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R. S T E V E N N O T LEY
PERSPECTIVA
Jesus
Coleção Estudos
Dirigida por J. Guinsburg
JESUS
^5 ¿ PERSPECTIVA
V/IW^־
Título do original em inglês: Jesus
Copyright © by The Magnes Press / The Hebrew University Jerusalem 1998
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÀO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
F668j
1* edição - Ia reimpressão
[PPD]
2019
D e d ica d o aos m eus a m ig o s M eronitas
Sumário
1. As F o n tes.................................................................................... 1
2. Ancestral id a d e ............................................................................ 7
3. O Batismo......................................................................................19
4. A Lei.............................................................................................. 35
5. Amor.............................................................................................. 57
6. É tica.............................................................................................. 69
7. O Reino do C é u ...........................................................................79
8. O F ilh o ..........................................................................................87
9. O Filho do Homem...................................................................... 97
10. Jerusalém .................................................................................... 107
11. M o rte ...........................................................................................117
12. Epílogo........................................................................................ 141
Estudos Suplementares
13. “A Casa de Davi” num O ssuário........................................... 147
14. “Quem é que Te Bateu?” .......................................................... 153
15. “ . ״Enterrar Caifás, Não Elogiá-lo” .........................................161
16. Qual Era 0 Significado Original de Ecce Homo? ................. 171
17. O Crucificado e os Ju d e u s........................................................ 183
18. Considerações Adicionais: Jesus Lamenta por Jerusalém .. 197
19. A Topografia e a Arqueologia da Paixão:
Uma Reconstrução da Via Dolorosa - Maguen Broshi.........209
20. Os Estágios da História da Redenção segundo
João Batista e Jesus.....................................................................215
1 P. van Paassen, Why Jesus Died, New York, Dial Press, 1949, p. 269. Cf. Walter
Kaufmann, Hegel, New York, Doubleday & Co., 1965.
XII JESUS
6 “ Pouco importa que um número muito grande destes dogmas não contenha a menor
parcela de verdade, hasta que os homens por quem eles são aceitos não saibam que
eles são falsos”. Tratado Teológico-Politico, XIV. Cf. a análise bastante astuciosa
deste ponto em Francis Kaplan, “Le salut par l’obéissance et lanécessité de larévé-
lation chez Spinoza”, Révue de Métaphysique et de Morale, n. 1, 1973, p. 16.
7 Para uma análise recente de todos estes pontos, cf. Henri Laux, Imagination et
Religion chez Spinoza. Lapotentia dans I 'Histoire, Paris, Vrin, 1993. Não se deve
esquecer os fundamentos da leitura spinoziana da Biblia em geral, que também
vale para o Novo Testamento; “Assim como o método na interpretação da natu
reza consiste em considerar desde o início a natureza como historiador c, depois
de reunir dados certos, concluir as definições das coisas naturais, também para
interpretar a Escritura é necessário dela adquirir um conhecimento histórico exato
e possuindo este conhecimento, isto é, dados e princípios certos, pode-se concluir
pela via de legítima consequência o pensamento dos atores da Escritura” ( Tra-
lado Teológico-Politico, VII, trad. C. appuhn, Paris, Gallimard, 1965, pp. 138
139). Cf. L. Jaffro, “Spinoza: la question théologico-politique et la rhétorique de
la philosophic”, em E. Cattin e outros (eds.), Figures du Théologico-politique,
Paris, Vrin, 1999, pp. 91 e ss.
8 Ainda hoje o texto mais relevante sobre o assunto é o de Paul Verniére, Spinoza
el la pensée française avant la Révolution, Paris, PUF, 1954.
XIV JESUS
11 Cf. “Observações de Jean-Jacques Rousseau ... sobre a resposta feita ao seu dis
curso” (Oeuvres Complètes, t. III, pp. 4 3 4 9 )־.
12 J-J. Rousseau, “Lettre à M. de Franquières”, Oeuvres complètes, t. IV, Paris,
Gallimard (La Pléiade), 1969, p. 1146. Um comentário pertinente de todos estes
pontos encontra-se em H. Gouhicr, Les Meditations Métaphysiques de Jean-
-Jacques Rousseau, Paris, Vrin, 1984, pp. 185 e ss.
XVI JESUS
seria aceita pelos sábios e por isto só admitiu no seu reino “os pobres
de espírito e os imbecis”. Quanto à moral de Jesus, ele a teria extraído
dos filósofos, de quem roubou as mais belas sentenças. Dos judeus,
usou as crenças dos fariseus sobre “imortalidade da alma, ressurrei
ção, inferno”.
A reputação divina que lhe veio após a morte, explica-se, segundo
0 autor anônimo, pelo fato de que 0 povo “é acostumado à desrazão”.
Deste modo, ele sempre corre “atrás de fantasmas e nada faz que tenha
a marca do bom senso”, sempre na busca de quimeras. Após a sua
morte, os seus discípulos frustrados “fizeram da necessidade virtude”.
Não tendo sucesso entre os judeus, seguiram rumo aos outros povos.
Com “prodígios e mentiras, deram ao seu mestre a honra de passar
por um Deus, honra à qual Jesus, quando vivia, não tinha alcançado”.
O cristianismo é uma só “impostura grosseira, cujo sucesso e
progressos espantariam mesmo os seus inventores se eles voltassem
ao mundo”15. A frase é importante na sequência de argumentos con
trários a Jesus e aos seus discípulos: eles não herdaram nada dos gre
gos, porque os pilharam. Eles não herdaram nada dos judeus, porque
desejavam abolir as bases de sua “república”. Eles inventaram (a
palavra foi solta!) tudo 0 que lhes diz respeito: divindade de Jesus,
ressurreição, e todos os dogmas.
Assim, quando Rousseau indica que Jesus foi um inventor, a orto
doxia cristã tem razões para apurar os olhos e os ouvidos. O arcebispo
de Paris, Monseigneur de Beaumont, soube dizer o quanto a religio
sidade rousseaunística não enganava os fiéis.
Jesus inventor de religião: tanto na linha de Rousseau, quanto na
mais antiga, a do Tratado dos Três Impostores, 0 Cristo nada deve ao
seu povo, nem aos gregos. Trata-se de um prodígio, nascido do éter
de pensamentos que paira acima das culturas e da história. Tanto a
imagem positiva quanto a negativa indicam um ser diáfano, encerrado
nas formas da moral (professor de boa moralidade, para Rousseau, de
péssima ética, segundo 0 autor dos Três Impostores). Estava preparado,
no cadinho do século XVIII, o básico para a tese do Jesus puramente
moral, 0 ser constituído apenas pela espiritualidade, sem nenhum apego
histórico e sem cultura alguma que o caracterizasse, visto ser ele um
valor, não um ente, capaz de se apresentar em toda cultura.
Chegara a época de I. Kant, 0 seguidor reverente de Rousseau no
campo espiritual. O “chinês de KOnigsberg”, na aguda percepção de
Nietzsche, reduziu a doutrina cristã e a existência de Jesus ao ponto
15 E. Morí (ed.), Traité des trois imposteurs, Herblay, Editions de l ’idée Libre,
1932 (texto de 1768). Encontrado no seguinte endereço eletrônico: http://www.
vc.unipmn.it/~mori/etexts/tti.htm. Paul Vemière desenvolve um extenso conten-
tário sobre este documento (cf. “L’ére des confusions (1715-1750)”, em Spinoza
el la penséefrançaise... ed. cit., pp. 362 e ss).
XVIII JESUS
[...] a pessoa histórica de Jesus, enquanto histórica, não contém qualquer valor em si.
A história pode nos dizer dele 0 que quiser. Nesse sentido é interessante notar que,
cm Kant, jamais aparece o nome de “Jesus”, que designaria o homem histórico, mas o
termo “filho de Deus”, “protótipo” etc., para 0 ideal de perfeição, e “mestre”, “homem
Deus” etc., para o homem concreto. O significado de sua pessoa só poderá estar em
relação com 0 ideal da humanidade13.
16 Para a análise das relações entre Jesus e o cristianismo, é relevante o uso do Kant
Lexicon, publicado por Rudolf Aisler. Emprego a tradução francesa desta obra
(cf. Paris, Gallimard, 1994, pp. 147-153).
17 Cf. Friedrich Delekat, “Person und Werk Jesu Christ¡ (Christologie)”, Immanuel
Kant. Historisch-Kritische Interpretation der Hauptschriften. Heidelberg, Quelle
&Maeyer, 1969, pp. 351-353.
18 Cf. F. J. Herrero, Religião e História em Kant, trad. J. A. Ceschin, São Paulo,
Loyola, 1991, pp. 178-179.
19 C f. J osef Simon, “ Philosophie Critique et Écriture Sainte”, Révue de M éta-
physique et de Morale, Octobre-Décem bre 2000, n. 4, pp. 441 e ss.
APRESENTAÇÀO XIX
20 Esta interpretação tem sido contestada, mas sem muitas oportunidades de persuadir
os leitores de Kant (cf. Stephen Palmquista, “Does Kant Reduce Religion to Mora
lity?”, Kant-Studien, Ano 83,2, 1992, pp. 129 e ss.). O autor “salva” Kant da pecha
de reduzir o cristianismo à moralidade, ampliando a pergunta sobre os nexos entre
os dois campos à figura do próprio Jesus: “Kant reduziu a religião à moral? Talvez
a melhor maneira de responder esta pergunta seja através de uma outra: Jesus e os
escritores bíblicos reduziram a religião à moral?" (p. 148). Esta retórica inteiro-
gativa tem 0 mesmo procedimento que se emprega para afirmar todas as más infi
nitudes: reverbera-se a mesma tese, sem provar o fundamento da questão inicial.
21 Um trabalho cativante, onde se discute as noções rousseaunísticas e kantianas
sobre Jesus enquanto Christus ou apenas enquanto Chrestus, foi redigido por Vin
cent A. MacCarthy, “Christus as Chrestus in Rousseau and Kant”, Kant-Studien,
Ano 73,2,1982, pp. 193 e ss.
22 Cf. Adina Davidovich, “How to Read Religion Within the Limits of Reason
Alone”, Kant-Studien, Ano 85, 1, 1994, p. 14. Para uma correta análise deste
assunto, cf. Edmilson Menezes, História e Esperança em Kant, Aracaju, Editora
da Universidade Federal de Sergipe, 2000.
23 O Cristo seria “o arquétipo da humanidade em sua perfeição moral, fim de toda a
criação. Kant dele distingue Jesus deNazaret, personagem puramente humano, mas
notável pelo caráter divino de seu ensinamento, pela abnegação de que fez prova
na paixão e na morte; ele é portanto para nós um modelo comovente, apenas a lei
moral lhe serve como critério para sua avaliação. Logo, Kant opõe 0 verdadeiro
XX JESUS
Deus morreu, este é 0 pensamento mais terrível: tudo 0 que é eterno e verdadeiro, não
é. A negação c 0 próprio Deus, à qual se une a dor mais elevada, 0 sentimento da completa
perdição, a renúncia de tudo 0 que é mais elevado. Mas 0 curso não se detém aqui, porém
vai até a sua efetivação, Deus persiste neste processo que é apenas 0 da morte da morte.
Deus retoma em vida, se transforma no seu contrário. A ressurreição pertence essencial
mente à fé. O Cristo apareceu após a sua ressurreição apenas para os seus amigos. Esta
não é uma história externa para os incrédulos, mas apenas uma aparição para a fé 21.
jaez traem de modo absoluto 0 desejo de Hegel de colocar sobre o Jesus histórico
as roupagens da Critica da Razão Prática. Nenhum espanto se 0 indivfduo Jesus,
de carne e osso, desapareceu neste horizonte do ideal e do racional. Uso a tradu
ção italiana dc N. Vaccaro e E. Mini, Hegel, Scritti Teologici Giovanili, Napoli,
Guida, 1977, vol. 1, pp. 119 e ss. Um dos mais importantes biógrafos de Hegel,
Karl Rosenkranz, afirma que o filósofo ficou muito pouco satisfeito com a Vida
de Jesus que produziu. Ele pretendia realizar uma “exposição mais completa deste
assunto”. Mais um plano frustrado na longa crônica do saber filosófico, quando
enfrenta a história (cf. Vita di Hegel, Firenze, Mondadori, 1974, p. 72).
27 Eu sublinho. “Christus is nach seiner Auferstehung nur seinen Freuden erschie-
nen; dies ist nicht ãusserliche Geschichte für den Unglauben, sondem nur für den
XXII JESUS
Glauben ist die Erscheinung”. Cf. “Vorlesungen ilber die Philosophic der Reli
gion”, em Werke in zwanzig Bünden, FAM, Suhrkamp, 1969, vol. 17, II, p. 290.
28 Cf. a edição italiana das Lições: E. Oberti e G. Borruso, Lezioni sulla filosofia
delia religione, Bolgona, Zanichelli, 1974, vol. II, pp. 371 e ss. (cf. também a
tradução de J. Gibelin, Leçons sur Ia Philosophie de Ia Religion, Paris, Vrin,
1975,111, 1, pp. 161 e ss.).
29 Lezioni sulla filosofia delia religione... ed. cit., p. 358.
30 G. Lebrun, La patience du concept, Paris, Gallimard, 1972, p. 34.
31 “A filosofia é a compreensão intemporal do próprio tempo e de um modo geral de
todas as coisas do ponto de vista de sua predestinação eterna” (Filosofia da Natureza,
citado por A. Comu, Karl Marx et Friedrich Engels, Paris, PUF, 1955,1.1, p. 42.).
APRESENTAÇÀO XXIII
que pretendera poder-se negligenciar no estudo da religião cristã a sua realidade his
tórica, os relatos bíblicos e evangélicos, para se apegar ao seu conteúdo simbólico,
ele considerava que estes relatos constituíam a essência da religião cristã e via nos
Evangelhos não símbolos filosóficos, mas, sim, mitos que traduziam as aspirações
profundas do povo judeu”54.
R o b er to R o m a n o
D ep a rta m en to de F ilosofia-U nicam p
40. A bibliografia é imensa. Cito apenas dois livros que me parecem interessan
tes para a rem em oração do assunto: H.E. M edico, The Riddle o f the Scrolls,
London, Burke, 1958; M. Burrows, More Light on the D ead Sea Scrolls,
New York, The Viking Press, 1958.
Preâmbulo à Edição Brasileira
Christianity, Tel Aviv, Sifriat Poalim), para se ter uma ideia da dimen
são e da originalidade de seu trabalho. O artigo “The Dead Sea Sect
and Pre-Pauline Christianity” (Scripta Hierosolymitana, Jerusalem,
1958) figura entre as análises mais significativas sobre 0 assunto. Da
mesma relevância são os estudos que realizou sobre o Josippon, entre
os quais “Mechaber Sefer Yosiphon, dmuto vetekufato” (“O autor do
Sefer Josippon, Sua Personalidade e Seu Tempo”, Zion, 18, 1953).
O presente livro, editado originalmente em alemão, sob o título
Jesus in Selbstzeugnissen und Bilddokumenten, apareceu no mesmo
ano, em 1968, em inglês, sendo reeditado nessa língua em 1997, e logo
no ano seguinte conheceu uma nova edição corrigida e aumentada, que
serviu de base para a tradução portuguesa. O título Jesus não define
a obra como uma biografia propriamente dita, pois ela envolve bem
mais do que isso, por seu rico conteúdo histórico, filológico e espiri-
tual-religioso adstrito ao mundo judaico que serviu de pano de fundo à
pregação do Nazareno e seus apóstolos e seguidores. As “biografias”,
ou os estudos sobre a vida do Jesus histórico, como ponto de partida
e pressuposto para o entendimento do cristianismo e suas origens,
acumularam uma imensa biblioteca refletindo correntes, concepções
e posturas religiosas de seus autores. Desde o século XIX, quando a
rejeição da cristologia ortodoxa passou a manifestar-se abertamente
no meio acadêmico, a figura do Nazareno foi objeto de numerosas
investigações que nem sempre ficaram isentas de convicções pessoais
e preconceitos. Desde a Vida de Jesus, de David Friedrich Strauss,
publicada em 1835, e a de Ernest Renan, lembrada acima, e os autores
do século XX já mencionados, passando pelos teólogos protestantes,
que se empenharam na busca da essência do cristianismo e da confi
guração inevitável de um Jesus histórico, foi percorrida uma grande
distância que a inestimável e valiosa obra de David Flusser vem con
firmar. A ênfase dada por ele ao valor do Novo Testamento como fonte
indispensável para 0 estudo do judaísmo e, do mesmo modo, o da lite
ratura rabínica para o entendimento dos escritos neotestamentários,
resulta numa notável intuição em seu método de pesquisa. Se a busca
do Jesus histórico perfaz quase dois séculos, foi nos últimos cinquenta
anos, ou a partir da descoberta dos manuscritos do Mar Morto, que se
começou a redesenhar um novo panorama espiritual do judaísmo do
Segundo Templo e sua conexão com 0 conteúdo do Novo Testamento.
Paralelamente a esse começo, a famosa conferência de E. Kãse-
mann, em 1953, lembrada pelo Prof. James H. Charlesworth - que
reconhece a influência da obra de Flusser - em seu livro Jesus within
Judaism, assinalou de fato “A Nova Busca do Jesus Histórico”,
tendência da atual pesquisa que 0 estudioso alemão G. Bomkamm
sintetizou no seu livro Jesus o f Nazareth. Nesse sentido, devemos
lembrar ainda a obra de Charlesworth que, ao citar um estudioso
PREAMBULO A EDIÇÀO BRASILEIRA XXXV
P r o f . N a c h m a n F a lb el
Prefácio
R. S t e v e n N o t l e y
P rofessor A ssisten te de N o vo Testam ento e C ristia n ism o A n tig o
J eru sa lem U niversity C ollege
Introdução
D a v id F l u s s e r
Jerusalém , P á sco a de 1997
1. As Fontes
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m
W ן
I
. . .
2 Ver agora W. Ustorf, Afrikanische Initiative: Das aktive Leiden des Propheten
Simon Kimbangu, Bern, 1975. O mistério de seu autoconhecimento, no entanto,
não foi solucionado.
3 Ver a relação em D. Flusser, Judaism and the Origins o f Christianity [doravante:
Judaism], Jerusalem, 1988, pp. 621-625.
4 JESUS
hebraico), pp. 28-49. Analisei isso também em meu artigo “The Last Supper
and the Essenes”, Judaism, p. 204.
2. Ancestralidade
eram tão comuns naqueles dias como José e João atualmente. Joset é
uma variação de José - 0 nome do pai de Jesus5. Nos dias de hoje, seria
praticamente impossível que um menino judeu recebesse o nome de
seu pai, se este ainda estivesse vivo. Todavia, em tempos antigos, tal
costume era bastante difundido. A mãe de Jesus chamava-se Maria,
que corresponde ao hebraico Miriam, outro nome comum naquela
época. Muito embora conheçamos poucos nomes femininos de então
- nenhum dos nomes das irmãs de Jesus nos foi transmitido pela
tradição - Josefo menciona oito mulheres chamadas de Miriam. A
primeira é a irmã de Moisés e todas as outras receberam seu nome
por causa dela.
O relato milagroso do nascimento de Jesus pode ser encontrado
em duas versões literárias independentes, a de Mateus e a de Lucas.
Não é mencionado em Marcos e João nem tampouco pressuposto em
nenhuma outra parte do Novo Testamento. À exceção dos escritores
do Novo Testamento, 0 primeiro a mencionar o nascimento virginal
foi Inácio de Antioquia (?6(107 ־.
Como se sabe muito bem, Jesus Cristo significa “Jesus, o Mes
sias”. De acordo com a antiga crença judaica, o Messias deveria ser
descendente de Davi - o Filho de Davi. Ambos, Mateus (1:2-16)
e Lucas (3:23-38) fornecem uma árvore genealógica de Jesus, que
reporta a Davi. Nessas duas genealogias José é 0 descendente do Rei
Davi, e não Maria. O fato mais extraordinário é que as genealogias
de José são encontradas nos mesmos Evangelhos - Mateus e Lucas
- que contam a história do nascimento virginal. Parece que os dois
evangelistas não viam nenhum conflito entre Jesus descender de Davi
através de José e sua concepção sem a intervenção de um pai humano.
Devemos ter em mente que as duas genealogias concordam somente
de Abraão até Davi7. Os problemas internos de ambas as relações e
suas diferenças consideráveis nos deixam a impressão de que foram
construídas ad hoc, por assim dizer, com 0 intuito de provar a dinas
tia de Davi8.
Seria muito natural que qualquer messias almejado fosse legi
timado retrospectivamente por seus seguidores como sendo 0 Filho
de Davi. Por outro lado, tomou-se claro que na época de Jesus havia
tenha coberto dois, ou mesmo três, anos. Hoje em dia, tomou-se sufi
cientemente claro que João, 0 teólogo, tinha poucas intenções de ser
um historiador e seria, pois, imprudente aceitar sua cronologia ou sua
estrutura geográfica sem um exame criterioso13.
Ao mesmo tempo, temos de indagar se também os três primeiros
Evangelhos pretendiam apresentar um esquema histórico e geográfico
ou, em que medida este esquema foi condicionado pelas suposições
teológicas dos evangelistas individuais14. Há evidência material suges-
ti va de que, nestes aspectos cronológicos e geográficos, os sinoptis-
tas são confiáveis. Jesus pode ter exercido seu ministério na Judeia
e em Jerusalém, antes de sua jornada final para a morte, mas sua
esfera real de atuação foi na Galileia, na margem noroeste do lago de
Genesaré. Ficará inclusive evidente que os acontecimentos na vida de
Jesus são melhor compreendidos partindo-se do pressuposto de que
0 batismo e a crucificação foram separados por um espaço de tempo
muito curto. Há eruditos que sugerem ter Jesus morrido na Páscoa,
no ano de 30 ou de 33. O mais provável é que tenha sido batizado em
28/29 e morto no ano 30.
Seus pais iam todos os anos a Jerusalém para a festa da Páscoa. Quando 0 menino
completou doze anos, segundo 0 costume, subiram para a festa. Terminados os dias,
eles voltaram, mas 0 menino Jesus ficou em Jerusalém, sem que seus pais 0 notassem.
Pensando que ele estivesse na caravana, andaram o caminho de um dia, c puseram-se a
procurá-lo entre os parentes e conhecidos. E não o encontrando, voltaram a Jerusalém
à sua procura. Três dias depois, eles 0 encontraram no Templo, sentado em meio aos
doutores, ouvindo-os e interrogando-os; e todos os que 0 ouviam ficavam extasiados
com sua inteligência e com suas respostas.
15 Ver Nm 18:15.
16 O historiador Flávio Josefo apresenta uma historieta similar sobre si mesmo,
“Enquanto ainda menino, com cerca dc quatorze anos, ganhei aplausos unânimes
12 JESUS
pelo meu amor às letras; a tal ponto que os principais sacerdotes e os homens
proeminentes da cidade costumavam vir a mim constantemente, à busca de
informação precisa sobre alguma particularidade cm nossos preceitos” (Life 9).
17 O comentário de L. H. Feldman em Josephus, Cambridge, Mass., 1965, vol. IX,
p. 49.
18 A definição de Jesus como um “homem sábio”, apresentada por Josefo, é con
firmada pela tradução árabe da suposta redação original da passagem.
19 A palavra grega “sofista” aparece também em textos rabínicos, designando um
sábio judeu. Ver M. Jastrow, Dictionary o f the Talmud, p. 968; M. Sokoloff, A
Dictionary o f Jewish Palestinian Aramaic, Ramat Gan, 1990, pp. 371-372.
20 Josefo, Antiquities 17:152; War 1:648, 650.
21 Ver a observação em Flávio Josefo, De bello Judaico, Darmstadt, 1957, vol. 1,
p. 425.
ANCESTRALIDADE 13
24 Mt 21:2327 ־c Lc 20:1-8. Ver D. Daubc, The New Testament and Rabbinic
Judaism, London, 1956.
25 Halm, op. cit., pp. 7 4 8 1 ־.
26 Hahn, op. cit., pp. 75-76.
27 Ver Ada Yardcni, Naha! Seelim Documents, Jerusalem, 1995, pp. 9 1 9 2 ־.
28 Tratado Avot [Massekhet Avot (Ética dos Pais)], 1:10.
29 J. Levy, Worterbuch iiber die Talmudim und Midraschim III, Berlim, 1924, p.
338.
ANCESTRALIDADE 15
pinteiro30. Este fato, por si só, não constitui uma prova de que ele ou
seu pai fossem instruidos, mas vem alegar contra a noção idílica de
Jesus como um trabalhador manual ingenuo, afável e simples.
Nietzsche estava certo ao escrever, “As tentativas que conheço de
construir a história de uma ‘alma’ a partir dos Evangelhos parecem
-me sugerir uma frivolidade psicológica deplorável”31. Existe, porém,
um elemento psicológico na vida de Jesus que não podemos ignorar:
0 conflito entre seus laços familiares e a compreensão que tinha de sua
tarefa divinamente nomeada. Este elemento pode ser encontrado até no
Evangelho de João que, do ponto de vista histórico, é menos fidedigno.
Numa festa de casamento em Caná, a mãe de Jesus pediu-lhe que
fizesse vinho e ele retrucou: “Que queres de mim, mulher?” (2:4)32.
