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R E V I S Ã O

Anomalias do Abnormalities of
desenvolvimento sexual development
sexual Mauri José Piazza 1

RESUMO
Palavras-chave:
As anormalidades da diferenciação sexual são infrequentes na prática clínica. A caracteriza- Anomalias Congênitas
Anomalias Urogenitais
ção de uma ampla variedade de síndromes tem sido muitas vezes confusa, necessitando,
Genética Médica
com relativa frequência, a consulta de múltiplos livros e uso constante de referências para
uma correta compreensão. O presente artigo tem a proposta de revisar as entidades mais
frequentes, seus métodos diagnósticos e sua conveniente orientação.

ABSTRACT
Keywords:
Abnormal sexual differentiation is not frequently seen in an individual clinician’s practice. Congenital abnormalities
Uro-genital abnormalities
The categories of many syndromes in this area require special and constant references to
Genetics medical
review many papers and books to understand these abnormalities. In this paper, the most
frequent syndromes are described, and their diagnostic methods and proposals for correct
orientation are provided.

1. Professor Titular de Ginecologia do Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná


- Curitiba - PR - Endereço para correspondência: Rua Padre Agostinho 1923 - ap. 701 - Curitiba - PR - CEP:
80710-000 - e-mail: mauripiazza@hotmail.com.

Femina®. 2016; 44 (3): 201-206 201


Anomalias do desenvolvimento sexual

A caracterização exata de anormalidades da diferenciação padia ou mesmo completamente femininos. A gônada disgené-
sexual é um requerimento necessário na prática clínica. Sua tica deverá ser retirada e a terapêutica hormonal complementar
exata compreensão torna-se necessária voltada principalmente dependerá da orientação sexual previamente estabelecida.
para um diagnóstico preciso e conveniente orientação terapêu-
tica. São diversas as entidades e, entre estas, as mais importan- Em síntese, os protocolos terapêuticos recomendados nas dis-
tes serão caracterizadas nesta revisão genesias gonadais constam basicamente da reposição hormo-
nal com associação estro-progestogênica para permitir perfeito
desenvolvimento sexual. Quanto à ressecção cirúrgica das gô-
DISGENESIAS GONADAIS nadas disgenéticas, esta é necessária quando existir maior risco
para a ocorrência de neoplasias.
Gônada disgenética é aquela gônada que não se desenvolveu
completamente ou teve diferenciação apenas parcial. Estas
gônadas são encontradas em indivíduos: FALÊNCIA/INSUFICIÊNCIA OVARIANA
PREMATURA (FOP, IOP)
• Somaticamente masculinos, como na Síndrome de Klinefel-
ter (47XXY) Constitui-se na interrupção precoce da função ovariana antes
• Somaticamente femininos, como na Disgenesia Gônado- dos 40 anos de idade, com consequentes manifestações clíni-
-Somática (DGS), na Síndrome de Turner (ST) e afins e na cas de hipoestrogenismo e níveis elevados de gonadotrofinas
Disgenesia Gonadal Pura (DGP); (FSH, LH) e níveis plasmáticos baixos do AMH. Como fatores
• S omaticamente com ambiguidade genital, como na Disge- causais encontram-se os genéticos, imunológicos-autoimunes,
nesia Gonadal Mista (DGM), dita também disgenesia gona- tóxico-ambientais (drogas quimioterápicas, tipo alquilantes) e
dal assimétrica. procedimentos cirúrgicos ou radioterápicos. Entre as possíveis
causas genéticas, têm destaque as ligadas a:

• Ausência de um cromossomo X (45, X)


