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net/publication/234518133
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Marcelo Soares
Southern University of Science and Technology - SUSTech
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All content following this page was uploaded by Marcelo Soares on 02 June 2014.
Os produtos de consumo que não observam os requisitos de segurança em seu design podem
causar acidentes e ser excluídos do mercado pela legislação vigente. As perdas financeiras e a
publicidade negativa daí decorrentes podem produzir efeitos catastróficos para a empresa. A
ergonomia tem muito a contribuir no design de produtos. No entanto, a relação entre a
ergonomia e o design deixa a desejar. Neste artigo são discutidos alguns aspectos referentes a
dificuldade de relação entre o design e a ergonomia, ao design de produtos seguros e a
responsabilidade criminal no design e fabricação de produtos de consumo.
PALAVRAS-CHAVE
Ergonomia, design, produto, desenvolvimento de produto, interação, interface
1. INTRODUÇÃO
Todos os dias nós interagimos com milhares de produtos. Com o usuários nós esperamos que esta
interação, não importando o quanto seja complexa, ocorra de maneira segura, confiável e
eficiente (KARWOWSKI, SOARES e STANTON, 2011). Infelizmente, este não é sempre o caso pois o
bom design não é fácil. O desenvolvimento de produto é um negócio de risco porque envolve, com
um alto custo, muitas áreas da companhia. Para ter uma chance razoável de sucesso o
desenvolvimento de produto deve atender completamente as necessidades dos usuários. O
processo de design pode reduzir o risco e/ou custos da falha do produto (KREIFELDT, 1984).
Os produtos devem ser desenvolvidos e projetados para atender as necessidades dos usuários.
Supostamente, um produto deve ser projetado para tornar a vida do usuário mais fácil e ajudá-lo
na realização de ações que não poderiam ser executadas por eles sem a ajuda de um dispositivo
mecânico ou material. Em teoria, este apresenta-se como uma das principais razões para os
produtos de consumo existam (SOARES, 1998; CORREIA et al. 2011).
A aplicação dos princípios ergonômicos no design, contribui para a redução de acidentes, riscos de
mal funcionamento do produto, melhoria da usabilidade e redução de custos no ciclo de vida do
produto. KARWOWSKI, SOARES e STANTON (2011) afirmam que existem evidências substanciais e
convicentes que a aplicação da ergonomia aos produtos de consumo melhora algumas
características do produto tais como a facilidade do uso, habilidade de aprendizagem, eficiência,
conforto, segurança, adaptabilidade e satisfação do usuário.
A ergonomia é uma tecnologia apoiada por dados científicos, o design de produto é um processo
de criar novos ou aperfeiçoar produtos para o uso de pessoas e sucesso comercial da empresa. A
ergonomia tem uma base claramente fundamentada nas ciências, enquanto que o design de
produto visa um processo de criação ou melhoria de produtos adicionando a eles valores
estéticos, de manufaturabilidade e de marketing. Os fabricantes, por outro lado e na sua maioria,
estão interessados principalmente no desempenho do produto no mercado em termos de
quantidade dos bens vendidos e os lucros obtidos.
KARWOWSKI (2006) advoga que a ergonomia é uma disciplina orientada ao design. Entretanto,
como discutido por KARWOWSKI (2005), os ergonomistas não projetam sistemas; ao invés disto
projetam a interação entre os artefatos e os seres humanos.
A ergonomia pode ser entendida como uma disciplina que se foca na natureza das interações do ser
humano com os artefatos, a partir de uma perspectiva unificada da ciência, engenharia, design, tecnologia
e gerenciamento da compatibilidade humano-sistema, incluindo uma variedade de produtos, processos e
ambientes naturais e artificiais (Karwowski, 2005). A ergonomia é uma disciplina que promove uma
abordagem holística e centrada no ser humano para o design de sistemas de trabalho que considera
relevante os fatores físicos, cognitivos, sociais, organizacionais e ambientais. (GRANDJEAN, 1997; WILSON e
CORLLET, 2005; SANDERS e MCCORMICK, 1993; SALVENDY, 2006; VICENTE, 2004; STANTON et al. 2005).