Numa narrativa apócrifa recentemente descoberta, esta temática de
tensão entre Jesus e sua família é realçada de forma quase que intolerá
vel. A fonte33 relata que, quando ele estava sendo crucificado, sua mãe
Maria e seus irmãos Tiago, Simão e Judá vieram e postaram-se diante
dele. Pendurado na cruz, Jesus disse a ela: “Pega teus filhos e vai-te!”
A intensificação desta tensão familiar está também presente nos
Evangelhos Sinóticos. Segundo Lucas 8:21, Jesus reconhecia a devo
ção religiosa de sua família, “Minha mãe e meus irmãos são aqueles
que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática”34. Não obstante,
ele exaltava a importância dos que acreditavam. Numa outra ocasião
ouvimos que “certa mulher levantou a voz do meio da multidão e
disse-lhe: ‘Felizes as entranhas que te trouxeram e os seios que te
amamentaram’. Ele, porém, responde: ‘felizes, antes, os que ouvem a
palavra de Deus e a observam’ ” (Lc 11:27-28)35. Ainda assim, a ver
são de Marcos a respeito de Lucas 8:21 exagera esta tensão familiar,
interpretando-a como uma rejeição que Jesus fazia de sua família: “
‘Quem é minha mãe e meus irmãos?’ E, repassando com 0 olhar os
que estavam sentados ao seu redor, disse: ‘Eis a minha mãe e os meus
irmãos. Quem fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe’”
(Mc 3:34-35; cf. Lc ll:27-28)36.
Não obstante a evidência da criatividade editorial dos evange
listas, Jesus compreendia claramente que um compromisso religioso
intransigente resulta, por vezes, no rompimento dos laços familiares:
“Em verdade eu vos digo, não há quem tenha deixado casa, mulher,
irmãos, pais ou filhos por causa do Reino de Deus, sem que receba
muito mais neste tempo e, no mundo futuro, a vida eterna” (Lc 18:28
30). “Disse a outro: ‘Segue-me’. Este respondeu: ‘Permite-me ir pri
meiro enterrar meu pai’. Ele replicou: ‘Deixa que os mortos enterrem
os seus mortos’ ... Outro disse-lhe ainda: ‘Eu te seguirei, senhor, mas
permite-me primeiro despedir-me dos que estão em minha casa’.
Jesus, porém, lhe respondeu: ‘Quem põe a mão no arado e olha para
trás não é apto para 0 Reino de Deus’ ” (Lc 9:59-62). Há um dito mais
pertinente que não soa tão inumano em hebraico como na tradução.
“Se alguém vem a mim e não odeia seu próprio pai e mãe, mulher,
filhos, irmãos, irmãs ... não pode ser meu discípulo” (Lc 14:26)3738.
Uma tensão carregada de emotividade parece ter surgido entre
Jesus e sua família em Nazaré. E pode ser que este fato psicológico -
cujo pano de fundo nos é desconhecido - tenha contribuído fortemente
para sua resolução pessoal, tão decisiva para a humanidade. O fator que
impulsionou sua partida de Nazaré foi, provavelmente, 0 fato de sua
família ter encarado a missão que conduziu Jesus à morte como uma
ilusão perigosa (Jo 7:5). Jesus suspeitava corretamente que nem seus
próprios familiares aprovariam sua missão e por esta razão não teria
voltado ao lar depois de seu batismo, dirigindo-se a Cafamaum. Mais
tarde, quando retornou de visita à sua cidade natal, provou que ninguém
é profeta em sua própria terra (Mt 13:57; Mc 6:4; Lc 4:24; Jo 4:44).
O que aconteceu à família de Jesus após a sua morte? Um relato
interessante (At 1:14)3sconta-nos que Maria, a mãe de Jesus, e seus
irmãos juntaram-se aos apóstolos em Jerusalém. O irmão do Senhor,
Tiago, veio a ter fé quando Jesus ressurrecto lhe apareceu39. Em 62 d.C.
36 A versão de Marcos deste dito parece ter sido influenciada por seu relato único e
não confiável alguns versículos antes, de que os familiares de Jesus vieram para
detê-lo, porque “diziam: ‘Enlouqueceu!’ ” (Mc 3:21). Ver Taylor, T h e G o s p e l
A c c o r d in g t o St. M a rk , New York, 1966, pp. 235-236; ver também Schmidt, op.
c it., pp. 122-123.
37 Em hebraico, os verbos “odiar e amar” podem ser justapostos de modo a sugerir
preferência (e .g ., Gn 29:31). O apóstolo Paulo estava também familiarizado com
este uso idiomático, “Conforme está escrito: ‘Amei a Jacó e aborrecí a Esaú’ ”
(Rm 9:13); “Contudo, eu amei Jacó e odiei a Esaú” (Ml 1:2-3).
38 Ver E. Haenchen, D ie A p o s te lg e s c h ic h te , Gottingen, 19592; E. Meyer, U r s p r u n g
u n d A n fü n g e d e s C h r is te n tu m s , Stuttgart-Berlin, 1921-1924, pp. 44-45.
39 1 Cor 15:7; Gl 2:9; sobre a história da família de Jesus, ver E. Hennecke & W.
Schneemelcher, N e w T e s ta m e n t A p o c r y p h a , /, G o s p e ls a n d R e l a t e d W ritin g s,
Westminster, 1991, pp. 470-488.
ANCESTRAL IDADE 17
Quando outros também sc juntaram às multidões à sua volta, pois que eram esti
mulados ao extremo pelos seus sermões, Herodes alarmou-se. Uma eloquência que
exercia um efeito tão grande sobre a humanidade poderia conduzir a alguma forma de
sedição, pois parecia que eles seriam guiados por João em tudo que fizessem. Herodes
decidiu, portanto, que seria bem melhor golpear primeiro e livrar-se dele antes que sua
obra provocasse uma rebelião, do que esperar por uma sublevação, envolver-se numa
situação difícil e constatar 0 erro’.
Havia exortado os judeus a levar uma vida íntegra, praticar a justiça para com seu
próximo e devoção para com Deus e assim proceder para tomar parte no batismo. A seu
ver, isto era uma preliminar necessária para que 0 batismo fosse aceitável por Deus.
Não deveríam empregá-lo para ganhar 0 perdão por quaisquer pecados que tivessem
cometido, mas como uma purificação do corpo, indicando que a alma já estava com
pletamente purificada pela conduta correta5.
Caverna 4 de Qumran.
6 R e g r a s d a C o m u n id a d e (IQS) 5:13-14.
7 I d e m (IQS) 3:8-9.
8 I d e m (IQS) 3:7-8.
9 Outra opinião, pela apologética, pode ser encontrada em At 19:1-7.
10 Lc 3:21-22.
11 A palavra grega traduz 0 hebraico “0 único” . Ver C. H. Turner, “Ho Hyios mou
110 agapetos J o u r n a l o f T h e o lo g ic a l S tu d ie s Π , 1926, ρρ. 113-129; ver também
Μ. D. Hooker, J e s u s a n d th e S e r v a n t, London, 1959, pp. 71, 183.
12 J. Jeremias em T h e o lo g is c h e s W õ rte r b u c h N T , V, p. 699; K. Stendhal, The S c h o o l
o f Sr. M a tth e w , Uppsala, 1954, pp. 110, 144; D. Flusser, “Blessed Are the Poor
in Spirit”, J u d a is m , pp. 110-111 e nota 25; Halm, o p . c it.. pp. 340-346; S. Pines,
The J e w is h C h r is tia n s o f th e E a r ly C e n tu r ie s o f C h r is tia n ity A c c o r d in g to a N e w
The Israel Academy o f Sciences and Humanities Proceedings, vol. II, n.
S o u rc e ,
13, Jerusalem, 1966, p. 63. Estes estudiosos viram que o final de Lc 3:21 e Me
1:11, “em ti me comprazo”, alude a Is 42:1, “era quem minha aliñase compraz” .
0 BATISMO 23
B a r c o d e p e s c a d o L a g o d e G e n e s a r é , p r i m e i r o s é c u lo .
Genesaré. Pedro era casado com uma mulher dos arredores de Cafar-
naum, onde vivia na casa de sua sogra14. Esta tornara-se crente após
ter sido curada de uma febre por Jesus. Sua casa transformou-se quase
num segundo lar para ele e, mais tarde, após a malograda visita à sua
Nazaré natal, Jesus voltou à região de Cafamaum.
O ambiente geográfico para 0 ministério público de Jesus pode
ter resultado da proximidade do local de seu batismo e de sua rela
ção com Pedro. Este não é um contexto teológico, mas estritamente
factual, sendo confirmado pelas próprias palavras de Jesus.
R u ín a s d a s i n a g o g a e m C o r a z im .
Mas eu vos digo: No dia do Julgamento haverá menos rigor para Tiro
e Sidónia do que para vós. E tu, Cafarnaum,/wr acaso te elevarás até
o céu? Antes, até o inferno descerás. Porque se em Sodoma tivessem
sido realizados os milagres que em ti se realizaram, ela teria perma
necido até hoje. Mas eu vos digo que no Dia do Julgamento haverá
menos rigor para a terra de Sodoma do que para vós” (Mt 11:2024;־
Le 10:12-15).
O lado noroeste do Mar da Galileia era densamente povoado e
bem cultivado. A vizinha Corazim - cujo trigo era famoso - não é
mencionada em nenhuma outra parte do Novo Testamento. A desven
turada Maria Madalena, “da qual haviam saído sete demônios” (Lc
8:2), era oriunda da vizinha Magdala. Muitos pescadores ali viviam
e navegavam rotineiramente para a margem oriental, onde havia pei
xes em abundância. Em contraposição a noções populares atuais, os
habitantes desta região não eram interioranos rudes.
Definir a relação entre João Batista e Jesus, após 0 batismo, é
mais importante do que estabelecer o ambiente geográfico do minis
tério público de Jesus. Só depois de corrigir algumas concepções
errôneas comuns é que poderemos retratar Jesus em sua autêntica
relevância. O motivo da distorção reside na cronologia da história
da salvação15, encontrada em Marcos. Porque, na visão cristã, João
Batista era justificadamente considerado 0 precursor de Jesus e porque
a entrada em cena de Jesus segue-se à de João, Marcos faz de João 0
precursor de Jesus, no sentido literal. Dessa forma, segundo Marcos,
Jesus poderia ter aparecido em público só depois de João ter sido
aprisionado. “Depois que João foi preso, veio Jesus para a Galileia
proclamando o Evangelho de Deus” (Mc 1:14).
Mateus dá um passo adiante. Ele seguiu a estrutura cronoló
gica de Marcos (ver Mt 4:12-13), que pressupunha que João tivesse
sido preso antes da primeira aparição de Jesus. Consequentemente,
só depois de João ter sido encarcerado é que Mateus foi capaz de
retratá-lo enviando mensageiros a Jesus, a fim de perguntar-lhe se
“ele era aquele que há de vir”. A versão de Mateus “corrigiu” a cro
nologia original sob a influência de Marcos. Assim, Lucas 4:1 está
certo, ao passo que Mateus 11:2 está errado. E ainda mais: Mateus
revela uma tendência de combinar as palavras de João com elemen
tos do discurso de Jesus (e vice-versa)16. Coloca, pois, a pregação de
Jesus, palavra por palavra, na boca do Batista (Mt 3:2; cf. 4:17). A
mudança da cronologia original por Marcos e Mateus, e a nova ordem
distorcida dos eventos, deu origem a reconstruções desnecessárias dos
primórdios de Jesus.
17 Analisei a tentação de Jesus por Satã em “Die Versuchung Jesu und ihr jtldischer
Hintergrund”, Judaica 45, 1989, pp. 110-128.
18 Mt 11:2-6; Lc 7:18-23.
19 A. von Hamack, Die Mission und Ausbreitung des Christentums, Leipzig, 1924,
vol. 1, p. 344.
0 BATISMO 29
messianique (4Q521)”, Revue de Qumran 60, outubro 1992, pp. 475-522. Apenas
a purificação dos leprosos está ausente nos paralelos. Quanto à última sentença
da resposta de Jesus, comparar com o final de Oseias.
23 A Ascensão de Moisés, 10:1.
24 Ver J. Jeremias, The Parables o f Jesus, New York, 1963, pp. 122-123.
O BATISMO 31
[...] começou Jesus a falar às multidões com respeito a João, “Que fostes ver 110 deserto?
Um caniço agitado pelo vento? Mas que fostes ver? Um homem vestido de roupas finas?
Mas os que vestem roupas finas vivem nos palácios dos reis. Então, que fostes ver? Um
profeta? Eu vos afirmo que sim, e mais do que um profeta. É dele que está escrito“ , ‘E is
que e n v io o m eu m e n s a g e ir o à tu a f r e n t e ; e le p r e p a r a r á o teu c a m in h o d ia n te d e t i Em
verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu nenhum maior do que
João, 0 Batista e, no entanto, 0 menor no Reino dos Céus é maior do que ele. Desde os
dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sofre violência, e violentos se apode
raram dele. Porque todos os profetas bem como a lei profetizaram até João. E, se qui
serdes dar crédito, ele é o Elias que deve vir. Quem tem ouvidos, ouça!” (Mt 11:7-15).
25 Mal 3:1.
26 Ver F a b u la e A e s o p ic a e , ed. Halm, Leipzig, 1875, números 179 “bc.
27 H. L. Strack & P. Billerbeck, K o m m e n ta r zu m N e u e n T e s ta m e n t a u s T a lm u d u n d
M id r a s c h , I, Munich, 1922-1961, pp. 596-597.
32 JESUS
A quem vou comparar esta geração? Ela é como crianças sentadas nas praças,
a desafiarem-se mutuamente, “Nós vos tocamos flauta, e não dançastes! Entoamos
lamentações e não batestes no peito!” Com efeito, veio João, que não come nem bebe,
e dizem: “Um demônio está nele”. Veio 0 Filho do Homem, que come e bebe, e dizem:
“Eis aí um glutão e beberrâo, amigo de publícanos e pecadores”. Mas a Sabedoria foi
justificada pelas suas obras31 (Mt 11:16-19).
7 Nm 19:2.
8 Billerbeck, 1, op. cit., p. 719. O importante é que Raban Yokhanan ben Zakai
estivera falando sobre um mandamento bíblico, ao passo que a abluçâo das mãos
era meramente um preceito posterior, e os preceitos de purificação dos fariseus
eram voluntários.
9 Ver também a importante história extracanônica do confronto entre Jesus e 0
sacerdote fariseu no átrio do Templo, em J. Jeremias, Unknown Sayings o f Jesus,
Naperville, 111., 1965, pp. 47-60.
10 Uma situação similar é descrita sobre Raban Gamaliel, 0 neto do mestre de Paulo,
que ensinava seus discípulos uma compreensão mais leniente de uma questão
legal, enquanto mantinha para si mesmo uma prática mais severa. Quando os
discípulos o desafiaram para que reservasse essa sua interpretação mais rígida
do preceito para sua noite de núpcias, respondeu: “Não prestarei atenção a vos
sas palavras para não cancelar para mim, por uma hora que seja, 0 reino do céu”
(Mischná, Tratado Berakhot 2:5).
40 JESUS
foi apontada para 0 mestre, ele não só veio em sua defesa como tam
bém respondeu de modo muito mais enérgico do que o caso aparen
temente merecia.
Jesus aproveitou a oportunidade para elucidar um ponto impor
tante. Suas respostas, aqui e acolá, não eram tão revolucionárias como
alguém inexperiente poderia imaginar. Seu discurso acerca da pureza
e da impureza é quase uma peça de sabedoria moral popular e as pala
vras de Jesus, na discussão sobre as espigas no Schabat, harmonizam
-se plenamente com as concepções dos escribas moderados. Naquela
mesma ocasião, Jesus dissera: “O Sábado foi feito para o homem, e
não 0 homem para 0 Sábado; de modo que 0 homem1' é senhor até do
Sábado” (Mc 2:27-28). Também os escribas haviam dito: “O Sábado
vos foi dado, não vós ao Sábado” 12.
Jesus sabia como explorar uma ocasião adequada para uma ofensiva
pedagógica contra os fanáticos intolerantes13. Assim 0 fez, por exem-
pio, ao realizar 0 milagre de cura no sábado. Para entender a situação
de forma adequada, devemos ter em mente que caso houvesse uma leve
suspeita de ameaça à vida, toda forma de cura era permitida. Mais ainda,
mesmo quando a doença não era perigosa, a utilização de meios mecâ
nicos era proibida, mas a cura através de palavras era sempre permitida
no sábado. Segundo os Evangelhos Sinóticos, Jesus ateve-se a estas res
trições em todas as suas curas14. O mesmo não ocorreu com João, que
estava menos interessado na história. Ele relata a cura de um homem
cego, história esta reminiscente de Marcos 8:22-26. De acordo com João
9:6, Jesus realizara a cura colocando lama, feita de terra e saliva, nos
olhos do homem cego. Ao contrário de Marcos, João acrescenta, “Ora,
era Sábado 0 dia em que Jesus fizera lama e lhe abrira os olhos... Diziam,
então, alguns dos fariseus: ‘Esse homem não vem de Deus, porque não
guarda 0 Sábado’ ” (Jo 9:14-16). Se Jesus tivesse agido assim, a objeção
dos fariseus teria sido legítima. Observamos, no entanto, que Jesus não
tinha nenhum desejo de opor-se à Lei de Moisés. Queria apenas expor
a inflexibilidade dos fanáticos, usando este caso como um exemplo.
Jesus não só utilizou a crítica de seus oponentes para propósitos
de ensino, ele na verdade sabia como criar situações que realçassem
aspectos de seu ensinamento.
Portanto, somente um único homem foi criado no mundo, para cnsiná-10 que, se
qualquer ser humano leva uma única alma a perecer, a Escritura lhe imputa ter causado
a morte de todo 0 mundo; se qualquer homem salva uma única alma, a Escritura atribui
a ele a salvação de todo 0 mundo15.
Aí lhe trouxeram um paralítico deitado numa cama. Jesus, vendo tão grande fé,
disse ao paralítico: “Tem ânimo, meu filho; os teus pecados te são perdoados”. Ao
ver isso, alguns dos escribas diziam consigo: “Está blasfemando. Quem pode perdoar
pecados senão Deus?” Mas Jesus, conhecendo os seus pensamentos, disse: “Por que
tendes esses maus pensamentos em vossos corações? Com efeito, que é mais fácil
dizer “Teus pecados são perdoados” ou dizer “Levanta-te e anda?” Pois bem, para que
saibais que 0 homem18 tem poder na terra de perdoar pecados” ... disse então ao para
lítico: “Levanta-te, toma tua cama e vai para casa”. Ele se levantou e foi para casa.
Vendo 0 ocorrido, as multidões ficaram com medo e glorificaram a Deus, que deu tal
poder aos homens (cf. Mt 9:1-8).
A cu ra d o h o m e m p a r a lític o (L e 5 :17-26 e p a r a is .) , d a Ig re ja d e D u r a E u r o p a s, p r i-
m e lra m e ta d e d o séc. I I I d .C .
20 Ver P. Volz, Der Geisl Gottes, Tübingen, 1910, p. 164; D. Flusscr, “Die Sünde
gegen den heiligen Geist, “ Wie gut sind deine Zelte, J a a k o w Festschrift zum
60. Geburtstag von Reinold Mayer, Gerlingen, 1986, pp. 139-147.
44 JESUS
D e se n h o d a s em b a rca çõ es.
Há pouca dúvida que 0 quadro da ação naval tinha como intuito referir-se à ocu
pação de um importante membro da familia aqui enterrado ... No caso presente, existe
razão para supor que se trata de uma cena 11a qual o falecido desempenhou papel de
liderança e ele é mostrado claramente na proa de seu navio24.
26 Josefo, Life, 12. Sobre 0 nome “fariseu” e seus vários significados, ver agora
D. Flusser, “Ein Sendschreiben aus Qumran (4QMMT) und der Ketzersegen”,
Bulletin der Sclrweizerischen Gesellschaft fiir judaistische Forschung 4, 1995,
pp. 27-31.
27 F1 3:5; At 23:6; 26:5.
28 Josefo, Life, 191.
29 TB, Tratado Sota 22b; Esta é uma alusão à história contada em Nm 25:6-15.
30 Documento de Damasco (CD) 8:12; 19:25 (segundo Ez. 13:10).
31 Rolo de Ação de Graças (IQH) 4:6-8.
32 TB, Tratado Sotó 22b; TJ, Tratado Berakhot 13b.
A LEI 47
C á te d ra d e M o is é s , d e C o r a z im (v e r M t 23 :2 ).
Porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omi
tido nem um só i, uma só vírgula da Lei12׳. Aquele, portanto, que violar um só desses
menores mandamentos e ensinar os homens a fazerem o mesmo, será chamado 0 menor
no Reino dos Céus. Aquele, porém, que os praticar e os ensinar, esse será chamado de
grande no Reino dos Céus (Mt 5:18-20) ״.
43 Seria absurdo acreditar que, após tais declarações, Jesus pretendesse dizer que
havia um contraste entre seu ensinamento e a lei mosaica. Sei que 'Judo é permi
tido - mas nem tudo convém”(l Cor 6:12). Já foi observado que 0 famoso “mas
eu vos digo” não é uma expressão da oposição de Jesus a Moisés. Na realidade,
a opinião pessoal de Jesus que se segue a esta frase é, na maioria das vezes, con
firmada também nas outras fontes judaicas. Ele escolheu uma ou duas opiniões
judaicas contrastantes que melhor se adaptam à sua ética. Mesmo Mt 5:44, “amai
os vossos inimigos” está dentro da estrutura contextual do Judaísmo (ver infra,
pp. 59-63 e 73-76). Nada que Jesus diz no sermão conflita particularmente com
0 conteúdo da legislação mosaica. Ver também D. Flusser, “Die Tora in der Ber-
gpredigt”, Entdeckungen, vol. 1, pp. 21-31 e “ 'Den Alten is gesagt’- Interpre
tation der sogenannten Antithesen der Bergpredigt”, Judaica 48, Basel, 1992,
pp. 35-39. S. Ruzer, “The Technique of Composite Citations in the Sermon on
the Mount (Mt 5:21-22, 33-37)”, Revue Biblique 103, 1996, pp. 65-75.
44 Ver At 10, particularmente a descrição de Cornélio cm 10:2. D. Flusser, “Paul’s
Jewish-Christian Opponents in the Didache”, Gilgul, Dedicated to R. J. Z m
Werblowsky, Leiden, 1987, pp. 71-90; D. Flusser e Sh. Safrai, “Das Apostei-
dekret und die Noachitischen Gebote, Wer Tora mehrt, mehrt Leben”, Festgabe
fu r Heinz Kremers, Neukirchen-Oluyn, 1986, pp. 173-192.
45 Rm 3:10; Tg 2:10.
52 JESUS
Houve também uma discussão entre eles: qual seria o maior. Jesus lhes disse: “Os
reis das nações os dominam e os que as tiranizam são chamados Benfeitores. Quanto
a vós, não deverá ser assim; pelo contrário, 0 maior dentre vós torne-se como 0 mais
jovem, e 0 que governa como aquele que serve. Pois, qual é o maior? O que está à
mesa, ou aquele que serve? Não é aquele que está à mesa?4'’ Eu, porém, estou no meio
de vós como aquele que serve!”4647
Pois também eu estou sob uma autoridade, e tenho soldados às minhas ordens; e
a um digo “Vai!”; e ele vai; e a outro “Vem!”, e ele vem; e a meu servo “Faze isto!” e
ele 0 faz”. Ao ouvir tais palavras, Jesus ficou admirado e, voltando-se para a multidão
que 0 seguia, disse: “Eu vos digo que nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé”52.
Essas são as duas únicas histórias em que Jesus curou não judeus.
Em ambas, as palavras decisivas não são pronunciadas por ele, mas
U m a s in a g o g a a n tig a d o s d ia s d e Jesu s - a s in a g o g a d e G a m a la .
53 Ver a passagem pertinente sobre 0 profeta Jonas em Mekhilta a Êxodo 12:1, ed.
H. S. Horowitz & I. A. Rabin, Jerusalém, 1960, pp. 3-4.
A LEI 55
mesma atitude é expressa na crítica que Jesus faz de sua geração (Mt
12:38-42; Lc 11:29-32)545. Talvez esta fosse a intenção da Providência
Divina, que no início a mensagem se restringisse aos filhos de Israel
- e Jesus tivesse aceito esta restrição” .
Teriam razão as várias seitas judaico-cristãs ao pensar que,
vivendo como judeus, estariam seguindo a vontade de Jesus? Expulsos
das sinagogas como hereges, estigmatizados pela Igreja dos gentios
como não ortodoxos, estes judeus viveram com a firme convicção de
que apenas eles honravam a verdadeira herança de seu mestre. Esta
vam também confiantes de serem os únicos a compreender 0 signifi
cado genuíno do Judaísmo. A história passou por eles. Tomaram-se
amargurados e, assim, entre eles, a pregação de Jesus transformou
-se gradualmente numa caricatura apologética rígida. Até o século
X poderíam ser encontrados em algum lugar de Mossul, totalmente
solitários em sua lealdade sobre-humana56.
54 Estas palavras dc Jesus mencionam 0 profeta Jonas da mesma forma que a pas
sagem rabínica citada na nota anterior
55 Mais tarde, Paulo (Rm 1:7b) fala sobre “a força de Deus para a salvação dc todo
aquele que crê, em primeiro lugar do judeu, mas também do grego" (ver também
Rm 2:9-10).
