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CONDUTA E RELACIONAMENTO

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INTRODUÇÃO
Existe ou não racionalidade na formação de preços dos ativos
transacionados nos mercados financeiros e de capitais?
Que tipo de agentes atuam nesses mercados e quais são suas
características?
Como suas peculiaridades afetam os preços dos ativos e, por
conseguinte, o retorno dos investimentos?
Essa é a polêmica que existe hoje quando se discute a eficiência do
mercado e a forma de decisão por parte dos investidores.
No fundo, trata-se da dicotomia entre a racionalidade e o fenômeno
comportamental e como tais referenciais interferem no estudo do mercado
financeiro.

MERCADOS FINANCEIROS E DE CAPITAIS


O mercado financeiro é uma entidade que permeia a economia e que
reúne indivíduos ou empresas que se interessam em captar ou emprestar
recursos financeiros por motivos e para fins diversos.
Isto é, há de um lado um grupo de poupadores, aqueles cuja renda lhes
permite satisfazer suas necessidades de consumo imediato e, ainda, reservar
parte para aplicar no mercado.
De outro, estão aqueles que necessitam de recursos adicionais para fazer
frente a suas necessidades imediatas, sejam elas para consumo ou para
investimentos produtivos.
Há um terceiro grupo de participantes: os intermediários, instituições
responsáveis por criar o mercado, isto é, reunir os diversos tomadores e
investidores e propiciar a realização de negócios, pelos quais auferem uma
comissão.
De acordo com Ross (2002), os mercados financeiros se dividem em
duas categorias básicas: o mercado monetário, composto pelos títulos
de dívida a curto prazo, e o mercado de capitais, no qual são
transacionados títulos de dívida de longo prazo e as ações.

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Resumindo, o mercado financeiro compreende um grupo organizado de
intermediários e instituições de apoio - o Sistema Financeiro Nacional - que
fazem convergir os interesses de tomadores e emprestadores, levando o capital
a fluir pela economia e exercendo as funções apontadas abaixo.

Funções do mercado financeiro e de capitais


Naik (2001) resume as quatro funções principais do mercado
financeiro, descritas a seguir.
A primeira seria a de permitir a decisão eficiente entre consumos atual e
futuro. Poupadores ou emprestadores são aqueles que abdicam do consumo
imediato - isto é, postergam seu consumo - em troca de rendimento futuro.
Tomadores são os indivíduos que necessitam antecipar o consumo para
satisfazer necessidades pessoais ou para investimento em atividades
produtivas. Por essa antecipação, eles se dispõem a pagar juros ou a dividir sua
renda futura com aqueles que lhes emprestam tais recursos.
O equilíbrio entre a oferta e a demanda por recursos se faz via taxa de
juros.
A segunda função, muito importante no contexto de finanças, é o
gerenciamento ou compartilhamento de risco. Isto é, empresas ou indivíduos
mantêm ativos expostos a riscos e procuram, no mercado, instrumentos que os
minimizem, seja pela diversificação de suas carteiras, seja pela transferência do
risco a outras empresas ou indivíduos que se dispõem a assumi-los em troca de
um prêmio.
O mercado financeiro cumpre, nesse caso, um importante papel no
sentido de garantir uma oferta constante e volume considerável de ativos e de
criar operações que permitam a troca de riscos entre seus participantes.
A garantia de ofertas se dá por intermédio das Bolsas de Valores, Bancos,
Corretoras e Distribuidoras; pela regulamentação de operações com títulos de
dívida e ações por parte dos órgãos reguladores instituídos pelo governo; e pela
criação de fundos mútuos e clubes de investimento.
A troca de riscos é possível por meio de operações de hedging,
transacionadas nas Bolsas de Futuros e em mesas específicas de Bancos e
Corretoras.

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Nesse último, cabe salientar a importante função do especulador, que é o
indivíduo disposto a absorver os riscos em troca de retornos mais elevados.
A terceira função do mercado financeiro é permitir a separação entre
investidores e a administração das empresas, isto é, pela liquidez do mercado
de ações, investidores podem cumprir seu papel de doadores de recursos sem
necessariamente estarem obrigados a administrar as companhias nas quais
mantêm seus investimentos.
Por outro lado, a administração se faz por meio de indivíduos nomeados
pelos investidores, sem necessariamente terem participação de capital nas
empresas que administram.
Sendo assim, cabe ao administrador investir os recursos da empresa em
projetos que venham a aumentar a riqueza dos investidores, ou seja, que tenham
VPL positivo e taxas de remuneração acima do mercado.
O interesse dos investidores é, por outro lado, manter seus recursos em
empresas que mantenham uma boa relação de retorno versus risco e, com isso,
aumentar sua riqueza.
A grande discussão em pauta, no presente, está justamente no equilíbrio
de interesses entre os investidores e a administração, relação essa inserida no
contexto denominado de governança corporativa.
Muitos têm sido hoje os exemplos de empresas e investidores que têm
sofrido fortes revezes por conta de decisões tomadas por administradores com
o fim único de garantir seus interesses pessoais e que têm ensejado a rigidez de
controles e de fiscalização por parte dos órgãos reguladores do mercado, como
ocorreu muito recentemente com a publicação da lei Sarbanes-Oxley nos EUA.
Como decorrência dessa última função, Naik (2001) afirma, também,
que o mercado financeiro é uma importante forma de avaliação do
desempenho da administração corporativa da empresa.
Por meio de seus instrumentos, o mercado é capaz, via preço, de
demonstrar a aprovação ou não das ações e dos investimentos realizados pela
administração.
Como decorrência, também pode ser utilizado pelos administradores para
"sentir" a reação do mercado a potenciais projetos que estão por realizar e,
assim, optar pelo de maior aceitação.

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O mercado e a informação
Naik (2001) aponta que a informação é uma das principais matérias-
primas do mercado financeiro, seja ela passado, presente ou
expectativas futuras.
É por intermédio dela que investidores direcionam seus investimentos;
estimam rendimentos futuros; dimensionam o tamanho de seus riscos e qual o
prêmio que exigirão para transferi-los a terceiros; determinam os papéis cujo
desempenho favorece a mitigação do risco da carteira; entre outras.
Informações, também, auxiliam na formação de cenários futuros que poderão
viabilizar novos investimentos e, portanto, captação de recursos pelos
tomadores.
O especulador as utiliza para decidir qual o risco que está disposto a
absorver e quanto será o retorno esperado, baseado em previsões formadas a
partir de dados atuais e de expectativas sobre o futuro.
Administradores, como já foi dito, utilizam informações do mercado para
avaliar projetos de investimento e para se auto-avaliarem enquanto gestores de
recursos de terceiros.
O governo não só as utiliza com o intuito de promover a melhor gestão da
coisa pública, como também são uma importante fonte geradora de dados
relevantes, que serão utilizados pelos diversos agentes da economia, incluindo
os participantes dos mercados financeiros e de capitais.
Mas qual a capacidade que tem o mercado de interpretar corretamente as
informações, se é que existem informações que podem ser consideradas como
corretas?
Como o mercado reage via preço a essas informações?
Serão essas as únicas fontes que realmente influenciam na precificação
de títulos e ações?
Ou a forma de interpretação dessas informações por parte dos indivíduos
traça um viés que influencia os preços dos ativos de forma não racional?
Essas são questões muito relevantes para o estudo da eficiência do
mercado e da forma pela qual investidores realizam suas transações.

