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Aula 4a – Definição de Comportamento:

Comportamento Respondente

Gabriela Esteves Lopes1


Mariliz Vasconcellos2
Pedro Bordini Faleiros3
Vera Lúcia Varanda Lombard-Platet4

1. A Análise do Comportamento e a concepção de comportamentos


A Análise do Comportamento estabelece a relação funcional entre os
comportamentos e o meio ambiente.

De acordo com Lombard-Platet, Watanabe & Cassetari (2015, p.28):

não é simples dar uma definição de comportamento. As discussões em torno do assunto


são inúmeras. No entanto, temos que partir de algum referencial comum, para podermos
nos entender de maneira objetiva. O comportamento é toda ação observável e
mensurável, executada por um organismo vivo.

Os comportamentos (chamados de respostas abreviadas por R) se referem a ações


executadas por qualquer organismo vivo, na relação com o meio ambiente. Segundo Catania
(1999, p. 27):

1
Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos
2
Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos
3
Doutor em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo
4
Mestre em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo
Os comportamentos são descritos com verbos: as pessoas andam, falam, pensam, fazem
coisas. Mas também fazemos distinção entre ações ativas e passivas. Embora possamos
dizer que alguém respira, não diríamos que alguém “bate o coração”. As pessoas
sangram quando se cortam, mas não falamos de seu sangramento como comportamento.

Deve-se descrever exatamente o que o sujeito está fazendo, ou seja, a ação executada
pelo organismo. Além disso, torna-se necessário observar e/ou analisar os comportamentos
relacionando-os com os estímulos ambientais.

Quando nos referimos ao termo passível de observação (ou observável), estamos


falando de fatos visíveis, audíveis, palpáveis, degustáveis, cheiráveis, enfim, perceptíveis pelos
órgãos dos sentidos. De modo geral, há predomínio do que é percebido pela visão e audição,
visto que são os sentidos mais usados por nós. Quando se diz que o comportamento deve ser
passível de medida precisa (ou mensurável), isso significa que ele pode ser quantificado. Para
isso, são usadas as técnicas de observação e registro de comportamentos, usando medidas
precisas. Podem ser citados como exemplos de medidas a frequência da resposta (número de
vezes que o comportamento ocorre) ou a duração da resposta (tempo que dura o
comportamento), entre outras.

Martin & Pear (2009, p.5) também discutem o conceito de comportamento:

a que nos referimos com a palavra comportamento? Alguns sinônimos comumente


usados incluem atividade, ação, desempenho, resposta e reação. Essencialmente,
comportamento é qualquer coisa que uma pessoa diz ou faz. Tecnicamente,
comportamento é qualquer atividade de um organismo, seja muscular, glandular ou
elétrica. A cor dos olhos de uma pessoa é comportamento? Piscar é comportamento? As
roupas que a pessoa está usando são comportamento? Vestir-se é comportamento? Se
você respondeu não à primeira e à terceira perguntas e sim à segunda e à quarta, estamos
de acordo.

Devemos atentar que alguns comportamentos na verdade configuram classes de


respostas, como um conjunto de comportamentos agrupados por possuírem topografias
(formas) semelhantes ou funções semelhantes no ambiente. Por exemplo, fazer um exercício é
um conjunto de comportamentos que deve terminar com um exercício feito. Podem fazer parte
dessa classe de respostas comportamentos como pegar uma caneta, pegar a folha de um
exercício, pegar folhas de papel, escrever no papel, entre outros. As topografias das respostas
(a sua forma) podem ser diferentes. No entanto, elas produzem a mesma consequência –
exercício feito.

Atribuir “rótulos” a um conjunto de respostas – como no exemplo fazer um exercício -


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é válido porque classifica muitos comportamentos diferentes em uma única categoria, que pode
ser empregada na comunicação entre estudiosos que seguem essa mesma convenção. Sem
definir claramente esses termos (ou rótulos), a comunicação pode ficar prejudicada e envolver
interpretações pessoais e subjetivas. Definir esses termos significa especificar as situações
antecedentes em que os comportamentos ocorrem e os comportamentos propriamente ditos
que farão parte dessa classe de respostas.

É importante definir essas categorias comportamentais principalmente quando o


“rótulo” envolve termos subjetivos, como “ser agressivo”. Enquanto não se identificar as
condições em que ocorrem os comportamentos e os comportamentos que fazem parte dessa
categoria, o uso desse tipo de rótulo não será útil, levando a interpretações subjetivas e sem
esclarecer claramente e de fato os comportamentos envolvidos.