56 Ver S. Pines, The Jewish Christians o f the Early Centuries o f Christianity Accor
ding to a New Source, The Israel Academy o f Sciences and Humanities Proceed
ings, vol. II, n. 13, Jerusalem, 1966.
5. Amor
1 Mischná, Tratado Avot 1:3. Ver K. Schlesinger, Die Gesetzeslehrer, Berlim, 1934.
p. 25. Acerca do que se segue, ver D. Flusser, “A New Sensitivity in Judaism
and the Christian Message”, Judaism, pp. 469-489.
2 Ver também as lendas em Avot de R. Natan 5:1, Schlesinger, op. cit., p. 25.
58 JESUS
3 J. B. Pritchard (ed.), Ancient Near Eastern Texts Relating to the Old Testament,
Princeton, 1955, p. 439.
ETICA 59
E x p r e s s ã o d a n o v a s e n s ib il id a d e n o m u n d o a n tig o . F ig u ra e n c o n tr a d a n u m a
tu m b a e m A s c a lo n , q u e d a t a a p r o x im a d a m e n te d e 300 d .C .
Não julgueis, para não serdes julgados; não condeneis, para não serdes conde
nados; perdoai, e vos será perdoado. Dai, e vos será dado; será derramada no vosso
regaço uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante, pois com a medida com que
medirdes sereis medidos também (Lc 6:37-38).
O início desta passagem nos faz recordar de algo já dito pelo céle
bre Hilel, “Não julgues 0 teu próximo enquanto não te encontrares
na situação dele!” 11 O dito “Com a medida com que medirdes sereis
medidos também”112era um provérbio judaico naqueles dias. O ensi
namento de Jesus, relatado por Lucas, tem um paralelo importante nas
palavras do Senhor, conforme reproduzidas por Clemente de Roma,
em aproximadamente 96 d.C., “Sêde misericordioso e encontrareis
misericórdia; perdoai e sereis perdoados; 0 que fizerdes, será feito a
vós; 0 que derdes, será dado a vós; como julgardes, sereis julgados;
como fizerdes 0 bem, 0 bem vos será feito; na mesma medida em que
derdes, será dado a vós” (1 Ciem 13:2). Este dito é oriundo da Madre
Igreja, ou talvez do próprio Jesus13.
Os temas nos quais a nova sensibilidade no Judaísmo se expres
sava naqueles dias estavam entremeados. Este método dinâmico de
interação temática é reconhecível no próprio estilo didático de Jesus.
Com sua maneira de ensinar, ele era capaz de integrar seus ditos bem
como associá-los à rede mais ampla de temáticas judaicas. Clemente
de Roma relata que 0 Senhor disse, “0 que fizerdes, será feito a vós”.
Isto é, como tratares teu semelhante, assim Deus te tratará. Esta é uma
variação fascinante da chamada Regra de Ouro, aceita como impera
tivo moral por muitas nações. Jesus citou esta máxima ao dizer, “Tudo
aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam, fazei-0 vós
a eles, pois esta é a Lei e os Profetas (Mt 7:12). Entre os judeus14,
mesmo antes da época de Jesus, esta era considerada uma súmula da Lei
inteira. Hilel dissera: “0 que é desagradável para ti, não 0 faças a teu
semelhante; esta é toda a Lei, 0 demais não é senão dedução”. Os judeus
28 Acerca deste dito, ver D. Flusser, “Qual 0 Caminho Correto que um Homem
Deve Escolher para Si Próprio?”, Tarbiz 60, 1991, pp. 172173( ־em hebraico);
D. Flusser, Das essenische Abenteuer, pp. 88-91; ver também Van l.oopik, The
Way o f the Sages, Tubingen, 1991, pp. 194197 ־.
29 A expressão “ou os profetas” não parece ser original.
30 Para um paralelo com o uso que Jesus fazia da expressão “dar pleno cumpri
mento”, ver Rm. 3:31.
31 TB, Tratado Bava Mesia 58b.
66 JESUS
32 Idem.
33 Mateus abrevia o dito e Marcos 9:43-48 o ampliou.
34 Midrasch Hagadol sobre Ex 20:14.
35 Ver J. P. Audet, “Affinités litteraires et doctrinales du Manuel de Discipline”,
Revue Biblique 59,1952, pp. 219-238 e D. Flusser, “Die Zwôlfapostellehre und
Jesu”, Das essenische Abenleuer, Winterthur, 1994, pp. 79-96.
36 Didaquê 3:1-3; Ver também D. Flusser, Judaism, p. 508.
ÉTICA 67
8 Ver D. Flusser, “Blessed are the Poor in Spirit”, Judaism, pp. 102-114. Sobre eles
paira o Espírito de Deus. Ver4Q 521, fragmento 211 + 4, linha 6, Revue Biblique
15, 1992, pp. 485-486.
9 Ver D. Flusser, “Some Notes to the Beatitudes", Judaism, p. 117.
72 JESUS
O homem bom não tem um olho que não pode ver; pois ele mostra misericórdia
a todos os homens, por mais pecadores que sejam e ainda que possam conspirar pela
sua ruína. Este homem, ao fazer 0 bem, vence 0 mal, uma vez que é protegido pelo
bem ... Se então, filhos, vossas mentes estão predispostas para 0 que é bom, homens
iníquos viverão convosco em paz, os devassos vos reverenciarão e voltar-se־ão para 0
bem e os argentários não só darão suas costas para as coisas pelas quais se empenha
ram, como também doarão 0 que conseguiram por intermédio de sua ganância àque
les que estão em aflição ... Seu bom coração não o deixará falar com duas línguas, a
da bênção c a da maldição, a do insulto e a do elogio, a do pesar e a da alegria, a da
quietude e a do tumulto, a da hipocrisia e a da verdade, a da pobreza e a da riqueza;
ele terá uma única inclinação, simples e pura, que diz a mesma coisa para todos. Não
possui visão ou audição duplas; sempre que tal homem faz, diz ou vê alguma coisa,
sabe que 0 Senhor olha para sua alma em juízo. E ele purifica sua mente para que não
seja condenado por Deus e pelos homens. Porém, tudo o que Belial faz é duplo e abso
lutamente nada tem de único.
M o e d a c u n h a d a c o m u m a f lo r - d e - li s .
Ouvistes que foi dito: “Olho por olho e dente por dente... golpe por golpe” (Ex
21:24-25)16. Eu, porém, vos digo: não resistais ao homem mau; antes, àquele que te
15 Testamento de Benjamim 4:2-3; 5:1; 6:5-7. Sparks, op. cit., pp. 595-597.
16 O final do dito bíblico está faltando cm Mateus, não obstante sejam precisamente
suas palavras de conclusão as que Jesus explica.
ETICA 75
fere na face direita oferece-lhe também a esquerda; e àquele que quer pleitear contigo,
para tomar-te a túnica, deixa-lhe também a veste; e se alguém te obriga a andar u’a
milha, caminha com ele duas. Dá ao que te pede e não voltes as costas ao que tc pede
emprestado17189. Ouvistes que foi dito: Amarás o leu próximo18 (Lv 19:18) e odiarás o
teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos ״e orai pelos que vos per-
seguem20; desse modo vos tomareis filhos do vosso Pai que está nos céus, porque Ele
faz nascer 0 seu sol igualmente sobre maus e bons e cair a chuva sobre justos e injus
tos... Portanto, deveis ser perfeitos como 0 vosso Pai celeste é perfeito (Mt 5:38-48).
17 Assim de acordo com Lc 6:30. Ver 0 comentário correto feito por G. Strecker,
"Der Weg der Gerechtigkeit”, Untersuchung zur Theologie des Matthüus, Gõt-
tingen, 1966, p. 134.
18 Ao invés de “como a ti mesmo", Mateus diz: “e odiarás teu inimigo”. Estas
palavras são uma explicação secundária da expressão (ausente) “como a vós
mesmos”. Aqueles que assim o faziam (evidentemente, saduceus) interpretavam
estas palavras: Age com 0 próximo conforme ele age contigo. Se ele é bom para
ti, é teu amigo, então sê amigável para com ele, mas se ele faz algo de ruim para
ti, odeia-o. Isso se harmoniza com a antiga ética (pagã) vulgar de retribuição.
Sobre este tipo de ética, ver A. Dihle, Die goldene Regei. O antigo poeta grego
Arquíloco (século VII a.C.) vangloria-se: “Sei amar um homem que (me) ama
e odiar 0 inimigo”. Ver Architochos, M. Treu (ed.), Munich, 1959, p. 10.
19 A interpretação correta deste amor ao inimigo é apresentada em Lc 6:27: “Amai
aos vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam”.
20 Ver 0 interessante paralelo rabínico em Tos. Baba Qama 9:29-30, Zuckermandel,
p. 365.
21 Testamento de Zabulón, cap. 7.
76 JESUS
Amigo, nâo fui injusto contigo. Não combinaste um denário? Toma lá 0 que é
teu e vai. Eu quero dar a este último 0 mesmo que a ti. Nâo lenho 0 direito de fazer 0
que cu quero com o que é meu? Ou 0 teu olho 6 mau porque cu sou bom? Assim, os
últimos serão os primeiros, e os primeiros serão os últimos.
[...] acreditais que, por terem sofrido tal sorte, esses galileus eram mais pecadores
do que todos os outros galileus? Não, eu vos digo; todavia, se não vos arrepender
des, perecereis todos do mesmo modo. Ou os dezoito que a torre de Siloé matou em
sua queda, julgais que a sua culpa tenha sido maior do que a de todos os habitantes
de Jerusalém? Não, eu vos digo; mas, se não vos arrependerdes, perecereis todos de
modo semelhante (Lc 13:1-5).
estéril (Le 13:6-9). Mais tarde, estando em Jerusalém, viu que a catás
trofe iminente era quase que inevitável (Le 19:40-44). A destruição
futura de Jerusalém poderia ter sido evitada se o povo tivesse esco
lhido o caminho da paz e do arrependimento23.
A noção de justiça divina de Jesus é, pois, incomensurável com
a razão. O homem não pode medi-la, mas pode compreendê-la. Ela
conduz à pregação do reino, no qual o último será o primeiro e o pri
meiro, o último. Leva também do Sermão da Montanha ao Gólgota,
onde o homem justo morre uma morte semelhante à do criminoso. É
ao mesmo tempo profundamente moral, e ainda assim, além do bem
e do mal. Neste esquema paradoxal, todas as virtudes costumeiras
“importantes” e a personalidade bem talhada, a dignidade mundana
e a insistência orgulhosa no cumprimento formal da Lei são fragmen
tárias e vazias. Sócrates questionou o aspecto intelectual do homem.
Jesus questionou 0 aspecto moral. Ambos foram executados. Seria
por mero acaso?
23 Veri. H. Marshall, The Gospel o f Luke, NIGTC, Grand Rapids, Mich., 1979, pp.
553, 717; Hugo Grotius sobre Lc 13:2. Ver também infra, cap. 18, nota 22.
Uma moeda judaica do período da guerra contra os romanos (66-70 d.C.).
7. O Reino do Céu
“Mestre, sabemos que falas e ensinas com retidão, e, sem levar em conta a pos¡־
çâo das pessoas, ensinas de fato o caminho de Deus. É lícito a nós pagar 0 tributo a
César ou não?” Ele, porém, penetrando-lhes a astúcia, disse: “Mostrai-me um denário.
Dc quem traz a imagem e a inscrição?” Responderam: “ De César”. Ele disse então:
“Devolvei, pois, 0 que é de César a César, e o que é de Deus a Deus” (cf. Lc 20:20-26).
eternamente’ ”101. Este dito era, ao que parece, dirigido não só contra
as esperanças futuras dos apocalipsistas, porém contra os zelotas que
desejavam tomar o céu à força. Quando os zelotas de fato tomaram
o governo pela violência e a rebelião foi reprimida sanguinariamente
por Roma, um dos escribas reclamou dos “governantes das cidades
de Judá, que se livraram do jugo do céu e tomaram para si o jugo do
governo de carne e sangue”". Esta visão era compartilhada por Raban
Yokhanan ben Zakai12. Após a destruição de Jerusalém, ao ver a filha
de Nicodemos aplacando sua fome com grãos de cevada apanhados
do esterco de um cavalo árabe, chorou e disse:
A concepção de que Jesus construiu uma espécie de ética e uma teologia baseadas
em sua expectativa acerca da iminência do reino de Deus é insustentável. Este tipo
de coisa pode acontecer perfeitamente no estudo de um teólogo ou de um filósofo... A
relação é totalmente contrária à imaginada pelos sistematizadores escatológicos. Não é
a expectativa escatológica que determina a compreensão que Jesus tinha de Deus e do
homem ... mas, inversamente, sua compreensão de Deus e do homem é que determina
sua expectativa escatológica ... Não conseguir ver isto significa que já se colocou os
óculos de um acadêmico ״.
A lb e r t S c h w e itz e r
17 Ver, de minha autoria, “Jesus’ Opinion about the Essenes”, Judaism, pp. 150
168, especialmente pp. 162-163.
18 J. Jeremias, “Abba”, Studien zur neutestamentlichen Theologie und Zeitgeschi-
chte, Gottingen, 1966, pp. 15-67. B. M. F. Van Iersel percebeu corretamente que,
entre os rabinos, dirigir-se a Deus como “nosso Pai” não tinha o mesmo peso
que “meu Pai”, ou “Aba”, conforme feito por Jesus. Contudo, considerando a
escassez de materia rabínico sobre a oração carismática, isso não nos diz muita
coisa (Der Sohn, Nov. Test. Supplement 111, Leiden, 1961).
92 JESUS
Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos
sábios e doutores e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu
agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém conhece 0 Filho20 senão o Pai,
e ninguém conhece 0 Pai senão 0 Filho e aquele a quem 0 Filho o quiser revelar (Mt
11:25־27 )21.
O dono da vinha enviou um servo aos vinhateiros, para que lhe entregassem
uma parte do fruto. Os vinhateiros espancaram-no, despedindo-o sem nada. O dono
enviou de novo outro servo, que também foi espancado e insultado. Enviou ainda um
terceiro, que foi ferido e lançado fora. Finalmente, enviou 0 seu filho, pensando que
0 respeitariam. Mas quando os vinhateiros 0 viram, disseram uns aos outros, “Este é
o herdeiro; vamos matá-lo e a herança será nossa”. Levaram-no para fora da vinha e
o mataram. O que lhes fará 0 dono da vinha? Eles virá e destruirá esses vinhateiros, c
dará a vinha a outros.
27 Ver Is 5:1-7.
O FILHO 95
28 O versículo seguinte cm Lucas (20:18) é: “Aquele que cair sobre esta pedra vai se
quebrar todo, e aquele sobre quem ela cair, ela o esmagará”. Estas palavras apare
cem somente em Lucas e seus paralelos judaicos. Ver B. H. Young, Jesus and His
Jewish Parables, New York, 1989, pp. 293-316; Jesus the Jewish Theologian, pp.
215-224. No que concerne a Mt 21:44, ver B. M. Metzger, A Textual Commentary
o f New Testament, London, 1975, p. 58. Ver também infra, cap. 11, nota 26.
29 Teria Jesus visto na pedra uma metáfora de si mesmo? De todo modo, a pedra
em SI 118:22 foi identificada, em fontes judaicas, com Davi. Ver o Targunt Ara-
maico de SI 118:22 c B. H. Young, Parables, New York, 1989, pp. 293-294.
30 Sifre sobre Dt 32:9. Ver Billerbeck, I, p. 874.
31 A começar com os casos de martirio nas perseguições feitas pelo selêucida Antí-
oco Epffanes (167 a.C.). Ver 2 Mc 6-7.
32 Por exemplo, comparar Mc 10:45 com seu paralelo em Lc 22:27. Ver D. Flusser.
“Salvation Present and Future”, Judaism, p. 233, nota 4.
33 Acerca deste tema, ver Morna Hooker, op. cit., pp. 151-157.
34 Os dois versículos cardinais, nos quais se relata que Jesus proclama explicita
mente que morrerá para dar sua vida em resgate, são Mc 10:45 (e Mt 20:28) e
96 JESUS
Certo dia, ele orava em particular, cercado dos discípulos, aos quais perguntou:
“quem sou eu, no dizer das multidões?” Eles responderam: “João Batista; outros, Elias;
outros, porém, um dos antigos profetas que ressuscitou.” Ele replicou: “E vós, quem
dizeis que eu sou?” Pedro então respondeu: “O Cristo de Deus" (Lc 9:18-20).
fato de Jesus, ao que parece, nunca ter utilizado o título “Messias” para
falar de si próprio. De mais a mais, sempre falava do Filho do Homem
na terceira pessoa, como se não fosse idêntico a ele. Os ditos evangé-
líeos sobre o Filho do Homem dividem-se em três grupos: 1) aqueles
que se referem ao Filho do Homem vindouro, 2) os que se referem ao
seu sofrimento e à sua ressurreição, e 3) aqueles nos quais 0 filho do
homem está atuando no presente. “As raposas têm tocas e as aves do
céu, ninhos; mas 0 Filho do Homem8não tem onde reclinar a cabeça”
(Mt 8:19-20). Neste e em outros pronunciamentos do terceiro grupo, 0
termo aramaico ou hebraico “filho do homem” significa simplesmente
“homem”. Este grupo de ditos, portanto, nada tem a ver com a espe
rança escatológica0de Jesus. O segundo grupo é aquele no qual 0 título
“filho do homem” é usado em conexão à paixão, morte e ressurreição
do Senhor. No passado, eu estava seguro - como muitos ainda estão
- de que este grupo era um produto do Cristianismo antigo. Os três
assim chamados “anúncios da paixão” (Lc 9:22; 9:43b-45; 18: 31-34
e parais.) são evidentemente, em sua forma presente, configurados
pela Igreja em seus primórdios. Apenas 0 segundo anúncio foi con
siderado original por um erudito proeminente do Novo Testamento10.
Segundo Lucas (9:44), Jesus disse a seus discípulos, “Quanto a vós,
abri bem os ouvidos às seguintes palavras: o Filho do Homem vai
ser entregue às mãos dos homens”. Este dito é reminiscente de outro
pronunciamento autêntico de Jesus. Durante a Última Ceia, ele disse:
“Eis, porém, que a mão do que me trai está comigo, sobre a mesa. O
Filho do Homem vai, segundo 0 que foi determinado, mas ai daquele
homem por quem ele for entregue!” (Lc 22:21). Estas duas frases são
similares até mesmo em sua forma, e ambas baseiam-se num jogo de
palavras em hebraico.
Nelas, Jesus fala sobre a entrega do “filho do homem”, e sobre seu
trágico fim nas mãos dos homens (em hebraico: “filhos dos homens”).
No primeiro caso (Lc 9:44), Jesus (“0 Filho do Homem”) será entregue
nas mãos dos homens (“filhos dos homens”), ao passo que no segundo
caso (Lc 22:21 -22), ele fala a respeito do homem (em hebraico: “ filho
do homem”) que o entregará. Entretanto, 0 aspecto formal destes dois
ditos autênticos é menos importante do que 0 fato de Jesus falar sobre
11 O. Vermes, Jesus the Jew, Philadelphia, 1981, pp. 160-191, especialmente pp.
163-168 e 188-191.
12 Tal espécie de eufemismo era então (e ainda hoje é) também utilizado em outras
ocasiões. Quando se dizia algo desagradável sobre os judeus, costumava-se falar
dos “inimigos de Israel” !
13 Jeremias, Theology, p. 261 nota 1.
14 D. Flusser, “Jesus and the Sign o f the Son o f Man”, Judaism, pp. 526-534.
15 Jesus, por exemplo, define este aspecto de seu caráter e de sua pregação em Mt
10:16.
Ο FILHO EX) HOMEM 1οι
Quando o Filho do Homem vier em sua glória, e todos os anjos com ele, então
se assentará no trono da sua glória. E serão reunidas em sua presença todas as nações
e ele separará os homens uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabri
tos, c porá as ovelhas à sua e direita e os cabritos à sua esquerda. Então dirá 0 rei aos
que estiverem à sua direita: “Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança 0 Reino
preparado para vós desde a fundação do mundo...” Em seguida dirá aos que estiverem
à sua esquerda: “Apartai-vos de mim, malditos, para 0 fogo eterno preparado para 0
diabo e para os seus anjos... E irão estes para 0 castigo eterno, enquanto os justos irão
para a vida eterna” (Mt 25: 31-36).
18 Por exemplo, I Enoque 48:10; 52:4. H. F. D. Sparks, op. cit.. pp. 230,232; e IV
Esdras, cap. 13, onde 0 “Homem” cósmico é, inequivocamente, 0 Messias.
19 I Enoque 71; Sparks, op. cit., pp. 255-256.
20 M. R. James (ed.), The Testament o f Abraham, Cambridge, 1892, caps. 12-13,
pp. 90, 92; F. Schmidt, Le Testamente grec d'Abraham, Tubingen, 1986, pp.
132-139.
21 M. de Jonge & A. S. Van der Woude, “ 11Q Melchizedek and the New Testa
ment”, New Testament Studies, 1966, pp. 301-321; D. Flusser, “Melchizedek &
the Son o f Man”, Judaism, pp. 186-192. Ver agora uma edição de 1lQMelch
comentada por E. Puech, Revue de Qumran 12, 1987, pp. 483-573. Obviamente,
este fragmento essênico é importante em conexão à Epístola aos Hebreus.
22 Junto com ele, surgirá “aquele ungido pelo Espírito” (i.e., 0 profeta escatológico).
23 Por exemplo, Midrasch sobre os Salmos, acerca de SI 82:1.
O FILHO DO HOMEM 103
24 Ver D. Flusser, “Melchizedek and the Son of Man”, Judaism, p. 192 “nota adi
cional”. Pode-se ver que o difícil - e provavelmente corrompido - versículo
em SI 110:3 significava provavelmente que o herói do salmo já tinha nascido,
ao passo que em SI 2, Deus diz ao herói do salmo, “Tu és meu filho, eu hoje te
gerei”. Não há grande diferença entre os dois versículos bíblicos.
25 Mc 15:26.
26 Para um paralelo destas palavras nos Manuscritos do Mar Morto, ver D. Flusser,
“At the Right Hand o f Power”, Judaism, pp. 301-305.
27 Mt 26:64 acrescenta “Tu 0 disseste” ; Mc 14:62 acrescenta “Eu sou”; Lc 22:67
70 acrescenta, entre outras coisas, “Vós dizeis que eu sou”.
28 Leo van Puyvelde, L'Agneau mystique d ’Hubert et Jean van Eyck, Brussels,
1964, p. 30.
Van Eyck, O Filho do Homem.
O FILHO DO HOMEM 105
Na mesma hora, aproximaram-se alguns fariseus que lhe disseram: “Parte e vai-te
daqui, porque Herodes quer te matar”. Ele respondeu: “Ide dizer a essa raposa: eis que
eu expulso demônios e realizo curas hoje e amanha e no terceiro dia terei consumado!
Mas hoje, amanha e depois de amanhã, devo prosseguir 0 meu caminho, pois que nâo
convém que um profeta pereça fora de Jerusalém” (Lc 13:31-33).
Herodes Antipas acreditava que Jesus fosse 0 Batista que ele havia
decapitado, ressuscitado dos mortos, e estava preparado para matá-lo
“novamente”. Jesus sabia que sua vida corria perigo - uma voz celestial
nunca vem de um céu azul límpido - mas não queria morrer na Gali
leia, onde estivera pregando o reino do céu. Morrería em Jerusalém,
que tinha a reputação de “matar os profetas e apedrejar os que a ela
foram enviados” (Lc 13:34). A razão ostensiva para sua peregrinação
era, entretanto, diferente. A Páscoa se aproximava. Os judeus estavam
acostumados a fazer uma peregrinação a Jerusalém, para sacrificar 0
cordeiro pascal e celebrar sua libertação da escravidão no Egito. Tam
bém Jesus ansiava veementemente por comer esta refeição festiva com
seus discípulos1. Então, iniciou-se seu caminho para a cruz.
Quando Jesus aproximou-se da cidade, enviou dois discípulos
para apanhar um jumento. Depois, montou 0 animal e cavalgou para
dentro de Jerusalém. Entrando na cidade, foi saudado com “Hosana!”
e um versículo dos Salmos (118:26), “Bendito 0 que vem em nome
do Senhor”. Nas festas de peregrinação, estas palavras eram cantadas
1 Lc 22:15.
108 JESUS
Quarenta anos mais tarde, 0 Templo ardeu em chamas nas mãos dos
romanos. A insuportável opressão romana provocou insurreição e ter
rorismo por parte dos fanáticos, e 0 santuário em Jerusalém foi 0
reduto dos odiados saduceus, que tinham feito um pacto com Roma.
A indignação aguça a visão, e muito previram a destruição do Templo,
Assim, por exemplo, em 62 d.C., na Festa dos Tabernáculos, aconte
ceu que Josué, filho de Ananias, um simples camponês, foi acometido
pelo Espírito e, de repente, pronunciou uma maldição profética na qual
prognosticou a destruição do Templo. Como um possesso, continuou
seu clamor dia e noite nas ruas de Jerusalém. As autoridades arras
taram-no para diante de Albino, o governador romano, que mandou
açoitá-lo. Contudo, 0 homem seguia repetindo sua profecia ameaça
dora. O governador, então, 0 pôs em liberdade, julgando-o fora de si6.
