvidas, proceder ao teste da glicemia capilar. Embora possa ser
difícil encontrar alimentos sem açúcar em alguns países (diet), na maioria das vezes, não é
necessário levar alimentos durante as viagens. No entanto, uma medida benéfica é levar uma 61
quantidade suplementar de lanches prontos, pois poderá necessitar deles no avião, durante um
passeio ou excursão ou em caso de atrasos. O aviso à empresa aérea previamente, também
diminui o índice de complicações agudas.
A insulina degrada-se por ação do gelo, temperaturas superiores a 25º C, ou por
agitação. Deve ser transportada em um saco térmico, firmemente embalada. Nunca coloque a
sua insulina em locais quentes como, por exemplo, o porta luvas do carro. Uma quantidade
adicional de insulina é necessária e deve ser embalada em diferentes sacos ou malas para
prevenir o caso da perda ou roubo de alguma das malas. Quando viajar de avião transporte a
insulina na sua bagagem de mão. Lembre-se de que, em outros países, a insulina pode ser de
diferentes tipos e dosagens da que está habituado(a). Não tente encontrar a insulina de uso
rotineiro em outro país. É importante portar sempre o glucagon (kit de injeção de glucagon)
quando viajar, que deve ser armazenado junto com a insulina. O glucagon tem uma validade até
18 meses.
As rotinas relacionadas com o diabetes podem ser confusas quando se atravessam
fusos horários diferentes. A solução mais simples quando se viaja para leste ou oeste é esperar
para acertar o relógio (e os horários das refeições e das injeções de insulina) até chegar ao
destino. Nessa altura poderá ser necessário administrar insulina suplementar ou realizar um
lanche. Faça o teste da glicemia capilar para o confirmar. Se viajar para o exterior por um
período superior a seis meses, é interessante obter informações sobre associações de
diabéticos e indústrias farmacêuticas produtoras de insulina, que poderão auxiliar na obtenção e
fornecimento da medicação. O seguro saúde internacional é importantíssimo.
0 estresse pode alterar a glicemia. Quanto maior a quantidade de problemas que
conseguir prever e resolver antes de partir, mais fácil será a sua viagem. Procure levar dinheiro a
mais para a viagem, cartão de crédito internacional, ‘traveller’s cheques’ e dólar americano, pois
são bastante úteis para cobrir uma despesa inesperada.
Em relação às festas, nunca aplique a insulina rápida ou ultra-rápida antes de chegar ao
local do evento. O atraso ou qualquer outro imprevisto pode ocasionar reações indesejáveis,
como hipoglicemias graves. Os usuários de bomba de insulina também devem levar a insulina
em caneta, para situações de emergência. Antes de sair de casa, o nível glicêmico deverá estar
em torno de 120 mg / dl. Já o teste e a administração da insulina rápida devem ser feitos após o
início dos serviços de ‘bufê’.
62
26 ATIVIDADE FÍSICA E DIABETES NO BRASIL: NECESSIDADE X RISCOS
Desde o século dezoito, o exercício vem sendo defendido como instrumento benéfico no
tratamento de pacientes com diabetes mellitus. Como ocorre em indivíduos sem diabetes,
pacientes com diabetes mellitus apresentam um aumento na utilização periférica da glicose
associado com um aumento na sensibilidade periférica a ação da insulina que persiste por 12 63
horas ou mais após o final do exercício. Em pacientes com diabetes mellitus tipo 1, um programa
de exercício pode melhorar a sensibilidade à insulina. Alguns estudos porém, não demonstram
uma melhora no controle glicêmico nestes pacientes. Entretanto é bem claro o efeito benéfico do
exercício na performance cardiovascular e no perfil lipídico, aumentando HDL colesterol e
reduzindo triglicérides, tornando valioso o seu efeito sobre a morbi-mortalidade em pacientes
com diabetes mellitus tipo 1 e 2.
No paciente tipo 2, a ocorrência freqüente de resistência à insulina, obesidade,
anormalidade no perfil lipídico e doença cardiovascular, tornam o exercício um potente
coadjuvante aliado na terapêutica e com baixo risco de hipoglicemia. No paciente com DM tipo 1,
o risco de hipoglicemia ou de piora da hiperglicemia e cetose conseqüentes ao exercício
merecem uma abordagem mais cautelosa.
