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NATAL / RN
DEZEMBRO
Palavras-Chave: casamento, poligamia, direito internacional privado, reconhecimento,
validade, lex loci celebrationis
INTRODUÇÃO
As relações entre pessoas de diferentes países têm se tornado mais comuns a cada dia
em virtude da constante integração entre os povos. Pessoas viajam por tempo determinado ou
fazem migração, passando a ter lar em outros países, muitos dos quais possuem uma base
cultural e costumes diferentes da sua terra natal. A depender do país, até mesmo os costumes e
leis referentes à constituição de famílias podem estabelecer modelos distintos daqueles comuns
e permitidos em outros como o Brasil. Enquanto aqui o ordenamento jurídico estabelece a
monogamia como único modelo de casamento permitido, em alguns países da Afríca e da Ásia
se admite legalmente a poligamia.
Este trabalho visa resenhar com base nos estudos do Direito Internacional Privado de
que forma o ordenamento jurídico brasileiro irá tratar o casamento poligâmico contraído no
estrangeiro para aqueles que venham a habitar no Brasil. Procuraremos expor o posicionamento
de pesquisadoras do Direito Internacional Privado sobre a questão e de que forma a legislação
pátria lidará com o reconhecimento ou não desse tipo de relacionamento.
DESENVOLVIMENTO
O autor destaca que o conceito de ordem pública pode variar no tempo e no espaço e
que caberá ao juiz no caso concreto observar sua aplicação. Gil (2008) se manifesta de forma
similar, afirmando que não é possível negar de forma genérica a possibilidade de se reconhecer
qualquer efeito ao casamento poligâmico, e fazendo um resgate histórico que a adoção do não
reconhecimento ao casamento poligâmico nos primórdios da jurisprudência inglesa teve
“efeitos perversos e virou-se contra as mulheres e filhos, as vítimas desta instituição”.
Um fator importante a ser levado em conta ao analisar a situação se dá pela liberdade
religiosa garantida pela Constituição Federal (BRASIL, 1988) em seu art. 5º, inciso VIII,
segundo o qual ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa. Não é
demasiado constatar que os países que admitem o casamento poligâmico o fazem por ser
previsto em sua cultura religiosa. O não reconhecimento de casamento poligâmico contraído no
estrangeiro poderia assim se confundir com discriminação a pessoas de outras crenças que
venham a ter domicílio no Brasil. Necessário ainda destacar que o inciso XXXVI do mesmo
art. 5º da Carta Magna assevera a proteção ao direito adquirido, no qual estaria enquadrado o
casamento realizado em países que admitem a poligamia.
Nesses termos, Medeiros, Sousa e Raposo (2021, pág. 195) também apontam a
necessidade de reconhecimento do casamento poligâmico contraído no estrangeiro como
situação assentada nos direitos fundamentais ligados à cultura e à religião dos envolvidos e
também no direito adquirido:
A união poligâmica, assim como qualquer outro direito inerente ao homem, tem
princípios que a fundamentam, como é o caso do respeito pela identidade cultural das
pessoas de estatuto poligâmico, visando à proteção da própria identidade pessoal; o
princípio da paridade de tratamento das leis, que busca o tratamento digno de todas as
leis, colocando os diferentes sistemas jurídicos em pé de igualdade; o respeito pelos
direitos adquiridos e a continuidade das relações privadas, uma vez que esse é um dos
princípios mais importantes a ter em conta nos casos de validação de casamento
contraído no exterior.
CONCLUSÃO
Diante do que foi exposto, em nossa análise concluímos que, não obstante a poligamia
seja proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro, o casamento poligâmico realizado no
exterior será reconhecido no Brasil em conformidade com o princípio da lex loci celebrationis
em respeito ao princípio do direito adquirido. O reconhecimento e a validade de tais relações
não poderão ser afastadas por suposta ofensa à ordem pública nacional, posto que a Constituição
Federal e o ordenamento jurídico preservam o direito adquirido, bem como a liberdade religiosa
dos indivíduos.
REFERÊNCIAS
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