Jesus expressou sua oposição aos abusos no Templo não só em
palavras, como também em ações. Como acontece em geral nos san
tuários, um comércio efervescente tinha lugar no Templo em Jerusalém
naqueles dias. Jesus não era 0 único cujo desprazer tinha sido suscitado
A catástrofe era iminente. Jesus não fez segredo dela aos seus dis-
cípulos22. Evidentemente, insinuou acerca de seu martírio futuro ao
anunciar sobre 0 pão partido: “Isto é 0 meu corpo”. Jesus disse ainda a
Pedro que, antes que 0 galo cantasse, este negaria conhecê-lo por três
vezes23. No banquete, à sombra da morte, disse, “Eis, porém, que a mão
do que me trai está24 sobre a mesa” (Lc 22:21). Teria ele descoberto 0
traidor? Ao que tudo indica, após 0 embate no Templo, Judas Iscariotes,
um dos doze, foi ao encontro dos sumos sacerdotes para entregar-lhes
Jesus. Estes prometeram pagar generosamente por sua ação (Lc 22:3-6
e parr.). Não sabemos por que ele fez isto, e os relatos de sua morte são
contraditórios. É mais provável que ele tenha desaparecido depois da
Getsêmani.
29 Creio ser esta uma invenção tendenciosa da fonte de João. Ver “Qual Era 0 Sig-
niñeado Original de Ecce H om oT, nos estudos suplementares desta obra.
30 J. Frankovic me fez recordar, numa conversa particular, do fato de Xeno-
fonte {Mem. I. 1, 10) enfatizar que também Sócrates falava sobre sua filosofia
abertamente.
11. Morte
onde ninguém ainda havia sido posto (Lc 23:5056)־. Apenas Mateus
inclui 0 detalhe questionável de que a tumba na qual Jesus foi colo
cado pertencia a José (Mt 27:60). Este foi, contudo, um ato profundo
de amor, porque dificilmente podemos encontrar tumbas judaicas
antigas daquela época na qual não houvesse vários ocupantes. José
de Arimateia era membro do conselho da cidade de Jerusalém - um
homem rico - e como tal, dele se esperava a caridade. Este dever foi
cumprido no sepultamento de Jesus.
De acordo com João (19:39), Nicodemos, que Jesus encontrara
algum tempo antes (Jo 3:1-15), trouxe uma mistura de mirra e aloés,
e juntos, ele e José sepultaram Jesus. Nicodemos também era oriundo
da Galileia (Jo 7:52). Sabemos a partir de fontes rabínicas que este
Nicodemos, filho de Gorion, era também um dos conselheiros de Jeru
salém e um dos três nobres mais ricos da cidade. Mais tarde, durante a
daquele ano”. Anás, mesmo já não sendo sumo sacerdote, ainda era
uma espécie de “eminência parda” muito influente. Neste ponto, João
deve ser confiável. De todo modo, Jesus passou sua última noite sob
custódia, na casa de Caifás14. A fim de passar 0 tempo e divertir-se, “os
guardas caçoavam de Jesus, espancavam-no, cobriam-lhe o rosto e 0
interrogavam: ‘Faz uma profecia: quem é que te bateu?’ ” (Lc 22:63
64 e parais.). Os soldados estavam colocando em prática um antigo
jogo violento, ainda hoje atual15. No caso de Jesus, o comportamento
dos guardas era particularmente ofensivo. Os saduceus não acredita
vam em anjos ou no espírito da profecia. Os guardas do sumo sacer
dote saduceu Caifás, ao que tudo indica, pensavam como seu mestre
- um profeta dos dias modernos era um despropósito supersticioso.
Ao raiar do dia, os anciãos, os chefes dos sacerdotes e os escribas
encontraram-se e levaram-no para seu Sinédrio (Lc 22:66), em outras
palavras, ao aposento onde 0 Sinédrio costumava encontrar-se16.
14 Incluí mais informação sobre Caifás nos estudos suplementares deste volume,
“Quem é que Te Bateu?” e “... Sepultar Caifás, Não Elogiá-lo”.
15 Ver mais detalhes sobre a história deste jogo no estudo suplementar, “Quem é
que Te Bateu?”
16 Ver supra, nota 4. Winter, op. cit., pp. 2 0 2 1 ־.
122 JESUS
17 Um édito de Antíoco III aos judeus, no ano 198 a.C. dizia: “Que 0 senado eos sacer-
dotes, os escribas e os cantores do Templo estejam isentos do imposto por cabeça,
do imposto sobre a coroa e do imposto sobre 0 sal”. Josefo, Antiquities 12:142.
18 Apesar de ser evidente, a partir dos relatos evangélicos, que Pilatos era um magis-
trado romano e que soldados romanos erigiram a cruz para Jesus, os romanos
nunca são mencionados como tal neste contexto - em todo o Novo Testamento!
Apenas uma vez, em Jo 11:48, fala-se sobre eles como uma possivel ameaça,
caso Jesus não seja morto.
19 Esta é a alusão messiânica à reconstrução do Templo. Ver supra, cap. 10 nota 15.
20 Lc (23:6-12) relata que, mais tarde, Pilatos enviou Jesus a Herodes Antipas,
governador da Galileia que, naqueles dias, encontrava-se em Jerusalém. Ao que
MORTE 123
26 Jesus certamente sabia que sua causa nâo se extinguiría pela crucificação - ver Lc
20:17 e paral. Não é por acaso que cita aqui o Salmo 118:22. Ele indica que será
a “pedra angular”. Igualmente significativo é o fato de Jesus aludir ao futuro,
assinalando que esperava que a crucificação não significasse 0 fim. Ver também
cap. 8 nota 28.
27 Sobre Pilatos, ver SchUrer, op. cil., vol. I, pp. 358,383-387; G. Winkler, Der kleine
Pauly, Berlim, 1979, vol. 4, p. 1050; M. Stern em Compendia Rerum Iudaicarum.
The Jewish People in the First Century, Assen, 1974, vol. 1, pp. 316,349-354; F.
Millar, Das rõmische Reich undseine Nachbaren. Fischer Weltgeschichte, 1966,
vol. 8, pp. 68-69; Philonis Alexandrini: Legatio ad Gaium, E. M. Smallwood (ed.),
Leiden, 1961, pp. 128-131,294-305; S. Mason, Josephus and the New Testament,
Peabody, 1993, pp. 103-105, 109, 114-117.
28 Legatio ad Gaium, 38:301.
29 Josefo, War 2:169-177; Antiquities 18:55-62, 85-90; Filo, Legatio ad Gaium
38:299-305.
30 Mason, op. cit., p. 116.
31 Idem.
32 Muitos acreditam hoje que Mateus é um Evangelho judaico-cristâo, mas a situa-
çâo é muito mais complexa. Ver D. Flusser, “Two Anti-Jewish Montages in Mat
thew”, e “ Matthew’s ‘Verus Israel’ ',,Judaism, pp. 552-576.
126 JESUS
Naquela época havia um sábio homem chamado Jesus. E sua conduta era boa
e ele era conhecido por ser virtuoso. Muitos dentre os judeus e dentre outras nações
tomaram-se seus discípulos. Pilatos 0 condenou a ser crucificado e a morrer. Todavia,
aqueles que haviam se tomado seus discípulos não abandonaram seu discipulado. Rela
taram que ele lhes havia aparecido três dias após sua crucificação e que estava vivo:
consequentemente, pensava-se que ele era o Messias (0 Cristo) sobre o qual os profetas
haviam contado maravilhas. E 0 povo dos cristãos, que foi designado com seu nome,
não desapareceu até o dia de hoje.
42 Schürcr, op. cit., vol. I, pp. 304-305 e vol. 2, pp. 34-35, em especial nota 27. Em
1995, foram escavadas as fundações do templo de Augusto em Cesareia.
43 Esta forma (Caesareum e, em grego, Sabasteiori) corresponde completamente
ao nosso “Tiberieum
MORTE 129
47 Joscfo, Antiquities 18:60-62; War 2:175-177; Stem, op. cit., pp. 351-352.
48 Filo, Legatio ad Gaium, cap. 38.
49 Idem, 38:303.
50 Idem, 38:306.
51 Idem, 38:305.
MORTE 131
52 De acordo com Jo (19:12 e 19:15), Pilatos finalmente decidiu não libertar Jesus,
devido à objeção, “Se 0 soltas, não és amigo de César...”
53 Ver Stem, Compendia, p. 353; Josefo, Antiquities 18:85-89.
54 Smallwood, legatio ad Gaium, p. 301.
132 JESUS
É possível que este clamor tenha sido uma realidade histórica. De todo
modo, a aclamação era supérflua, pois Pilatos sabia que se Barrabás
fosse libertado, Jesus seria crucificado. Uma vez mais, Pilatos tentou
a sorte para salvar a situação. Disse que não podia encontrar acusa-
ção nenhuma contra Jesus, que fosse séria 0 suficiente para justificar
a execução. Ele 0 castigaria e 0 deixaria partir (Lc 23:22), mas isto de
nada serviu. Pilatos tinha de libertar Barrabás, e Jesus foi castigado e
entregue para ser crucificado (Mt 27:26).
A lei romana ordenava que “instigadores de uma revolta, motim,
ou agitadores do povo” deveríam ser “crucificados, lançados às feras,
ou banidos para uma ilha”. A punição era determinada pela posição
do perpetrador na sociedade romana64. O status de Jesus fez com que
ganhasse a crucificação.
Exibindo um senso de justiça distorcido, Pilatos libertou Barra-
bás. Sua decisão 0 obrigou, por bem ou por mal, a levar a acusação
contra Jesus muito mais a sério do que antes. Devido ao incidente no
Templo e a censura profética de Jesus contra os sacerdotes aristocra-
tas, Pilatos podia facilmente crucificá-lo como um agitador do povo.
Ademais, circulavam rumores de que ele era 0 Messias65.
Ao que tudo indica, Jesus foi entregue a Pilatos sem um veredito
e, em nenhuma parte nas fontes, tampouco é mencionado 0 veredito
de Pilatos. No catálogo dos seus crimes, fornecido pelo filósofo Filo
de Alexandria66, entre outras coisas encontramos “execução constante
sem julgamento”. Parece, pois, que 0 trágico fim de Jesus não foi pre-
cedido por nenhum veredito de qualquer poder judiciário terreno. Foi
resultado de uma interação pavorosa de esferas de interesse nuas, à
sombra de antagonismos brutais. Visivelmente, não tinha nenhuma
relação real com 0 homem Jesus ou com sua causa.
Somente Rembrandt captou 0 isolamento silencioso de Jesus em
seu julgamento - que não foi deveras um julgamento. Numa água-
-forte, retrata Jesus sendo trazido de Pilatos para 0 povo, sem que nin-
guém realmente esteja observando este estranho espetáculo. Jesus é
bastante passivo, como se estivesse esperando que a pantomima sem
67 F. Kafka, The Tria!, New York, 1937, p. 248. Ver, contudo, “O Crucificado c os
Judeus”, nos estudos suplementares da presente obra.
136 JESUS
[...] e levaram-no ao ginásio. Ali, ele foi içado cm um tablado, para que pudesse ser
visto por todos. Colocou-se sobre a cabeça, à guisa dc diadema, uma cesta esburacada;
envolveram seu corpo com uma esteira grosseira, à guisa de traje real; alguém, vendo
no caminho um pedaço de papiro, pegou-o e colocou-o na mão, à guisa de cetro. E,
como numa farsa teatral, após ter recebido as insígnias de sua realeza e ter sido ador
nado como um rei, jovens com bastões sobre os ombros, como lanceiros, postaram
-se à sua direita e à sua esquerda, numa imitação de guarda. Outros aproximaram-se
dele, uns fingiam saudá-lo, outros demandavam justiça, outros ainda consultavam-no
sobre questões dc Estado. Então, das multidões que 0 rodeavam, ouviu-se um grito
saudando-o de Mari®, que se supunha era o nome para “Senhor", usado pelos sírios70.
colocaram sobre ele uma coroa de espinhos”. Steve Notley me fez recordar desta lei
tura variante (comunicação particular). Se ela realmente reflete a narrativa original, a
coroação de Jesus com espinhos pertence à Paixão, também no Evangelho de Lucas.
69 “ Mari” (meu Senhor) era evidentemente a palavra aramaica; ver infra, cap. 16
nota 9. Comparar com 1 Cor 16:22.
70 Filo, In Flaccum, 36:39. Ver Filo de Alexandria, On Proofs o f G od’s Power,
Cambridge, Mass., 1962. A similaridade entre o escárnio feito pelos soldados e
0 incidente em Alexandria foi observada por Grotius em seu comentário sobre
Mt 27:28. Ver infra. cap. 16 nota 10.
71 O texto deste papiro aparece em V. A. Tchcrikover & A. Fuks (eds.), Corpus
Papyrorum Judaicarum, II, Cambridge, Mass., 1960, pp. 61-62 e Acia Alexan-
drinorum, ed. H. Musurillo, Leipzig, 1961, p. 37.
72 Naqueles dias, Cirene era um centro judaico importante. O nome de Simão c 0
dc seus filhos, Alexandre e Rufo eram muito comuns entre os judeus. Simão c
o equivalente do Simeão bíblico; Rufo é o equivalente do Ruben bíblico. Ver
Corpus Papyrorum Judaicarum, I, op. cit., 1957, p. 29.
73 Ver Safra¡, op. cit., pp. 205-206.
138 JESUS
a minha vida com a fuga?” Samuel respondeu, “Sim! Se fugires, estarás seguro.
Mas se aceitares o julgamento de Deus, amanhã estarás comigo [i.e., no céu]”. Ver
Ginsberg, The Legends o f the Jews, vol. 4, p. 71; e a glosa a Uvltico Rabá 26:7, no
dicionário de Jastrow, pp. 760-761. Comparar também Billerbeck, op. cit., vol. 2,
pp. 264-265. Pergunta-se por que Pirke de Rabí Eliezer, obra midráschica muito
posterior, datada dos século VIII-IX, é citada ao invés do Levítico Rabá. Em Pirke)’
de Rabí Eliezer 33, o midrasch sobre 1 Sm 28:19 é repetido (Comparar também
Midrasch Samuel 23:4). De mais a mais, Billerbeck não analisou satisfatoriamente
o significado deste midrasch com relação a Lucas 23:39-43.
O midrasch encara a aceitação de Saul de sua morte iminente como indica
ção de arrependimento. Em outras palavras, ao não fugir, Saul aceitou 0 julga
mento de Deus e pagou a pena por sua desobediência anterior. O mesmo tipo de
pensamento reflete-se na Mischná, Tratado Sanhedrin 6:5: “Quando ele estava
aproximadamente a dez cubitos do local do apedrejamento, costumavam dizer
-lhe, ‘Faz tua confissão’, pois o caminho daqueles que foram condenados à morte
é fazer a confissão, já que a todo aquele que faz sua confissão cabe uma parcela
no mundo vindouro... Se ele não sabe como fazer sua confissão, dizem-lhe, ‘Diz,
que minha morte possa ser uma expiação para todos os meus pecados’” (tradução
de Danby, p. 390). A única defesa criminal de Jesus é, em essência, uma confissão
de culpa e a aceitação da justiça divina. Portanto, segundo 0 pensamento judaico,
este criminoso merecería uma parcela no mundo vindouro, ou Paraíso. É a mesma
temática vista em Levítico Rabá 26:7. Como Jesus e os dois criminosos morreram
no mesmo dia em que foram crucificados, as palavras “amanhã estarás comigo
[no Paraíso]” tiveram que ser modificadas para “Hoje estarás comigo no Paraíso”.
A concepção de que esta passagem de Lucas tenha sido gerada por impul
sos midráschicos é sustentada por duas considerações adicionais. Em primeiro
lugar, não há paralelo da história em Mateus ou em Marcos. Em segundo lugar,
este episódio não se coaduna com a tradição fundamentada historicamente que
Paulo recebeu (1 Cor 15:4) e que mais tarde foi absorvida no Credo Apostólico:
“Ele sofreu nas mãos de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado. Des
ceu à mansão dos mortos. Ressuscitou ao terceiro dia” (ver “Credo Apostólico”,
The New Encyclopaedia Britannica's Micropaedia). J. Fitzmyer focaliza essa
mesma tensão quando diz, “A junção de ‘hoje’ e ‘no Paraíso’ neste versículo
cria um problema quando se tenta relacioná-lo com o ‘descenso ao Inferno’ do
credo, e até mesmo com 1 Pd 3:19-20”, J. Fitzmyer, The Gospel According to
Luke X-XXIV, The Anchor Bible, New York, 1985, p. 1511.
79 Em Marcos 15:34 (seguido por Mt 27:46), o último grito de Jesus foi 0 Salmo
22:2 (ver também 0 apócrifo Evangelho de Pedro 5:19). O paradoxo de Marcos foi
eliminado por Lucas (23:46). Na narrativa de Lucas, Jesus citou o Salmo 31:6(5).
O mesmo versículo bíblico (transliterado em grego a partir do original hebraico)
figura no apócrifo Atos de Pilatos 11. Observar que o Salmo 31:6(5) faz parte da
confissão padrão dita por um judeu em seu leito de morte. Ver também J. H. Hertz,
The Authorised Daily Prayer Book, edição revista, New York, 1965, p. 1065.
A maneira mais fácil de explicar a discrepância entre Marcos e Lucas é sugerir
que era impossível discernir o significado, se é que havia algum, do último grito
agonizante de Jesus. Marcos colocou em sua boca 0 Salmo 22:2, a fim de mostrar
que 0 solitário Jesus foi aparentemente abandonado até por Deus. Lucas, por
outro lado, retratou Jesus dizendo o que esperaríamos que um judeu observante
dissesse à beira da morte. Ver também supra, cap. 1 nota 4.
O suicidio de Judas e a crucificação de Jesus.
12. Epílogo
Não discorrerei aqui sobre Jesus após sua morte na cruz, exceto
para discorrer como, no pensamento da antiga comunidade crente, a
elevada autoconsciência do Jesus “histórico” começou a evoluir para
a cristologia da fé cristã. Neste livro1, desafiei 0 preconceito moderno,
que vê pouca relação entre a compreensão que Jesus tinha de sua
tarefa na organização divina e 0 “querigma” da Igreja. Face à morte
iminente, Jesus contou a parábola dos vinhateiros homicidas (Lc 20:9
16). Ao final acrescentou, “Que significa então o que está escrito: ‘a
pedra que os edificadores tinham rejeitado tornou-se a pedra angu
lar’?” Ao citar 0 Salmo 118:22, Jesus informou seus ouvintes de que
a crucificação não impediría o triunfo de sua causa12. Ele tinha razão.
Entretanto, na história da Igreja em seus primordios, duas ten
dências revolucionárias causaram uma modificação na estrutura da fé
cristã. A primeira foi a dissonância cognitiva que surgiu no curso da
tragédia da crucificação. O próprio Lucas encontrou algumas das per
sonagens dramáticas da crise, descrevendo sua experiência traumática,
especialmente na história de Emaús (24:13-35) e no diálogo entre 0
Senhor ressurrecto e seus apóstolos (At 1:1-9). Para que a comunidade
neófita e sua nova crença pudessem superar esta crise, uma solução
1 Este artigo é reimpresso com a gentil permissão do Museu de Israel, onde í'oi
publicado pela primeira vez em The Israel Museum Journal 5, 1986, pp. 37-40.
Foi editado por Brad Young.
2 Ver as publicações de Kloner, “ Urna Cova de Sepultamento do Periodo do
Segundo Templo em Givat Hamivtar, Jerusalém”, relato preliminar em hebraico,
Qadmoniot 19-20 (1972), pp. 108109 ; ־foi publicado em inglés em Jerusalem
Revealed, Jerusalem, 1975, pp. 69-70 e, novamente em hebraico, com 0 mesmo
título, em Jerusalém no Período do Segundo Templo. Abraham Schalit Memorial
Volume, Jerusalém, 1980, pp. 191-224, resumo em inglês, pp. xii-xiii. O ultimo
estudo é a publicação definitiva e só a ela nos referiremos aqui.
148 JESUS
ה^דףד.^
A inscrição “A Casa de D avi”.
5 Josefo, Antiquities 17:4145 ;־E. Schürer, The History o f the Jewish People, G.
Vermes, F. Millar & M. Black (eds.), Edinburgh, 1979, vol. 2, p. 505.
6 O final da tradução é citado a partir dc Schürer.
7 Josefo, Antiquities 15:259-266; Schürer, op. cit., vol. 1, pp. 303304־.
150 JESUS
e Trajano (III, 32:3-4). Com base em Hegésipo (c. 180 d.C.), Eusébio
observou que estes imperadores perseguiam a família de Davi para
que nenhum descendente da linhagem real sobrevivesse. Vemos, pois,
que 0 número daqueles que alegavam ter origem davídica não era
absolutamente pequeno. Entretanto, mesmo aqui devemos ser caute
losos, porque toda esta informação está mais ou menos relacionada à
família de Jesus e, consequentemente, estas perseguições de davídicos
poderíam ter sido causadas pela difusão do Cristianismo. Por outro
lado, 0 valor dessa informação para 0 nosso questionamento não é
absolutamente negligenciável9.
Para nosso propósito, é importante observar que durante este
período descobrimos várias referências a uma forma escrita de
genealogias101. A existência de genealogias seculares escritas não é
controvertida e é evidente que havia tradições genealógicas orais e
escritas sobre famílias seculares, de caráter particular e público. Um
estudioso até mesmo deduziu, a partir de fontes rabínicas, que durante
aquele período todo israelita podia remontar à sua ancestralidade por
cinco gerações". Em tal atmosfera, a existência da Casa de Davi teria
sido esquecida apenas se a família tivesse desaparecido fisicamente,
probabilidade esta muito pequena. Segundo um relato talmúdico12,
membros de certas famílias costumavam trazer madeira para o altar
do Templo, um privilégio antigo que reporta à época da reorganização
da comunidade judaica após 0 exílio babilónico. Esta prerrogativa foi
zelosamente conservada por famílias privilegiadas durante séculos,
conforme aprendemos de uma relação preservada na Mischná, Taa-
nit 4:5, dos que forneciam madeira para 0 altar e das datas em que
estas famílias cumpriam a nobre tarefa: “A oferenda da madeira, dos
13 Jeremias trata das duas listas da estirpe davídica de Jesus (Mt 1:1-17, Lc 3:23
38), pp. 290-297. Com razão dá preferência a Lucas, dizendo que, numa com
paração com Mateus, aquele apresenta uma tradição mais fidedigna.
14. “Quem é que Te Bateu?”
1 Este artigo apareceu pela primeira vez em Immanuel 20; D. Flusser, Judaism,
pp. 604-609.
2 Ver D. Flusser, “What Was the Original Meaning o f Ecce H om oT , Judaism, pp.
593603־, ao qual este estudo está associado.
3 Cf. Mt 26:67-68 e Mc 14:65. Lucas preservou todos os elementos do acontecí-
mento. Mateus esqueceu-se de dizer que Jesus teve então seus olhos vendados,
154 JESUS
ao passo que em Marcos os homens gritavam apenas, “Faz uma profecia!”. Por
conseguinte, a questão decisiva “Quem é que te bateu?” não aparece lá. As pala
vras “cobriam seu rosto” estão ausentes cm alguns testemunhos de Mc 14:65,
entre eles o importante Codex Bezae. A respeito dos problemas textuais de Mc
14:65, ver V. Taylor, The Gospel According to St. Mark, London, 1975, p. 571;
Metzger, op. cit., p. 115.
"QUEM É QUE TE BATEU?’ 155
4 Taylor, op. cit., pp. 570571־. Cf. I. H. Marshall, Commentary on Luke, Grand
Rapids, 1979, p. 845.
5 Ver nota 3. Mateus (26:67-68) depende em grande parte de Mc 14:65, mas
um pequeno ponto importante de consenso com Lc 22:63-64 indica que, como
Lucas, 0 autor de Mateus também conhecia 0 relato original. Em Marcos pede
-se a Jesus somente que somente faça uma profecia, porém Mateus está certo
ao escrever: “Faze-nos uma profecia, Cristo: quem é que te bateu?” A adição de
“nos” e “Cristo” são maneirismos de Mateus.
6 W. C. Van Unnik já sugeriu que 0 episódio reflete um jogo, “Jesu Verhühnung
vor dem Synhedrium”, ZNW 29, 1930, pp. 310 ess. Ver também E. Klostemiann,
Das Markusevangelium, Tübingen, 1971, p. 157.
156 JESUS
7 A criada que perguntou a Pedro se ele era um dos discípulos de Jesus era, clara
mente, uma escrava (schifkhá, ver Lc 22:58; Mt 26:68; Mc 14:66) que guardava
a porta (Jo 18:17).
8 Tos. Menakhot 13:21. Tradução alemã em Strack & Billerbeck, op. cit., II: 570.
Em Tos. Pessakhim 7:14 (ver S. Lieberman, Tosefia ki-feshutah, New York, 1962,
IV:614-5, e The Tosefta, p. 182), ouvimos falar a respeito de soldados gentios
que guardavam os portões de Jerusalém - exceto os do Templo, pois esta era
uma das tarefas dos levitas.
9 TB, Tratado Kiduschin 70b.
10 Publicado pela primeira vez em 1908. Cito 0 romance de Walser de acordo com
a edição de Suhrkamp Taschenbuch, Frankfurt, 1982. As passagens pertinentes
estão nas pp. 202, 203-204, 207, 208-209.