Todos os pacientes diabéticos que iniciarão um programa de exercícios físicos devem
ser previamente avaliados. Se o controle glicêmico é pobre, deverá ser equilibrado antes do
início do exercício. Como regra geral a glicemia deveria ser inferior a 250mg/dl e sem cetose.
Retinopatia severa contra-indica exercício intenso pelo risco de hemorragia. Exercícios
envolvendo membros inferiores em pacientes com neuropatia periférica requerem observação
cuidadosa de lesões nos pés e pode mesmo ser contra-indicado. Para pacientes com neuropatia
pode ser necessário selecionar atividades que não coloque em risco o trauma de membros
inferiores, como por exemplo nadar.
Os diabéticos, reconhecem a atividade física como um elemento importante no controle
metabólico. Porém, em raros casos recebem um suporte e apoio técnico adequados para fazê-
la. Muitas vezes os pacientes diabéticos são orientados pelos endocrinologistas a fazerem uma
atividade física, porém não sabem como começar, qual atividade fazer e como reajustar seu
controle; ao se inscreverem numa academia, em geral, os pacientes se deparam com
profissionais sem nenhuma noção sobre atividade física em diabéticos.
Após o início da atividade física, faz-se necessário a realização testes de glicemias
capilares antes, durante (para treinos com duração maior de 1 hora) e depois da atividade. Com
esses registros de glicemia capilar é possível o ajuste da dose de insulina que em geral é
reduzida com a atividade física.
64
27 EPIDEMIOLOGIA DO DIABETES TIPO 2 NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA
Logo no começo do século XX foi observado que alguns casos de diabetes em crianças
tinham um curso clínico diferente apesar de apresentarem no diagnóstico os mesmos sintomas
das crianças com diabetes clássico, denominado na época diabetes infanto juvenil. Essas
crianças raramente desenvolviam cetoacidose e o uso de insulina não era necessário para a 65
sobrevida. Em 1960 foi descrito um tipo de diabetes de herança dominante de início na infância
que foi denominado diabetes da maturidade no jovem (MODY). Durante alguns anos esses dois
tipos de diabetes eram considerados entidades semelhantes. Atualmente reconhece-se a
existência do diabetes tipo 2 (DM2) em crianças e adolescentes como um tipo de diabetes
distinto do diabetes tipo 1 e MODY.
O DM2 da criança e adolescente responde hoje por até 20% dos casos de diabetes
nesta faixa etária nos Estados Unidos da América, ocorrendo principalmente nas minorias
raciais, isto é, negros e hispano-americanos. De acordo com a Federação Internacional de
Diabetes as alterações do estilo de vida, principalmente a ingestão de alimentos de alto valor
calórico e teor de gordura com diminuição dos exercícios físicos, tiveram como conseqüência a
obesidade que hoje constitui um dos mais importantes fatores de risco para o diabetes tipo2. O
aumento da prevalência da obesidade nas diferentes faixas etárias é um fato constatado na
maioria dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, sendo de até 54% em crianças e
adolescentes americanos principalmente nos últimos anos desta década, enfatizando-se o
surgimento freqüente da obesidade mórbida que era rara nesta fase precoce de vida. A
obesidade não seria um fator de risco somente para a intolerância a glicose e/ou diabetes, mas
também para outras alterações metabólicas e clínicas como a dislipidemia, hiperuricemia e
hipertensão arterial como recentemente foi demonstrado.
Os estudos epidemiológicos sobre DM2 em crianças e adolescentes ainda são
escassos, com pouca representatividade mundial. No Canadá, pesquisas demonstram que em
Manitoba a prevalência de DM2 nos índios nativos triplicou nos últimos 5 anos, já atingindo 20%.