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A EFICIÊNCIA DO MERCADO
Por eficiência entende-se a capacidade que o mercado tem de refletir
fatos novos nos preços dos ativos comercializados.
De acordo com Ross (2002), "mercados eficientes de capitais são
aqueles nos quais os preços correntes de mercado refletem as
informações disponíveis. Isso significa que os preços correntes de
mercado refletem o valor presente dos títulos, e que não há maneira
alguma de obter lucros extraordinários com o uso das informações
disponíveis [...] quando um mercado é eficiente em termos de
informação, dizemos que os preços contêm essa informação" (grifo do
autor).
Por decorrência dessa definição, conclui-se que mudanças de preços
acontecem sempre pela incorporação de novos eventos ao preço atual do ativo
ou, em outras palavras, são consequências do uso eficiente de informações
sobre processos aleatórios.
Por processos aleatórios entende-se a inexistência de padrões de
comportamento dos ativos.
Essa é mais uma importante característica da teoria dos mercados
eficientes: desempenho passado não é garantia de desempenho futuro. Como
não existem padrões, não se pode utilizar informações passadas para prever o
futuro.
Preços futuros são, como já foi dito acima, influenciados apenas por novas
informações que venham a afetar o ativo (como por exemplo, a aprovação de
um novo projeto com VPL positivo por parte de uma empresa) e somente a partir
do momento em que essa informação é divulgada.
A eficiência de mercado é categorizada em fraca, semiforte e forte. O
mercado é eficiente na forma fraca quando os preços dos ativos incorporam
informações passadas, como, por exemplo, as demonstrações financeiras do
período encerrado.
A variação dos preços dos ativos ocorre sempre que alguma nova
informação surge, modificando assim o retorno esperado até então. É o que se
chama de caminhada aleatória ou "random walk".
Na forma semiforte, os preços atuais refletem toda a informação
publicamente disponível no momento e o preço se altera imediatamente após o
anúncio de novas notícias.

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Na eficiência forte, os preços incorporam todas as informações
disponíveis, sejam elas públicas ou não.
A teoria da eficiência de mercado está fundamentada em quatro
grandes premissas. Na primeira, considera que as expectativas dos
investidores são racionais (THALER, 2001 e PEROBELLI et al., 2000),
isto é, os investidores têm acesso a todas as informações disponíveis
sobre o ativo e tomam suas decisões de forma racional.
Por exemplo, dentre diversas alternativas de investimento, o indivíduo
sempre optará por aquela que lhe garantirá o melhor rendimento futuro ou cuja
característica de rentabilidade venha a mitigar os riscos diversificáveis de sua
carteira. Isso corresponde a uma visão de um investidor racional, técnico, que
sabe fazer contas e interpretar plenamente as informações do mercado.
A segunda premissa, apontada por Germain (2001), é a de que
qualquer discrepância entre as taxas de retorno esperadas dos ativos
é rapidamente arbitrada, eliminando-se, assim, potenciais ganhos
supranormais.
Estudos realizados por pesquisadores demonstram a rapidez com que o
mercado absorve as novas notícias e como isso reflete nos preços dos ativos.
Um exemplo muito claro está apontado em Ross (2002:288), que faz
referência a estudos realizados por Szewczyk, Tsetsekos e Zantout
(1997) sobre preço das ações de empresas que anunciaram
suspensão de dividendos.
Segundo esse estudo, o mercado antecipa em até um dia tais anúncios,
de forma que o preço das ações cai.
A partir do dia seguinte do anúncio, o preço do ativo deixa de sofrer
oscilações significativas, demonstrando, assim, que o novo evento já estava
"precificado".
No dia anterior e no próprio dia do anúncio, o preço poderá oscilar
fortemente, até mesmo em função das operações de arbitragem que os
investidores estarão realizando, fato que será regularizado a curtíssimo prazo,
de forma que os preços médios e os das operações, a partir do dia seguinte ao
anúncio, estarão estabilizados em um novo patamar condizente com a nova
realidade do ativo. Resumindo, o mercado eficiente funciona de forma a evitar
que investidores obtenham uma taxa anormal de retorno.
O conhecimento de qualquer nova informação, ao ser divulgada, não
propicia vantagens adicionais à grande maioria dos investidores, pois o preço do

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ativo se ajusta imediatamente, antes mesmo que eles consigam negociá-lo com
o uso da informação.
Da mesma forma, as empresas emissoras recebem os preços justos pela
venda de seus títulos.
Terceiro, um investidor poderia inferir as informações relevantes às
perspectivas de um ativo a partir da observação do comportamento de seu preço
de mercado (GERMAIN, 2001).
Isso corresponde a dirigir um carro olhando pelo retrovisor. A oscilação do
preço do ativo no mercado pode dizer ao investidor se o emissor está projetando
maiores lucros futuros em função de projetos em implantação ou se já ocorreram
outros eventos que já se incorporaram ao preço.
É importante notar que se está tratando apenas do passado e o investidor
está ciente de que não obterá ganhos anormais com esses eventos, pois o preço
corrente do ativo já incorpora todas essas informações analisadas
retrospectivamente.
É importante deixar muito claro que essa premissa em momento algum
dispõe que o futuro pode ser previsto em função do passado. O máximo que se
pode esperar do futuro é ter os ganhos normais já embutidos no preço corrente
do ativo.
A última premissa diz que todas as alterações nos preços dos ativos que
diferem da apreciação normal feita pelos investidores devem ser decorrentes de
novas informações (GERMAIN, 2001).
Logo, eventos ou informações novas são a única causa de flutuações de
preços, principalmente levando-se em conta que o investidor é racional e só
admitirá comprar ativos cujos preços reflitam exatamente as condições de
rentabilidade já incorporadas e absorvidas pelo mercado.
No jornal Valor Econômico de 27.09.02, em uma reportagem intitulada
"Dados econômicos dos EUA surpreendem e bolsas sobem", o analista descreve
com muita clareza como o preço das ações cotadas na Bolsa de New York
flutuou ao sabor de eventos recém-divulgados: "As encomendas de bens
duráveis à indústria caíram 0,6% em agosto, mas isso foi motivo de alívio para
os investidores, que esperavam um número pior (2,5%). Além disso, o número
de americanos pedindo auxílio desemprego caiu [...](e) as vendas de novas

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residências atingiram um nível recorde[...] Tudo isso alimentou esperanças de
que o crescimento dos lucros [...] pode finalmente começar a se acelerar.
O índice Dow Jones [...] registrou o primeiro ganho em dois pregões
consecutivos [...]". Mais abaixo, uma má notícia: "A ação da General Electric -
que liderou a alta na quarta-feira - caiu ontem, depois que a companhia disse
que só vai alcançar a meta de lucro para o terceiro trimestre por causa de ganhos
com a venda de uma unidade e por causa de uma carga tributária menor".
Note que o motivo da alta não necessariamente representa uma iniciativa
própria da empresa - no caso, a redução da carga tributária - ou mesmo decisões
que venham na contramão da expansão dos negócios e que a longo prazo
possam afetar a geração de retorno aos acionistas - como a venda da unidade.
Estaria sendo racional a análise do investidor?
Estariam esses ganhos beneficiando os investidores apenas no curto
prazo?
A dicotomia entre curto e longo prazos e a preferência dos investidores
será um assunto tratado no item quatro deste artigo.
Retornando ao exemplo citado, diariamente se vê que jornais, revistas e
outras publicações estão repletos de exemplos como esse, que reforçam a teoria
de mercados eficientes.

CONTROVÉRSIAS ACERCA DA TEORIA DE MERCADOS


EFICIENTES
A questão é se realmente se pode afirmar que a flutuação de preços dos
ativos pode ser exclusivamente explicada sob o prisma racional.
Existem outros fatores que podem influenciar na decisão do investidor e
que subitamente pode fazê-lo engendrar um caminho distinto daquele ditado
pela eficiência de mercado? Seguem algumas questões levantadas por
pesquisadores na atualidade.
De acordo com Barberis (2001), o mercado é formado por pessoas,
que cometem erros de processamento das informações, que podem
ser influenciadas por outras que visam obter ganhos extraordinários a
suas custas. Elas, também, podem, simplesmente, não ter acesso
tempestivo a informações ainda que públicas.