11 O jogo é retratado na página 204. Vale a pena citar a descrição em sua totalidade,
também para demonstrar a excelente qualidade do estilo de Walser: “Es hieB
das “Schinkenklopfen” und bestand in einem ziemlich brutalen Draufloshauen
mit der gestreckt Hachen Hand auf den Podex desjeningen, des verdammt war,
denselbcn den umbarmherzigen Hieben darzuhalten. Einer der Nichtmitspieler
muBte dem Dulder die Augen zudccken, damit er sich nicht die Herkunft der
Hiebe und Schlãge merken konnte. Erriet er nun aber trozdem die Person des
sen, der ihn gehauen hatte, so war er freí, und der Ertappte hatte sich, willig oder
nicht, an die unangenehme Stelle des Erlõsten herabzubücken, bis auch ihm das
rasch-oder langsam-crkãmpfte Gltlck des richtigen Erratens zufiel”. Os cama
radas de Hitler praticavam o mesmo jogo cruel que os guardas de Jesus, “Hitler
aber sitzt in Landsberg,,. Im ErdgcschoB veranstaltet der lãrmende Parteigenosse
‘QUEM É QUE TE BATEU?’־ 157
homem condenado a ser objeto deste jogo tem seus olhos vendados
e seu traseiro golpeado. Quando consegue adivinhar quem lhe bateu,
é libertado e aquele cujo soco foi identificado toma-se seu substi
tuto. Tanto quanto é de meu conhecimento, este jogo, bem como seu
nome, é comum em países de língua alemã. Durante a Primeira Guerra
Mundial, 0 pai de Shmuel Safrai foi obrigado a participar dele numa
prisão tzarista na Polônia. Existe também 0 relato interessante de que
em 1923, após o putsch malogrado, Hitler e seus camaradas pratica
ram este jogo na prisão em Landsberg. Apesar de ter posteriormente
se transformado num jogo infantil, não há dúvida de que 0 Sitz im
Leben deste tipo de esporte brutal eram, como ainda são, as prisões.
Por conseguinte, não é de admirar que, durante a noite final de Jesus,
os homens que o mantinham sob guarda na casa do sumo sacerdote
estivessem se divertindo com uma variante desse jogo cruel. Como
já presumimos, estes eram os violentos escravos gentios do sumo
sacerdote - que, tanto quanto sabemos, tampouco era considerado
exatamente um cavalheiro.
Antes de apresentarmos provas adicionais, devemos fazer duas
perguntas, à primeira das quais não tenho qualquer resposta defini
tiva. Os Evangelhos referem-se apenas num aparte à brincadeira bru
tal daqueles que vigiavam Jesus12, de modo que nosso conhecimento
deste jogo é fragmentário. Ao que tudo indica, Jesus relutava em coo
perar, dando a resposta obrigatória à repetida questão sobre quem é
que lhe havia batido e estragando toda a diversão. Seria mais impor
tante saber em que medida os homens adaptaram o jogo à pessoa de
Jesus. Em outras palavras, a exigência “Faz uma profecia, quem é
que te bateu?” teria sido ditada pela tarefa profética de Jesus ou será
que outros prisioneiros comuns eram tratados igualmente? A resposta
para esta questão depende de 0 verbo hebraico “profetizar” poder ou
não ser utilizado no sentido mais amplo de “adivinhar”. Esta parece
ter sido uma possibilidade13, mas nosso conhecimento restrito não
nos permite responder conclusivamente com uma afirmativa. De todo
modo, no presente caso, 0 intuito principal do jogo era claramente o
de humilhar o profeta da Galileia.
Até agora, não encontrei nenhum comentarista teológico que
ousasse sugerir que o que ele lê no Evangelho pode ser observado
Heines mit den Kameraden ‘Schinkenklopfen’ und andere Spiele...” Ver K. Hei-
den, A dolf Hitler, Zürich, 1936, vol. 1, p. 207.
12 Lucas, um leitor sensível de sua fonte, sentiu que a descrição do escárnio na pri
são era superficial e acrescentou as observações seguintes, “E proferiram contra
ele muitos outros insultos”.
13 Há três passagens no Talmud da Babilônia (Eruvin 60b; BavaBatra 12a; Bekho-
rot 45a), nas quais as palavras divrey neviut (palavras de profecia) são emprega
das num sentido depreciativo - mais ou menos como “mera adivinhação”. Ver
W. Bacher, Die exegetische Terminologie, Darmstadt, 1965, pt. II, p. 123.
158 JESUS
1 Este artigo apareceu pela primeira vez em Jerusalem Perspective 4,4-5, 1991,
pp. 2 3 2 8 ־. Ver também D. Flusser, “Caiaphas in the New Testament”, Aliquot
21, 1992, pp. 81-87.
2 Existem duas grafias diferentes: “Caiaphas” e “Kaiaphas” Utilizamos a primeira,
que é comum nas traduções inglesas do Novo Testamento e na literatura erudita
[em português, a tradução de uso corrente é “Caifás” - N. da T.].
3 Ver D. Flusser, “A Literary Approach to the Trial of Jesus”, Judaism, pp. 588
592. Sobre 0 julgamento, ver na presente obra: “O Crucificado e os Judeus”,
“Qual Era o Significado Original de Ecce HomoT'\ “Quem é que Te Bateu?”.
Ver também “Utilitas Crucis”, E. Bickermann, Studies in Jewish and Christian
History, parte 3, Leiden, 1978, pp. 82-138.
4 No que concerne a Caifás e à sua família, ver D. Barag & D. Flusser, “The
Ossuary of Jehohanah Granddaughter o f the High Priest Theophilus”, Israel
Exploration Journal 36, 1986, pp. 39-44; D. R. Schwartz, Agrippa I: The Last
King o f Judaea, Tubingen, 1990, pp. 184-185; E. SchUrer, The History o f the
Jewish People, Edinburgh, 1979, vol. 2, pp. 225-236; J. Jeremias, Jerusalem in
162 JESUS
O Ossuário de Caifás.
“Desfruta tua vida!” Uma inscrição saduceia, dos primordios do século I a.C.,
encontrada numa tumba em Jerusalém.
22 Ver Paul Winter, On lhe Trial o f Jesus, Berlin, 1961, pp. 125-126, e A. F. J. Klijn,
“Scribes, Pharisees, High Priests and Elders”, Novum Teslamentum 3, 1959, pp.
259-267.
23 Ver A Comparative Greek Concordance o f the Synoptic Gospels, R. L. Lindsey
(ed.), Jerusalem, 1989, vol. 3, pp. 267-269.
* A parte legislativa da literatura talmúdica (N. da T.).
24 Ver Seder Olam Rabá, final do cap. 3, e o chamado “Birkat há-Minim”, nas
Dezoito Bênçãos. No presente volume, ver cap. 4 nota 36. Sobre o último item,
ver também 0 estudo de D. Flusser em Tarbiz 60 (1992), pp. 333-374 (em
hebraico). Em alemão, “Ein Sendschreiben”, pp. 13-16.
168 JESUS
Não está claro em que medida este relato foi moldado por João ou
por sua fonte. Muito embora a declaração de Caifás, de que se muitos
acreditassem em Jesus “os romanos virão, destruindo 0 nosso lugar
santo e a nação”, possa ser tardia, sabe-se muito bem que nos tempos
de Caifás, profecias de destruição sobre a futura queda do Templo já
existiam26; uma delas foi pronunciada pelo próprio Jesus.
É muito provável que Caifás tenha decidido agir porque receava
que 0 movimento de Jesus e seu possível sucesso entre 0 povo desen
cadeasse um processo violento de intervenção romana. Sua ansiedade
era exagerada, se bem que tivesse seus fundamentos. As forças milita
res romanas não só lutavam contra os rebeldes judeus como também
esmagavam qualquer movimento profético judaico entusiasta, cujo
objetivo fosse a libertação de Israel. O líder de um destes movimen
tos, Teudas, é mencionado em Atos 5:36. Josefo descreve sua carreira:
“Ele persuadira a maioria das massas a que tomassem suas posses e
o seguissem até 0 rio Jordão. Declarou ser um profeta e que, a seu
comando, as águas do rio se abriríam, fornecendo-lhes uma fácil pas
sagem”. Fado “enviou contra eles um esquadrão de cavalaria... mas
sacrou muitos” e 0 próprio Teudas foi executado pelos romanos27.
Quando Félix foi governador da Judeia, “enganadores e impos
tores, sob o pretexto de que a inspiração divina fomentaria mudanças
1 Este artigo foi publ içado original mente em hebraico em Proceedings o f the Israel
Academy o f Science and Humanities VI:8, 1982, pp. 143151 ־, baseado numa
conferência ministrada em 9 de dezembro de 1980; traduzido do hebraico por
Anna Barber.
172 JESUS
6 Sobre 0 costume de conceder perdão aos prisioneiros judeus, ver S. Safrai, Die
Wallfahrt im Zeitalter des Zweiten Tempels, Neukirchen-VIuyn, 1981, p. 206.
Safrai cita as seguintes passagens: Tratado Pessakhim 8:6; TB, Tratado Pes-
sakhim 91a; TJ, Tratado Pessakhim 36a (8:6).
7 Ver D. Flusser, “O Julgamento e a Morte de Jesus de Nazaré”, Yahadut u-Mekoroi
há-Natzrut (Fontes Judaicas no Cristianismo Antigo), Tel Aviv, 1979, pp. 120
149 (cm hebraico).
8 Esta situação estranha pode ser explicada partindo-se do pressuposto de que
existe uma fonte de João mais antiga. Ver D. Flusser, “Eine judenchristliche
174 JESUS
gentios do advento do rei messiânico. Se nossa hipótese está correta, suas aclama-
çôes farsescas antissemitas serviam também, num nível psicológico, para superar seu
medo do advento do Messias. De todo modo, 0 manto púrpura de Simeão é paralelo
àquele com o qual os soldados romanos trajaram Jesus, para dele escarnecer. O relato
está ausente em Lucas. Ali (23:8-11) conta-se que, antes de ser entregue a Pilatos,
Jesus foi levado diante de Heredes Antipas. Este e seus soldados “trataram-no com
desprezo e escárnio, remetendo-o a Pilatos trajando uma veste brilhante”. Alguns
eruditos entenderam que isto significava “uma veste branca” que, neste caso, seria
paralela à túnica branca de Simeâo bar Guiora - ver supra, cap. 11 nota 68.
12 R. T. Fortna, The Gospel o f Signs, Cambridge, 1970.
13 D. Flusscr, “Uma Fonte Judaico-Cristã para 0 Evangelho de João”, Fontes Judai
cas no Cristianismo Antigo, op. cit., pp. 60-72 (em hebraico), e sua tradução alemã,
supra, nota 8.0 presente artigo é uma espécie de suplemento daquele estudo anterior.
14 Para uma análise dos acontecimentos daquela noite, específicamente de um ato de
humilhação cerimonial um tanto análogo ao aqui discutido, ver “Quem é que Te
Bateu?”
176 JESUS
pois, razoável pressupor que ele fora detido pela guarda do Templo,
conforme sugerido pelo relato em Lucas 22:52. Os três Evangelhos
Sinóticos mencionam o ferimento do servo do sumo sacerdote, que
ocorreu nesta ocasião (ver também Jo 18:10-11). Em João, por outro
lado, lemos, “Judas [Iscariotes], então, levando um destacamento
[coorte] de soldados [i.e., soldados romanos] e guardas destacados
pelos chefes dos sacerdotes e pelos fariseus...” (18:3). Adiante, “0
destacamento [i.e., coorte] com seu tribuno, e os guardas dos judeus
prenderam a Jesus e o mataram” (18:12). Parece, portanto, que a
fonte judaico-cristã de João introduziu soldados romanos na história
da captura de Jesus, com base no envolvimento da coorte romana na
coroação zombeteira que se seguiu à entrega de Jesus aos romanos15.
Na verdade, Jesus foi detido pelos guardas dos sumos sacerdotes, e
não pelas tropas romanas.
Este exemplo ilustra 0 caráter da fonte judaico-cristã de João.
O evangelista elaborou partes dela, que tinha uma orientação muito
diferente da sua, dentro de seu Evangelho. Este processo levou a cer
tas discrepâncias no fluxo da narrativa que, por sua vez, produziram
- deliberadamente, ao que parece - a atmosfera de profundo mistério
que permeia o Evangelho Segundo João. A própria tensão entre a men
sagem do evangelista e a orientação de sua fonte nos permite isolar
os fragmentos da fonte do evangelho em si - procedimento este que
pode ser aplicado à passagem em discussão. Ademais, o autor contri
bui para a confusão, repetindo 0 episódio da apresentação de Jesus ao
povo, feita por Pi latos e as conversas entre ambos, produzindo assim
duplicações. Desta forma, a influência da fonte judaico-cristã se faz
sentir até mesmo naquelas passagens que são de autoria do próprio
evangelista. Abordaremos este aspecto confuso do Evangelho de João
apenas na medida em que for pertinente para a nossa questão histórica.
Um exame de nossa passagem (Jo 19:1-16) revela duas seções
paralelas, João 19:4-6 e 12-14. Cada uma delas parece refletir, à sua
maneira, a mesma passagem da fonte judaico-cristã original. Em
ambas, Pilatos apresenta Jesus ao judeus (v. 4-5; 13-14) e estes res
pondem com o chamado para sua crucificação (v. 6, v. 15). As forças
judaicas que pediram a crucificação de Jesus eram “os chefes dos
sacerdotes e seus guardas” (v. 6), os judeus (v. 7,12,14), e “os chefes
dos sacerdotes” (v. 15). Quem está familiarizado com a perspectiva do
autor deste evangelho percebe com clareza que, aqui e acolá, a men
ção aos “judeus” como inimigos de Jesus é obra do redator final. Por
15 Muito embora o termo próprio “coorte” não seja utilizado na descrição que João
faz da aclamação de chacota dos soldados romanos, ele pode ter aparecido na
sua fonte judaico-cristã, tendo aparentemente passado desapercebido pelo autor
de nosso Evangelho.
QUAL ERA O SIGNIFICADO ORIGINAL DE F.C.CM H O M O ? ]77
16 Ver Brown, op. cit., nota 4, pp. 880-881; Schnackenburg, op. cit., nota 4, p. 305.
JESUS
1 O título original deste artigo era: “Der Gekreuzigte und die Juden”, publicado em
J a h r e s b e r ic h t 1 9 7 5 -1 9 7 6 o f th e L u c e r n e T h e o lo g ic a l F a c u lty a n d C a te c h e tic a l
I n s titu te ׳, também J u d a is m , pp. 575-587. Foi dedicado em gratidão à Faculdade
Teológica de Lucerna, e traduzido para o inglés por Yvonne Bearne.
JESUS
2 Em minha versão alemã, p. 133 (em baixo) e nota 237. Esta pressuposição é
improvável. Havia uma tendência cristã antiga de relacionar as palavras do SI 22
com a morte de Jesus. Em Marcos (15:34; cf. Mt 27:46) 0 versículo 2 transforma
-se no grito vindo da cruz; Lucas (23:35) e Marcos (15:29; cf. Mt 27:39) aludem
ao versículo 8; 0 sorteio realizado, no que diz respeito às vestes de Jesus (Lc
23:34; Mc 15:24, Mt 27:35; Jo 19:23 e s.) depende do SI 22:19. Existe a possi
bilidade de ter havido uma influência sucessiva do Salmo sobre os Evangelhos.
Isso até pode ser verdade no que tange a Lucas, e por esta razão não podemos
saber em que medida as palavras do SI 22 já haviam influenciado sua fonte. 0
salmo SI 22:8, em sua forma grega, já tinha influenciado Lc 23:35. No SI 22:8
está escrito: “Todos os que me veem caçoam de mim... meneiam a cabeça”.
Somente o meneio das cabeças é registrado em Mc 15:29 e Mt 27:39, ao passo
que em Lc 23:35, lemos: “O povo permanecia lá, a olhar. Os chefes, porém,
zombavam” . Esta conexão, aparentemente clara, entre SI 22:8 e Lc 23:35 não é,
de fato, evidente: No Salmo, os observadores são os que zombam, enquanto que
em Lucas, 0 povo que fica a olhar nada tem a ver com o escárnio; as pessoas que
O CRUCIFICADO E OS JUDEUS 185
Eles eram obviamente de opinião que Jesus tinha orado para seu Pai
celestial, solicitando perdão para seus oponentes judeus e, por este
motivo, não acreditaram na autenticidade da expressão. Portanto, não
se deveria permitir que ela aparecesse nos seus manuscritos. Ainda
que estas palavras tivessem sido encontradas na fonte de Marcos, é
possível que, pela mesma razão, ele não deixasse que elas perma
necessem. Entretanto, não é certo que Jesus pediu por seus adver
sários judeus. Talvez estivesse orando pelos soldados romanos que
0 crucificaram.
Cheguemos, porém, ao ponto principal. No caminho para a cru
cificação, Jesus foi seguido por uma multidão de judeus e, como de
costume na época, as mulheres demonstravam seu pesar entoando
lamentos. Quando Jesus foi crucificado, “0 povo permanecia lá, a
olhar” (Lc 23:35). E quando Jesus morreu, a multidão é mencionada
pela terceira vez: “E toda a multidão que havia acorrido para o espetá
culo, vendo 0 que havia acontecido, voltou, batendo no peito” (23:48).
A menção tripla à multidão é artisticamente associada a palavras de
orientação. Na primeira (23:27) e na segunda (23:35a) vezes, Lucas
fala do “povo”, na segunda (23:35a) e na terceira (23:48), fala sobre
“olhar”, e por duas vezes, no primeiro (23:27) e no terceiro (23:48)
casos, relata as lamentações da multidão presente no caminho de Jesus
para a crucificação e após sua morte. É evidente que 0 mesmo povo
judeu é mencionado três vezes como solidário a Jesus. Partimos do
pressuposto que assim estivesse escrito na fonte de Lucas, bem como
a informação adicional, “todos os seus amigos, bem como as mulheres
que o haviam acompanhado desde a Galileia, permaneciam à distân
cia, observando essas coisas” (23:49). A palavra “ver” é também aqui
utilizada no que concerne ao centurião: “O centurião, vendo o que
acontecera5, glorificava a Deus6, dizendo: ‘Realmente, este homem era
um justo!’ ” (23:47). É compreensível que um dos auxiliares dos exe
cutores ficasse profundamente abalado com a execução de um homem
justo, fato relatado com frequência na história. No entanto, não é
muito plausível que, na narrativa de Marcos, 0 centurião chame Jesus
de “ Filho de Deus” e não, como em Lucas, de “justo”, 0 que serve de
argumento adicional para dar-se preferência ao relato deste último.
Resumamos o que vimos até agora. A solidariedade da multidão
judaica com aquele a ser crucificado é expressa três vezes na narrativa
de Lucas, que nunca menciona qualquer chacota feita por judeus presentes.
A multidão 0 acompanha e as mulheres lamentam, 0 povo presencia
que subiram com ele para Jerusalém” (Me 15:40 e s.; cf. Le 23:49;
Mt 27:55 e s.), i.e., as mulheres da comunidade cristã na Galileia, por
assim dizer. De acordo com Marcos e Mateus, nenhum outro judeu
está ao lado de Jesus - em forte contraste a Lucas.
Antes de Jesus pronunciar suas últimas palavras na cruz, ele é inju
riado por três vezes, de acordo com Marcos (15:29-32; Mt 27:3943)־:
13 Marcos (15:36) nos diz: “E um deles, correndo, encheu uma esponja de vinagre
c, fixando-a numa vara, dava-lhe de beber” Em Lucas (23:36): “Os soldados
também caçoavam dele; aproximando-se, traziam-lhe vinagre”. Talvez a vara
com a esponja seja uma adição pitoresca inventada por Marcos.
190 JESUS
suas cabeças, dizem ‘Ah! tu, que destróis 0 Templo e em três dias
o edificas...’” (Mc 15:29). Marcos, por intermédio dos transeuntes,
repete a acusação que, segundo ele, foi pronunciada pelo Sinédrio
(14:58) e que em Lucas está ausente em ambos os casos.
Marcos interpreta zombeteiramente as palavras do Salmo pronun
ciadas na cruz (15:35 e s.; Mt 27:47 e s.). “Alguns dos presentes, ao
ouvirem isso, disseram: ‘Eis que ele chama por Elias!’ e um deles, cor
rendo, encheu uma esponja de vinagre e, fixando-a numa vara, dava-lhe
de beber, dizendo: ‘Deixai! Vejamos se Elias vem descê-lo!’ ”
Esta chacota feita pelos judeus está ausente em Lucas! É muito
provável que 0 duplo escárnio associado a Elias seja invenção de
Marcos, originando-se da ação de um único judeu escarnecedor que,
alegadamente, deu ao homem na cruz vinagre para beber. Lucas, toda
via, relata este fato com referência aos soldados romanos (23:36 e s.).
Tal manipulação parece trair a intenção de Marcos. Deve-se observar
que 0 ponto importante é a incriminação dos judeus, e não 0 fato de
que em Marcos (e Mateus) 0 escárnio do Jesus já crucificado, feito
pelos soldados, esteja ausente, uma vez que, de acordo com Marcos
(15:16-20; Mt 27:27-31), eles caçoam de Jesus antes da crucificação
(cf. Lc 23:11).
Na parte da narrativa que tratamos seria, pois, difícil encontrar
em Marcos algo que ampliasse o nosso conhecimento sobre a cruci
ficação de Jesus, conforme obtido de Lucas - talvez com uma exce-
ção14. Segundo Marcos (15:23), ofereceram a Jesus, no caminho para
a crucificação, vinho misturado com mirra, mas ele não aceitou. Era
habitual na época anestesiar a pessoa condenada com tal bebida15antes
da morte. Marcos ouviu falar desse costume16, mas não sabemos se
isso realmente aconteceu no caso de Jesus17.
Sumarizemos os resultados de nossa investigação. Como vimos, a
menção tripla à multidão judaica (Lc 23:27, 32, 35, 48), que deplora e
lamenta por Jesus de Nazaré em seu caminho para a morte, está ausente
em Marcos (e em Mateus). Após a terceira menção à multidão, a infor
mação (Lc 23:49a) de que todos os seus conhecidos postaram-se à dis
tância tampouco consta. Se presumirmos que Marcos possuía um texto
similar, poderiamos conjeturar que ele, por descuido, tenha omitido a
Eles, porém, vociferaram, todos juntos: “Morra este homem! Solta-nos Bar
rabás’’... Pilatos, querendo soltar Jesus, dirigiu-lhes de novo a palavra. Mas eles grita
ram, “Crucifica-o! Crucifica-o!” Pela terceira vez, disse-lhes: “Que mal fez este homem?
Nenhum motivo de morte encontrei nele!”... Eles, porém, insistiam com grandes gritos,
pedindo que fosse crucificado; e seus clamores aumentavam. Então Pilatos sentenciou
que se atendesse ao pedido deles... (Lc 23:18 e s.; ver também 23:4 e s.).
Deus... glorificou 0 seu servo Jesus, a quem vós entregastes e negastes diante de
Pilatos, quando este já estava decidido a soltá-lo. Vós acusastes 0 Santo e o Justo, e
exigistes que fosse agraciado para vós um assassino, enquanto fazíeis morrer 0 Prín
cipe da vida... Entretanto, irmãos, sei que agistes por ignorância, da mesma forma
como vossos chefes.
nada sobre a existência de uma tensão hostil entre ele e o povo. “Ele
ensinava diariamente no Templo. Os chefes dos sacerdotes e os escri
bas procuravam fazê-lo perecer, bem como os chefes do povo. Mas
não encontravam o que fazer, pois o povo todo o ouvia, enlevado” (Le
19:47 e s.; Me 11:18 e s.; cf. também Le 20:19; Me 12.12; Mt 21:45 e
s.). Era natural que o povo lamentasse o mártir da crueldade romana.
Por conseguinte, Lucas é fidedigno e Marcos distorce os fatos.
Qual a relação entre os dois relatos da crucificação, 0 de Marcos e 0
de Lucas? Deveriamos pressupor que havia duas fontes, uma mais histó
rica e amistosa com relação aos judeus, um “proto-Lucas”, a outra mais
hostil e menos histórica, nosso Marcos? Ou ambos, Lucas e Marcos,
baseiam-se na mesma fonte? As duas possibilidades indicam um movi
mento progressivo que se afasta da realidade, no sentido de um distan
ciamento hostil do judaísmo. Isto é verdade no que concerne à narrativa
de Marcos, ainda que algo mais pudesse desempenhar aqui este papel.
É possível que, por meio de suas invenções, Marcos também qui
sesse expressar que Jesus tinha sido abandonado por todos, exceto as
mulheres cristãs e 0 centurião convertido; à exceção deles, Jesus mor
reu num mundo hostil. Contudo, mesmo alguém que esteja disposto
a aceitar tal hipótese como a principal intenção de Marcos não pode
deixar de perceber em seus relatos os judeus hostis e escarnecedores
no local da crucificação, em contraposição a Lucas, onde a multidão
lamenta por Jesus. Enumeramos razões suficientes para considerar não
histórica a chacota atribuída ao povo judeu durante a crucificação. Uma
coisa é certa. Se é verdade que Marcos inventou os judeus motejadores
afim de enfatizar a solidão “existencial” de Jesus na cruz, é imprová
vel que tivesse boas intenções com relação à multidão judaica. Marcos
estava mais próximo da ideia de que 0 povo judeu tinha “rejeitado”
Jesus. O reconhecimento deste fato me parece significativo.