Cabe ressaltar que a observação de comportamentos envolve a objetividade. Por vezes,


pode haver uma tendência a analisar um NÃO comportamento. Por exemplo, ficar triste, ser
agressivo, estar indisposto não exprimem as ações executadas pelo organismo. Esses termos
envolvem a subjetividade na medida em que cada um pode “interpretar” ficar triste, por ex.,
de uma forma diferente. No entanto, esses termos podem ser usados como rótulos DESDE
QUE seja feita uma definição envolvendo a situação e os comportamentos que compõem a
categoria. Essas definições podem variar entre estudos, de sujeito para sujeito. Por exemplo,
pode-se definir “ser agressiva” para a Maria: diante de um pedido de sua mãe para realizar
qualquer tarefa escolar, Maria grita com a mãe, joga os cadernos no chão, chora. Para João,
“ser agressivo” pode ser que ao ver sua filha com o namorado, ele fala palavrões, grita ofensas
ao namorado, dá um tapa no namorado da filha.

Quantos comportamentos podem ser incluídos em uma classe de respostas? Depende


dos objetivos do estudo, do indivíduo que está sendo analisado, entre outros fatores, ou seja,
não há um número determinado de comportamentos que devam fazer parte de uma dada classe
de respostas.

Lombard-Platet, Watanabe & Cassetari (2015, p. 32) dão um exemplo de “participar


da aula”:

“Estando em situação de aula expositiva, em presença do professor, o aluno deverá


apresentar os seguintes comportamentos:

– Olhar em direção ao professor enquanto este fala e/ou se movimenta; – fazer


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anotações no caderno sobre o conteúdo explanado pelo professor; – responder
às perguntas feitas pelo professor, durante a explanação; – fazer perguntas
relacionadas ao assunto explanado;

– Dar exemplos relacionados ao assunto explanado;

– Executar prontamente uma solicitação do professor quando este propõe uma atividade,
tal como ler um texto, responder questões por escrito”.

Mais uma vez, temos respostas bem diferentes incluídas na mesma classe de respostas.

Catania (1999, p.137) cita o exemplo da classe de comportamento autolesivo em


crianças com atraso de desenvolvimento, incluindo “bater a cabeça com força, morder a
própria pele até sair sangue, colocar o dedo no espaço entre o globo ocular e a cavidade ocular
e muitas outras topografias”. O interessante é que o autor compara três crianças diferentes,
com topografias (formas) semelhantes, mas que, ao emitir essas respostas, obtêm estímulos
consequentes diferentes em seu meio ambiente, o que mostra funções diferentes dos
comportamentos.

A topografia refere-se à forma do comportamento, ou seja, movimentos envolvidos,


enquanto a função é a relação entre comportamentos e estímulos consequentes. Topografias
iguais ou semelhantes podem produzir estímulos consequentes diferentes. Catania (1999, p.
137) nos esclarece da seguinte forma:

Para a primeira criança o comportamento de autolesão chama a atenção; para a segunda,


ele evita ter que obedecer a exigências; e para a terceira, o comportamento não parece
depender de qualquer contingência do meio. Tais análises recomendam programas de
tratamento muito diferentes para cada menino.

Em resumo, quando se trabalha com classes de respostas é importante verificar, além


das topografias (que podem ser semelhantes ou não), as funções desses comportamentos, no
sentido de quais são os estímulos consequentes produzidos. Essa análise pode sugerir diferentes
planejamentos de intervenção.

2. Os comportamentos encobertos

Há uma categoria de comportamentos que só pode ser observada e percebida pelo


próprio sujeito – os comportamentos encobertos (ou eventos privados). Tais
comportamentos encobertos só podem ser indiretamente observados, através de outros
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comportamentos observáveis – por exemplo, o relato verbal, incluindo o oral, gestual e escrito,
segundo Skinner (1978). Os comportamentos encobertos, por não serem diretamente
observáveis, são mais difíceis de serem pesquisados cientificamente, mas são muito
importantes. Como lidar com o cliente em terapia sem ter que recorrer a seus comportamentos
encobertos? Como lidar com qualquer aprendiz sem ter que lidar com seus comportamentos
encobertos? Ler, escutar, ver, ouvir, pensar, raciocinar, sentir, todos esses comportamentos
fazem parte da categoria citada.

De Rose (1997, p. 80) afirma que:

à capacidade para comportamentos encobertos é resultado de aprendizagem: um músico


aprende a ler uma partitura, tocando as notas em um instrumento ou cantando. Com a
prática, ele torna-se capaz de cantar as notas de modo inaudível para os demais, mas
audível para ele mesmo. O mesmo ocorre quando uma criança aprende a ler em silêncio.
Estes comportamentos invisíveis são denominados de comportamentos encobertos.

Vamos testar seu conhecimento sobre comportamento fazendo um exercício. Para cada
uma das frases a seguir, diga se há comportamento, ou se há comportamento encoberto ou se
não há comportamento e por quê.