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Além disso, pessoas interpretam informações de acordo com suas
crenças e valores, cuja atualização se dá lentamente, isto é, a velocidade de
mudança dessas crenças e valores pode ser infinitamente inferior a dos eventos
do mercado financeiro.
Por consequência, transacionam ativos por inércia, super-reagem ou sub-
reagem a notícias e podem até mesmo encontrar padrões onde não existem.
Com relação a essa última tendência, esse mesmo autor cita o "data
mining", ou seja, o uso de ferramenta estatística que busca encontrar padrões
que determinaram estratégias lucrativas no passado e que podem ser replicadas
no presente a fim de se auferir em ganhos extraordinários.
Kahneman e Smith foram os ganhadores do prêmio Nobel de 2002 por
suas pesquisas no ramo de finanças ou economia comportamentais,
cujo escopo é estudar fenômenos como os citados acima (ALTMAN,
2002).
Pedro Malan, Ministro da Fazenda do governo Fernando Henrique
Cardoso, em uma reportagem do jornal Valor Econômico de 27.09.02,
criticou os analistas de Wall Street pelo que chamou de "preocupações
excessivas do mercado com o resultado da eleição".
Citando que o mercado exibe um "comportamento de manada",
enfatizou: "Os mercados são dirigidos por uma combinação de
ganância contagiosa [...]; de medo [...]; e de ignorância".
Em segundo lugar, autores como Andrew Lo e Craig Mackinlay (2001)
realizaram pesquisas que refutaram a teoria da caminhada aleatória.
Por meio de evidências empíricas, constataram que os preços
presentes de ações têm correlação parcial com o desempenho
passado, o que tornaria possível a previsibilidade, principalmente a
curto prazo.
Consequentemente, abre-se a possibilidade de investidores terem ganhos
anormais "por meio da administração de investimentos ativa e disciplinada[...] os
lucros provenientes de uma administração ativa de investimentos não precisam
ser decorrentes da ineficiência do mercado, mas podem ser simplesmente a
justa recompensa por investidas bem sucedidas em tecnologia financeira" (grifo
ao autor).
Outro ponto, levantado por Musto (2001), refere-se à real confiabilidade
nos números apresentados nas demonstrações financeiras das
empresas, pois essas tendem a ajustar seus balanços de final de

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exercício visando a outros interesses distintos dos acionistas, como
crédito e remuneração dos administradores.
Em outras palavras, nem sempre as informações divulgadas por meio das
demonstrações financeiras anuais refletem a real situação econômica da
empresa e seus projetos futuros, pois necessidades internas, muitas vezes
descoladas dos interesses dos acionistas - principalmente dos minoritários -
podem interferir em sua elaboração. Informações incorretas gerarão
expectativas falsas e, portanto, precificação errônea dos ativos.
Ainda com relação a essa questão, Ball (1991) cita a decisão de
retenção de lucros, que pode se chocar com as expectativas anteriores
do mercado quanto à lucratividade do papel (nesse caso em termos de
fluxo de caixa para o investidor).
Os defensores do mercado eficiente poderão dizer que, nesse caso, os
preços se formaram com base nas informações passadas ou publicamente
disponíveis, ainda que "contaminadas", o que estaria de acordo com as formas
fraca e possivelmente semiforte de eficiência.
Mas o mesmo não seria verdadeiro para a forma forte. Além disto, estar-
se-ia entrando em uma esfera não racional de argumentação, e, por
consequência, inserindo na análise um comportamento egoísta por parte
daqueles que deveriam garantir informações verdadeiras ao mercado.
A quarta questão refere-se à dicotomia entre curto e longo prazos,
explorada por Marsh (2001).
A característica do investidor é ser imediatista - quer receber dividendos
no menor prazo possível - o que só é possível se a administração trabalhar
visando a lucros de curto prazo e, portanto, inibindo ou até mesmo abortando
projetos com prazos de maturação mais longos. Isso reforça a falta de
racionalidade com que o investidor realiza suas aplicações, pois visando ao curto
prazo ele está, na verdade, comprometendo seus lucros futuros a longo prazo.
No sentido figurado, ele estaria "dando um tiro em seu próprio pé".
A quinta e última controvérsia corresponde ao questionamento levantado
por Dechow et al. (2001) quanto à independência dos analistas de mercado.
Esses profissionais são uma importante fonte de informação e de
formação de opiniões para o mercado, e por isso deveriam ser o mais
independentes e imparciais possível.

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Todavia, essa independência e imparcialidade são seriamente
comprometidas pelas estratégias de suas instituições, pelas funções que esses
profissionais efetivamente exercem e por interesses próprios.
O analista se torna, na realidade, um importante fator para alavancar
negócios em suas instituições, nas quais, muitas vezes, coexistem serviços de
subscrição e de corretagem, ao mesmo tempo.
Além disso, são portadores de informações confidenciais, nem sempre à
disposição do grande público, e que por isso adquirem valor.
Além do mais, analistas, também, são indivíduos, que interpretam
negócios e investimentos baseados em análises técnicas e em seu conjunto
muito particular de crenças e valores, dentre os quais existe o receio de se tornar
um profissional marcado como excessivamente pessimista ou otimista.
No artigo do jornal Valor Econômico de 27.09.02, Mohamed El-Erian,
administrador de fundos de investimento, tece o seguinte comentário a
respeito dos analistas de Wall Street com relação às suas
interpretações pessimistas quanto ao risco Brasil: "Muitos analistas
estão cometendo o mesmo erro que cometeram na Argentina. Mas, no
caso da Argentina, esse erro os levou a ser otimistas demais[...]. No
caso do Brasil, os analistas estão cometendo o mesmo erro pelo outro
lado".
Isto é, muitos analistas avaliaram a crise Argentina como um fenômeno
apenas conjuntural, com pequena duração e consequências menores para o
mercado financeiro, o que se revelou mais tarde um grande erro de avaliação e
levou muitos clientes a perdas irreparáveis.
O medo de cometer o mesmo tipo de erro de avaliação os levou a
exacerbar os efeitos da crise brasileira, considerando-a como estrutural e
recomendando a seus clientes transferir seus recursos a países ou a títulos com
menor risco - o que o Sr. El-Erian considerava ser outro grande erro.
Na Gazeta Mercantil de 08.10.02 consta que "milhares de analistas de
Wall Street estão com a cabeça a prêmio. Citigroup, Crédit Suisse, First Boston
e Merril Lynch parecem resignados a manter seus analistas em empresas
separadas por conta de acusações de parlamentares, autoridades e investidores
[...] de que os bancos de investimento lucraram com as estimativas irreais de
seus analistas".

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Essa última citação demonstra como a falta de independência desses
analistas pode afetar seriamente a credibilidade dos agentes do mercado, dado
que suas recomendações buscaram trazer lucros a certas unidades de negócios
das instituições para as quais trabalhavam, em detrimento dos clientes a quem
deveriam aconselhar.
Essas controvérsias mostram, portanto, o outro lado da moeda, isto é, que
o mercado não é tão racional e bem informado como demonstram os estudos
acerca da teoria da eficiência de mercado.
É, na verdade, formado por indivíduos que buscam por resultados de
forma muito peculiar, baseados em realidades construídas em função de sua
experiência de vida, da possibilidade de acesso a informações e de interesses
pessoais.
As últimas décadas do século XX foram marcadas por transformações
profundas em todo o mundo, estimuladas em grande medida pela
democratização dos regimes políticos, pela abertura de fronteiras comerciais e
por um desenvolvimento tecnológico sem precedentes.
A magnitude destas mudanças tem impactos econômicos, sociais e
culturais em escala mundial, cujos efeitos ainda não podem ser apreciados nem
antecipados com exatidão.
O fenômeno de globalização das economias e dos mercados arrasta uma
tendência para a convergência de gostos, de normas, de comportamentos, de
expectativas, de padrões de qualidade e de desempenho, constituindo uma
pressão suplementar para todas as organizações e empresas,
independentemente do nível em que operam – local, regional, nacional ou
mundial.
O aumento significativo dos fluxos de comércio internacional, facilitados
por tecnologias inovadoras de processamento de informação e de comunicação,
tornou a dimensão ética da atividade empresarial uma das principais
preocupações de gestores, políticos, pesquisadores e da sociedade em geral
(Robertson, Crittenden, Brady, & Hoffman, 2002).
A adoção de uma conduta baseada em princípios morais que respeitem o
ambiente e os valores da comunidade envolvente é uma exigência incontornável
das sociedades contemporâneas que os responsáveis organizacionais não
podem ignorar.