O desafio da ergonomia é compreender a interação entre o ser humano e tudo que o rodeia. Com base
neste conhecimento, a ergonomia busca otimizar o bem estar do humano e um melhor desempenho de
todo o sistema. A National Academy of Engineering dos Estados Unidos (NAE, 2004), afirma que, no futuro,
o desenvolvimento na engenharia irá se “expandir através de conexões próximas entre a engenharia e a
experiência humana, incluindo novos produtos customizados para as dimensões e capacidades físicas dos
usuários considerando o design ergonômico da engenharia de produtos.
Se no passado a ergonomia era direcionada pela tecnologia (uma abordagem reativa do design), no futuro
a ergonomia deveria direcionar a tecnologia (uma abordagem proativa do design). Neste contexto, a partir
de NRC (2001), a tecnologia deve ser definida como um sistema composto de pessoas e organizações,
conhecimento, processos e equipamentos que irão criar e operar artefatos tecnológicos. A tecnologia é um
produto e um processo envolvido tanto na ciência, quanto na engenharia. Desta forma, a ciência permite o
entendimento do “porquê” e o “como” da natureza (através do processo científico da inquirição científica,
que gera o conhecimento sobre o mundo natural).
Este artigo objetiva analisar a contribuição da ergonomia para o design de produto e para a
segurança de produtos de consumo.
2. Ergonomia e design do produto: vencendo as distâncias.
De acordo com GRANDJEAN (1984) e WOOD (1990), durante muito tempo os ergonomistas têm
criticado os designers por produzir produtos inseguros, por falhar na ênfase aos aspectos de
usabilidade e falta de consideração científica; por outro lado, os designers têm afirmado que os
dados ergonômicos têm sido apresentados num formato ou linguagem inadequada para eles e
que isto representa uma obstrução para a criatividade do design. Finalmente, os fabricantes, de
maneira geral, preferem considerar os fatos realisticamente ao invés do que eles considerariam
como uma abordagem idealística dos ergonomistas e designers.
Alguns autores têm apontado dificuldades nas relações entre os designers e os ergonomistas,
como por exemplo: ABENI, 1988; BROWN & WIER, 1982; GRANDJEAN, 1984; LINGAARD, 1989;
PHEASANT, 2005; RYAN, 1987b; SMITH, 1987; WARD, 1990, 1992; WOOD, 1990; NAEL, 2011.
De acordo com MEYER (1989) e WARD (1990), as principais áreas de conflito entre os designers de
produto e os ergonomistas surgem da ênfase que cada grupo dá a metodologia empregada para
atingir os seus objetivos. Espera-se sempre que os designers sejam inovadores, busquem sempre
por uma solução diferente para os problemas, que trabalhem de uma forma criativa e intuitiva,
testando diversas soluções e avaliando-as posteriormente. Eles normalmente abordam os
problemas usando o que se pode chamar de “pensamento lateral”, que significa o uso do
pensamento criativo para solucionar problemas evitando a abordagem excessivamente lógica e
limitada. Embora o ergonomista use algumas vezes técnicas criativas, eles ou elas tendem a
analisar o problema e desenvolver fórmulas ou experimentos que conduzam a respostas ou
melhores soluções.
Após entrevistar quatro designers, MOSSEL & CHRISTIAANS (1991) afirmam que os aspectos
estéticos são tão importante para os designers que, muitas vezes, eles não dão tanta importância
aos aspectos construtivos, gerenciais e ergonômicos. O estudo realizado pelos autores conduz as
seguintes conclusões:
Embora este estudo tenha incluído apenas o trabalho de quatro designers, os resultados devem
ser considerados como fonte de reflexão para o papel da ergonomia nas atividades de design.
SOARES (1998) realizou uma pesquisa com onze designers de cadeiras de rodas na Inglaterra,
Escócia e País de Gales com o objetivo de entender como os designers conduziam a sua atividade
projetual, que tipo de dados eles necessitavam dos usuários e quais demandas os usuários
deficientes possuem com relação aos equipamentos para garantir ou melhorar a sua mobilidade.
Como resultado, concluiu que:
A quase totalidade dos designers que participou do estudo conduzia todas as fases de
desenvolvimento do produto baseado nas suas próprias suposições sobre as expectativas e
necessidades dos usuários e não incluíam as necessidades dos usuários, daqueles que
prescrevem o produto e dos assistentes dos usuários no processo de design;
Embora os participantes da pesquisa considerassem a ergonomia importante, o seu uso
efetivo no processo de desenvolvimento do produto ainda estava para acontecer;
Observou-se que algumas companhias falhavam na condução de todas as fases de
especificação de design, tais quais: identificar as necessidades dos usuários, avaliar produtos
competitivos, estabelecer o perfil dos usuários, definir os requisitos de desempenho do
produto e determinar as limitações de design.