Tanto a DGS quanto a DGP apresentam-se clinicamente com
• Mutações no cromossomo X frágil (tipo Xq27.3 ou Xq26-q28)
retardo do desenvolvimento puberal total ou parcial e sem, ou
• Trisomia do X (47, XXX)
com poucos, caracteres sexuais secundários desenvolvidos.
• Autossômicas com erros enzimáticos: Galactosemia, deficiên-
A etiologia das disgenesias gonadais está relacionada com ano-
cia da enzima 17-hidroxilase
malias dos cromossomos sexuais na grande maioria dos casos.
• Translocações no braço longo do cromossomo X (Xq13-26)
Podendo-se encontrar uma grande multiplicidade de carióti-
pos, sendo os mais frequentes: 45, X, 46, XX/45, X, 45, X/46, XY
ou outros mosaicismos na DGS; 46, XX ou 46, XY (Síndrome de
Com a instalação do quadro clínico, na FOP estarão presen-
Swyer) na DGP; 45, X/46, XY na DGM.
tes todas as manifestações do hipoestrogenismo, acrescidas
As gônadas disgenéticas têm como características serem com- de distúrbios cardiovasculares, urogenitais, metabólicos e
postas por uma estria de tecido conjuntivo, vasos e restos em- cerebrais. Deste modo, as alterações degenerativas ocorre-
brionários do hilo gonadal. Tais gônadas habitualmente são rão precocemente com sensível piora das condições de vida.
desprovidas de células germinativas-gametas e, consequente- Outro ponto essencial, e frequentemente necessário, é avaliar
mente, inexiste produção hormonal. Na DGP é essencial a ca- o potencial reprodutivo destas pacientes, pois tratando-se de
racterização do cariótipo, pois embora na sua maioria seja 46, pacientes jovens há que se determinar a existência ou não de
XX, naquelas com o cariótipo 46, XY ou nos mosaicismos que células germinativas nos ovários.
contenham um fragmento do cromossomo Y, há maior risco (25
a 30%) para o desenvolvimento das neoplasias gonadais, tais A avaliação através das dosagens hormonais, como a do FSH
como gonadoblastomas, disgerminomas ou tumores do seio e do AMH, permite aferir de modo indireto tal possibilidade,
endodérmico.1
mas somente com a biópsia ovariana será possível estimar o
prognóstico definitivo. Inexistindo folículos ovarianos nestas
Na DGM ou assimétrica,2 coexistem de um lado uma gônada
pacientes desejosas de gestar, há a possibilidade de fertiliza-
disgenética e do outro, um testículo. Como consequência disto,
há do lado da gônada disgnética o desenvolvimento de estru- ção in vitro com o emprego de oócitos de doadoras ou, mes-
turas Mullerianas e, do outro lado, pela presença do testículo e mo, apesar dos resultados precários, do transplante de tecido
do fator inibidor de Muller (AMH), há inibição na formação des- ovariano in situ ou mesmo heterotópico. Tendo sido confir-
tas estruturas. Os genitais externos se apresentam com graus mado o diagnóstico da FOP há que se iniciar de imediato a
variáveis de masculinização e poderão variar desde genitais reposição com a combinação estrogênios-progestogênios,
externos masculinos, ambíguos com diferentes graus de hipos- conforme esquemas clássicos de substituição hormonal.