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A tolerância perante os abusos de poder ou a exploração inadequada de
recursos é cada vez menor e a concorrência entre empresas passa também pelo
alcance social e ambiental dos seus resultados e da sua atividade (Luce, Barber,
& Hillman, 2001).
Por outro lado, à medida que as interações de gestores e executivos de
diferentes países são mais frequentes, a capacidade de compreender as
diferenças de comportamento e as suas motivações morais é mais necessária
para garantir o êxito dessas interações (Priem & Shaffer, 2001).
A ética, enquanto disciplina teórica estuda os códigos de valores que
determinam o comportamento e influenciam a tomada de decisões num
determinado contexto.
Estes códigos têm por base um conjunto tendencialmente consensual de
princípios morais, que determinam o que deve ou não deve ser feito em função
do que é considerado certo ou errado por determinada comunidade.
No ambiente organizacional e na gestão de empresas em particular, a
ética estuda os códigos morais que orientam as decisões empresariais, na
medida em que estas afetem as pessoas e a comunidade envolvente, partindo
de um conjunto socialmente aceito de direitos e obrigações individuais e
coletivos.
As empresas consideradas éticas são geralmente aquelas cuja conduta é
socialmente valorizada e cujas políticas se reconhecem sintonizadas com a
moral vigente, subordinando as suas atividades e estratégias a uma reflexão
ética prévia e agindo posteriormente de forma socialmente responsável.
Muitos pesquisadores têm-se dedicado a estudar a conduta ética dos
gestores e os fatores que a influenciam no contexto empresarial, destacando-se,
neste domínio, três níveis de explicação do comportamento ético: individual,
organizacional e cultural.
Um número elevado de estudos tem procurado explicar a postura ética
dos executivos a partir de algumas das suas características individuais como o
gênero (Deshpande, 1997; Elm, Kennedy, & Lawton, 2001; Luthar, DiBattista, &
Gautschi, 1997; McDaniel, Schoeps, & Lincourt, 2001), a idade (Ruegger & King,
1992; Vitell, Lumpkin, & Rawwas, 1991), o grau de instrução (Deshpande, 1997;
Elm et al., 2001), as orientações filosóficas (Cherry & Frederich, 2000; Deconinck
& Lewis, 1997; Singhapakdi, Vitell, & Franke, 1999) ou os valores morais (Agle,

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Mitchell, & Sonnenfeld, 1999; Carlson, Kacmar, & Wadsworth, 2002; Glover,
Bumpus, Logan, & Ciesla, 1997; Ray & Pauli, 2002). Em nível organizacional os
determinantes mais estudados incluem o clima ético da organização
(Deshpande, 1996; Frietzsche, 2000; Peterson, 2002; Vardy, 2001), o papel dos
códigos de ética (Farrell, Cobin, & Farrell, 2002; Hoivik, 2002; Schwartz, 2001;
Wotruba, Chonko, & Loe, 2001) e a estrutura do capital (Brower & Shrader, 2000;
Bucar & Hisrich, 2001; Hornsby, Kuratko, Naffziger, LaFollette, & Hodgetts, 1994;
Johnson & Greeing, 1999).
Constituindo um interesse mais recente da comunidade científica, a
investigação sobre a influência dos fatores de ordem cultural e social nos
comportamentos éticos e nos sistemas de valores dos gestores tem produzido
igualmente estudos empíricos de crescente profundidade e relevância (Jackson
& Artola, 1997; Priem & Shaffer, 2001; Robertson et al., 2002; Tsui & Windsor,
2001).
Para além do recurso a essas três ordens de fatores (individual,
organizacional e cultural), considerados em geral estáveis, para explicar os
comportamentos moralmente qualificáveis no contexto empresarial, alguns
autores defendem ainda o caráter situacional das decisões éticas.
Segundo esses autores, a decisão de um mesmo indivíduo pode ser
diferente, consoante o contexto específico que envolva essa decisão
(Hoffman, Couch, & Lamont, 1998; Robertson et al., 2002), variando,
por exemplo, de acordo com a posição que o indivíduo ocupa na
empresa ou com a antecipação subjetiva que ele faça da reação
pública à sua decisão.
Por não exigirem um conhecimento técnico nem se regerem por leis de
oferta e de procura, as decisões que envolvem um julgamento moral são as
únicas que, em ambiente empresarial, estão sempre sujeitas a uma avaliação
externa que pode condenar definitivamente ou amplificar significativamente o
sucesso de qualquer iniciativa.
O desempenho social da organização será, em última análise, a face
visível do comportamento ético dos seus dirigentes, refletindo a boa ou a má
prática empresarial que se refletirá, por seu lado, nos resultados financeiros e na
própria sustentabilidade da atividade da empresa (Ruf, Muralidhar, Brown,
Janney, & Paul, 2001).

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Compreender os mecanismos que influenciam e explicam os
comportamentos éticos é, portanto, um requisito indispensável para sobreviver
num mercado global cada vez mais atento e mais exigente em relação às
práticas empresariais.
Pretende-se neste artigo apresentar um modelo teórico explicativo do
desempenho social das organizações a partir da análise dos seus determinantes
culturais, organizacionais e individuais.
Com base na revisão da literatura fundamental, propõe-se um modelo
integrado, onde se relacionam os valores culturais, o desenvolvimento moral, o
clima ético organizacional e o desempenho social, com o objetivo de destacar o
papel central dos fatores não estratégicos nas opções de ação social das
organizações.
Com esta contribuição, pretende-se alargar o campo teórico da discussão
atual sobre as motivações éticas da atuação empresarial, centrando a análise no
papel decisivo que a visão subjetiva do dirigente organizacional pode ter na
definição de estratégias socialmente responsáveis.

FATORES CULTURAIS
O comportamento social, os valores morais, a conduta individual e a
reação perante o desconhecido são manifestações humanas que dependem em
larga medida do contexto sociocultural, onde o indivíduo se insere e que este
mantém como referência.
O conceito de cultura está associado a este contexto sociocultural. Citado
por Ogburn, Tyler definiu cultura como um espaço complexo, onde estão
incluídos os conhecimentos, as crenças, as artes, os valores morais, as leis e os
costumes, assim como qualquer outra capacidade ou hábito adquirido pelo
indivíduo, enquanto membro de uma sociedade (Ogburn, 1964).
Swidler sugere a noção de cultura como um conjunto de ferramentas
(concretizadas em símbolos, histórias, rituais e visões do mundo) que
os indivíduos podem utilizar em diferentes combinações para lidar com
diferentes tipos de problema (Swidler, 1986).
Num sentido mais lato, a cultura é normalmente encarada como um
sistema de normas e de valores socialmente transmitido (Lynn, 1990).

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Hofstede, por seu lado, defende a ideia de que cada indivíduo
transporta consigo uma programação mental constituída por
componentes da cultura nacional onde está integrado, que foram
transmitidas pela família, depois pela escola e mais tarde reforçadas
pelas organizações onde trabalha.
A cultura será esta programação coletiva que distingue um grupo do outro
e que permite manter a ordem social ao tornar os comportamentos individuais
previsíveis (Hofstede, 1980).
No seu amplamente citado e explorado estudo publicado em 1980,
Hofstede conceitualizou a cultura através da sua decomposição em quatro
dimensões (distância hierárquica, aversão à incerteza, individualismo e
masculinidade), apresentando um mapa cultural do mundo, como resultado de
um vasto estudo empírico, que viria a servir de referência para a generalidade
dos estudos posteriores sobre aspectos culturais dos indivíduos, das
organizações e dos países.
As dimensões propostas por Hofstede reúnem uma significativa
aceitação entre os cientistas sociais e a sua validade tem sido
repetidamente demonstrada em inúmeros trabalhos (Robertson et al.,
2002).
Neste mapa cultural do mundo é possível identificar grupos homogêneos
de países, em cujo âmbito os perfis culturais são idênticos entre si em aspectos
pertinentes para a análise das questões éticas.
Apesar das dimensões de Hofstede serem habitualmente aplicadas ao
nível nacional, alguns autores sugerem que elas também são identificáveis ao
nível individual (Wagner, 1995; Triandis, Bontempo, Villareal, Asai, & Lucca,
1988), considerando-as bons indicadores do comportamento e critério válido
para distinguir pessoas.
No contexto organizacional, o indivíduo não está imune aos efeitos e às
influências da cultura social. Um dos fatores que pode influenciar a forma como
uma pessoa reage perante diferentes dilemas éticos é precisamente a sua
perspectiva cultural (Robertson et al., 2002).
Nos anos mais recentes, o interesse da comunidade científica pelo estudo
do fenômeno ético a partir de uma abordagem cultural tem aumentado; no
entanto, o número de trabalhos realizados sobre o tema ainda é reduzido

16
(Jackson & Artola, 1997) e os resultados globais ainda são inconclusivos (Priem
& Shaffer, 2001).
Numa abordagem da ligação entre as referências culturais e a ética
profissional, Tsui e Windsor estudaram a relação entre a teoria cultural de
Hofstede e o desenvolvimento moral de auditores chineses e australianos, tendo
encontrado suporte empírico para essa relação (Tsui & Windsor, 2001).
Outros autores têm desenvolvido estudos empíricos que corroboraram a
existência de uma relação entre as dimensões culturais e a avaliação moral dos
indivíduos perante dilemas éticos (Husted, Dozier, McMahon, & Kattan, 1996;
Jackson & Artola, 1997; Priem & Shaffer, 2001; Vitell, Nwachukwu, & Barnes,
1993), mas a medida exacta desta relação ainda não é muito clara, dado
existirem igualmente autores que não encontraram evidência empírica da sua
existência (Lysonski & Gaidis, 1991; Whipple & Swords, 1992).
O relativismo cultural sugerido pelos estudos que estabelecem uma
relação entre cultura e ética contraria a visão deontológica que defende um
quadro estável de valores morais idênticos para todas as sociedades em todo o
mundo.
Segundo Moon e Woolliams, a dimensão ética da atividade empresarial
tem especificidades culturais difíceis de evitar (Moon & Woolliams,
2000) e os decisores devem estar preparados para compreender e
aproveitar essas particularidades inerentes à condição social da vida
humana.