As decisões dos gerentes, pessoal técnico e designers não são baseadas em consulta aos
usuários, mas apenas na experiência destes.
PHEASANT (2995) argumenta que os designers precisam ter em mente que a ergonomia não é
apenas a aplicação de dados e sim desenvolver uma abordagem totalmente centrada no usuário.
O design centrado no usuário é um método para desenvolver produtos baseados nas necessidades
e interesses dos usuários, com ênfase em tornar o produto útil e compreensível.
SOARES (op.cit.) desenvolveu um método de design de produtos centrado nos usuários no qual
pudesse traduzir as necessidades de um usuário portador de deficiência em requisitos que os
designers pudessem utilizar no desenvolvimento de produtos. Embora o método tenha sido
originalmente desenvolvimento para pessoas portadoras de deficiência, poderá ser utilizado para
qualquer produto de consumo produzido em larga escala.
NORMAN (2002) define dois princípios fundamentais do design para tornar os produtos
compreensíveis e utilizáveis: a) fornecer um bom modelo conceitual e b) tornar as coisas visíveis.
Analisando o primeiro, é importante observar que um bom conceito mental permite-nos predizer
os efeitos de nossas ações. Um modelo mental pode ser definido como uma representação
conceitual do sistema e/ou tarefa formado pelo usuário, baseado em experiências prévias assim
como em observações atuais, que fornece um poder preditivo e exploratório ao usuário no
entendimento do sistema e guia a sua interação com este sistema (CHRISTIAANS, 1989; NORMAN,
1983 e WILSON & RUTHERFORD, 1989).
GELDERBLOM & CHRISTIAANS (1992) chamam a atenção para o fato que ao operar produtos de
consumo não familiares, o usuário pode apresentar grandes dificuldades em encontrar a maneira
apropriada de lidar com o produto e que estas dificuldades podem ser de natureza cognitiva. O
designer espera que o modelo mental do usuário seja idêntico ao seu próprio modelo conceitual.
Os problemas surgem quando os designers não interagem diretamente com os usuários e
assumem que esta premissa é sempre verdadeira. Os problemas são também mais sérios quando
os produtos são usados por usuários deficientes, principalmente aqueles que sofrem de
impedimentos cognitivos.
Os designers não são usuários típicos. Ao contrário, eles se tornam especialistas em usar os
produtos que eles próprios tenham projetado e não acreditam que ninguém mais possa ter
problemas em manusear tais produtos. THIMBLEBY (1991) afirmou, de uma maneira sarcástica,
que os designers tendem a projetar coisas para eles mesmos e acreditam que não existem
problemas com o design do produto que projetaram e que possíveis faltas são de inteira
responsabilidade dos usuários por não pensarem adequadamente.
EASON (1984) afirma que a usabilidade é determinada pelo usuário específico, pela tarefa
específica a desempenhar e os movimentos específicos no qual a interação ocorre. Desta forma, a
usabilidade é uma variável que muda com o tempo.
De acordo com a ISO, usabilidade é o grau em que um usuário pode alcançar metas específicas em
um ambiente particular - efetivamente, eficientemente, confortavelmente e de modo aceitável.
Os princípios mencionados acima tornam os usuários o foco do design. Uma abordagem centrada
no usuário necessita focar nos usuários em todos os estágios do desenvolvimento do produto.
GLEN & LORD (1996) realizaram um estudo com 113 empresas envolvidas no desenvolvimento de
novos produtos na indústria médica do Reino Unido e obtiveram como resultado, quase unânime
a necessidade de: [i] focar no consumidor e usuário final em todos os estágios de
desenvolvimento; [ii] obter um feedback consistente e aplicável e [iii] realizar uma pesquisa de
mercado precisa que antecipe os requisitos dos futuros consumidores
A única forma de realizar um processo de design centrado no usuário é usar a ergonomia desde os
estágios iniciais do processo de desenvolvimento do produto. Esta abordagem é apoiada por
diversos autores (CUSHMAN & ROSENBERG, 1991; HARRIS, 1990; KREIFELDT, 1984, 1992; WARD,
1990). O uso da prototipagem rápida e testes de usabilidade têm capacitado a ergonomia a
fornecer dados no início do desenvolvimento do produto e trabalhar interativamente, tornando os
problemas de design fáceis de identificar e as recomendações mais fáceis de serem atingidas. O
termo “usabilidade” aqui esta relacionada a obtenção de requisitos dos usuários antes do início do
processo de design e nos estágios iniciais do design, assim como, na avaliação de protótipos e
produtos que já foram construídos (MITAL & ANAND, 1992).