No Japão, entre 1976 e 1995, a incidência do DM2 aumentou de 0.2 para 7.3 /100.000, sendo
hoje quatro vezes maior que a do DM1. Em Cincinati, a incidência de DM2 em adolescentes
aumentou de 0.7 para 7.2 /100.000 de 1982 a 1994, atingindo 16% dos casos até 19 anos e 33%
dos casos de 10 a 19 anos. Na Califórnia, 31 % dos pacientes jovens com diabetes com idade
inferior a 17 anos são de DM2. Nos índios Pima esta mesma tendência foi observada com um
aumento da prevalência de 1967-1976 para 1987-1996 de zero até 5.31% entre 10 e 14 anos.
Na maioria destes estudos a maior incidência é verificada na adolescência entre 10 e 15 anos, e
em algumas séries no sexo feminino com presença de acanthosis nigricans em mais de 50% dos
casos. No diagnóstico do diabetes os sintomas podem estar presentes acompanhados de cetose
sendo necessário o uso de insulina que posteriormente pode ser descontinuado e substituído por
hipoglicemiantes orais. Os antecedentes familiares de DM2, em geral maternos, estão presentes
em mais de 50% dos pacientes. No momento atual o ambiente intra-uterino diabetogênico e o 66
peso no nascimento menor que 2.5 kg e maior que 4.5kg têm sido descrito como importantes
fatores de risco. A prevenção da obesidade na criança e adolescente, através de mudanças
comportamentais, através de um trabalho conjunto entre profissionais de saúde, escola e
familiares é opção terapêutica mais eficaz a longo prazo.
28 TRATAMENTO DO DIABETES TIPO II
GLIBENCLAMIDA
67
1. Mecanismo de ação: reduz o nível sangüíneo de glicose inicialmente
pela estimulação da liberação de insulina pelo pâncreas.
2. Posologia: deve ser administrado junto às refeições e iniciado com uma
dose baixa, que deve ser aumentada gradualmente, objetivando-se evitar a
ocorrência de hipoglicemia recomenda-se a dose inicial de um comprimido de 5
mg ao dia junto com uma refeição. Pode-se aumentar a dose para um
comprimido após o almoço e outro após o jantar. Os aumentos de dose devem
ser feitos com intervalos de 2 semanas até atingir o controle da glicose, até a
dose máxima de 20 mg por dia.
3. Reações adversas: diarréia, dor abdominal, náusea, vômitos,
dispepsia, flatulência e paladar metálico. Podem ocorrer também sintomas de
hipoglicemia: obnubilação, tremor, sudorese e sensação de fome incomum.
Podem ainda ocorrer cefaléia e reações dermatológicas de hipersensibilidade
(prurido, exantemas). Reações de hipersensibilidade generalizada são raras.
METFORMINA
CLORPROPAMIDA
GLIMEPIRIDA
GLICLAZIDA
NATEGLINIDA
70
GLIPIZIDA
ACARBOSE
PIOGLITAZONA
71
ROSIGLITAZONA
72
REPAGLINIDA
NATEGLINIDA
Provas de Depuração
Depuração da uréia
81
31 PROVAS QUE REFLETEM LESAO GLOMERULAR GRAVE, LESAO TUBULAR OU
AMBAS
82
O nitrogênio uréico do sangue (uremia) é, na realidade, determinado mais no soro do
que no sangue total e pode ser dosado na urina. A uréia pode ser dosada através de métodos
bioquímicos ou enzimáticos (com a enzima específica urease). Poucas substâncias interferem
significativamente com ambos os métodos.
Conforme assinalado anteriormente, a uréia é produzida no fígado e excretada pelos
rins. Quando o rim é incapaz de depurar suficientemente a uréia, ela se acumula no sangue. Por
conseguinte, na presença de função hepática razoável, a determinação da uréia fornece uma
estimativa da função renal. A elevação dos níveis de uréia é também conhecida como uremia.