Será que Lucas aqui se apoia numa fonte especial ou Marcos
depende da mesma fonte, que foi então alterada para adequar-se à sua
inclinação? Esta pergunta não é tão difícil de responder quanto parece
à primeira vista. No decorrer de meu trabalho, percebí por vezes que
0 Evangelho Segundo Marcos representa uma revisão completa do
material antigo, não sendo idêntico a ele, enquanto Lucas nos apresenta
aquele relato antigo original, independente de Marcos; e talvez Mar
eos até mesmo dependa de Lucas. Em resumo, Marcos e Lucas tinham
uma fonte mútua, mas a versão de Lucas é preferível à de Marcos. A
investigação presente confirma os outros resultados de minha pesquisa;
também ali, Lucas é muito mais fiel ao original, mais histórico, em
contraste a Marcos, que fez uma revisão completa de sua fonte.
Creio que na passagem aqui abordada há também uma indicação
de que Marcos fundamentou sua narrativa num texto similar àquele a
partir do qual Lucas trabalhou, mas que pessoalmente 0 reescreveu.
194 JESUS
O Arco de Tito.
Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, sabei que está próxima a sua
devastação. Então, os que estiverem na Judeia fujam para os montes, os que estiverem
dentro da cidade saiam e os que estiverem nos campos não entrem nela, porque serão
dias de punição, nos quais deverá cumprir-se tudo 0 que foi escrito. Ai daquelas que
estiverem grávidas e estiverem amamentando naqueles dias! Com efeito, haverá uma
grande angústia na terra e cólera contra este povo. E cairão ao fio da espada, levados
cativos para todas as nações, e Jerusalém será pisada por nações até que se cumpram
os tempos das nações..89. Quando começarem a acontecer essas coisas, erguei-vos e
levantai a cabeça, pois está próxima a vossa libertação.
Após ter dito que a libertação de seu povo estava próxima, Jesus
concluiu (em Mt 24:32-33; Mc 13:28-29; Lc 21:29-31) sua visão do
futuro, dizendo, “Vede a figueira e as árvores todas. Quando brotam,
olhando-as, sabeis que 0 verão já está próximo. Da mesma forma
também vós, quando virdes essas coisas acontecerem, sabei que 0
Reino de Deus está p r ó x i m o Jesus alude aqui à figueira do Cântico
dos Cânticos 2:13, em consonância com a opinião judaica comu-
mente aceita de que toda a passagem (2:11-13) fala sobre a redenção
de Israel10. A relação intrincada da temática da redenção com a alusão
de Jesus ao Cântico dos Cânticos 2:13 é interrompida pela omissão
de Marcos do paralelo a Lucas 21:28, “Levantai a cabeça, pois está
próxima a vossa libertação” . Uma vez mais, vemos que a estrutura
original dos ditos de Jesus é melhor preservada em Lucas,
A passagem em Lucas é produto de um esquema profético básico
das Escrituras11. Em geral, tem início com uma destruição. Seguem
-se, como consequência, tribulações e sofrimento na dispersão, culmi
nando na alegria do retorno à terra natal, quando 0 tempo está maduro.
O exemplo mais antigo deste paradigma é encontrado nas palavras
de Deus a Abraão (Gn 15:13-16). Ali, a destruição está ausente, mas
os descendentes de Abraão serão estrangeiros numa terra que não a
deles, escravizados e oprimidos; depois, entretanto, retornarão. Isto
acontecerá somente na quarta geração, “Porque até lá a iniquidade
dos amorreus não terá atingido o seu cúmulo”. O antigo esquema res
surge posteriormente no livro de Tobias (14:4-5). Ali, 0 Tobias mais
velho descreve 0 futuro para sua família. Jerusalém ficará desolada e
0 (Primeiro) Templo queimado, porém ao final, os judeus retomarão
à sua casa e reconstruirão o Templo. Este (Segundo) Templo não será
12 Para a conveniência do leitor, citarei as frases similares nas três fontes. Gn 15:16,
“porque até lá a iniquidade dos amorreus não terá atingido 0 seu cúmulo”; Tb
14:5, “até estarem completos os tempos”; Lc 21:24, “até que se cumpram os
tempos das nações” .
13 Pode haver uma dependência recíproca entre estas duas esferas.
202 JESUS
Ah! Sc neste dia também tu conhecesses a mensagem de paz! Agora, porém, isso
está escondido a teus olhos. Pois dias virão sobre ti, e os teus inimigos que cercaram
com trincheiras, te rodearão e tc apertarão por todos os lados. Deitarão por terra a ti e
a teus filhos no meio de ti, e não deixarão de ti pedra sobre pedra, porque não reconhe
ceste 0 tempo em que foste visitada!
Filhas de Jerusalém, não choreis por mim; chorai, antes, por vós mesmas e por
vossos filhos! Pois, eis que virão dias em que se dirá: “Felizes as estéreis, as entranhas
que não conceberam e os seios que não amamentaram! Então, começarão a dizer às
montanhas: Caí sobre nós! E às colinas: Cobri-nos! Porque se fazem assim com o lenho
verde, o que acontecerá com o seco?” (Lc 23:27-31 )2J.
23 Para paralelos judaicos do proverbial versículo 31, ver Billerbeck, II, pp. 262
263; Brown, The D e a th o f th e M e s s ia h , vol. 2, pp. 924-927.
24 Conforme já dito, Mateus segue Marcos, à exceção de Mt 23:37-39, que é idén
tico a Lc 13:34-35. De acordo com a solução sinótica clássica das “duas fontes”,
a passagem é extraída de Q.
25 Além do “Apocalipse Sinótico” em Marcos (13:20, 22 e 27) e seus paralelos em
Mateus (24:22,24 c 30), 0 termo “os eleitos” aparece duas vezes no final de uma
parábola: uma vez em Mateus (22:14), a outra em Lucas (18:7). Nos dois casos,
0 termo não possui a conotação específica que tem em Marcos, e aparentemente
não se origina de Jesus. Parece-me que a designação “os eleitos” é dualista e não
se ajusta à teologia de Jesus. Acerca da raiz essênica deste conceito, ver D. Flus-
ser, J u d a is m , pp. 30-31. Uma observação importante - antes da descoberta dos
Rolos de Qumran - foi feita por E. Meyer no capítulo sobre os essênios em sua
obra V rs p ru n g u n d A n fü n g e d e s C h r is te n tu m s , vol. 2 (Stuttgart, 1921), p. 402.
26 Ver, e .g ., 0 R o lo d e G u e r r a d e Q u m r a n (1QM )1:11-12: “Este é um tempo de
forte inquietação para o povo que deve ser redimido por Deus. Em todas as suas
CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS: JESUS LAMENTA POR JERUSALÉM 205
dizendo que Deus abreviará os dias “por causa dos eleitos que esco
lheu”. Dois versículos depois, Marcos 13:22 (e Mt 24:24), nutnapas-
sagem sem paralelo em Lucas, diz, “Hão de surgir falsos messias e
falsos profetas, os quais apresentarão sinais e prodígios para enganar,
se possível, os eleitos”.
O terceiro - e mais interessante - surgimento dos eleitos está em
Marcos 13:24 (e Mt 24: 31), no final da passagem sobre 0 advento
do Filho do Homem, que “enviará os anjos e reunirá seus eleitos,
dos quatro ventos, da extremidade da terra à extremidade do céu”.
A congregação da Igreja gentia é um conceito básico dos primordios
do Cristianismo27 que, com rapidez, perdeu sua importância. Origi
nalmente, os dois conceitos de congregação estavam associados28,
entretanto a situação modificou-se quase que de imediato. As fon
tes subsistentes revelam vários graus de conexão ou tensão entre a
esperança pela congregação do antigo Israel e a reunião dos crentes
gentios. Por vezes tem-se a impressão de uma espécie de rivalidade
entre antigos e novos conceitos da congregação dos dispersos. Todo
0 antigo complexo cristão é fluido.
Não há contraste visível em João 11:52 e 12:32 entre 0 Israel
histórico e a congregação da Cristandade gentia. Jesus não morreu
só pela nação judaica, mas também “para congregar na unidade todos
os filhos de Deus dispersos” (Jo 11:52). De acordo com este Evange
lho, supôe-se que Jesus tenha dito, “Quando eu for elevado da terra,
atrairei todos a mim” (Jo 12:32). Isso nos faz recordar da estranha
descrição em 1 Ts 4:15-17, quando Paulo descreve “a vinda de nosso
Senhor Jesus Cristo e a nossa reunião com ele” (ver 2 Ts 2:1). Do
mesmo modo, “Quando 0 Senhor... descer do céu, então os mortos em
Cristo ressuscitarão primeiro; em seguida nós, os vivos que estiver
mos lá, seremos arrebatados com eles nas nuvens para 0 encontro com
0 Senhor, nos ares. E assim, estaremos para sempre com 0 Senhor”.
No antigo documento cristão, 0 Didaquê (c. 100 d.C.), a congregação
dos cristãos é mencionada duas vezes, sem a ascensão apocalíptica às
inquietações, nunca houve outro [tempo] igual a este, apressando-se sua conclu
são para a redenção eterna”. Ver a observação de Y. Yadin em T h e S c r o ti o f th e
W ar o f th e S o n s o f L ig h t, Oxford, 1962. Todo este sistema complexo baseia-se em
Daniel 12:1 e numa exegese de Is 60:12, “Em seu tempo, eu 0 apressarei”. Ben
Sirac (36:10) diz: “Apressa 0 fim, lembra-te do término!” Ver também Billerbcck,
op. c it., 1, pp. 599-600 e 953. Ver especialmente TB, T ra ta d o S a n h e d rin 98a: “Se
Israel 0 merecer, ‘Eu o apressarei’, mas se ele não 0 merecer: ‘Em seu tempo’ ”.
Ver também o Apocalipse Grego de Baruc 4:3 e Os Salmos de Salomão 17:45.
27 Acerca desta noção, ver L. Clerici, E in s a m m lu n g d e r Z e r s tr e u te n , Münster,
1966; K. Niedcrvvimmcr, D ie D id a c h e , Gottingen, 1989, pp. 187-191; D. Flus-
ser, “Matthew’s 'Verus Israel’ ”, J u d a is m , pp. 561-574. Ver a citação bíblica
composta em 1 A p o lo g ia 52:10, de Justino, 0 Mártir. Cf. Skarsaune, pp. 76-78.
28 Ver em especial At 1:6-8 e minha contribuição sobre Paulo na T h e o lo g is c h e
R e a le n z y k lo p ã d ie , a ser publicada.
206 JESUS
29 Estes são os dois primeiros capítulos de IV (ou 0 Segundo Livro de) Esdras. Estão
preservados somente em latim e não pertencem ao livro em si. O pequeno iivreto
foi escrito originalmente em grego; é de procedência cristã e foi evidentemente
escrito no século II d.C. A tradução inglesa aqui utilizada é a de J. M. Myers, 1
a n d I I E s d r a s , Th e Anchor B ib le , New York, 1974, pp. 140-158. Outra tradução
existente está em Charlesworth, op. cit., vol. 1, pp. 525-532. Ver também, de
minha autoria, “Verus Israel”, op. cit., pp. 568-571. Acerca da transferência da
eleição de Israel para a Igreja Gentia, ver Skarsaune, pp. 326-374.
30 D. Flusscr, idem.
31 D. Flusscr, Judaism, pp. 558-574.
32 Justino, o Mártir certamente compreendeu de forma correta 0 redator final de
Mateus, ao citar três vezes (Diálogos, 76:4; 120:5-6; 140:4) a passagem em Mt
8:11-12 como prova das Escrituras para a concepção de que a eleição do Israel
culpado fora abolida e transferida para a Igreja Cristã.
CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS: JESUS LAMENTA POR JERUSALÉM 207
Até que ponto Marcos estava ligado a uma posição tão perigosa?
É claro que ele via os crentes cristãos como um corpo separado dos
judeus não cristãos. Marcos menciona apenas a congregação escatoló-
gica dos crentes cristãos. Ainda assim, não há sinal nenhum de que
ele também acreditasse que a eleição de Deus tinha sido transferida
para a Cristandade gentia, e que “os filhos do reino” seriam conde
nados ao inferno. Muito embora Marcos não estivesse predisposto a
aceitar a posição radical (ver Mc 12:29) do redator final de Mateus,
este último não sentiu ser necessário opor-se a Marcos.
O desenvolvimento infeliz de Lucas a Marcos e dali ao redator
final de Mateus pode ser mostrado pela história sinótica de Lucas
4:3233. De acordo com este dito em sua forma mais antiga, quando
Jesus começou seu ministério na sinagoga em Cafamaum, os ouvintes
ficaram pasmos “porque falava com autoridade” (Lc 4: 32). Marcos
1:22 deixa 0 significado mais explícito, “ Estavam espantados com 0
seu ensinamento, pois ele os ensinava como quem tem autoridade e
não como os escribas”. Mateus (7:28-29) repete as palavras de Mar
eos. Ele “esclarece” ainda mais a situação, falando sobre “seus escri
bas”, mas também transfere, propositadamente, 0 espanto dos ouvintes
de Jesus para outra situação. “Aconteceu que ao terminar Jesus essas
palavras, as multidões ficaram extasiadas com 0 seu ensinamento, por
que as ensinava com autoridade e não como os seus escribas.” E, qual
é “0 discurso” que Jesus, de acordo com o redator final de Mateus,
concluiu naquele momento? O “Sermão da Montanha” que, na ver
dade, assemelha-se muito ao “ensinamento dos escribas”. Sentimo
-nos intrigados com as tendências sutis na metamorfose da sentença.
É provável que Marcos não tenha previsto aonde suas modificações
literárias iriam levar. Por outro lado, é difícil negar que, mesmo no
Evangelho de Marcos, estas forças centrífugas posteriores já estives
sem operando.
A peregrinação de Jesus a Jerusalém é 0 primeiro ato de sua tra
gédia. Ele não se dirigiu para lá a fim de curar, mas como 0 profeta
da destruição. Quis evitar o inevitável. Tinha até mesmo vaticinado
que lá morrería, como outros profetas antes dele (Lc 13:33). Tentei
mostrar que este sentimento é uma realidade histórica e não uma
invenção de Lucas. Nossas conclusões são resultado de uma análise
literária do “Apocalipse Sinótico” em sua forma marciana (e matiana).
Marcos omite deliberadamente - com uma exceção (Mc 13:2)34 - de
seu “apocalipse” qualquer menção à tragédia futura de Jerusalém. Ao
invés, coloca por três vezes nos lábios de Jesus (Mc 13:20, 22, 27)
declarações sobre 0 futuro dos eleitos, i.e., o núcleo cristão da futura
35 Nada disso pode ser encontrado cm Paulo! Por exemplo, ver a famosa passagem
em Romanos, capitulo 11.
19. A Topografia e a
Arqueologia da Paixão:
Uma Reconstrução da Via
Dolorosa
M a g u e n B r o sh i
7 Dc acordo com 0 Novo Testamento, Jesus ressuscitou no terceiro dia. Este é tam
bém 0 significado da expressão de Marcos, se bem que ele tivesse escrito “depois
dc três dias” (Mc 8:31; 9:31; 10:34). Marcos segue aqui 0 sistema romano de
A TOPOGRAFIA E A ARQUEOLOGIA DA PAIXÀO 213
1 Flusscr, Das Christenlum - eine jüdische Religion, pp. 37-52; Young, Jesus the
Jewish Theologian, pp. 49-74; J. Jeremias, Die VerkiindingungJesu, Gütersloh,
1971, pp. 99-110. Ver pp. 46-53.
2 Indicamos supra, pp. 22-25 que Jesus foi batizado nas vizinhanças de Betsaida,
onde moravam os irmãos André c Pedro, os quais conhecera depois de seu
batismo (Jo 1:40-44). Esta probabilidade é agora reforçada por pesquisas adicio
nais. Segundo Lucas 9:10,12, o local cm Betsaida onde se pescava era rodeado
pelo “deserto” (ver Mc 6:31; Mt 14:13,15) e João batizou no “deserto”. Ver agora
M. Nun, Jerusalem Perspective 53, out.-dez. 1997, pp. 16-17 e 37. Na página
precedente, vê-se um aqueduto antigo que canalizava água do rio Jordão para
irrigar a planície de Betsaida. Acerca de Betsaida, ver Tabula Imperii Romani/
Judaea-Palestina, eds. Y. Tsafrir, L. DiSegni, J. Green, Jerusalém, Academia
Israelense de Ciências e Humanidades, 1994, p. 85.
216 JESUS
vez que os fatos básicos que provocaram o cisma não slo comumente
conhecidos, gostaria de apresentá-los ao leitor.
Quando o Batista ouviu sobre a atividade de Jesus, enviou dois
de seus discípulos para que perguntassem: “És tu aquele que há de
vir, ou devemos esperar um outro?” (Mt 11:2-4; Lc 7:18-21). João
esperava “aquele que haveria de vir”. Anteriormente, já tinha aludido
por este termo, em sua “pregação messiânica” (Mt 3: 4-6; Mc 1:7 e
Lc 3:16), a Daniel 7:13, que fala sobre “um como Filho de Homem,
vindo sobre as nuvens do céu”. Ao que parece, João Batista esperava
o advento do conhecido Filho do Homem escatológico34.
Muito embora a figura do Filho do Homem seja conhecida de
Daniel 7, ela não pertence à escatologia rabínica. Por outro lado, 0
Filho do Homem escatológico é uma figura importante em tendências
associadas ao apocalipsismo judaico e a Jesus. Na verdade, para Jesus
esta ideia era central. De forma similar aos escritos apocalípticos, ele
descreve o Filho do Homem como 0 juiz sobre-humano poderoso do
Último Julgamento.
Quando o Filho do Homem vier em sua glória, e todos os anjos com ele, então
se assentará no trono da sua glória. E serão reunidas em sua presença todas as nações
e ele separará os homens uns dos outros como 0 pastor separa as ovelhas do cabritos,
e porá as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então dirá 0 rei aos que
estiverem à sua direita: “Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança 0 Reino pre
parado para vós desde a fundação do mundo”... Em seguida, dirá aos que estiverem
à sua esquerda: “Apartai-vos de mim, malditos, para 0 fogo eterno preparado para 0
diabo e para os seus anjos”... E irão estes para 0 castigo eterno, enquanto os justos irão
para a vida eterna (Mt 25:31-46)J.
3 Ver cap. 9.
4 Ver também Mt 7:23 e Lc 13:27 (i.e., SI 6:9).
5 Ver Flusser, “Melchizedek and the Son o f M&n", Judaism, pp. 186-191. Ver tarn-
bém a edição de 1lQMel com comentários de E. Puech, “Notes sur le manuscrit
de 11 Q Meichisedeq”, Revue de Qumran 48/12, 1987, pp. 483-513.
OS ESTÁGIOS DA HISTÓRIA DA REDENÇÃO SEGUNDO JOÃO BATISTA E JESUS 217
para nenhum período intermediário entre esta era iníqua e o fim deste
mundo - quando o Filho do Homem será revelado. Por conseguinte,
dentro desta agenda escatológica, que foi também adotada pela seita
do Mar Morto, não há lugar para o conceito rabínico de reino do céu6.
Jesus enviou ao Batista uma resposta parcialmente afirmativa.
Uma nova era fora inaugurada por João. Jesus disse aos mensageiros
do Batista,
Ide contar a João 0 que estais ouvindo e vendo: os cegos recuperam a vista, os
coxos andam, os leprosos são purificados e os surdos ouvem, os mortos ressuscitam
e os pobres são evangelizados. E bem-aventurado aquele que não ficar escandalizado
por causa de mim! (Mt 11:2-6; Lc 7:18-23).
6 É somente em Mateus que João Batista fala sobre 0 reino do céu. “Mas não se
pode confiar em que Mateus faça uma distinção entre as palavras de João e as
de Jesus” . Dodd, Parables, p. 39.
7 Este texto é 4Q521, fragmento 2ii e 4, linhas 6-13, especialmente linha 12. Ver E.
Puech, “Une apocalypse messianique” (4Q521), pp. 477-522. Ver Isaías 26:19;
29; 18; 35:5; 61:1. Apenas a purificação dos leprosos está ausente do paralelo.
Ver supra, pp. 29-30, nota 22. Os últimos na lista de Jesus (Mt 11:5 e Lc 7:22),
específicamente, “os pobres são evangelizados”, é 0 grego equivalente a ls 61:1
e aparece também no fragmento de Qumran (linha 12).
218 JESUS
Em verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu nenhum maior®
do que João, o Batista, e, no entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele.
Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sofre violências e violentos
se apoderam dele. Porque todos os profetas bem como a Lei profetizaram até João.
E, se quiserdes dar crédito, ele é o Elias que deve vir. Quem tem ouvidos, ouça! (Mt
11:11-15).
era impensável. Jesus, porém, estava certo de que, por seu intermé
dio, a era do reino dos céu seria inaugurada antes do fim dos dias. Ele
reconheceu a existência de um período após o reino do céu - 0 dia
desconhecido do advento do Filho do Homem e do Último Julgamento
(ver, e.g., Lc 17:22-24; Mc 13:32; Mt 24:36 e At 1:7)'°.
João acreditava que 0 juízo final fosse iminente; 0 machado já
está posto à raíz das árvores, e 0 Todo Poderoso virá com “a pá em
sua mão: vai limpar a sua eira e recolher seu trigo no celeiro; mas,
quanto à palha, vai queimá-la num fogo inextinguível” (Mt 3:12; Lc
3:17). Jesus rejeitou tal perspectiva, expressando sua concepção na
Parábola do Joio (Mt 13:24-30)n. “Para não acontecer que, ao arrancar
0 joio, com ele arranqueis também 0 trigo, Deixai-os crescer juntos
até a colheita” (Mt 13:29). O julgamento deve esperar até a colheita.
“No tempo da colheita, direi aos ceifeiros: ‘Arrancai primeiro o joio
e atai-0 em feixes para ser queimado; quanto ao trigo, recolhei-o no
meu celeiro’ ” (Mt 13:30). Parece até que a parábola de Jesus era uma
resposta adequada à metáfora da colheita de João. Atualmente, no
período intermediário, é inevitável que os pecadores vivam no mesmo
mundo que os justos. Só no final, no Último Julgamento, 0 Filho do
Homem “separará os homens uns dos outros, como 0 pastor separa
as ovelhas dos cabritos”1012. Os pecadores “irão para 0 castigo eterno,
enquanto os justos irão para a vida eterna” (Mt 25:31-46).
Jesus adotou a ideia do período intermediário entre 0 passado his
tórico e 0 fim da história. Mesmo assim, ele é 0 único pensador conhe
cido a tirar deste esquema a conclusão lógica de que, até a destruição
final dos iníquos, justos e pecadores necessariamente coexistirão. Este
discernimento lhe era necessário, uma vez que identificava 0 período
intermediário com 0 conceito rabínico de reino do céu - segundo 0
qual a coexistência dos perversos e do justos é indiscutível.
Jesus foi a única pessoa a inserir 0 reino do céu como 0 segundo
estágio da escatologia tripartite. Veremos em seguida que, nos para
lelos judaicos contemporâneos, 0 segundo estágio é a era messiânica.
10 É verdade que a divisão bipartite entre este mundo e 0 mundo vindouro esca-
tológico é mais antiga que o sistema tripartite de Jesus. Contudo, entre seus
contemporâneos, ele certamente não foi o único pensador judeu a acreditar que,
subsequente à história presente e antes da era puramente escatológica, havería
uma espécie de era de transição.
11 Ver também a Parábola da Rede (Mt 13:47-50) e a Parábola da Figueira (Lc
13:6-9).
12 Ver Ez 37:16-17. Há um antigo poema hebraico que faz parte da liturgia do Ano
Novo judaico e que diz: “Como um pastor apascenta seu rebanho, fazendo com
que as ovelhas passem sob seu cajado, do mesmo modo Tu farás com que sejam
julgadas, contadas, calculadas e consideradas as almas de todos os seres vivos;
repartirás as necessidades de toda a Tua criação e proferirás o veredito”. The
Complete Artscroll Machzor. Rosh Hashamh, trad, de Rabi Nossan Scherman,
New York, 1984, p. 483.
220 JESUS
13 Ver Vielhauer, Aufsütze zum Neuen Testament, pp. 80-94; Young, Parables, pp.
51-83.
14 Ver Dodd, op. cit., p. 8.
15 Traduções similares são preservadas nos Targumim aramaicos.
16 Horovitz e Rabin (eds.), Mekhilta de Rabbi Ishmael, pp. 150-151.
17 Targum de Zacarias 14:9.
18 Ver, e.g., Mischná, Tratado Avot 3:6.
OS ESTÁGIOS DA HISTÓRIA DA REDENÇÀO SEGUNDO JOÀO BATISTA E JESUS 221
19 Sobre este dito, ver também meus estudos “Hiliel’s Self-Awareness and Jesus”,
Judaism, ρρ. 510-511; “Hillel and Jesus, Two Ways of Self-Awareness”, Hillel
and Jesus, eds. J. H. Charlesworth e L. L. Johns, Philadelphia, 1997, pp. 71-107,
em especial pp. 84-85, 92-107,
222 JESUS
24 As palavras “em seu Dia” não são confirmadas nos melhores manuscritos.
25 A passagem toda está em Lc 17:22-24,26-32,34-37. A passagem precedente (Lc
17:20-21) parece ser unia criação interpretativa, uma espécie de duplicata de Lc
17:23. Ver p. 84. De todo modo, 0 futurista “reino de Deus” certamente faz parte
da terminologia de Lucas. Ver também a Última Ceia em Lc 22:16 e 18!