UNGARI (1995) afirma que existem três novas formas da abordagem do design de produtos na
América: CAID (computer-aided industrial design), análise da tarefa e testes de usabilidade.
Um ponto interessante a ser observado é que os dois últimos têm sido parte do domínio da
ergonomia por muitos anos. Estas ferramentas representam um novo potencial para os designers
e ergonomistas para criarem conjuntamente produtos que tenham os usuários como parte
fundamental do processo, ao invés de tê-los apenas como receptores passivos. UNGARI (op.cit.)
conclui que o design industrial pode agora se tornar um processo centrado no usuário e baseado
na interatividade do usuário ao invés de apenas se adaptar ao usuário.
A abordagem ergonômica dá-se através de uma aplicação sistemática das informações relevantes
sobre as capacidades humanas, limitações, características, comportamentos e motivação para o
design de equipamentos e sistemas e procedimentos de uso das pessoas e o ambiente no qual
elas as usam.
Isto envolve investigações científicas apropriadas para descobrir informações relevantes sobre os
seres humanos e suas respostas ao uso de produtos, máquinas, objetos, sistemas e ambientes.Tais
informações servem como base para a geração de recomendações de design e para a prevenção
dos prováveis efeitos das diversas alternativas projetuais sobre os usuários e trabalhadores.
Assim, de acordo com CHAPANIS (1996), a ergonomia estuda, identifica e aplica informações sobre
o comportamento, habilidades, limitações e outras características humanas para o design de
ferramentas, máquinas, sistemas, tarefas, trabalho e ambientes para o uso humano produtivo,
seguro, confortável e eficiente.
É importante explicitar que a ergonomia não é apenas aplicar “checklists” e recomendações, nem
usar um único indivíduo como modelo para o design de objetos, máquinas, produtos, sistemas,
ambientes e procedimentos, muito menos o uso do senso comum; mas sim, a aplicação de
métodos apropriados utilizando uma abordagem científica de caráter multidisciplinar a fim
analisar o conteúdo do trabalho. Tudo isso, sob a forma de análise e investigação sistemática
sobre (i) a tarefa atribuída ao trabalhador no seu posto de trabalho e a maneira como é
organizada e executada; (ii) os indivíduos que ocupam e interagem com o posto de trabalho em
questão e (iii) os aspectos físicos da interface humano-tarefa- máquina, incluindo o
dimensionamento e as características físicas das estações de trabalho.
Acidentes no manuseio de produtos de consumo são bastante freqüentes. As razões para isto são
muitas e variadas, e incluem o mau uso, falhas na fabricação e mesmo o mau design. Os produtos
de consumo que não observam os requisitos de segurança podem causar ferimentos ou mesmo a
morte dos usuários e podem ser excluídos do mercado pela legislação preventiva ou repressiva. As
perdas financeiras e a publicidade negativa daí decorrentes podem produzir efeitos catastróficos
para a empresa.
Neste artigo, entende-se produto de consumo como aqueles bens e serviços usados pelo público
em geral (CUSHMAN & ROSENBERG, 1991; HEDGE, 2001; HUNTER, 1992; KREIFELDT, 1984;
WILLIANS e NOYES (2011). De acordo com CUSHMAN & ROSENBERG (op.cit.) e WILSON (1983) os
produtos de consumo podem ser classificados em duas categorias: a) aqueles usados para a
satisfação das necessidades dos usuários em geral e b) aqueles produzidos para grupos
específicos, tais como as crianças e os portadores de deficiências. Os produtos de consumo são
normalmente usados em casa ou em torno da casa, em ambientes residenciais ou sociais ao invés
de ambientes de trabalho. Os usuários deste tipo de produto normalmente não necessitam
treinamento, supervisionamento, nem habilidades específicas; tais produtos podem ainda ter um
perfil educacional, cultural ou econômico abrangente.