As respostas deste exercício estão após as questões, mas não olhe antes de fazer!

a. Claudete digitou as respostas do exercício no computador.


b. Dirce pensou que a aula seria na quinta feira.
c. A janela bateu na cabeça de Alberto.
d. Lígia não telefonou para seu namorado.

Respostas e justificativas:

a. Há COMPORTAMENTO. Justificativa: há um organismo (Claudete) que executa uma


ação (digitar as respostas no computador) e esta ação é observável e mensurável.
b. Há COMPORTAMENTO ENCOBERTO. Justificativa: há um organismo (Dirce) que
executa uma ação não diretamente observável e mensurável (pensar)
c. NÃO HÁ COMPORTAMENTO. Justificativa: NÃO há um organismo que execute uma
ação observável e mensurável.
d. NÃO HÁ COMPORTAMENTO. Justificativa: há um organismo (Lígia) mas ela não
executa uma ação observável e mensurável.

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3. A Análise do Comportamento e o meio ambiente

O meio ambiente pode ser decomposto em muitos estímulos (abreviados por S). Os
estímulos podem ser definidos como qualquer alteração detectável no meio ambiente. Cabe
aos analistas do comportamento selecionar os estímulos relevantes a um dado comportamento,
os quais, de fato, têm relação com ele.

Pode-se ter como exemplos de estímulos os eventos (como chuva, alguém chamando,
uma cadeira que cai no pé da pessoa, uma instrução dada por alguém); horários, lugares,
objetos, pessoas, estímulos internos como uma dor de barriga. Enfim, há uma imensa variedade
de estímulos, mas devem ser selecionados os que de fato têm relação de dependência com um
dado comportamento, ou seja, estabelecem algum controle sobre esse comportamento.

4. Comportamentos respondentes

Alguns comportamentos estão estreitamente relacionados às contingências de seleção


natural: o ambiente seleciona os indivíduos que, como membros de uma determinada espécie,
exibem certos padrões comportamentais que aumentaram as chances de sobrevivência e de
reprodução, no passado, dos membros dessa espécie (Benvenuti, Gioia, Micheletto, Andery,
& Sério, 2007). Os comportamentos respondentes não são aprendidos, sendo iguais para cada
membro da espécie, e se diz que são eliciados (provocados) por estímulos que os antecedem,
são involuntários.

Segundo Skinner (1931), um reflexo não é o estímulo e nem a resposta, é a relação


entre eles. Todos os reflexos possuem em comum a característica de que um estímulo
específico produz confiavelmente/seguramente uma resposta específica em um organismo
fisicamente sadio. Na relação reflexa ou respondente, as respostas são determinadas apenas
por eventos ambientais antecedentes (Benvenuti et al., 2007).

Na relação operante, o organismo opera no seu meio, emitindo uma resposta e


produzindo consequências que determinam a probabilidade futura da classe de resposta. Na
relação reflexa ou respondente, o organismo apenas responde a estímulos do seu meio. Por
essa razão usamos o termo eliciar quando nos referimos a relação ambiente/sujeito presente
no comportamento respondente: dizemos que o estímulo elicia, no sentido de forçar, e a
resposta é eliciada, no sentido de ser forçada (Benvenuti et al., 2007).

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Para Catania (1999), chamamos de relação respondente aquela em que a resposta tem
probabilidade próxima a 100% na presença do estímulo, enquanto a probabilidade da resposta
na ausência do estímulo é próxima a 0.

Pode-se então discutir as propriedades (ou leis) dos reflexos: limiar, latência e
magnitude.

Dentre as propriedades de um estímulo, podemos começar pelo limiar, que se refere a


intensidade mínima necessária de um estímulo para eliciar uma resposta. Segundo Catania
(1999), a intensidade do estímulo eliciador pode afetar também o tempo de surgimento da
resposta eliciada. Utilizamos então o termo latência para nos referir ao tempo decorrido entre
a apresentação do estímulo e a ocorrência da resposta. Quanto mais intenso um estímulo, mais
rapidamente o organismo responde.

No que se refere a magnitude e duração, estas variam diretamente em relação a


intensidade do estímulo, ou seja, quanto mais forte o estímulo, mais longa e mais intensa é a
resposta eliciada. A variação conjunta dessas propriedades caracteriza a força do reflexo, isto
é, um reflexo será forte quando o responder tem latência curta, a magnitude da resposta é
grande e a duração longa. Ao contrário, um reflexo é fraco se, diante de um estímulo de grande
intensidade, a latência da resposta é longa, a magnitude pequena e a duração curta (Benvenuti
et al., 2007).