Todavia, os níveis elevados de uréia não são específicos de doença renal intrínseca. Podem
ocorrer níveis sangüíneos elevados de uréia devido a quantidades excessivas de uréia
apresentadas aos rins; diminuição do fluxo sangüíneo renal, impedindo a filtração glomerular
adequada; presença de doença renal intrínseca, que afeta a função glomerular ou tubular;
obstrução urinária, que resulta na interferência da remoção da uréia devido a pressão
retrógrada. Por conseguinte, em alguns tipos de uremia, o rim não está estruturalmente afetado,
e a uremia 6 transitória. Em outros pacientes com uremia, a lesão do parênquima renal constitui
a causa primária; nesta situação, a reversibilidade do aumento da uréia ira depender da
capacidade do rim de recuperar um grau suficiente de função. Os níveis de uréia podem estar
diminuídos abaixo dos níveis esperados na hepatopatia grave (produção insuficiente) e, por
vezes, no final da gravidez.
UREMIA RENAL
1. Doença renal bilateral difusa e crônica ou lesão renal bilateral grave (por
exemplo, glomerulonefrite crônica ou pielonefrite bilateral crônica)
2. Necrose tubular aguda (lesão glomerular ou tubular [ou ambas], devido a
hipotensão ou choque, com insuficiência renal aguda, rabdomiólise traumática ou não-
traumática, transfusões ou reações alérgicas. Certos venenos e precipitação de cristais de
ácido úrico ou de sulfa nos túbulos renais)
3. Lesão glomerular aguda grave (por exemplo, GNA)
Creatinina Sérica
Densidade
Osmolalidade
Excreção de Eletrólitos
A excreção urinária de eletrólitos pode ser utilizada como prova de função renal. Em
condições normais, o rim é muito eficiente na sua capacidade de reabsorver o sódio urinário que
é filtrado no glomérulo.Na presença de lesão renal bilateral difusa e grave (aguda ou crônica), a
capacidade do rim de reabsorver sódio encontra-se prejudicada, de modo que a excreção renal
de sódio torna-se fixa e situada entre 30 e 9OmEq/b (mmol/l).Enquanto a excreção renal de
cloreto permanece fixa entre 30 e 100 mEq/l. As concentrações urinárias de sódio ou de cloreto
de mais de 15 mEq/l acima ou abaixo destes limites constituem uma evidência contra a necrose
tubular aguda ou a insuficiência renal, uma vez que sugerem a presença de certa capacidade de
excreção ou reabsorção tubular renal. Verifica-se uma considerável sobreposição entre uremia 91
pré-renal e necrose tubular aguda na região entre 15 e 40 mEq/1 para o sódio urinário. A
excreção urinária de sódio deve ser inferior a 15 mEq/l para ser razoavelmente diagnóstica de
uremia pré-renal. E mais difícil interpretar valores situados entre 40 e 105 mEq/l, visto que
podem ocorrer tanto normalmente quanto na presença de insuficiência renal, dependendo do
equilíbrio corporal do sódio. Na presença de hiponatremia, a avaliação torna-se muito mais fácil.
A hiponatremia impele o rim a reabsorver maior número de íons sódio, resultando normalmente
numa queda do nível urinário de sódio para menos de 15 mEq/l. Na presença de hiponatremia, o
nível urinário de sódio na faixa de 40-90 mEq/l sugere fortemente insuficiência renal. Uma das
principais dificuldades consiste no uso freqüente de diuréticos em pacientes com possíveis
problemas renais, uma vez que estes medicamentos modificam os padrões renais normais de
eletrólitos, podendo aumentar a excreção urinária de sódio acima do esperado na hiponatremia.
Embora possa ser útil, a excreção urinária de sódio não é mais considerada a prova mais
confiável ou de maior utilidade para diferencia na uremia pré-renal da insuficiência renal.
A depuração de água livre baseia-se na função tubular renal que envolve a reabsorção
de líquidos e eletrólitos, com formação de água livre. Esta atividade é uma das últimas funções
renais a serem perdidas. Quando não pode mais ocorrer reabsorção de água, a excreção de
água livre aumenta. Pode-se utilizar a prova de depuração de água livre para demonstrar a
capacidade de concentração renal ao calcular a depuração de partículas osmoticamente ativas
(influenciada pelo conteúdo de eletrólitos e água livre na urina) e ao relacioná-la com a
velocidade do fluxo urinário para obter a fração de água livre excretada.