LAUGHERY (1993) afirma que os produtos de consumo são freqüentemente projetados partindo
da premissa que os usuários possuem algum conhecimento ou informação necessários para
manusear tais produtos. Na verdade, esses usuários, ou parte deles, podem não ter a informação
requerida para um uso otimizado do produto. Esta doutrina assume que os consumidores irão
usar a sua inteligência e experiência para se protegerem contra possíveis riscos no manuseio do
produto.
De acordo com CHRISTENSEN (1987), CUSHMAN & ROSENBERG (1991), LAUGHERY e WOGALTER
(2011) e STADLER-ESTRIN & ESTRIN (1987):
O perigo potencial associado ao produto pode ser classificado como óbvio e latente (CUSHMAN &
ROSENBERG, 1991 e RYAN, 1985). Os primeiros compreendem os produtos que têm, pelo seu
design particular e aparência física, um nível de perigo potencial facilmente perceptível aos
usuários comuns, p. ex. armas, fogos de artifício, etc. Os segundos são os produtos que contêm
um nível de perigo potencial, que normalmente não é adequadamente identificado pelos usuários
comuns, p. ex. escadas, cortadores de grama, panelas de pressão, processadores de alimento, etc.
Orientar o design do produto objetivando a segurança não garante que todos os perigos
potenciais, óbvios ou latentes, sejam eliminados. Levando-se em conta que alguns produtos são
basicamente perigosos, um produto que é completamente seguro para todos os usuários
potenciais irá provavelmente ter um preço proibitivo. Para se criar um produto que possa ser
comercializável, deve-se alcançar um equilíbrio entre os custos de fabricação, a qualidade e a
segurança. Embora não seja possível eliminar todos os perigos potenciais, a realização de testes e
o fornecimento de advertências adequadas podem garantir que produtos potencialmente
perigosos possam ser usados em segurança dentro do seu contexto de uso pretendido (THOMAS
et al., 1990 e LAUGHERY e WOGALTER, 2011).
De acordo com WILSON & KIRK (1980) um produto pode apresentar defeitos de duas formas:
Os produtos que não foram produzidos como planejado e que incluem alguma falha de
fabricação ou que foram inspecionados incorretamente.
Os produtos que foram produzidos tal como planejado, mas que são perigosos ao público ou
aos seus usuários. De fato, não é suficiente apenas projetar produtos que sejam seguros
quando usados da forma pretendida, o uso impróprio também deve ser considerado.
Durante o estágio de vida média os consumidores podem esperar, para a maior parte dos
produtos, um período relativamente longo de uso seguro e confiável.
As falhas neste estágio podem ser atribuídas as mudanças imprevistas no uso do produto. No
estágio mais avançado da vida do produto, quando ele começa a se desgastar, o aumento no
número de falhas é provavelmente bem maior. Neste ponto as falhas são normalmente
decorrentes do esforço acumulado nos materiais, abrasão, fatores ambientais, etc. Alguns testes
físicos podem ser usados para avaliar materiais e componentes na tentativa de prevenção de
possíveis falhas no produto. O uso da metodologia de análise ergonômica apresenta-se como uma
ferramenta bastante eficaz na prevenção de falhas nos estágios iniciais do processo de design do
produto e na aplicação de testes de usabilidade nos modelos finais e protótipos. Alguns autores
como CUSHMAN & ROSENBERG (op. cit.), MORAES & MONT´ALVÃO (2010) e SOARES (1998)
apresentam detalhadamente metodologia de análise ergonômica aplicada à produtos de
consumo.
De acordo com KREIFELDT (1992), MITAL & ANAND (1992) e RYAN (1982), os problemas de falhas,
mau funcionamento e segurança do produto podem ser causados por uma variedade de fatores
incluindo:
Até recentemente, uma boa parte das falhas nos produtos eram atribuídas essencialmente a erros
dos usuários. Considerações sobre o erro humano é um ponto essencial na tentativa de se
identificar falhas que possam culminar em acidentes.
O grau de perigo real associado ao produto é freqüentemente difícil de quantificar, mas existe um
ponto quando tal perigo, sob certas circunstâncias, irá aumentar o grau no qual a probabilidade do
risco de acidente é grande o suficiente para que seja previsível (STADTLER-ESTRIN e ESTRIN, 1987;
GAGG, 2005). A fim de garantir que os produtos não contenham ou apresentem níveis de perigo
potencial que possam causar riscos ao usuário, ou pessoas que estejam em contato com o
produto, são realizados testes de segurança e análises.