DESENVOLVIMENTO MORAL COGNITIVO


As teorias atuais sobre o desenvolvimento moral dos indivíduos têm o
seu fundamento nos trabalhos exploratórios de Jean Piaget sobre os
processos de avaliação moral desenvolvidos pelas crianças. Piaget
acrescentou um determinante cognitivo ao conceito de moralidade que,
até então, era explicado com recurso exclusivo a determinantes
ambientais (Piaget, 1932).
Em 1969, o psicólogo Lawrence Kohlberg, baseado nas experiências e
nos escritos de Piaget, formulou a teoria do desenvolvimento moral
cognitivo (cognitive moral development), estudando especialmente a dimensão
cognitiva do julgamento moral e a forma como este influencia o comportamento

17
humano. Esta teoria tornou-se a base da pesquisa científica no campo do
pensamento moral.
Kohlberg explorou os fatores que influenciam a percepção moral dos
indivíduos desde a infância até à idade adulta e os processos de tomada de
decisão que lhe estão associados.
O modelo de Kohlberg baseia-se no conceito de justiça como
fundamento da moralidade e sugere que um indivíduo progride através de um
conjunto de fases sequenciais, à medida que desenvolve as suas percepções
morais (Kohlberg, 1969).
Este processo cognitivo compreende três níveis de desenvolvimento
moral – pré-convencional, convencional e pós-convencional –; cada um se
subdivide em duas fases, também elas sequenciais.
A passagem de um nível para outro pressupõe uma progressão no
desenvolvimento moral do indivíduo e uma mudança na forma de pensar que,
em geral, não admite retrocessos. Em cada nível existem duas fases,
representando a segunda uma forma mais avançada e organizada da primeira.
Na Figura 1 é apresentado um resumo dos níveis de desenvolvimento
moral.

18
No primeiro nível de percepção moral – pré-convencional – os indivíduos
tomam as decisões com base nas consequências ou recompensas das suas
ações, associando os conceitos de 'certo' e de 'errado' aos efeitos do seu
comportamento e cedendo o seu julgamento ao exercício autoritário de poder.
No nível convencional, a opinião dos grupos sociais envolventes passa
a ter importância para a tomada de decisões que, na generalidade, visam
satisfazer e obter a aprovação dos outros, verificando-se uma aderência a
comportamentos, normas e valores aceitos pela sociedade em geral.
Finalmente, à medida que o indivíduo atinge a maturidade moral, evolui
para o nível pós-convencional, verificando-se um esforço por desenvolver
padrões morais pessoais regulados por uma consciência crítica do mundo e
independentes das normas estabelecidas por via da autoridade de qualquer
outro agente social (Kohlberg, 1969, 1984).
Apesar de alguns autores criticarem a rigidez da formulação teórica do
modelo de Kohlberg (Elm & Weber, 1994; Gilligan, 1977; Trevino, 1992),
inúmeros estudos têm demonstrado ao longo dos anos a sua validade empírica

19
(Blasi, 1980; Thoma, 1985; Weber & Wasieleski, 2001), constituindo o referencial
teórico mais divulgado entre os cientistas que estudam o desenvolvimento moral
e os aspectos cognitivos do processo psicológico subjacente.
No seguimento dos trabalhos de Kohlberg, James Rest (1979) sugeriu
algumas variações ao modelo originalmente proposto, flexibilizando a
sua articulação teórica e facilitando a operacionalização da pesquisa
empírica sobre desenvolvimento moral.
O modelo de Rest baseia-se no conceito de justiça social, atribuindo
ao conceito de justiça, apresentado por Kohlberg como um valor
individual, um sentido mais alargado, associado à cooperação social
(Rest, 1979, 1986).
No modelo de Rest, um indivíduo pode manifestar diferentes níveis de
moralidade, consoante o contexto e as características do dilema ético,
contrariando o sentido unidirecional da evolução moral proposto por Kohlberg
que defende que cada pessoa se encontra, em cada momento, num determinado
estádio de desenvolvimento moral, que se manifesta da mesma forma na
resposta a qualquer circunstância que envolva um conflito de valores.
O quadro de valores morais de um indivíduo influencia e condiciona
fortemente o seu comportamento.
A visão moral do mundo de um dirigente é referencial importante para
compreender algumas das suas decisões e das suas escolhas entre opções
alternativas.
Desta forma, assumindo a ligação entre valores morais e comportamento,
pode estabelecer-se uma relação entre o nível de desenvolvimento moral de um
dirigente e a orientação social das práticas organizacionais que ele define e
influencia.
A gestão ética e o desempenho social das organizações pode
efetivamente constituir, ainda que parcialmente, um reflexo da maturidade moral
dos seus dirigentes.

20
CLIMA ÉTICO ORGANIZACIONAL
O clima organizacional é geralmente identificado como a atmosfera
psicológica, social e humana que caracteriza a forma como as pessoas se
relacionam entre si dentro da organização.
A dimensão ética do clima organizacional foi originalmente
conceitualizada por Victor e Cullen (1988).
Estes autores definiram o clima ético organizacional como um conceito
multifacetado composto pelas percepções partilhadas pelos membros de uma
organização sobre quais são os comportamentos eticamente corretos e qual a
forma como devem ser abordados os assuntos moralmente qualificáveis (Victor
& Cullen, 1988).
Desta forma, o clima ético é afetado pelos diversos sistemas normativos
da organização, tais como as políticas, os procedimentos, os esquemas
remuneratórios e os sistemas de controlo (Barnett & Vaicys, 2000).
Wyld e Jones sugerem que a percepção de cada indivíduo sobre o
clima ético da organização a que pertence desempenha um papel
determinante nos processos de decisão individual (Wyld & Jones,
1997).
Wimbush argumenta, por seu lado, que, se os supervisores
conseguem influenciar o clima organizacional, os gestores poderão
influenciar o comportamento ético dos funcionários através do efeito
das suas ações no clima ético de grupos de trabalho onde a atitude
ética é inadequada (Wimbush & Markham, 1997).
Trevino defende que as pessoas procuram frequentemente fora de si
mesmas uma orientação para tomar decisões perante dilemas éticos,
concluindo que as organizações poderão moderar a relação entre a
avaliação cognitiva que os indivíduos fazem da realidade e o seu
comportamento, através do incentivo do comportamento ético, do
desenvolvimento de normas organizacionais e da responsabilização
das hierarquias (Trevino, 1986).
De fato, diversos estudos sugerem a existência de uma relação entre o
clima ético e o comportamento individual (Deshpande, 1996; Frietzsche, 2000;
Peterson, 2002), confirmando a pertinência do conceito e justificando-o como
variável organizacional que ajuda a explicar as opções de natureza social que
caracterizam a prática empresarial.