26 Ver Lc 18:29-30 (e Mc 10:29-30; Mt 19:20): “... não há quem tenha deixado
casa..., por causa do Reino de Deus, sem que receba muito mais neste tempo e,
no mundo futuro, a vida eterna”. Ver também a “vida eterna" em Mt 25:46.
* Em hebraico, literalmente “mundo vindouro” (N. da T.).
27 Há, entretanto, uma analogia entre a divisão judaica comum em três períodos
e a agenda da seita do Mar Morto; ali, os três períodos são 0 passado bíblico
(evidentemente, mais ou menos o periodo até a destruição do primeiro Templo),
0 periodo perverso atual (os “dias do domínio de Belial”, 1QS 2:19) e 0 tempo
puramente escatológico. No tempo de uma (nova) criação, Deus diz: “Criarei
Meu Templo c o estabelecerei para Mim [Deus] para a eternidade” (Rolo do
Templo 29:7-10). Ver também supra, cap. 10 nota 12. De todo modo, esta divisão
tripartite não é absolutamente idêntica à de Jesus e a das fontes judaicas para-
leias. Steve Notley chamou minha atenção para o Livro de Tobias 14:4-5. Ali,
Tobias fala sobre a primeira “Casa de Deus, que ficará queimada”. Depois do
retorno do exílio babilónico, os judeus “reconstruirão sua Casa, menos bela do
que a primeira”. E, no futuro, “a casa de Deus será reerguida em seu esplendor
para todas as gerações”. O Terceiro Templo é 0 magnífico templo escatológico.
Podemos provar que esta esperança escatológica não se concretizou após a des
truição do Segundo Templo. Foi somente reforçada depois da destruição dos
romanos.
224 JESUS
história corrente28. Ela inclui 0 juízo final, um novo céu e terra, uma
ressurreição e a vida eterna29.
Atualmente, é impossível saber com exatidão quando esta esca-
tologia tripartite foi formulada. No judaísmo rabínico, uma distinção
precisa entre a era messiânica e a “era vindoura” foi esquecida com
muita rapidez, e os antigos ditos rabínicos pertinentes são sucintos
demais para indicar seu pensamento de forma plena. De todo modo,
esta espécie de escatologia já estava indubitavelmente estabelecida
na segunda metade do primeiro século d.C. Tal fato também pode
ser reconhecido a partir da literatura rabínica. Quase todos os sábios
judeus que tentaram calcular a duração do período messiânico vive
ram na segunda metade do século I ou no século 11 d.C.30É lógico que
pensavam que depois deste período teria início “a era vindoura”. Os
ensinamentos de Jesus podem até ser a primeira evidência inequívoca
desta agenda messiânica.
Estou certo de que as origens da agenda messiânica de Jesus estão
no pensamento rabínico contemporâneo, mas se quisermos ver isto
de forma mais explícita, devemos buscar ajuda em três textos apo
calípticos, todos eles escritos no final do século 1 d.C. Um deles é 0
Apocalipse, o último livro do Novo Testamento. Os Últimos Dias são
ali descritos nos capítulos 20-21. Segundo este livro, 0 reino messiâ
nico durará mil anos31. No final deste período, terão lugar 0 Último Jul
gamento e a ressurreição dos mortos (Ap 20:11-15). Depois (Ap 21:1),
diz 0 autor: “Vi então um céu novo e uma nova terra - pois 0 primeiro
28 Ver P. Volz, Die Eschatologie der jüdischen Gemeinde, Tübingen, 1934, pp.
6 4 6 7 ־, em especial 7 1 7 7 ־,e M. Zobel, Gottes Gesalbter, Berlim, Schoken, 1938,
pp. 69-74, 125-129. Ver também Schürer, op. cit., vol. 2, pp. 537-547, e Bil-
lerbeck, op. cit.. pp. 4b: 799976־. Ver igualmente TB, Tratado Sanhedrin, 91b,
especialmente as palavras de Rabi Samuel e Sifre para Deuteronômio, sobre Dt
6:6, ed. L. Finkelstein, reimpressão, New York, 1969, p. 62 e a observação lá
assinalada; Nakhntânides, Toral hú-Adam, ed. H. D. Chavel, Jerusalem, 1963,
pp. 300-303: “Designamos a era após a ressurreição dos mortos de ‘a era vin
doura” ’. Ver ali as fontes. Ver também, de minha autoria, Gleichnisse (supra,
nota 9), pp. 270-272, 280-281. Segundo fontes rabínicas, Moisés e os profetas
referiam-se ao futuro até a era messiânica, mas a “era vindoura” estava fora de
seu escopo. Jesus, contudo, colocou o limite antes dos dias do Messias (ver Mt
11:13). A propósito, o termo “a era vindoura” é confirmado em 1 Enoque 71:15.
29 Paulo já conhecia este esquema escatológico e o modificou de acordo com sua
perspectiva. Ver 1 Cor 15:23-28; H. Conzelmann, Der erste Brief an die Korin-
ther, Gottingen, 1989, pp. 315-320.
30 TB, 'Tratado Sanhedrin 99a, Midrasch sobre os Salmos SI 90:15 e paralelos. Ver
Volz, op. cit., pp. 226-228 e Zobel, op. cit., pp. 72-73.
31 Esta opinião foi aceita por alguns sábios judeus (ver Volz, op. cit., pp. 226-228)
e é também confirmada, numa das versões, em IV Esdras 7:28. Ver também Taná
de-vei Eliyahu (ou: Seder Eliyahu), Viena, 1902, 1902, pp. 6-7, e 0 comentário
de M. Friedmann. O texto é citado em TB, Tratado Sanhedrin 97a/b; TB, Tra
tado Avodá '¿ará 9a. Acerca da cifra 2000 anos, ver Volz, op. cit., p. 227.
OS ESTÁGIOS DA HISTÓRIA DA REDENÇÁO SEGUNDO JOÃO BATISTA E JESUS 225
Pois Meu Messias será revelado com aqueles que estão com ele, e causará o júbilo
daqueles que permanecem por quatrocentos anos38. Após estas coisas Meu servo, 0
Messias, morrerá e com ele todos os que exalam 0 hálito humano. E o mundo retomará
ao silêncio primevo por sete dias, como aconteceu nos inícios; e ninguém restará. E
após sete dias, 0 mundo que não está desperto se levantará e o que for corruptível pere
cerá... E os tesouros abdicarão das almas que a eles foram confiadas. E o Excelso será
revelado no trono do julgamento...59
41 Ver, porém, Billcrbeck, 1 op. cit., pp. 486, 956-959. O Filho do Homem em
Daniel 7:13c por vezes, em fontes rabínicas no século III d.C., identificado com
o Messias, mas a figura divina do Filho do Homem como 0 juiz escatológico no
Último Julgamento não aparece nas fontes rabínicas.
42 Ver Flusser, “Jesus and the Sign o f the Son of Man”, Judaism, pp. 515-534.
228 JESUS
43 Sobre o advento futuro de Elias, ver Zobel, op. cit., pp. 58-68; Billerbeck, op.
cit., vol. 4b:779-798; Volz, op. cit., 195-197.
44 É surpreendente descobrir que a agenda messiânica de Jesus não é muito diferente
do esquema escatológico tripartite do excêntrico filósofo medieval Joaquim de
Fiore(c. 1132-1202). Este dividiu a história em: história do Antigo Testamento,
0 período atual da graça do Novo Testamento e o período futuro do Espírito. As
diferenças em conteúdo, entretanto, não são pequenas.
45 “Contudo, se é pelo dedo de Deus que eu expulso os demônios então 0 Reino
de Deus já chegou a vós”(Lc 11:20). Como já dito [supra, p. 217, a expressão
“ dedo de Deus” é extraída de Êxodo 8:15[19], Por meio desta citação, Jesus
alude à percepção de que, por seu intermédio, a redenção divina já começou.
Ver a oração escatológica de Eclo 36:1-22, particularmente os versículos 6-7:
“Renova os prodígios, faze outras maravilhas,
glorifica a tua mão e 0 teu braço direito.”
Por meio das curas de Jesus, Deus repete os “prodígios” e “maravilhas” da
libertação do jugo egípcio.
Quadro Cronológico
A.C.
134-104 Simâo é sucedido por seu filho João Hircano I. Este, no final
de seu sacerdócio, abandona os fariseus e alia-se aos saduceus.
104-103 Aristóbulo I sucede a João Hircano e é nomeado rei. A Judá
essênica.
103-76 Alexandre Janeu, irmão de Aristóbulo, torna-se sumo sacerdote
e rei. Persegue sanguinariamente os fariseus.
76-67 Sua viúva, Salomé Alexandra, torna-se rainha e transforma
os fariseus no partido dominante. Os saduceus sào oprimidos.
Hircano II, filho de Alexandra, é sumo sacerdote.
67 Aristóbulo II revolta-se contra seu irmão Hircano, autono-
meando-se sumo sacerdote e rei depois da morte de sua mãe.
Início da guerra civil. Hircano é apoiado pelos fariseus, Aris-
tóbulo pelos saduceus.
65 (início) Aristóbulo sitiado no Monte do Templo por Hircano e seus
aliados. Honi (Onias), 0 do círculo, é morto.
64 O general romano Pompeu põe fim ao Império sírio dos
selêucidas.
63 Pompeu em Damasco no início do ano. Serve de árbitro entre
os dois irmãos, decidindo a favor de Hircano; aprisiona Aris-
tóbulo e conquista Jerusalém no outono. A Judeia tranforma-se
num principado vassalo de Roma, com Hircano II como sumo
sacerdote. A conspiração de Catilínia em Roma é sufocada.
47 O idumeu Antípaler, pai de Herodes, é nomeado por César
governador da Judeia.
44 César é assassinado.
43 Antípater é assassinado.
40 Hircano II é deposto pelos partos, liderados por seu sobrinho
Antígono; exilado para a Babilônia, é executado por Herodes
em 30 a.C.
37 Antígono é derrotado pelos romanos e Herodes é nomeado rei
da Judeia (37-34 a.C.) por Antônio.
31 Otaviano ( mais tarde Augusto) derrota Antônio na batalha de
Áccio.
31 a .C .- O imperador Augusto
14 d.C.
c. 20 a.C. - O filósofo judeu Filo de Alexandria.
após 40 d.C.
c. 20 a.C. - Os dois grandes escribas fariseus, Hilel e Schamai.
4 a.C. Morte de Herodes Magno. Divisão do império entre seus filhos:
Arquelau, Etnarca da Judeia, Samaria e Idumeia (4 a.C.- 6
d.C.); Herodes Antipas, Tetrarca da Galileia e da Pereia (4
a.C.-39 d .C .); Filipe, marido de Salomé, Tetrarca da região
nordeste (4 a.C.-34 d.C.).
c. 2 Provável nascimento de Jesus.
QUADRO CRONOLÓGICO 231
D.C.
9 :3 7 -3 8 -2 0 1 5 :2 4 -5 4
1 0 :5 -7 -5 4 1 6 :1 4 -1 2 3 η. 24
1 0 :5 -1 5 -1 9 8 1 6 :1 7 -1 9 -9 7
1 0 :5 -1 6 -8 5 1 7 :5 -1 0 5
1 0 :6 - 5 3 η. 50, 54 1 7 :1 0 -1 3 -3 4
1 0 :1 5 -2 3 -1 9 8 1 9 :2 0 -2 2 3 η. 26, 226
1 0 :1 6 -8 3 1 9 :2 8 -1 0 2
1 0 :1 7 -1 8 - 198 η. 6 2 0 :1 -1 6 -7 6
1 1 :2 - 2 7 20:24-28 - 53 η. 48, 96 η. 34
1 1 :2 -4 -2 1 6 2 0 :2 8 - 5 3 η. 48, 95 η. 34
1 1 :2 -6 -2 8 η. 18, 2 9 ,2 1 7 2 1 : 8 - 108η. 3
1 1 :4 -6 -2 2 1 ,2 2 8 21:11 - 108
1 1 :5 -2 1 7 η. 7 2 1 :1 2 -1 1 1 η. 8
11:7-15-31 2 1 :1 2 -1 3 -1 1 1 η. 11
11:11 - 2 1 8 η . 8 2 1 :1 5 -1 6 -1 0 8 η. 5
1 1 :1 1-15-218 2 1 :2 3 -2 7 - 14 η. 24
1 1 :1 2 -1 5 -2 2 8 2 1 :3 1 -3 2 -8 6
1 1 :1 2 -3 2 η. 29, 84, 222 2 1 :4 3 -2 0 6
11:13-111 η. 12 21:45 e s . - 193
1 1 :1 6 -1 9 -3 4 2 2 :1 4 -2 0 4 η. 25
11:20-24 - 27, 54 2 2 :3 5 -4 0 -6 3
1 1 :2 3 -2 1 8 2 2 :3 9 - 6 2
1 1 :2 5 -2 7 -9 2 2 3 :1 -3 6 -4 6
1 1 :2 8 -3 0 -9 2 η. 21 2 3 :2 -3 -4 8
1 2 :8 - 4 0 η. 11 2 3 :3 -4 6
1 2 :9 -1 4 -4 1 2 3 :4 -4 7
1 2 : 1 4 - 4 1 ,4 2 η. 1 7 ,8 8 η. 10 2 3 :6 -1 2 -1 4
12:28-30-221 2 3 :1 3 - 4 7
1 2 :3 0 -2 2 1 , 228 2 3 :1 5 -5 1
1 2 :3 2 -4 3 , 226 2 3 :2 4 - 113 η. 14
1 2 :3 8 -4 2 -5 5 2 3 :2 5 -2 6 -3 9
12:4 0 -2 1 2 -2 1 3 η. 7 2 3 :2 7 -2 8 -4 6
1 3 :1 1 -1 5 -8 5 23:29-31 - 4 9 , 167, 203
1 3 :1 4 -3 0 -2 9 23:30 e s s . - 183
1 3 :2 4 -3 0 -2 1 9 , 221 2 3 :3 7 - 113 η. 14
1 3 :2 9 -2 1 9 23:37-39 - 197 η. 2, 2 0 3 ,2 0 4 η. 24
1 3 :3 0 -2 1 9 2 3 :3 9 -2 0 2 η. 18
1 3 :3 3 -8 5 2 4 :1 -2 -2 0 3
1 3 :4 7 -5 0 -2 9 , 219 η. 11,221 2 4 :1 -3 -1 9 7
1 3 :5 2 -6 3 2 4 :1 4 - 198η. 6
1 3 :5 5 -1 5 η. 30 2 4 :2 1 -2 2 -2 0 4
1 3 :5 7 -1 6 2 4 :2 2 - 2 0 4 η. 25
1 4 :1 -3 3 2 4 :2 4 - 2 0 4 η. 25, 205
1 4 :1 -2 -9 7 η. 2 2 4 :2 6 -2 8 - 199-200 η. 9
1 4 :3 -1 2 -2 0 η. 4 24:29-31 - 199 η. 9
14:13, 1 5 - 2 1 5 η. 2 2 4 :3 0 - 2 0 4 η. 25
1 5 :1 -4 1 24:31 - 2 0 5
1 5 :1 1 -3 8 24:32-33 - 200
1 5 :2 1 -2 8 -5 3 24:34b - 5 0 η. 42
240 JESUS
24:34-35 - 50 η. 42 2 7 :4 7 -1 8 9
2 4 :3 6 -2 1 9 , 223 27:47 e s . - 190
2 5 :3 1 -3 6 - 101 2 7 :4 8 - 138, 189
2 5 :3 1 -4 6 -2 9 ,2 1 6 ,2 1 9 2 7 :5 4 - 185 η. 2
2 5 :4 6 -2 2 3 η. 26 2 7 :5 5 - 185 η. 2
26:1 e s . - 1 9 2 27:55 e s . - 1 8 9
2 6 :1 7 -2 0 - 114 η. 17 2 7 :6 0 - 119
2 6 :2 3 - 114 η. 24 2 7 :6 2 -1 6 7
2 6 :2 8 - 9 6 η. 34 2 7 :6 2 -6 6 -2 1 3 η. 7
2 6 :3 0 -2 0 9 27:63 - 2 1 3 η. 7
2 6 :4 1 b - 115 η. 28 2 8 :1 1 -1 5 -2 1 3 η. 7
26:51 - 156 2 8 :2 0 - 5
2 6 :5 7 - 118
26:57-61 - 122 M arcos
2 6 :5 7 -6 8 - 118 1 :2 -4 -1 9
2 6 :5 9 - 118 1 :7 -2 1 6
2 6 :6 0 -1 1 1 η. 12 1 :9 -2 4
26:61 - 111 1 :1 4 -2 7
2 6 :6 2 -1 6 5 1 :2 9 - 2 6 η. 14
2 6 :6 2 -6 4 -1 6 5 2:27-28 - 40
2 6 :6 3 - 113 η. 13 3 : 6 - 4 2 η. 17
2 6 :6 4 -1 0 3 η. 27 3 : 1 8 - 8 0 η. 3
26: 6 7 -6 8 -1 5 3 η. 3, 155 η. 5, 158 3:21 - 16 η. 36
2 6 :6 8 - 156 η. 7 3:34-35 - 16
26:73 - 7 η. 2 5 :4 3 -9 1
2 7 :1 -2 -1 1 8 6 : 3 - 7 , 15 η. 30
27:11-23 - 130 6 :4 -1 6
2 7 :1 2 -1 6 5 6 :7 -2 8
27:15 - 133 η. 61 6 :1 4 -1 6 -9 7 η. 2
2 7 :1 8 -1 6 5 η. 19 6: 1 7 -2 9 - 2 0 η. 4
2 7 :1 9 -2 1 2 6:31 - 2 1 5 η. 2
2 7 :2 0 - 165 7 :5 -3 8
27:21-23 - 171 7 :8 -3 8
2 7 :2 4 -2 5 - 166 η. 21 8 :2 2 -2 6 -4 0
2 7 :2 5 -1 6 6 η. 21 8:28 - 123
2 7 :2 6 - 134, 181 η. 27 8:31 - 2 1 2 η . 7
2 7 :2 7 - 175,211 9 :7 -1 0 5
27:27-31-1 3 2 η. 5 8 ,136η. 68,172,181,190 9:31 - 2 1 2 η. 7
2 7 :2 8 - 137 η. 70 9 :4 3 -4 8 -6 6 η. 33
2 7 :3 4 - 190 η. 17 1 0 :1 3 -1 6 -8 9
2 7 :3 5 - 184 η. 2 10:24:25-71
27:39- 184 η. 2, 189 1 0 :2 9 -3 0 -2 2 3 η. 26, 226
2 7 :3 9 -4 3 - 189 1 0 :3 4 -2 1 2 η. 7
27: 39 e s . - 1 8 7 η. 9 1 0 :4 1 -4 5 -5 3 η. 48
27:41 - 185, 189 1 0 :4 5 -5 3 η. 48, 95 ηη. 3 2 e 3 4
2 7 :4 2 - 189 1 1 :8 -1 0 8 η. 3
2 7 :4 4 - 188 η. 9 1 1 :1 5 -1 1 1 η. 8
27:46 - 4 η. 4, 139 η. 79, 184, 184 η. 2, 11:15-17-111 η. 11
190 η. 14 1 1 :1 8 -1 9 -1 0 8 η. 5
ÍNDICE DE FONTES 241
11:18 e s . - 1 9 3 1 5 :1 5 -1 7 5
12:12-187, 193 1 5 :1 6 -2 1 1 ,2 1 2
12:28-34-64 15:16-20- 132 η. 5 8 ,1 3 6 ,1 3 6 η. 68, 171,
12:29 - 207 181, 190
1 3 -1 9 7 15:21 - 137
1 3 :2 -2 0 4 , 207 1 5 :2 3 - 138, 190
13:2-4-197 1 5 :2 4 -1 8 4 η, 2
1 3:9-198 η. 6 1 5 :2 6 - 103 η. 25
13:9-133-198 1 5 :2 9 - 184 η. 2, 189, 190
1 3:10-198 η. 6 15:29 e s . - 187 η. 9, 191, 194
13:190-20-204 15 :2 9 -3 2- 189
13:20-204 η. 25, 207 15:31 - 185
13:22-204, 204 η. 25, 207 15:31 e s . - 191, 194
13:24-205 1 5 :3 2 -1 8 9
13:24-27- 199 η. 9 1 5 : 3 2 b - 188 η. 9, 191, 194
13:27-204 η. 25, 207 15:34 - 4 η. 4, 139η. 79, 184, 184-185 η.