CUSHMAN & ROSENBERG (1991) afirmam que a análise e o teste de segurança do produto têm,
pelo menos, três objetivos:
Duas categorias de testes são úteis na análise de segurança do produto: os testes ergonômicos e
os físicos. O uso de testes ergonômicos nos produtos de consumo diferencia-se dos físico porquê o
primeiro envolve diretamente o usuário (RENNIE, 1981; KIRK & RIDGWAY, 1970) e relaciona os
aspectos anatômicos, fisiológicos e psicológicos do usuário com os diversos aspectos de
desempenho do produto (KIRK e RIDGWAY, 1971). Cumpre enfatizar a necessidade dos testes
envolvendo a participação de seres humanos serem guiados por princípios éticos que garantam a
integridade física e psicológica dos sujeitos participantes do experimento (SOARES, 1995).
Dentre as demais técnicas, que podem ser utilizadas para a análise de acidentes e identificação de
riscos envolvendo produtos de consumo, apresentam-se as seguintes:
A avaliação de mensagens de instruções e advertências, sem ter que expor os usuários ao perigo, é
realizada através de testes conceituais (CUSHMAN e ROSENBERG, op.cit.). Este tipo de teste é
usado para avaliar:
Também é necessário realizar testes para coletar informações sobre acidentes relacionados a
produtos específicos. Estes procedimentos podem ser úteis durante as fases de design. WARNE
(1982) afirma que tais procedimentos podem:
WEEGELS (1996) e WEEGELS & KANIS (1998) defendem que, em termos de uso pelo designer
industrial, a análise de acidentes de produtos de consumo deve envolver simultaneamente uma
investigação acerca do funcionamento do produto, das atividades desempenhadas pelo usuário e
o ambiente no qual ocorreu o acidente. Esta abordagem valoriza enfaticamente a perspectiva dos
usuários.
JENKINS & DAVIES (1989) afirmam que numerosos problemas de segurança podem ser previstos
durante os estágios iniciais do processo de design. Por esta razão, torna-se necessário prestar mais
atenção em tais fatores durante os estágios iniciais do design; incorporando, desde as fases
preliminares, os princípios de segurança, ergonomia e correta instrução de uso. Se, durante o
design, surgirem problemas de desempenho que possam oferecer riscos aos usuários, deve-se
efetuar as mudanças necessárias ou, em sua impossibilidade, oferecer uma advertência
apropriada.
Historicamente, era freqüente o acidente ser creditado a negligência da pessoa acidentada.
Pesquisas realizadas nas últimas duas décadas têm revelado que a pessoa acidentada não percebe
o perigo potencial associado ao produto que ele ou ela está usando (STADLER-ESTRIN & ESTRIN,
1987).
KREIFELDT & ALPERT (1985) descrevem as seguintes etapas como necessárias ao design de
produtos seguros:
CHRISTENSEN (1987), HECHT (2003), KREIFELDT (1992), RYAN (1982), e WILLIAM e NOYES
(2011) sugerem a seguinte estratégia para a redução de riscos no uso do produto, a ser conduzida
nos estágios de desenvolvimento do produto:
Naqueles casos nos quais o perigo potencial não pode ser eliminado, o designer deve:
Fornecer barreiras físicas ao usuário, prevenindo o contato com as fontes de perigo potencial.
Fornecer, no produto, legendas e sinais de perigo adequados.
Fornecer instruções adequadas sobre o uso seguro do produto.
Fornecer treinamento necessário sobre o uso seguro do produto.
Para atingir este objetivo, RYAN (op.cit) afirma que os ergonomistas e designers possuem muitos
procedimentos valiosos e diversos recursos disponíveis, tais como:
WILLIAM e NOYES (2011) afirmam que existem duas formas nas quais os riscos podem ser
identificados: as análises estatísticas dos acidentes e a estimativa de risco de exposição por parte
do usuário.
O uso de mock-ups e modelos pode ser necessário para se testar a adequação antropométrica e
biomecânica. Adicionalmente ao próprio produto, protetores, instruções e advertências devem ser
analisados para identificar elementos incorretos ou impróprios, uso de códigos ou norma
inadequados (que não estejam de acordo com o estado-da-arte) e o uso de materiais
inadequados.