Podemos definir comportamentos respondentes como comportamentos eliciados por


estímulos prévios e que não são afetados pelas suas consequências. Comportamentos
respondentes são influenciados pelo condicionamento respondente, o qual se baseia em
reflexos incondicionados. Reflexo incondicionado é uma relação estímulo-resposta em que
um estímulo automaticamente elicia uma resposta sem qualquer aprendizagem prévia. Em
outras palavras, os reflexos incondicionados são “automáticos” ou inatos.

Esse estímulo é chamado de estímulo incondicionado (US, do inglês unconditional


stimulus). Uma resposta eliciada por um US é chamada resposta incondicionada (UR, do
inglês unconditional response).

Um reflexo condicionado é uma relação estímulo-resposta em que o primeiro elicia o


segundo por causa de um condicionamento respondente prévio. O estímulo em um reflexo
condicionado é chamado estímulo condicionado, pois elicia uma resposta por ser um estímulo
que foi pareado a outro que elicia a resposta. Em um reflexo condicionado, a resposta é referida

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como resposta condicionada (RC), sendo definida como uma resposta eliciada por um CS.

Usamos como sinônimos os termos condicionamento respondente,


condicionamento clássico e condicionamento pavloviano.

Existem diversas variáveis que influenciam o desenvolvimento de um reflexo


condicionado:

∙ Quanto maior o número de pareamentos de um estímulo condicionado com um


incondicionado, maior é a habilidade do primeiro de eliciar a resposta
condicionada (CR);

∙ O condicionamento mais forte ocorre quando o estímulo condicionado (CS)


precede o estímulo incondicionado (US) em cerca de meio segundo, uma vez
de por um tempo maior ou se ocorrer após o US;

∙ Um estímulo condicionado (CS) adquire maior habilidade de eliciar uma resposta


condicionada (CR) se ele sempre, e não ocasionalmente, for pareado com um
estímulo incondicionado (US);

∙ Quando vários estímulos neutros precedem um estímulo incondicionado (US),


aquele que estiver mais consistentemente associado ao estímulo incondicionado
(US) é o que mais provavelmente se tornara um estímulo condicionado (CS)
forte;

∙ O condicionamento respondente irá se desenvolver de maneira mais rápida e


intensa do que o estímulo condicionado (CS) ou o estímulo incondicionado
(US), ou ambos serão intensos, em vez de fracos.

- Respostas condicionadas comuns

Por meio da evolução, os seres humanos passaram a nascer com numerosos reflexos
incondicionados.

Vale lembrar que o fato de as respostas reflexas poderem ser condicionadas a estímulos
previamente neutros é um fator biologicamente adaptativo, havendo algumas respostas
condicionadas comuns, como nos exemplos a seguir:

- Sistema digestivo: a salivação é apenas um dos reflexos digestivos suscetíveis ao


condicionamento pavloviano.
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∙ Aversão de paladar condicionada: devido a uma experiência prévia negativa, o sabor
que antes era incondicionado passa a ser condicionado, causando repulsa. O
fenômeno da aversão de paladar condicionada é uma exceção à regra de que o
condicionamento respondente é ineficaz se houver um longo intervalo de tempo
entre o estímulo condicionado (CS) e o incondicionado (US).

- Sistema circulatório: frequência cardíaca elevada e fluxo sanguíneo estão


envolvidos em muitos reflexos condicionados (situações inesperadas de susto ou
constrangimento em público).

- Sistema respiratório: o condicionamento pavloviano também está relacionado a


tosse, espirros e crises asmáticas – reflexos do sistema respiratório (crises de espirros podem
ser eliciadas mediante a visão de cigarro ou animais que soltam pelos).

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Referências

Benvenuti, M., Gioia, P. S., Micheletto, N., Andery, M. A., & Sério, T. M. (2009).
Comportamento respondente condicional e incondicional. Em: M.A. Andery, N.
Michelleto, & T.M. Sério (Org.), Comportamento e causalidade, pp. 49-61.

Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Porto Alegre:


Artmed.

De Rose, J.C.C. (1997). O que é comportamento. Em: R.A. Banaco, (Org.). Sobre
comportamento e cognição: Aspectos teóricos, metodológicos e de formação em análise
do comportamento e terapia cognitivista. (Volume 1). São Paulo: Arbytes, pp. 79-81.

Lombard-Platet, V.L.V., Watanabe, O.M., & Cassetari, L. (2015) Psicologia experimental:


manual teórico e prático de análise do comportamento. 5 ed. São Paulo: EDICON.

Martin, G., & Pear, J. (2009). Modificação de Comportamento: o que é e como fazer. São Paulo:
Rocca.

Skinner, B.F. (1978) Comportamento verbal. São Paulo: Cultrix/EDUSP.

Skinner, B. F. (1989). Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes.

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