21
DESEMPENHO SOCIAL DAS EMPRESAS
A presença de preocupações sociais nas práticas empresariais pode ser
encontrada em inúmeros exemplos e referências ao longo da história da
humanidade.
No entanto, apenas no século XX foram publicados os primeiros trabalhos
formais sobre responsabilidade social.
Em especial, o livro Social Responsibilities of the Businessman, de
Howard Bowen (1953), representa o marco decisivo que dá início à era moderna
da literatura sobre Responsabilidade Social das Empresas (RSE).
No seu livro, Bowen considera que as empresas, devido à sua
dimensão e proliferação crescentes, haviam adquirido uma influência
alargada na estruturação e desenvolvimento das sociedades.
Segundo o autor, este aumento de poder deveria ser acompanhado
por um aumento da responsabilidade, constituindo, portanto a RSE a
obrigação de os empresários adotarem políticas e práticas adequadas
aos objetivos e valores da sociedade (Bowen, 1953).
Desde então, o conceito tem sido explorado e debatido por estudiosos,
acadêmicos, empresários, políticos e cidadãos em todo o mundo, existindo já um
corpo significativo de contribuições teóricas que têm promovido o
desenvolvimento do conceito e que facilitam a sua compreensão.
No entanto, apesar do debate e do reconhecimento da sua importância
nas sociedades contemporâneas, a RSE não é um tema consensual, dadas as
múltiplas definições e interpretações que tem suscitado e a complexidade das
suas motivações e implicações.
Depois de Bowen, vários autores acrescentaram dimensões,
especificaram conteúdos e delimitaram fronteiras no estudo da RSE.
Submetido a abordagens segundo critérios ideológicos, morais ou
econômicos, o termo RSE adquiriu sentidos diversos que, na maioria dos casos,
são complementares entre si.
No contexto empresarial, a designação responsabilidade social visa
destacar o papel central que as empresas representam, enquanto organizações
humanas, na manutenção e desenvolvimento do bem-estar social.

22
O conjunto de responsabilidades sociais de uma empresa engloba as
ações e políticas de alcance alargado que visam contribuir para o equilíbrio social
da comunidade envolvente, situando-se, no entanto, além das exigências
específicas da finalidade que justifica a existência da própria organização.
Segundo Ackerman, a responsabilidade social implica um
acompanhamento permanente e uma avaliação sistemática das
condições ambientais, centrando a análise nas necessidades dos
diferentes stakeholders ligados à organização (Ackerman, 1975).
As políticas socialmente responsáveis e o respeito ativo por valores
morais e sociais constituem os indicadores teóricos do desempenho social da
empresa (DSE).
Carroll defende que o DSE compreende três componentes:
(1) o nível de responsabilidade social,
(2) o comprometimento com causas sociais e
(3) a filosofia subjacente à resposta das empresas perante problemas ou
desafios de natureza social (Carroll, 1979).
Wartick e Cochran concretizam a definição de DSE na observação de
três dimensões da atividade empresarial: os princípios (valores que
orientam as políticas de responsabilidade social),
os processos (mecanismos utilizados para atuar socialmente) e
as políticas sociais (Wartick & Cochran, 1985).
Donna Wood acrescenta aos princípios, aos processos e às políticas
promovidas pela empresa, os resultados observáveis e os impactos sociais da
sua ação (Wood, 1991).
O DSE está relacionado mais com os meios do que com os fins da
atividade empresarial.
O resultado financeiro, o volume de vendas, a quota de mercado ou a
valorização do capital são indicadores que medem a concretização dos fins a
que se destina a atividade da empresa.
O DSE espelha a forma como a empresa, no desenrolar da sua atividade,
utiliza os recursos disponíveis e promove o seu desenvolvimento, transfere
meios para apoiar causas sociais, protege e respeita o ambiente e a comunidade
envolvente (Miles, 1987).
Destaca-se, por exemplo, no âmbito do DSE, o tratamento justo e
responsável dos trabalhadores, as práticas transparentes, a limitação dos

23
desperdícios e da produção de matérias poluentes ou os donativos e apoio a
obras e iniciativas comunitárias de índole social, cultural ou desportiva.

MODELO INTEGRADO DO PROCESSO ÉTICO


A ética, enquanto valor subjetivo da ação humana está presente num
número significativo de decisões cotidianas da atividade empresarial (Weber &
Wasieleski, 2001), tendo-se tornado um dos elementos centrais da avaliação do
desempenho das empresas e dos seus responsáveis.
Apesar da teoria exposta ser aplicável à generalidade das organizações,
a proposta ganha especial relevância no contexto das empresas com fins
lucrativos, sendo em seguida analisada para esse tipo particular de organização.
Com base na revisão de literatura efetuada, propõe-se então um modelo
teórico que integra os fatores individuais subjetivos – culturais e morais – que
influenciam as práticas empresariais que afetam o seu desempenho social.
Este modelo é centrado no papel do dirigente enquanto agente
privilegiado de decisão, destacando o efeito dos valores culturais no seu
desenvolvimento moral e no clima ético da organização que, por sua vez,
influenciam a natureza do desempenho social empresarial.
Apresenta-se em seguida o modelo provisoriamente designado
de modelo integrado do processo ético, procurando assim sintetizar a
dimensão da ética individual no processo de decisão que afeta
as responsabilidades sociais das empresas:

24
O modelo proposto visa reunir as principais variáveis que caracterizam o
processo de decisão ética no contexto organizacional, integrando determinantes
culturais, organizacionais e individuais.
Trata-se de um modelo que explica parcialmente o desempenho social
com recurso a variáveis contextuais e à percepção dos dirigentes
organizacionais.
No modelo, as relações entre Cultura, Desenvolvimento Moral, Clima
Ético e Desempenho Social representam o eixo central, acrescentando ainda
a influência secundária dos fatores demográficos e do estilo de gestão.
Apesar do seu sentido aparentemente determinista, não se pretende com
este modelo explicar todo o processo de decisão ética nem estabelecer uma
relação de causalidade única entre as variáveis.
Pretende-se sim evidenciar o grau de correlação que existe entre as
variáveis em causa, destacando a importância dos determinantes não
estratégicos nas práticas de responsabilidade social das organizações.
Os determinantes culturais e demográficos são as únicas variáveis
independentes do modelo, subjacente ao qual existe um conjunto articulado de
hipóteses de pesquisa.
Estas hipóteses são desenvolvidas em seguida, pretendendo-se, através
delas, explicitar com maior detalhe os fundamentos teóricos que justificam as
relações propostas.

25
HIPÓTESES DO MODELO
O modelo apresentado compreende um conjunto articulado de hipóteses
subjacentes que, partindo do adequado enquadramento teórico, representam a
principal contribuição intelectual da reflexão aqui proposta.
Em seguida são apresentadas essas hipóteses, distinguindo uma
hipótese central e a sua decomposição em diversas hipóteses básicas
representantes das diversas relações entre as variáveis que constituem o
modelo.
Hipótese Teórica: O contexto sociocultural e o perfil moral dos dirigentes
organizacionais têm um impacto determinante no comportamento ético interno e
externo da organização.

Hipótese Os dirigentes organizacionais que partilham


Básica referências socioculturais semelhantes apresentam um
1a (HB1a): índice de desenvolvimento moral idêntico entre si.

Hipótese O contexto sociocultural exerce uma influência


Básica significativa no clima ético da organização.
1b (HB1b):

Hipótese O contexto sociocultural exerce uma influência


Básica significativa no estilo de gestão e de liderança praticado na
1c (HB1c): organização.

Hipótese O desenvolvimento moral dos dirigentes


Básica organizacionais exerce uma influência positiva significativa
2a (HB2a): no clima ético da organização.

Hipótese O desenvolvimento moral dos dirigentes


Básica organizacionais exerce uma influência significativa no estilo
2b (HB2b): de gestão e de liderança praticado na organização.

26
Hipótese O desenvolvimento moral dos dirigentes
Básica organizacionais exerce uma influência positiva significativa
2c (HB2c): no desempenho social da organização.

Hipótese O clima ético organizacional exerce uma influência


Básica positiva significativa no desempenho social da organização.
3 (HB3):

Hipótese O estilo de gestão e de liderança praticado na


Básica organização exerce uma influência significativa no clima
4 (HB4): ético organizacional.

Hipótese O desenvolvimento moral dos dirigentes


Básica organizacionais é influenciado significativamente pelas
5 (HB5): suas características pessoais.