ABBOTT & TYLER (1997) reconhecem a impossibilidade de que alguns produtos possam ser
considerados completamente seguros. Para reduzir os riscos o autor sugere uma estratégia de
design, baseada nos princípios de gerenciamento de riscos, considerando quatro etapas:
Identificação dos riscos do produto, prevê que se os riscos não forem previamente
identificados eles não podem ser eliminados/ reduzidos. O perigo é que, devido a familiaridade
do designer com o produto, ele considere que o usuário já reconheça a carga de perigo e
minimize as prevenções do risco.
Programa de redução de risco, a próxima etapa da estratégia, é composto de técnicas de
análise de acidentes e identificação de riscos (como as descritas anteriormente neste artigo).
As duas primeiras fases incluem uma revisão dos procedimentos de design e devem ser
devidamente documentadas.
Programa de transferência de riscos, considerando que nenhum produto é absolutamente
seguro e que, mesmo após a aplicação da etapa anterior, algum risco residual possa ter
permanecido, esta fase sugere que, após o risco ter sido devidamente identificado e
impossibilitado de eliminar, seja transferido para terceiros através de seguro. Embora seja uma
área complexa e que requer a participação de profissionais da área jurídica, o designer deve
estar consciente da sua responsabilidade em casos de litígios.
Programa de retenção de riscos. Após a aplicação das etapas anteriores pode ainda existir a
possibilidade de haver riscos devido a, por exemplo, inviabilidade comercial da solução de
design ou o estado da arte não permitir adotar a solução encontrada. Um programa específico
que inclua um contrato específico de seguro e estratégias para a alocação de fundos especiais
para possíveis litígios deve ser conduzido.
De acordo com KREIFELDT (1992), uma defesa apresentada por um designer nos tribunais,
alegando que um acidente ocorreu por causa de um infortúnio “não intencional”, não foi
considerada como sendo aceitável. Sendo assim, o autor afirma que o designer deve seguir o
seguinte “dogma”, no que se refere ao design de produtos seguros:
De acordo com WILSON (1984), é possível reduzir acidentes pela melhoria do design através da
implementação das normas de segurança. Portanto, é certo que, quanto maior o nível de
imposição das normas, maior a pressão sobre os fabricantes e designers para a melhoria da
qualidade e, acima de tudo, a segurança dos produtos de consumo.
RYAN (1985) discute alguns casos recentes nos quais a justiça americana responsabilizou os
fabricantes por danos causados com o uso de produtos de consumo. Em alguns casos, embora os
produtos em questão atendessem às normas de segurança, seus fornecedores foram considerados
culpados, por não terem fornecido o grau de segurança esperado pelos usuários.
Desta forma, pode-se concluir que a observância a requisitos mínimos de segurança pode não ser
suficiente. Dentre outras referências que tratam da responsabilidade criminal associada a
produtos de consumo encontram-se ABBOTT & TYLER (1997), ABBOTT & TYLER (1997), DEWIS et
al. (1980), HUNTER (1992), WEEGELS (1996) e WILSON & KIRK (1980).
Conclusão
Como foi visto, embora existam fricções entre a ergonomia e o design de produto diversos autores
são unânimes ao afirmar que tais discordâncias precisam ser superadas. Mais ainda,
indubitavelmente, o sucesso da integração entre a ergonomia e o design de produto irá produzir
produtos de qualidade superior em termos de estética e usabilidade. JORDAN (2002) afirma que o
design deve ir além da usabilidade do produto fornecendo produtos que transmitam prazer ao
serem usados.
Também vale a pena mencionar que nenhum produto pode ser considerado como absolutamente
seguro. Para se atingir a um nível aceitável de segurança no produto necessita-se definir uma
estratégia de design e avaliação adequada dos produtos. Esta estratégia envolve diversas etapas
descritas neste artigo.
A legislação de proteção aos direitos do consumidor apresenta uma nova dimensão ao processo
de design. As elevadas perdas decorrentes de ações judiciais representam, ao menos para as
grandes empresas, uma responsabilidade muito grande para ser deixada nas mãos de um único
designer ou um departamento isolado. Os elevados custos decorrentes de tais perdas, em termos
financeiros e danos a imagem da empresa, podem comprometer seriamente a permanência da
empresa no mercado.
Referencias bibliográficas