A faixa de referência para a prova de depuração de água livre é de –20 a –100. Na
necrose tubular aguda ou na insuficiência renal crônica, os valores geralmente aproximam-se de
zero ou são positivos. Todavia, certas outras condições podem produzir valores semelhantes,
incluindo excreção de água em excesso em pessoas com baixa osmolalidade sérica e diurese
em pacientes com osmolalidade sérica e diurese em pacientes com osmolalidade sérica normal
induzida por vários fatores, como diuréticos. Todavia, o valor produzido da depuração de água
livre geralmente não persiste por mais de 24 horas nessas condições, porém o faz em pacientes
com lesão renal grave. A depuração de água livre constitui a prova de função renal de maior
utilidade para diferenciar a uremia pré-renal da insuficiência renal. As principais desvantagens 92
incluem a necessidade de colheitas de urina em horas exatas e a interferência dos diuréticos.
Vários registros indicam que os pacientes com uremia pré-renal tendem a reabsorver
mais sódio urinário após filtração glomerular do que os pacientes com lesão renal intrínseca
grave, como necrose tubular aguda ou insuficiência renal crônica. A fórmula utilizada é:
Outras provas
Foram sugeridas duas substâncias como marcadores da função tubular renal. A N-acetil-
beta-D-glicosaminidase (NAG) é uma enzima demasiado grande para ser filtrada pelos
glomérulos, sendo encontrada em altas concentrações no epitélio tubular proximal renal. O
aumento na excreção urinária de NAG indica a sua liberação pelas células tubulares renais e
sugere a presença de lesão celular tubular renal. Esta informação não diferencia entre lesão
focal e difusa, nem entre comprometimento unilateral e bilateral. Diversas etiologias produzem
lesão tubular renal aguda, como redução do fluxo sanguíneo arterial renal (por exemplo, episódio
de hipotensão produzindo necrose tubular aguda), rejeição de transplante renal e toxicidade
medicamentosa (por exemplo, ciclosporina ou aminoglicosídeos). A dosagem desta enzima tem
sido utilizada, em grande parte, como triagem para rejeição de transplante renal. A observação
de uma elevação pronunciada, apesar de não específica, levanta a possibilidade de rejeição.
Outra substância encontrada apenas nas células tubulares proximais é a proteína de
ligação da adenosina-desaminase (PLA ou ABP). A determinação da ABP também tem sido
altamente utilizada para a detecção de rejeição de transplante renal e apresenta a maioria das
vantagens e desvantagens observadas com a NAG.
Existe uma variedade de técnicas de pesquisa que não são geralmente disponíveis, mas
que podem avaliar uma ou outra das numerosas funções renais, incluindo secreção tubular de
várias substâncias, filtração glomerular de materiais não reabsorvidos e fluxo sanguíneo renal 93
através da depuração de substâncias que são filtradas e secretadas.
33 UREMIA (ELEVAÇÃO DO NÍVEL DE NITROGÊNIO URÉICO DO SANGUE) E
INSUFICIÊNCIA RENAL
Muitos autores utilizam o termo “azotemia” como sinônimo de uremia, embora a uremia
seja uma síndrome que deve ser também definida em termos clínicos. Em geral, o valor de cerca 94
de 100mg/dL para a uréia é considerado como limite para separar a categoria geral das uremias
pré-renais agudas reversíveis dos episódios agudos mais prolongados e das uremias crônicas.
Em geral, trata-se de uma distinção exata, embora exista uma minoria pequena, porém
importante, de casos que não obedecem a esta regra. Assim, alguns pacientes urêmicos
parecem estabilizar-se com níveis mais baixos de uréia até o episódio terminal, enquanto alguns
indivíduos com uremia transitória aguda podem apresentar níveis de uréia em torno de
100mg/dL e, raramente, superiores a 125mg/dL que se normalizam rapidamente após o
tratamento do distúrbio sistêmico primário. É preciso admitir que a uremia pré-renal facilmente
corrigível, com elevação apreciável da uréia, está quase sempre superposta a uma perda da
função ou a uma lesão renal subclínica anterior. Embora a lesão anterior possa não ter sido
grave o suficiente para produzir sintomas, a reserva funcional do rim foi eliminada devido a
alterações causadas pela idade, pielonefrite ou distúrbios semelhantes. Em geral, observa-se o
mesmo processo para a uremia de grau leve (30 a 50mg/dL), que ocorre com desidratação, alta
ingesta de proteínas, insuficiência cardíaca e outras situações importantes, mas não
potencialmente fatais. Após a normalização dos níveis de uréia, a determinação da depuração
de creatinina irá permitir uma avaliação adequada do estado renal do paciente.