O DSE representa um fator de desenvolvimento organizacional, na


medida em que as empresas com níveis elevados de DSE mantêm, à partida,
relações saudáveis e de confiança com os diversos grupos de interesse com os
quais se relacionam e dos quais dependem, permitindo assim reduzir os níveis
de risco financeiro (Orlitzky & Benjamin, 2001).
A investigação sobre o DSE tem produzido poucos trabalhos que estudem
o papel dos dirigentes organizacionais como determinantes do desempenho
social (Thomas & Simerly, 1995).
A Hipótese Teórica deste estudo representa o problema central que se
pretende esclarecer e tem subjacente a ideia de que o comportamento ético da
organização é fortemente influenciado pela filosofia pessoal e pelos processos
cognitivos de decisão dos seus dirigentes, apoiada nas ideias de Miles (1987) e
Ackerman (1975).
A Hipótese HB1a representa uma das relações centrais propostas pelo
modelo teórico e destaca a forte relação entre o contexto sociocultural e o índice
de desenvolvimento moral dos dirigentes, baseando a sua formulação em
estudos como os de Tsui e Windsor (2001), Husted et al. (1996) e Vitell (1993).
As Hipóteses HB1b e HB1c estendem o impacto do contexto cultural ao
clima ético da organização e ao estilo de direção que a caracteriza.

27
As Hipóteses HB2a, HB2b e HB2c referem-se à teoria de
desenvolvimento moral cognitivo de Kohlberg como indicador-chave do índice
moral dos dirigentes empresariais.
Esta teoria representa a base teórica mais utilizada no estudo empírico da
influência dos processos cognitivos de decisão no comportamento ético (Trevino,
1992; Tsui & Windsor, 2001).
A Hipótese HB3 destaca a influência do clima ético organizacional na
extensão e profundidade das políticas de natureza social conduzidas pela
empresa.
A formulação desta hipótese baseia-se na base alargada de estudos
empíricos que relacionam o clima ético com o comportamento ético (Barnett &
Vaicys, 2000; Peterson, 2002).
A Hipótese HB4 introduz o estilo de gestão como variável influenciada
pelo contexto cultural e pelo quadro ético de referência dos dirigentes, afetando,
por sua vez, o clima ético organizacional.
O estilo de gestão é ainda um determinante pouco estudado no âmbito
das políticas e estratégias empresariais; no entanto, existem já alguns estudos
que o destacam como uma variável central na explicação de decisões
empresariais em geral (Almeida, 2001) e de opções éticas em particular
(Pennino, 2002).
Finalmente, na sequência dos resultados apresentados por um número
significativo de estudos empíricos (Deshpande, 1997; Elm & Nichols, 1993; Elm
et al., 2001; Ruegger & King, 1992; Thoma, 1985), a Hipótese HB5 estabelece
uma relação causal entre as características pessoais do decisor como a idade,
o gênero, o grau de instrução ou a função desempenhada, e o seu índice de
desenvolvimento moral.
Retomando a introdução a este texto, foram reunidos de forma
simplificada, os argumentos que municiam o embate entre essas duas diferentes
visões acerca do funcionamento do mercado de capitais.
Como pano de fundo, tem-se o choque entre diferentes correntes
metodológicas, cada uma delas com seus pressupostos conceituais que lhe são
característicos.

28
De um lado, o pensamento racional, que torna técnica e padronizada a
ação dos agentes de mercado, que coloca a análise de dados acima das
limitações ou idiossincrasias humanas.
Estudos estatísticos demonstram como o comportamento dos preços
segue padrões aleatórios, mas baseados em premissas recorrentes:
informações disponíveis, democraticamente, ao mercado geram análises
padronizadas e expectativas comuns a todos e desencadeiam movimentos de
preços presentes que antecipam os resultados estimados futuros.
As imprecisões nos modelos decorrem, exclusivamente, do fato de os
mercados não estarem todos no mesmo nível de eficiência: alguns trabalharão
dentro de uma eficiência fraca, outros na semiforte e na forte.
Por consequência, pesquisadores podem embutir o comportamento do
mercado em fórmulas matemáticas e estatísticas, nas quais um pequeno número
de variáveis pode ser suficiente para explicar os resultados obtidos.
De outro lado, há correntes de pensamento que se caracterizam por
pressupor que a realidade não pode ser tão racionalmente determinada, pois o
nível de complexidade das relações internas aos mercados não permite que os
investidores analisem todo o conjunto de variáveis existentes para tornar
exclusivamente racional sua decisão de investir.
Tais variáveis são ora objetivas - como informações disponíveis, taxas de
juros, e outras-ora subjetivas, como as características de personalidade do
investidor, efeito manada, etc.
Thomaz Wood (1995) discute a relação entre a teoria do caos e
finanças da seguinte forma: “Estudos recentes têm levado em conta as
relações não lineares entre as variáveis financeiras e os complexos
mecanismos de retroalimentação do sistema”.
Segundo estes estudos, as séries temporais de valores de ações têm
componentes tanto deterministas - gerados por leis caóticas vindas da
infraestrutura do mercado - quanto componentes randômicos, ligados à
constante chegada de informações aos agentes.
Citando a pesquisa feita por Larrain (1991) a respeito da evolução do
preço das ações, Wood escreve que "a questão maior para os teóricos
e matemáticos do Caos é determinar se há um modelo particular pelo
qual os sistemas se dirigem à desordem e à turbulência [...] O trabalho
sugere que, na prática, coexistem estruturas não lineares - capazes de

29
bifurcações periódicas e comportamento violento - com estruturas
macroeconômicas bem comportadas".
Todavia, se o conjunto desses fatores, em última instância, forma uma
corrente que demonstra a eficiência de mercado é uma questão ainda a ser
analisada por pesquisadores.
Entretanto, serão esses pesquisadores totalmente independentes, livres
de ideias preconcebidas e desejosos de aceitar realidades distintas de suas
crenças pessoais?
Será, também, a realidade um objeto de estudo estático, que não se
modifica nem mesmo pela simples presença do pesquisador?

RELAÇÃO ENTRE A EMPRESA E A COMUNIDADE LOCAL


As empresas estão interessadas em aproximar-se da comunidade local
(ou do público externo) para ter acesso aos seus recursos físicos e humanos
disponíveis.
Por isto, Reis (2007) estabelece que a aproximação da sociedade
deve-se ao fato de as instituições se apropriarem dos seus recursos
que geralmente não lhe pertencem, e que são de alguma maneira,
patrimônio gratuito e coletivo da humanidade. Portanto, o autor afirma
que as organizações contraem “uma dívida social”, assim, elas têm o
compromisso de restituir a sociedade por meio de investimentos e
planejamento de ações coletivas na área social e ambiental.
Em relação ao grau de comprometimento das organizações com a
comunidade, Tachizawa (2009) apresenta os estágios de
responsabilidade social corporativo. No primeiro, descreve que as
organizações não assumem responsabilidades frente aos problemas
da sociedade e não aplicam nenhuma ação relativa ao exercício da
cidadania.
No segundo, as empresas gerenciam os danos causados pelo seu
funcionamento e apresentam algumas ações isoladas no sentido de diminuir
esses impactos.
No terceiro, a atuação organizacional começa com a sistematização e a
avaliação dos impactos causados pela sua existência. Assim, buscam lidar com
assuntos de interesse local e envolver os seus membros no desenvolvimento
social.

30
No quarto estágio, o processo de avaliação de impactos já está
começando a se sistematizar. Deste modo, a corporação começa a tomar frente
das questões de interesse da comunidade de várias maneiras, por exemplo, o
comprometimento ético para com a sociedade local.
No estágio mais avançado, o processo de avaliação dos impactos
causados já está estruturado, procurando antecipar as questões públicas. Neste
nível de atuação, as empresas lideram questões de interesse comunitário e
estimulam a participação dos envolvidos.
Finalmente, as organizações recebem retroalimentação para avaliar e
propor melhorias no exercício da cidadania e no enfrentamento dos problemas
de ordem pública. Portanto, estes estágios resultaram na capacidade de avaliar
o grau de envolvimento das instituições no que diz respeito às ações
organizacionais de responsabilidade social.
No caso das empresas socialmente responsáveis, elas podem avaliar os
indicadores negativos gerados por suas atividades, e a partir daí, realizarem a
estruturação de projetos que promovam o desenvolvimento socioeconômico,
bem como soluções para os problemas sociais existentes na região.
Por este motivo, Quazi e O’Brien (2000) elaboraram o modelo
bidimensional que mostra as visões das organizações no que se refere
à prática da responsabilidade social, conforme demostrado na Figura
1 abaixo.