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PSEUDO-HERMAFRODITISMO FEMININO alta mortalidade neonatal, hipernatremia, hipocalemia, hiper-


tensão arterial e retardo puberal (Figura 1). O diagnóstico preco-
Nesta entidade, os fetos geneticamente femininos sofrem um ce destas alterações permitirá uma orientação sexual adequada
acentuado estímulo de androgenização com graus variáveis de e, deste modo, propiciará um desenvolvimento puberal normal
soldadura lábio-escrotal nos genitais externos e do crescimento e mesmo uma normal perspectiva reprodutora. A terapêutica
fálico. Embora afete os genitais externos induzindo quadros de
da HVSR direciona-se ao uso de corticosteroides administrados
ambiguidade sexual, os genitais internos mantêm-se femininos.
precocemente e ininterruptamente para reduzir a produção
A origem dos androgênios é, na maioria dos casos, da suprar- dos precursores androgênicos. A correção cirúrgica das anor-
renal fetal, podendo ser raramente produzidos por tumores malidades anatômicas deverá ser realizada nos primeiros anos
virilizantes materno ou fetal ou, ainda, por ingesta irregular de de vida para que não se desenvolvam problemas psicológicos
substância “símile” aos androgênios pela mãe durante a gesta- devido à anormalidade dos genitais externos.
ção. Sua manifestação clínica poderá ocorrer na vida intraute-
rina ou mais tardiamente, na presença de hiperplasia virilizan- Logo que confirmada a gestação, a gestante deverá ser imedia-
te das suprarrenais (HVSR) devido a um erro enzimático com tamente tratada com dexametasona na dose de 20ug/Kg/dia
déficit na produção dos glicocorticoides (cortisol) e um des- em 3 doses diárias. É importante que se inicie a terapia antes
vio da esteroidogênese para a síntese de androgênios. A for- da 8ª semana de gravidez. Na 11-12ª semana deve-se proceder
ma mais frequente deste erro enzimático é o déficit da enzima a biópsia de vilo coriônico para estudo do sexo fetal e do gene
21-hidroxilase (P450c21) (95% dos casos), sendo esta anormali- CPY21. Se o sexo fetal for feminino e o teste pelo PCR do ale-
dade herdada de forma autossômica recessiva.
lo for positivo, o feto será afetado e a dexametasona deve ser
administrada à mãe e mantida até o final da gestação. Haven-
Os genes responsáveis pela síntese da 21-hidroxilase, designa-
dos de CYP21A e CYP21B, acham-se localizados no cromosso- do suspeita de possível recorrência, o diagnóstico pré-natal da
mo 6. Menos frequentemente (5% dos casos), a enzima 11-beta- HVSR poderá ser realizado quando o casal já teve previamente
hidroxilase (P450c11) poderá também ser deficiente. Raramen- um filho afetado ou serem heterozigotos para a mutação do
te as enzimas 3–beta-hidroxiesteroide-desidrogenase e 17-alfa- CYP.21 Lembrar que esta doença é autossômica recessiva e a
-hidroxilase são insuficientes. Estes casos são responsáveis por chance de ocorrer repetição numa nova gravidez é de 25%.