O início de oligúria levanta sempre a suspeita de possível insuficiência renal. Durante
muito tempo, a oligúria foi considerada um sinal clínico constante de insuficiência renal aguda
(também denominada necrose tubular aguda); todavia, na atualidade, sabe-se que 30 a 50 %
dos pacientes com insuficiência renal aguda não apresentam oligúria. O volume urinário normal
do adulto é de 500 a 1.600ml/24 horas (depende da ingesta de líquidos). A presença de um
volume de menos de 400ml/24 horas é considerada uma indicação de oligúria se toda a urina
produzida tiver sido realmente colhida. A colheita incompleta ou qualquer perda em torno do
cateter podem dar uma falsa impressão de oligúria. Em certas ocasiões, verifica-se o
desenvolvimento de oligúria e uremia progressiva, tornando-se necessário diferenciar a uremia
pré-renal, que pode ser corrigida ao melhorar a circulação do paciente, da necrose tubular renal
aguda. Este problema é observado com mais freqüência após um episódio hipotensivo ou após
cirurgia.
O diagnóstico diferencial da uremia inclui uremia pré-renal, insuficiência renal aguda
(necrose tubular aguda) e insuficiência renal crônica. Existem duas provas: i fração filtrada de
sódio e a depuração de água livre. Em certas condições, estas duas provas são geralmente
capazes de distinguir a uremia renal da insuficiência renal. Em geral, a elevação do nível sérico
de creatinina e da uréia sugere mais uma insuficiência renal do que uremia pré-renal. Todavia, 95
este aspecto supõe que a elevação da uréia tenha sido detectada numa fase muito precoce após
o seu início. Na maioria das condições, a distinção entre uremia pré-renal e necrose tubular
aguda através do nível sérico de creatinina não é suficientemente confiável. Foram propostas
várias outras provas para a mesma finalidade. Estas provas têm sido consideradas úteis por
alguns investigadores, mas não por outros num número suficiente de casos. Parte desta
diferença de opinião provém dos critérios que cada pesquisador utiliza para diferenciar a uremia
pré-renal da necrose tubular aguda. Em geral, quando os critérios das provas são simplesmente
estruturados para permitir uma melhor separação estatística de todos os casos de uremia pré-
renal e necrose tubular aguda, verifica-se um considerável sobreposição entre os dois grupos.
Quando os critérios são deliberadamente estruturados para separar os casos de uremia pré-
renal ou os casos de necrose tubular aguda e o diagnóstico é apenas estabelecido nos casos
restantes. a prova passa a não ser sensível o suficiente. um bom exemplo é a prova que utiliza a
excreção urinária de sódio. Se for utilizado o ponto-limite de menos de 15 mEq/1 (mmol/l) para o
sódio urinário, a confiabilidade da prova torna-se excelente para excluir a necrose tubular aguda.
Entretanto, um pesquisador verificou que 67% dos pacientes com necrose tubular aguda e 63%
dos pacientes com uremia pré-renal apresentavam valores de sódio urinário situados entre 15 e
40 mEq/l (mmol/l). Por conseguinte, se decidirmos utilizar o valor de menos de 15 mEq/1
(mmol/l) como limite diagnóstico para evitar qualquer sobreposição, excluímos 63% dos casos de
uremia pré-renal deste pesquisador, de modo que a prova torna-se pouco sensível para a uremia
pré-renal, a despeito de sua excelente especificidade obtida ao excluir quase todos os casos de
necrose tubular aguda.
Parte do problema reside no fato de que a necrose tubular aguda pode ser oligúrica ou
não-oligúrica. Alguns critérios de prova, que permitem uma boa separação entre uremia pré-
renal e necrose tubular aguda oligúrica, não se mostram tão adequados para distinguir a uremia
pré-renal da necrose tubular aguda não-oligúrica. Se os pontos-limite da prova forem
reestruturados para incluir a necrose tubular aguda oligúrica e não-oligúrica, a precisão global da
prova pode ser afetada.