31
Estreita da responsabilidade social em que os negócios são percebidos
de modo clássico, ou seja, em termos de fornecimento de bens e serviços e
tendo como principal objetivo a maximização do lucro.
A ênfase nesta visão é a geração de lucros em curto prazo. O lado
esquerdo considera a RSC em um contexto mais abrangente, indo além das
exigências legais e atingindo expectativas mais amplas da sociedade, como em
áreas de proteção ambiental, desenvolvimento da comunidade, preservação dos
recursos e ações filantrópicas.
O eixo vertical do modelo representa dois extremos na percepção das
consequências das ações sociais, variando desde uma preocupação com o seu
custo até o foco nos seus benefícios.
O lado vertical negativo do eixo está relacionado ao custo do compromisso
social, em que as despesas envolvidas nos exercícios da RS em curto prazo são
levadas em consideração.
A ênfase nesta ótica é nos custos sociais em um período curto de tempo.
Já em relação ao lado positivo do eixo vertical, o foco encontra-se nos benefícios
em longo prazo advindos das ações e da percepção das vantagens potenciais,
ou seja, as organizações percebem que os gastos com as ações sociais
retornam como benefícios intangíveis (QUAZI e O’BRIEN, 2000).

32
Portanto, as corporações que aplicam a visão moderna do modelo estão
mais aptas a perceberem que os investimentos em responsabilidade social.

A EVOLUÇÃO RECENTE DO SETOR BANCÁRIO NO BRASIL


Uma das principais medidas adotadas para promover a abertura
financeira foi a Resolução do Conselho Monetário Nacional no 1.832, de 31 de
maio de 1991, que regulamentou os investimentos estrangeiros em títulos e
valores mobiliários nas companhias abertas brasileiras, aumentando
consideravelmente o ingresso de recursos externos.
O governo manteve, entretanto, a proibição de depósitos em moeda
estrangeira no sistema bancário doméstico, ao contrário do que ocorreu em
grande parte dos países da América Latina (Rocha, 2002).
Nesse período observa-se um aumento significativo na oferta de crédito,
o que foi resultado, principalmente:
a) da queda da receita dos bancos nas operações com títulos, após a forte
redução da dívida pública em mercado promovida, em março de 1990, pelo
Plano Collor;
b) do fim das aplicações em overnight após o Plano Collor II, de janeiro
de 1991;
c) do cenário econômico mais favorável, possibilitado pela volta dos
recursos externos em 1992 e pela retomada do crescimento econômico; e
d) da necessidade de os bancos se anteciparem frente à perspectiva de
queda da inflação (Carvalho, 2003).
A partir de 1994, com a implementação do Plano Real, são eliminadas as
receitas inflacionárias oriundas do float5 de recursos remunerados a taxas reais
negativas ou inferiores às de aplicação.
Estas receitas, que atingiram 4% do PIB no período 1990-93, foram
reduzidas a 2%, em 1994, e a 0,1%, em 1995 (Tabela 1.4). Em termos do valor
da produção bancária imputada, as receitas inflacionárias, que representavam
87,3% em 1993, reduziram-se para 49,5% em 1994, e 1,6% em 1995 (Corazza,
2001).

33
Os bancos buscaram compensar essa perda de receitas com um aumento
na oferta de crédito, o que acentuou a expansão que já estava em andamento
no início da década.
Com a redução drástica das taxas de inflação e o expressivo crescimento
da economia em 1994 e 1995, os depósitos bancários se tornaram atrativos
novamente, com um crescimento de 165% nos primeiros seis meses do Plano
Real.
Esses depósitos constituíram o funding das operações de crédito,
incentivando o direcionamento dos bancos ao crédito aos agentes privados,
fossem eles firmas ou consumidores, e financiando o primeiro miniciclo
expansivo do Plano Real (Maia, 2003).
Um dos principais atrativos para o aumento da oferta de crédito pelos
bancos foram as elevadas taxas de juros e os respectivos spreads
proporcionados.
No período de 1997 a 2002, a taxa de juros nominal do crédito pessoal
atingiu o pico de 133% ao ano, em fevereiro de 1998, e o piso de 68%, em abril
de 2000 (Jacob, 2003).
O crescimento da demanda por crédito, por sua vez, foi possibilitado pelo
forte crescimento econômico, pela melhoria nos salários reais e pela diminuição
nos juros nominais.
Esse movimento fez com que o governo impusesse, a partir de outubro
de 2004, restrições sobre a oferta de crédito, por meio do aumento nos
requerimentos de reserva sobre os depósitos à vista e a prazo e da criação de
um depósito compulsório sobre os empréstimos concedidos pelos bancos.
O recolhimento compulsório sobre depósitos à vista passou de 48% para
100%, enquanto o recolhimento sobre os depósitos de poupança passou de 10%
para 30%.
Foi instituído, ainda, um recolhimento de 30% sobre o saldo dos depósitos
a prazo. Neste contexto, os efeitos da crise mexicana atingiram o país, fazendo
com que o governo promovesse um significativo aumento nas taxas de juros
domésticas, em março de 1995.
Como consequência, verifica-se uma reversão no ritmo de crescimento
econômico do país. O aumento da taxa de juros provocou um aumento da taxa
de inadimplência e uma desaceleração no crescimento do crédito.

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Os empréstimos ao setor privado aumentaram quase 60% no primeiro ano
do Plano Real.

A EVOLUÇÃO RECENTE DO SETOR BANCÁRIO NO BRASIL


Os bancos, entretanto, conseguiram manter as margens de lucro em 1995
e 1996, devido ao direcionamento para operações com títulos públicos, à
manutenção de juros e spreads elevados e ao aumento da captação externa e
da securitização de dívidas.
Por outro lado, foram reduzidas as despesas administrativas e com
pessoal, devido à informatização e ao e-banking (Rocha, 2002).
A manutenção das margens de lucro também foi possibilitada pelo
aumento das receitas sobre serviços bancários, resultado do aumento dos
custos operacionais embutidos na captação de recursos sem juros ou com juros
abaixo da média do mercado.
Com inflação alta, o custo destes recursos é compensado pelos altos
rendimentos nominais obtidos; entretanto, com inflação baixa, os bancos
procuram repassar esses custos para os clientes.
Alguns bancos varejistas de porte médio conseguiram elevar de 10% para
35% a parcela de sua receita bruta originada de cobrança de tarifas.
Também contribuíram para esse desempenho os ganhos em operações
com moeda estrangeira, que refletiram o posicionamento acertado da maioria
dos bancos de que a nova moeda seria implementada acompanhada de juros
altos e valorização real do câmbio.
Essa posição gerou lucros muito acima do esperado. Além disso, o
aumento das receitas com crédito também representou um papel relevante
apesar do grande esforço das autoridades para impedi-lo.
Dessa forma, antes da estabilização de preços, a instabilidade
inflacionária permitia ao setor bancário obter altos lucros da operação com títulos
da dívida pública.
Depois da estabilização de preços, a instabilidade do balanço de
pagamentos permitiu ao setor bancário continuar obtendo seus lucros
exatamente da mesma forma.

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Essa peculiaridade do setor bancário brasileiro permitiu que as
instituições mantivessem, durante toda a década, sua rentabilidade patrimonial
histórica.
A rentabilidade média dos bancos brasileiros aumentou de 14,9%, em
1993, para 16,8%, em 1994, mantendo-se no patamar dos 13% até 1998 .
Em 1999, a mesma chegou a 23%, em virtude dos ganhos com a
desvalorização cambial (Corazza, 2001).
Portanto, o Plano Real resultou, inicialmente, em um breve período de
maior crescimento econômico, em relação aos anos 80, em ampliação da
demanda agregada, em remonetização e em aumento das operações de crédito.
No entanto, esse processo foi rapidamente abortado, em 1995, devido às
altas taxas de juros praticadas após a crise mexicana, que levariam a uma forte
deterioração da qualidade dos empréstimos, devido às políticas econômicas
restritivas necessárias para fazer frente a crises de balanço de pagamentos. Isso
porque, nesses primeiros anos do Plano Real, devido à abertura comercial
excessiva e à apreciação real do câmbio, o país ficou dependente de fluxos de
capital para sustentar o balanço de pagamentos.
Assim, durante a crise do México, em 1995, essa forma de financiamento
no mercado de capitais já sofre uma primeira ruptura significativa.
O sistema bancário, portanto, enfrentava alguns problemas, relacionados
à eliminação do rendimento que era antes obtido com a inflação, às elevadas
reservas compulsórias exigidas, ao aumento da inadimplência e ao
“empoçamento da liquidez”.

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