Figura 1 - Hiperplasia Virilizante das suprarrenais. Diferentes Erros Enzimáticos na Esteroidogênese.

Esteroides

Colesterol

11 -
C21 pregnenolona Progesterona Desoxicorticosterona Aldosterona

P450c17
P450c21

P450c11
3bHSD

(hidroxilase)

170H-pregnenolona 170H-pregnenolona 11 - Desoxicortisol Cortisol

P450c17
(C17, 20-liase)

Desidroepiandrosterona
C19 (DHEA)
Androstenediona Testosterona 5-alfa-redutase

P450aro
3bHSD

C18 Estronal Estradiol Diidrotestosterona (DHT)

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Anomalias do desenvolvimento sexual

PSEUDO-HERMAFRODITISMO MASCULINO deverão ser extirpados cirurgicamente, pois após os 25 anos de


idade há a possibilidade de ocorrerem neoplasias em 25% des-
É a entidade em que os indivíduos são geneticamente mascu- tes pacientes. Nas outras formas de déficit androgênico, a orien-
linos, portadores de testículos, mas que sofreram uma andro- tação e a correção das anomalias irão depender da orientação
genização parcial ou mesmo ausente nos genitais externos. sexual anteriormente estabelecida.
O desenvolvimento dos genitais externos depende basicamen-
te da conversão da testosterona em dihidrotestosterona (DHT)
pela ação da enzima 5-alfa-redutase. Assim quando há ausência HERMAFRODITISMO VERDADEIRO
da DHT, a masculinização dos genitais externos não ocorre e
o feto terá os genitais externos “abertos” com uma vagina em É a ocorrência do desenvolvimento de testículos e dos ovários
fundo cego, e clitóris e lábios menores e maiores normais. ou ovotestis no mesmo indivíduo. Embora possa ocorrer em
certas espécies de animais, sua ocorrência nos humanos é rara.
As causas mais comuns deste pseudo-hermafroditismo são: Sua etiologia é incerta e o quimerismo genético com padrão
• Desordens na produção da testosterona p/erros enzimáticos cromossômico de 46, XX/46, XY pode ser a justificativa, embora
• Déficits na 20, 22 desmolase/17-alfa-hidroxilase/3 beta hidro- o cariótipo 46, XX seja o mais frequente.
esteroide desidrogenase
• Desordens nos locais de ação androgênica por insensibilidade Os tecidos testicular e ovariano poderão estar localizados no
androgênica mesmo lado da pélvis, em lados opostos ou constituindo uma
• Desordens no metabolismo da testosterona por déficit da 5 aparente estrutura única como 1 ou 2 ovotestis, sendo este o
alfa-redutase mais comum. Nos genitais internos, os sistemas ductais que se
desenvolvem dependerão do tecido gonadal mais próximo e o
Consequentemente, estes pacientes não apresentam estrutu- útero, quando presente, poderá apresentar diferentes anoma-
ras Mullerianas, os genitais externos são ambíguos ou femininos lias. Os genitais externos, pela ação da DHT, poderão ter aspecto
e os testículos acham-se no canal inguinal ou no retroperitô- ambíguo e, na fase de adolescência há, com frequência, o apa-
neo. Em indivíduos 46, XY portando gônadas disgenéticas (Sín- recimento das mamas e até a ocorrência de fluxos menstruais.
drome de Swyer), sendo as gônadas rudimentos testiculares,
poderá haver o desenvolvimento de estruturas Mullerianas e A(s) proposta(s) terapêutica(s) visa(rão) exclusivamente assegu-
um maior risco ao surgimento de neoplasias nestas gônadas. rar a estes pacientes uma perfeita adequação entre os achados
anormais e seu sexo de criação e o psicossocial. Com tais me-
A síndrome de insensibilidade androgênica (Síndrome de Mor- didas, as estruturas contraditórias deverão ser ressecadas e as
ris) é uma doença hereditária em que ocorre uma total ou par- anomalias corrigidas para permitir, se possível, uma convenien-
cial insensibilidade aos androgênios produzidos pelos testícu- te vida sexual e/ou reprodutiva.
los na vida fetal. Estudos têm demonstrado que esta síndrome
seria de transmissão materna aos homens e que teria caráter
recessivo ligado ao X ou herança autossômica ligada ao sexo ANOMALIAS MULLERIANAS
masculino. O gene para o receptor dos androgênios está locali-
zado próximo ao centrômero, no braço longo do cromossomo Constituem um grande grupo de anormalidades de ocorrência
X (entre o Xq11-Xq13). Como esta insensibilidade androgênica infrequente na população geral, mas extremamente importan-
poderá ser total ou parcial, as manifestações clínicas ocorrerão te tendo em vista suas possíveis implicações menstruais, hor-
na época puberal. monais e reprodutivas. Diversas classificações foram propostas,
mas a organizada em 1988 pela AFS (American Fertility Society)3
Na forma completa, há ausência dos fluxos menstruais e inexis- permite uma análise destas anormalidades baseada na compre-
ensão da sua embriologia (Figura 2).
tem pelos axilares-pubianos, mas os caracteres sexuais secun-
dários, como as mamas e o aspecto trófico dos genitais exter-
Esta classificação está assim disposta:
nos, são normais, com a vagina relativamente curta em fundo
Classe I. Agenesia ou hipoplasia das estruturas Mullerianas:
cego. Na forma incompleta, há uma grande variabilidade clínica
vagina, colo uterino, fundo uterino, tubas, anomalias combi-
com ginecomastia, genitais ambíguos e graus diversos de pilifi-
cação axilar-pubiano e facial. nadas
A terapêutica dependerá do grau de virilização. Na forma com- Classe II. Útero unicorno único, corno rudimentar acessório

pleta, após o desenvolvimento puberal pleno, os testículos com ou sem cavitação.

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Figura 2- Classificação da AFS (American Fertility Society) das diversas Anomalias Mullerianas.