13:28-29-200 2, 190 η. 14
13:32-219, 223 1 5 :3 5 - 189, 190
14:1 e s . - 192 15:35 e s . - 190, 191, 194
14:6-209 1 5 :3 6 - 138, 189, 189 η. 13, 191, 194
14:20- 114 η. 24 1 5 :3 9 - 185 η. 2, 191
14:24-95-96 η. 34 1 5 :4 0 - 185 η. 2, 191, 194
14:38b- 115 η. 28 15:40 e s . - 189
14:43-52- 154 1 6 :1 5 -1 8 1 η. 27
14:47-156
14:53-118, 154 Lucas
14:53-65 - 118 1 :1 -4 -1 4 3 η. 6
14:54-154 1 :3 6 -2 4
14:55-118 1 : 5 9 - 8 η. 5
14:55-64- 154 1 :6 8 -2 0 2 η. 15
14:57-59- 111 2-202
14:58-111, 190 2 :4 -9
14:60-62- 165 2 :2 2 -2 4 - 11
14:61 - 113 η. 13 2 :2 5 - 2 0 2
14:62- 103 η. 27 2 :3 4 -3 3
14:65 - 153-154 η. 3, 154, 155 η. 5, 158 2 : 3 5 - 17 η. 42
14:65b- 155 2 :3 6 -3 8 -2 0 2
14:66- 156 η. 7 2 :3 8 - 2 0 2 η. 15
14:66-72- 154 2:41-51 - 11
14:70-7 η. 2 3 :9 -2 1 6
15:1 - 118, 154 3 :1 0 -1 4 -2 8
15:3-165 3 : 1 6 - 3 3 ,2 1 6
15:6-133 η. 61 3 :1 6 -1 7 -2 9
15:6-10-133 3 :1 7 -2 1 9
15:6-12-130 3 :1 9 -2 0 -2 0 η. 4
15:9-178 3:21 - 2 2 η. 12
15:10-165 η. 19 3 :2 1 -2 2 -2 2 η. 10
15:11 - 133, 165 3 :2 3 -3 8 -8 , 152 η. 13
15:12-14-171 4:1 - 2 7
242 JESUS
4 :1 7 -1 8 -3 0 1 1 :27-28- 16
4 :1 8 -2 1 -3 0 1 1 :2 9 -3 2 -5 5
4 : 2 2 - 1 5 η. 30 1 1 :4 7 -4 8 -4 9 η. 38
4 :2 4 -1 6 1 1 :5 2 -4 7
4 :3 2 - 2 0 7 1 3 :1 -5 -7 6 , 125
4 : 3 8 - 2 6 η. 14 1 3 :1 -9 -2 0 3
5 : 3 0 - 7 6 η. 22 1 3 :2 - 7 7 η. 23
5 :3 0 -3 2 -7 6 1 3 :3 -2 0 3
5 : 3 2 - 7 6 η. 22 1 3 :5 -2 0 3
6 :1 - 5 -3 7 1 3 :6 -9 -7 7 , 200 η. 10,219 η. 11
6 :6 -1 1 -4 1 1 3 :1 8 -1 9 -8 5
6:11 - 4 2 , 88 η. 10 1 3 :3 1 -3 3
6 : 1 5 - 8 0 η. 3 13 :3 1 -3 3 - 107
6:16-17011. 31 1 3 :3 2 -3 2
6: 2 4 -2 6 -7 1 13:33 - 9 8 , 207
6 : 2 7 - 7 5 η. 19 13:33b- 2 0 3
6 : 3 0 - 7 5 η. 17 1 3 :3 4 -9 8 , 107
6 :3 6 -5 9 13:34-35 - 197, 202, 203, 204 η. 24
6 :3 7 -3 8 -6 1 1 3 :3 5 -1 1 3
7 :1 -1 0 -5 3 13:35b- 2 0 2 η. 18
7:18-21 - 2 1 6 1 4 :2 6 -1 6
7:18-23 - 2 8 η. 18, 2 9 ,2 1 7 1 6 :2 -2 2 2
7:22-23 - 2 2 1 ,2 2 8 1 6 :8 -1 2 -7 0
8 :2 -2 7 1 6 :1 6 -8 4 , 111 η. 12
8 :5 -6 -9 1 1 7 :6 -4 3
8:21 - 15 17:20-21 - 8 4 , 223 η. 25
9 :1 -3 3 1 7 :2 2 -2 4 -2 1 5 ,2 1 9 , 223 η. 25
9:7-9 - 97 η. 2 1 7 :2 2 -3 7 -2 0 0 η. 9
9 :1 8 -2 0 -9 9 17:23 - 2 2 3 η. 25
9 :1 9 -9 9 1 7 :2 4 -2 2 3
9 :2 2 - 101, 118 1 7 :2 5 -2 0 0 η. 9
9 :2 8 -3 6 -9 3 , 95 1 7 :2 6 -3 2 -2 2 3 η. 25
9 :3 1 - 9 3 17:31 - 2 0 0 η. 9
9 :3 5 - 106, 187 η. 8 17:33 - 2 0 0 η. 9
9 :43b -45- 101 1 7 :3 4 -3 7 -2 2 3 η. 25
9 :4 4 -1 0 1 , 118 1 8 :7 -2 0 4 η. 25
9 :5 9 -6 2 -1 6 1 8 :1 5 -8 9
1 0 :1 2 -1 5 -2 7 1 8 :2 7 -5 3 η. 48
1 0 :1 3 -1 5 -5 5 1 8 :2 8 -3 0 - 16
10:17-20-221 1 8 :2 9 -3 0 -2 2 3 η. 26, 226
1 0 :1 8 -3 0 1 8 :3 1 -3 4 -9 9 , 118
1 0 :2 2 -9 2 η. 20 1 9 :4 0 -4 4 -7 7
1 0 :2 5 -2 8 -6 3 η. 20, 64 1 9 :4 1 -4 4 -1 9 7 , 203
1 1 :2 0 -3 0 , 84,21 7 , 2 2 1 ,2 2 8 η. 45 1 9 :4 5 -4 6 - 111, 111 η. 8
11: 20-21 -2 2 0 1 9 :4 5 -4 8 -1 6 6
11: 20- 22-221 1 9 :4 7 -1 9 3
11: 21- 22-221 19 :4 7 -4 8- 108 η. 5
11:23 - 2 2 1 20:1 - 122
1 1 :2 1 -2 3 -3 0 2 0 :1 - 8 -1 4 η. 24, 108
ÍNDICE DE FONTES 243
20:9-16-141 2 2 :3 4 - 114 η. 23
20:9-18- 108, 166 2 2 :3 5 -3 8 -8 0 η. 1
20:9-19 - 93 , 98, 105 2 2 :3 9 -1 1 5 η. 26, 209 η. 1
2 0 :1 7 -9 5 , 125 η. 26 2 2 :3 9 -4 6 - 115
20:18 - 33 . 95 η. 28 2 2 :4 8 - 116
20:19- 108, 187, 193 2 2 :5 2 - 176
20:19-20- 166 2 2 :5 4 - 165,211 η. 3
20 :20-26-79, 122 2 2 :5 6 -6 2 - 154
20:27-39 - 72 2 2 :5 8 - 156 η. 7
20:33-35 - 226 2 2 : 5 9 - 7 η. 2
20:41-43 - 103 2 2 :6 3 - 165
20:41-44- 14 2 2 :6 3 -6 4 - 121, 153, 155, 155 η. 5
21:5-6- 108, 165, 198 2 2 :6 3 -6 5 - 154
2 1 :5 -7 -1 9 7 2 2 :6 4 - 158
21:7 -8 -1 9 8 2 2 :6 6 -1 1 8 , 121,211 η. 3
2 1 :9 -1 9 8 22:66-71 - 122, 154
21:9-11 - 198 2 2 :6 7 - 113 η. 13
21:10-11-198 η. 5 2 2 :6 7 -7 0 - 103, 103 η. 27
21:1 2 -1 9 8 2 2 :6 9 - 103, 123
21:12-19-198 22:71 - 125
21:2 0 -1 9 8 2 3 :1 -2 -1 2 2
21:20-23 - 198 2 3 :1 -5 -1 5 4
21:20-24- 198, 199 2 3 :2 - 1 6 9
21:21 - 198 2 3 :4 - 2 1 2
21 :23-24-204 23:4 e s . - 191
21:24- 198, 200 η. 9, 201,201 η. 12, 204 2 3 :6 -1 2 - 122 η. 20, 132, 132 η. 58
21:25-26- 199 η. 9 2 3 :6 -1 6 - 136 η. 68
21:25-27- 198 η. 5 23:8-11 - 175 η. 11
21:28-197.198. 199.200 η. 10,200,200 23:11 - 172 η. 3, 190
η. 10, 202 η. 15 2 3 :1 2 -1 3 2
21:29-31 - 2 0 0 23:13 - 191, 192 η. 19
2 1:38-192 23:13 e s . - 191, 192
22 :1-6-164 2 3 :1 3 -3 5 - 188 η. 11
22:1 e s . - 192 2 3 :1 7 - 133 η. 61
22:2 - 1 2 2 23:18-21 - 130
22:3-6-115 23:18 e s . - 191
22:15 - 107 η. 1, 114 η. 18 2 3 :1 9 - 133 η. 61
22:16, 18 - 223 η. 25 2 3 :2 1 -2 3 - 171
2 2 :1 5 -1 9 -114η. 21 2 3 :2 2 - 191 η. 18
22 :19-20-96 η. 34 2 3 :2 6 -4 9 -1 8 5
22:20 - 96 η. 34 23:26 e s . - 192
22:21 - 9 9 , 114 η. 24 2 3 :2 7 -1 8 5 , 190, 191
22:21-22-99, 114 η. 22 23:27 es. - 185
22:22- 170 23:27-31 - 197, 204
22:24-27 - 52, 96 η. 34 23:27 es. - 194
22:26- 118 2 3 :3 2 -1 9 0
22:27 - 95 η. 32 2 3 :3 4 - 138 η. 75, 184 η. 2, 185
22:28-30- 102 2 3 :3 4 b -1 8 7
22:30- 156 2 3 :3 5 - 184 η. 2, 186, 191, 194
244 JESUS
2 3 :3 5 a - 186, 192 1 8 :1 -2 0 9
2 3 :3 5 b - 189, 191, 192 η. 19, 194 1 8 :3 -4 9 , 116, 176, 181
2 3 :3 5 -3 9 - 187 1 8 :1 0 -1 5 6
2 3 :3 6 - 138, 189 η. 13 18:10-11 - 176
23:36 e s . - 190, 191, 194 1 8 :1 2 -1 7 6 , 181
2 3 :3 6 -3 7 - 136 η. 68 1 8 :1 2 -1 4 -1 2 0
2 3 :3 7 - 133 η. 61 18:13 - 163,209
2 3 :3 9 - 189, 194 1 8 :1 3 -2 4 -1 6 3
23:39-43- 138-139 η. 78 1 8 :1 7 -1 5 6 η. 7
2 3 :4 6 - 139 η. 79 1 8 :1 8 -1 5 6
2 3 :4 7 - 185 11. 2, 186 18:22-23 - 159 η. 18
2 3 :4 8 - 139, 186, 186 η. 5, 190, 194 1 8 :2 4 - 120, 209,211
2 3 :4 8 -4 9 - 185 η. 2 1 8 :2 6 -1 5 6
2 3 :4 9 - 186, 189 1 8 :2 8 -5 3 η. 51, 211
2 3 :4 9 a - 190, 194 18 :2 9 -3 8 - 132
2 3 :5 0 -5 6 - 119 1 8 :3 9 -1 7 8
2 4 :1 3 -3 5 - 141 19:1 - 181 η. 27
2 4 :2 0 - 188 η. 11 1 9 :1 -3 -1 7 1
24:21 - 2 0 2 1 9 :1 -1 6 -1 7 6
1 9 :2 -3 -1 7 5
João 1 9 :4 -5 - 172, 176, 177
1 :1 7 -9 2 1 9 :4 -6 -1 7 6
1 :4 0 -4 4 -2 5 , 215 η. 2 1 9 :6 -1 3 3 , 176
2 :4 -1 5 1 9 :7 -1 7 6
2 :1 3 -1 7 -1 1 1 η. 11 1 9 :1 2 -1 3 1 , 131 η. 52, 176, 177
2 :1 5 -1 1 1 η. 11 1 9 :1 2 -1 4 -1 7 6
2 :1 9 -1 1 1 ηη. 11 e 12 1 9 :1 3 -2 1 2
3:1 - 120 η. 7 1 9 :1 3 -1 4 -1 7 6 , 177
3 :1 -1 5 -1 1 9 1 9 :1 4 -1 7 6
3 :2 3 -9 1 9 :1 5 -1 3 1 η. 52, 176, 177, 195 η. 21
3 :2 4 -2 8 1 9 :1 6 -1 8 1 η. 27
4 :4 4 -1 6 1 9 :1 9 -2 2 -1 7 3
5 :1 8 -9 2 1 9 :2 0 -2 1 3
7 : 5 - 16 19:23 e s . - 1 8 4 η. 2
7 :1 5 - 1 2 1 9 :3 9 -1 1 9
7 :4 1 -4 2 -9 1 9 :3 9 -4 0 - 120 η. 7
7 :5 0 -5 2 - 120 η. 7 2 0 :1 7 - 9 2
7 :5 2 -1 1 9 , 120 η. 7
9 :6 -4 0 A to s d o s A p ó s to lo s
9 :1 4 -1 6 -4 0 1 :1 -9 -1 4 1
11:47-51 - 168 1 :6 -8 1
11:47-52- 170 1 :6 -7 -2 0 2
11:47-53 - 167 1 :6 -8 -2 0 5 η. 28
1 1 :4 8 - 122 η. 18 1 :7 -2 1 9 , 223
1 1 :4 9 -5 0 -5 0 η. 40 1 :1 3 - 8 0 η. 3
1 1 :5 2 -2 0 5 1 :1 4 - 1 6
1 2 :1 3 -1 0 8 η. 3 2:22 e s . - 192
1 2 :3 2 -2 0 5 3:13 e s . - 192
1 3 :4 0 -1 3 3 η. 61 3 :1 7 - 1 8 8 η. 11
ÍNDICE DE FONTES
3 :1 7 -2 2 -9 8 9 :5 -1 7
4 :1 -2 - 164 η. 13 1 0 :2 5 -2 6 -3 5
4 :1 -3 -1 6 6 11:23b - 170 η. 31
4 :5 -1 8 8 η. 11 1 1 :2 3 -2 4 -9 6 η. 34
4 :6 -1 6 4 , 164ηη. 13 e 17,166 1 1 :2 3 -2 5 -9 6 η. 34
4 :8 -1 8 8 η. 11 1 5 :3 -8 -1 2 4
4 :1 3 -1 2 1 5 :4 - 139 η. 78
4 :1 6 -8 8 η. 10 1 5 :7 - 16η. 39
4 :2 5 -2 8 - 123 η. 20 1 5 :2 3 -2 8 -2 2 4 η. 29
5 :1 7 -1 8 -1 6 6 1 5 :4 2 -5 4 -2 2 7
5 :1 7 -4 2 -4 9 , 164 1 6 :2 2 - 137 η. 69
5:21 - 166
5:27-28- 166, 166 η. 21 G á la ta s
5:28 - 50 η. 40 2 : 9 - 16 η. 39
5 :3 4 -4 6 4 :4 -5 4
5 :3 6 -1 6 8
7:52 - 170 η. 31 E fé s io s
7 :6 0 - 138 η. 75 1 :1 0 -2 2 2
9 :1 5 -1 9 8 η. 6
1 0 -5 1 η. 44 F ilip e n s e s
1 0 :2 -5 1 η. 44 3 : 5 - 4 6 η. 27
1 0 :2 8 -5 3 η. 51
13:25 - 2 7 η. 15 1 a o s T e s s a lo n ic e n s e s
13:27- 188 η. 11 4 :1 5 -1 7 -2 0 5
16:6-10-35 5 : 2 - 2 0 0 η. 9
1 9 :1 -7 -2 2 η. 9
2 0 :2 4 -2 7 η. 15 2 a o s T e s s a lo n ic e n s e s
2 1 :3 8 - 124 η. 25, 169 2 :1 -2 0 5
2 2 :30-23-10-49
2 3 :2 -4 - 159 η. 18 H eb rea s
2 3 :6 -4 6 η. 27. 155 9 :1 0 -3 5
23:23 - 128 1 3 :1 2 -2 1 3
23:33 - 128
23:35-211 E p ís to la d e T ia g o
26:5 - 46 η. 27 2 :1 0 - 5 1 η. 45
Rom anos 1 E p ís to la d e P e d r o
1:7b- 5 5 η. 55 2 :7 - 8 -3 3
2 :9 -1 0 -5 5 η. 55 3 :1 8 -1 0 5
3 :1 0 -5 1 η. 45 3 :1 9 -2 0 - 139 n. 78
3 :3 1 -6 5 η. 30
8:15-91 A p o c a lip s e
9 :1 3 -1 6 η. 37 1 1 :3 -1 2 -1 2 3
1 1 -2 0 8 η. 35 1 8 -8 1
12:9-13:7-73 η. 14 20-21 - 2 2 4
1 5 :8 -5 4 2 0 :1 1 -1 5 -2 2 4
2 1 :1 - 2 2 4
I a o s C o r in tio s 2 1 :1 -2 -2 2 5
6 :1 2 -5 1 η. 43 2 1 :2 -2 2 5
246 JESUS
7 0 b - 156 η. 9 S e d e r O la m R a b á
Β α ν α M e s ta fim do cap. 3 - 167 η. 24
5 8 b - 6 5 η. 3 1 ,6 6 η. 32 cap. 3 - 50 η. 40
Β α να B a tr a
1 2 a - 157 η. 13 S ifr e
S a n h e d r in Dt. 6:5 - 64 n. 25
97a/b - 224 η. 31 Dt 6:6 - 224 n. 28
9 8 a - 2 0 5 η. 26 Dt. 3 2 : 9 - 9 5 n. 30
99a - 224 η. 30 Dt. 3 2 :2 9 -8 1 n. 8
G u itin
5 6 a - 120 η. 7 M i d r a s c h T a n a im
B ek h o ro t Dt. 6:5 - 64 n. 25
4 5 a - 157 η. 13
M id r a s c h H a g a d o l
Ta l m u d de J e r u s a l é m (TJ) Ex. 2 0 : 1 4 - 6 6 n. 34
B erakh ot
P ir k e d e R a b i E lie z e r
13b- 4 6 n. 32
33 sobre 1 Samuel 28:19 - 139 n. 78
14b- 4 7 n. 33
T eru m ot
(H. S. Horo-
M e k h ilta d e R a b i I s c h m a e l
VIII 4 6 b - 170 n. 32
vitz & I. A. Rabin, eds.)
P e s s a k h im
Êxodo 12:1 (pp. 3-4) - 54 n. 53
36a (8 : 6 )- 173 n. 6
Êxodo 15:2 (p. 1 2 7 ) - 5 9 n. 4
Êxodo 15:18 (pp. 150-151)-82n . 10
Tra ta do s M e n o r e s
Êxodo 19:1 (pp. 2 0 3 -2 0 4 )-8 2 n. 13, 120
A vot d eR . N a t a n (ed. S. Schechter,
n. 8
Vienna, 1887, Versão A)
Êxodo 31:14 (p. 34!) - 40 n. 12
V (pp. 25-26) - 57 η. 2
XX (p. 72) - 82 η. 11
Ταηά d e - v e i E liy a h u
(Versão B)
(ediç30 de Viena)
XXI (p. 53) - 62 n. 18
pp. 6 - 7 - 2 2 4 η. 3 1 ,2 2 6 η. 39
G u e rim
A p ó c r if o s ε P s e u d o e p ig r á f ic o s
3 :2 -5 3 n. 51 B en S ir a c
2 7 :3 0 -2 8 :7 -5 9
Mid r a s c h im
2 8 :3 -5 -6 2
le v itic o R a b á
3 6 :1 -2 2 -2 2 8 n. 45
26:7 (Margulies ed., pp. 605-606) - 139 3 6 :6 -7 -2 2 8 n. 45
n. 78
3 6 :1 0 -2 0 5 n. 26
C â n tic o s R a b á
2:13 - 2 0 0 n. 10 T o b ia s
1 4 :4 -5 -2 2 3 n. 27
M id r a s c h S a m u e l
2 3 :4 - 139 n. 78 A A s c e n s ã o d e M o is é s
7 -4 8
M id r a s c h s o b r e o s S a l m o s 7 : 3 - 9 -3 8 η. 6
82:1 - 102 n. 23 (Buber ed.) 10:1 - 3 0 η. 23, 221
90:15 - 224 n. 30 1 0 :1 -1 0 -8 2 η. 14
118 (p. 488) - 108 n. 2
JESUS
R o lo d o s S a lm o s 1 8 :118-119-20 η. 3
(1 Qpsa) - 202 η. 17 1 9 :3 4 2 -1 6 3 η. 9
2 2 :3 -4 -2 0 2 2 0 :9 7 -9 9 -1 6 8 η. 27
2 2 :9 - 2 0 2 2 0 :1 6 9 -1 7 2 -1 2 4 η. 25
2 0 :1 9 8 - 163 η. 11
R o lo d o T e m p lo 2 0 :1 9 9 -1 6 4 ηη. 14 e 15
2 9 :7 -1 0 -2 2 3 11. 27, 225 20:200-201 - 17 η. 40, 49 η. 39
29:9-10-111-113 η. 12 20:200-203- 117 η. 1, 168 η. 25
3 8 :3 0 5 - 130 η. 51 l A p o lo g ia
3 8 :3 0 6 - 130 η. 50 5 2 :1 0 -2 0 5 η. 27
E fr é m da S íria
D id a q u ê
C o m e n tá r io a o D ia te s s e r o n (L. Leloir,
1 : 2 - 6 4 n. 26
ed., Dublin, 1963)
3 :1 - 3 -6 6 , 66 n. 36
p. 104 - 37 n. 2
9 - 205
9 :4 -2 0 6
1 0 - 206
1 0 :5 -2 0 6 J u st in o
(ed. W. Seel)
H is to r ia e P h ilip p ic a e
EusÉBro p. 2 7 6 -4 4 - 4 5 , 45 n. 25
H is tó r ia E c le s iá s tic a
III, 11, 19-20, 32 - 17 n. 41 L u c ia n o de S a m o sa ta
III, 1 2 - 150 D e M o r te P e r e g r in ¡
J u st in o , O M á r tir PAULUS
D i á l o g o c o m T rífid o Sent. 5, 22, 1 = dig. 48, 19, 38, par. 2
26:1 - 2 0 6 134 η. 64
4 7 - 5 0 n. 41
7 6 :4 - 2 0 6 n. 32 PÉRSIO
8 0 :1 -2 0 6 1 ,2 8 - 179 η. 21
1 1 3 :3 -4 -2 0 6
1 2 0 :5 -6 -2 0 6 n. 32 SUETÔNIO
1 3 9 :4 -5 -2 0 6 T ib e r iu s
1 4 0 :4 -2 0 6 n. 32 2 6 -1 2 9
ÍNDICE d e f o n t e s
XENOFONTE
M em orabilia 1.1, 1 0 -1 1 6 n. 30
Indice Remissivo
Ccsareia - 128, 129-130. 177, 211; cons D avi - 14; Casa de - 147-152; a origem
trução da capela por Pilatos em - de Jesus e - 152, 152 n. 13; elos
128; Templo de Augusto em - 128 genealógieos com - 8, 17
n. 42, 129 Davídicas, famílias, na época do Segundo
Cidadelas de Jerusalém - 212 Templo - 148, 150-152
C ircne- 137. 137 n. 72, 175 Decálogo, exegese de Jesus das Escritu
C l e m e n t e d e R o m a - 61 ras - 66
Codex Bezae - 133 n. 61, 136 n. 68 Dedo de D eu s- 2 1 7 . 22811. 45
Cólera, igualada a assassinato - 66 Destino do homem - 58
Comércio na área do Templo - 111, 111 Deus - 5 1 ; advento do Seu Reino - 80-81,
n. 8, 165-166 82-83; justiça divina - 76, 77; 0
Compaixão de Deus - 57-58 temor a Deus, comparado ao amor
Constantino - 2 1 4 a Deus - 64; “Pai” - 89-90, 91. 92
Controvérsias - 40-44 n. 19, 93
Conversos ao Judaísmo - 51 -52 Deus como “juiz” - 102
Corazim - 26, 27, 47, 54 D iabo- 3 0 , 221
Cósmico, significado, da tarefa de Jesus Dias do Messias - 220, 222, 224 n. 28,
- 142 226 n. 39, 227-228
Crença em Jesus - 142 Discípulos de Jesus; aprisionamiento da
Crianças - 89, 89 η. 16, 91 comunidade em Jerusalém - 166; da
Cristãos; comunidades na Palestina - 212; culpa dos sumos sacerdotes saduceus
congregação dos - 205-206, 207 pela entrega de Jesus - 167; dcscri-
Cristianismo - 13, 51 ,7 3 ,1 4 2 ; difusão na ções de perseguições futuras dos -
Europa - 35, 37; primordios do - 35, 198, 198 n. 6; Evangelhos Sinóticos
50, 184 n. 2, 188-189, 190-191. 195 e - 4; esperança na libertação futura
Cristologia - 3, 53 n. 48, 91, 93, 94-95, de Israel e - 202; esperança no
141, 142, 187-189 governo de Deus e - 81; observan
Crucificação - 132-133,214 cia ritual do Judaísmo e - 37, 39-40
Crucificação de Jesus- 4 n. 4,41-42, 124 Discípulos, missões dos - 28
125, 133-134, 137-138. 138 n. 78, Divino caráter do Cristo - 142
140, 166, 173, 176-177, 178-179, “Dois Caminhos”, elaboração judaica - 66
184-185, 189-192, 194, 195; crí D o m ic ia n o (imperador) - 17, 150
tica literária e descrição da - 184,
185; escárnio na - 189, 189 n. 13, E
190; fontes para descrição da - 192
193; inimigos n a - 187; oração pelos Ebionitas - 100
adversários na - 194; últimas pala “Ecce Homo” - 211 n. 4; significado
vras de Jesus na cruz - 189-190; V er -1 7 1 -1 8 1
ta m b é m R e i d o s J u d e u s Educação judaica de Jesus - 11-14
Curas, milagres de - 30,40, 41-42,42, 88 E gito- 9 , 158
η. 10, 89, 90, 91; não judeus - 52-53 E l e a z a r - 151 n. 9
CYPROS - 150 Eleição - 206, 207, 222 n. 23
Eleição divina - 91
D Eleito de Deus - 24, 187, 187 n. 8
“Eleitos” - 204, 204 n. 25, 205, 207
Da n ie l , uso da expressão “filho do E u a s - 9 3 , 97 n. 3, 123, 185; Jesus iden
homem” em - 101 tificado com - 99; João Batista visto
Dar a outra face - 74-75, 83 como - 28. 31, 32, 33, 34, 218, 228
256 JESUS
K M
Nordeste 1817
Carlos Guilherme Mota (f.008)
Cristãos Novos na Bahia
Anita Novinsky ( e009)
Vida e Valores do Povo Judeu
Unesco (p.013)
História e Historiografia do Povo Judeu
Salo W. Baron (E023)
O Mito Ariano
Léon Poliakov (E034)
O Regionalismo Gaúcho
Joseph L. Love (F.037)
Burocracia e Sociedade no Brasil Colonial
Stuart B. Schwartz (E050)
De Cristo aos Judeus da Corte
Léon Poliakov ( e 063)
De Maomé aos Marranos
Léon Poliakov (E064)
De Voltaire a Wagner
Léon Poliakov (E065)
A Europa Suicida
Léon Poliakov ( e 066)
Jesus e Israel
Jules Isaac (F.087)
A Causalidade Diabólica i
Léon Poliakov (E124)
A Causalidade Diabólica 11
Léon Poliakov (e i 25)
A República de Hemingway
Giselle Beiguelman (F.137)
Sabatai Tzvi: O Messias Místico 1, π, w
Gershom Scholem (E141)
Os Espirituais Franciscanos
Nachman I-'albel (E146)
Mito e Tragédia na Grécia Antiga
Jean-Pierre Vernant e Pierre Vidal-Naquet (e 163)
A Cultura Grega e a Origem do Pensamento Europeu
Bruno Snell (e 168)
O Anti-Semitismo na Era Vargas
Maria Luiza Tucci Carneiro (E171)
Jesus
David l-'lussser (E176)
Em Guarda Contra 0 Perigo Vermelho”
Rodrigo Sá Motta ( e 180)
O Preconceito Racial em Portugal e Brasil Colônia
Maria Luiza Thcci Carneiro (E197)
A Síntese Histórica e a Escola dos Anais
Aaron Guriêvitch ( f.201)
Nazi-tatuagens: Inscrições ou Injúrias no Corpo Humano?
Célia Maria Antonacci Ramos (E221)
1789-1799: A Revolução Francesa
Carlos Guilherme Mota (E244)
História e Literatura
Francisco Iglésias (E269)
A Descoberta da Europa pelo Islã
Bernard Lewis (E274)
Tempos de Casa-Grande
Silvia Cortez Silva (F.276)
O Mosteiro de Shaolin
Meir Shahar (E284)
Notas Republicanas
Alberto Venancio Filho (e 288)
A Orquestra do Reich
Misha Aster (E310)
Eros na Grécia Antiga
Claude Caíame (E312)
A Revolução Holandesa: Origens e Projeção Oceânica
Roberto Chacon de Albuquerque (E324)
A Mais Alemã das Artes
Pamela Potter (E327)
Este livro foi im presso na cidade de Cotia,
nas oficinas da Meta Brasil,
para a Editora Perspectiva.
PERSPECTIVA
Próximo lançamento
O Ator-Compositor
Matteo Bonfitto