Em alguns casos, as provas iniciais indicam que ainda permanece alguma função renal;
todavia, o paciente desenvolve subseqüentemente necrose tubular aguda, devido a progressão
da doença subjacente ou a superposição de algum outro fator.
0 exame de urina pode fornecer informações úteis em pacientes com necrose tubular
aguda. A presença de cilindros hemáticos ou hemoglobínicos sugere glomerulonefrite, 96
endocardite bacteriana subaguda, reação transfusional e doença do colágeno. Os cristais de
ácido úrico podem fornecer uma pista para a nefropatia por ácido úrico. A obtenção de
resultados fortemente positivos nas provas químicas de urina para hemoglobina, na ausência de
números significativos de eritrócitos no exame microscópico, sugere a possibilidade de
mioglobina.
A diferenciação entre necrose tubular aguda e insuficiência renal crônica é
extremamente difícil sem evidência clínica de início agudo. Se o paciente não apresentar níveis
séricos elevados de creatinina, quando examinado pela primeira vez, ou se o ,nível de creatinina
estiver apenas levemente aumentado na ausência de anemia ou de outra evidência de uremia,
existe maior probabilidade de necrose tubular aguda do que de insuficiência renal crônica. As
dificuldades são ainda maiores quando o paciente desenvolve necrose tubular aguda, e surge o
problema de saber se a função renal do paciente pode ser recuperada. Estudos radioisotópicos
com câmara de cintilação podem ser úteis. A observação de captação bilateral deficiente,
trânsito inadequado do córtex para a pelve e redução do fluxo sangüíneo sugere doença renal
difusa crônica. Por outro lado, a captação adequada pelo córtex, o trânsito inadequado do córtex
para a pelve e o fluxo sangüíneo normal indicam mais a presença de necrose tubular aguda ou
de uremia pré-renal. As técnicas isotópicas podem demonstrar uma obstrução pós-renal e quase
sempre são capazes de visualizar os rins quando o PIV falha.
A proteinúria em si não constitui urna prova de função renal, mas acompanha quase
invariavelmente a lesão renal grave. A sua intensidade não se correlaciona necessariamente
98
com o grau de lesão do parênquima renal ou com o estado de qualquer função renal ou grupo de
sistemas. A sua presença e a determinação do seu grau podem, em associação a outros
achados, ajudar a estabelecer o diagnOstico de certas síndromes ou entidades patológicas cujos
achados patológicos renais são conhecidos. A proteinúria pode ser secundária a etiologias
benignas ou extra-renais ou, inclusive, a contaminação da amostra.
Uma questão que surge continuamente é a do significado da presença de pequenos
graus de proteinúria. ,O limite inferior da faixa de referência das proteínas urinárias é geralmente
de 10 mg/dL nos livros. Em termos gerais, os valores de até 30mg/dL encontram-se dentro da
faixa normal; a obtenção de níveis de 30-40 mg/dL pode ou não ser significativamente anormal.
E preciso assinalar que os valores de referência em termos de débito urinário total de proteínas
por 24 h podem atingir 100 mg/24 h. Os valores expressos em miligramas por 24 h podem não
coincidir com os valores expressos em miligramas por 100 ml devido a quantidades variáveis de
água. Uma exceção aos valores de referência convencionais é o diabetes melito, em que a
presença de graus menores de albuminúria pode refletir uma lesão renal inicial e sugerir a
necessidade de revisão da terapia. E preciso frisar que a duração da proteinúria é ainda mais
importante do que a sua quantidade, sobretudo na presença de baixos valores. Por exemplo, a
obtenção de um valor de 60 mg/dL pode ser significativo se persistir. Isso se torna evidente ao
examinar a lista das possíveis causas de proteinúria. A doença renal intrínseca está
habitualmente associada com proteinúria persistente, enquanto a proteinúria observada com
muitos tipos extra-renais aparecem rapidamente quando a doença primária é tratada com êxito.