Hipoplasia/ Anegesia Bicorno

Completo Parcial

Septado

Vaginal Cervical

Completo Parcial

Arqueado Didelfo

Fúndica Tubárea Combinada

Unicorno

Relacionado a DES

Comunicante Não comunicante

Sem cavidade Sem corno

Classe III. Útero didelfo com septo vaginal longitudinal ou


 de fusão das estruturas Mullerianas.4,5 O gene HOXA 13 loca-
com septo vaginal oblíquo liza-se no braço curto do cromossomo 7, entre os loci 14-15.
O gene HOXA 9 é importante para o desenvolvimento das
Classe IV. Útero bicorno completo ou parcial
tubas, o HOXA 10 e o 11 têm ações no útero-endométrio
Classe V. Útero septado completo ou parcial
e no segmento inferior do útero e cervix e o HOXA 13 na
Classe VI. Útero arqueado ectocervice e no terço superior da vagina.
Classe VII. Anormalidades devidas ao DES (Dietilestilbes-
 •C  ystic fibrosis transmembrane conductance regulator gene
trol), útero em T. (CFTR). Esta mutação gênica é capaz de induzir a fibrose cís-
tica. Apresenta uma alta letalidade, sendo também induto-
ra de múltiplas doenças com fenótipos variáveis. Além das
A maioria das anomalias congênitas no aparelho genital femi- manifestações pulmonares poderão suceder nos homens
nino é de etiologia desconhecida, sendo habitualmente casos anomalias Wolffianas e nas mulheres anomalias Mullerianas.6
isolados. A ocorrência simultânea destas anormalidades asso- • Tumor de Wilms 1 gene (WT 1). O nefroblastoma de Wilms
ciadas a defeitos múltiplos em outros órgãos tem mostrado, por é induzido por um gene localizado no cromossomo 11p13,
sua vez, que existem implicações genéticas com vários fatores deletado em pacientes com esta neoplasia. Esta alteração
gênicos envolvidos. Entre estas mutações gênicas conhecidas pode ser acompanhada de retardo mental, malformações
temos: genitais e hipoplasia-agenesia da íris. A expressão preco-
• Gene Homeobox A (HOXA 13). Os genes da família HOXA ce do gene WT1 é necessária para o desenvolvimento das
são essenciais para o desenvolvimento das estruturas Mul- estruturas Mullerianas. Na ocorrência de mutações deste
lerianas. É um tipo de anomalia de origem genética autos- gene, haverá uma ação inapropriada do AMH, causando
sômica dominante em que se associam anomalias esque- regressão parcial dos ductos Mullerianos.7
léticas múltiplas, principalmente nas mãos e nos pés. As • Hormônio antimulleriano (AMH). A deficiência do seu sinal,
anomalias genitais são do tipo multiplicidade com déficits ou mesmo ausência do receptor do AMH8, resultará na

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Anomalias do desenvolvimento sexual

persistência dos ductos Mullerianos nos homens. Sua ina- ANOMALIAS INDUZIDAS POR FATORES
propriada expressão gênica poderá resultar na regressão AMBIENTAIS
anormal dos ductos Mullerianos em mulheres, gerando
assim quadros de agenesia/hipoplasia. Este gene acha-se A exposição a certos agentes teratogênicos poderá induzir
localizado no cromossomo 19 com sub-bandas 13.2 e 13.3 várias malformações. A talidomida, que atua induzindo efeitos
e tem a capacidade de codificar uma glicoproteína produzi- anormais no mesoderma e consequente anomalia nos mem-
da nas células de Sertoli testicular. Nos fetos femininos, sua bros tipo focomelia, é capaz de induzir também anormalidade
existência induz uma diminuição da atividade da enzima nos aparelhos urinário e cardiocirculatório por desregular a
aromatase nas células da granulosa dos ovários. expressão de genes nestes locais.

O dietilestilbestrol (DES), um estrogênio sintético, não esteroide,


anteriormente empregado para a prevenção de abortamentos
AGENESIA ÚTERO-VAGINAL
de repetição e da pré-eclâmpsia, foi capaz de induzir nas filhas
Sua ocorrência é de 1 em 4500 a 5000 mulheres, mas a etiolo- destas usuárias uma maior ocorrência de adenose e de adeno-
gia não está perfeitamente definida. Já foi descrita associada a carcinoma de células claras da vagina.9 Também neste grupo de
erros enzimáticos, como a galactose 1 fosfato-uridyltransferase pacientes foi evidenciado maior ocorrência de anormalidades
(GALT), quando a exposição excessiva à galactose seria respon- uterinas10 descritas como útero em T ou com quadros de hi-
sável pelo desenvolvimento anormal da vagina. Perda da fun- poplasia uterina, anormalidades das tubas e do colo uterino. O
ção gênica do gene Wnt4 ou alterações dos genes HOXA 9 e exato mecanismo teratogênico do DES não é bem conhecido,
HOXA 13 foram também correlacionados com esta anormali- mas acredita-se que o mesmo interfira e exerça mudanças na
dade Mulleriana. Os genes Wnt4 e Wnt5a codificam fatores de expressão de genes da família HOXA, principalmente HOXA10
crescimento para os rins, suprarrenais e todo o aparelho geni- e HOXA.11
tal feminino e podem estar envolvidas no aparecimento desta
agenesia.
LEITURAS SUPLEMENTARES:
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