Todavia, isso nem sempre se mostra verdadeiro, e é preciso lembrar que uma doença pode
causar Iesão permanente em mais de um órgão. Por exemplo, a arteriosclerose ou a hipertensão
podem reduzir ou destruir o tecido renal funcionantes através de nefrosclerose arteriolar, embora
os sintomas cardíacos devidos a lesão cardíaca possam encobrir o quadro renal.
Uma situação comum é o paciente que apresenta proteinúria assintomática isolada ou
em associação a uma doença cuja presença não é esperada. A primeira etapa consiste em
repetir a prova depois de dois ou três dias (em indivíduos clinicamente sadios), ou quando a
doença manifesta estiver sob controle (em pacientes hospitalizados), utilizando uma amostra
colhida pela manhã, a fim de evitar a proteinúria ortostática. Esta técnica é importante, uma vez
que a proteinúria ortostática é comum; vários registros indicam que ela constitui a causa em
cerca de 20% (faixa: 15-70%) dos homens jovens sadios com proteinúria no exame de urina de
rotina. Quando a proteinúria persiste e a possibilidade de proteinúria ortostática e afastada, o
relatório do exame microscópico deve ser analisado a procura de sugestões diagnósticas. Deve- 99
se tomar o devido cuidado para evitar a contaminação da amostra de urina, sobretudo nas
mulheres. A presença e o grau de hematúria ou de piúria sugerem diversas doenças. Se urna
delas estiver presente, deve-se procurar cuidadosamente o aparecimento de cilindros hemáticos
ou leucocitários. A obtenção de uma história clínica cuidadosa pode fornecer informações a
respeito de proteinúria ou hematúria anteriores, sugerindo glomerulonefrite crônica, ou de
infecção renal ou cálculos renais anteriores, que indicam pielonefrite crônica. A uremia que
ocorre em conseqüência de doença renal bilateral crônica quase sempre apresenta hipertensão
associada. (Naturalmente, a hipertensão em si pode ser a doença primária e causar lesão renal
secundária extensa.) Além disso, na doença renal difusa crônica e grave, verifica-se quase
sempre o desenvolvimento de anemia de grau baixo ou moderado, normocrômica ou
ligeiramente hipocrômica, sem qualquer evidência de reticulocitose ou de perda sangüínea. A
etapa seguinte consiste em analisar qualquer densidade randômica obtida. Se uma
determinação for normal (isto é, >1 ,020), a função renal está provavelmente adequada. Se to-
das as determinações forem mais baixas, pode-se efetuar uma prova de concentração ou de
depuração da creatinina, visto que as densidades randômicas de baixo valor podem significar
simplesmente uma exceção elevada de água em vez de uma falta de capacidade de
concentração urinária. Se a taxa de depuração da creatinina sofrer uma redução leve ou
moderada, o paciente possui com mais probabilidade uma perda funcional apenas leve ou
possivelmente moderada. Quando a taxa de depuração da creatinina está acentuadamente
anormal e o valor da uréia está normal na ausência de hipertensão ou anemia, o paciente mais
provavelmente apresenta alguma anormalidade renal bilateral difusa grave, mas não uma
doença totalmente no estágio terminal.
Quando a uréia se encontra elevada, mas o nível sérico de creatinina ainda se encontra
dentro da faixa de referência, podem-se efetuar algumas provas, como a depuração de água
livre, para diferenciar a uremia pré-renal da insuficiência renal inicial (aguda ou crônica). Quando
tanto a uréia quanto o nível sérico de creatinina estão elevados na ausência de anemia ou de
hipertensão deve-se efetuar o diagnóstico diferencial de uremia pré-renal ou de insuficiência
renal, embora a primeira seja menos provável. Nos casos em que a uréia e o nível sérico de
creatinina estão significativamente elevados na presença de anemia e outras evidências de
uremia, o prognóstico é geralmente muito sombrio, embora alguns pacientes com uremia
definida possam sobreviver durante anos com terapia apropriada. Existem exceções as
situações anteriormente descritas, mas elas não são muito numerosas. 100
35 O PROBLEMA DA HEMATURIA