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Uma Análise Comparativa entre a Psicologia Humanista e a Abordagem

Teórica da Terapia Cognitivo-Comportamental

Rafaeli Mazzarolo
Sara Nobile

Resumo
Uma breve análise comparativa entre a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e
a Teoria Humanista, buscando identificar seus pontos de convergência e
divergência. A proposta é explorar como essas duas abordagens terapêuticas se
relacionam e contrastam em termos de princípios teóricos, técnicas aplicadas e
visão de mundo. Ao examinar as similaridades e diferenças entre a TCC e a
Abordagem Humanista, o estudo visa oferecer uma compreensão mais abrangente
das nuances e complementaridades entre essas duas importantes correntes na
psicologia clínica.
Palavras-Chave: Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC); Abordagem Humanista;
Carl Rogers; Campo de atuação em Psicologia.

Abstract
A brief comparative analysis between Cognitive-Behavioral Therapy (CBT) and the
Humanistic Theory, aiming to identify their points of convergence and divergence.
The proposal is to explore how these two therapeutic approaches relate to and
contrast with each other in terms of theoretical principles, applied techniques, and
worldview. By examining the similarities and differences between CBT and the
Humanistic Approach, the study aims to provide a more comprehensive
understanding of the nuances and complementarities between these two significant
currents in clinical psychology.
Key-Words: Cognitive-Behavioral Therapy (CBT); Humanistic Approach; Carl
Rogers; Field of Practice in Psychology.

Psicologia Humanista e Terapia Cognitivo-Comportamental

A psicologia humanista é uma vertente que enfatiza a importância da


experiência subjetiva e do desenvolvimento pessoal, focando no crescimento
individual, autoconhecimento e autenticidade. Carl Rogers, um dos principais
representantes desses ideais, contribuiu significativamente para a psicologia
humanista com suas ideias e práticas, como a Abordagem Centrada na Pessoa
(ACP). Rogers lutou para ampliar o campo de atuação dos psicólogos, buscando
tirar a exclusividade dos médicos na aplicação da psicoterapia. Essa luta reflete a
visão humanista de que o desenvolvimento pessoal e o entendimento de si mesmo
não devem ser restritos a uma profissão específica, mas são aspectos fundamentais
da experiência humana.
Ao destacar que a eficácia da psicoterapia depende mais da disposição
interior do indivíduo em sua relação com o profissional do que de definições
externas preestabelecidas, Rogers está alinhado com a ênfase humanista na
subjetividade e na singularidade de cada pessoa. A abordagem humanista
reconhece a importância do autoconhecimento e da autenticidade na busca pelo
desenvolvimento pessoal. A criação da Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) por
Rogers reflete sua crença de que os valores e atitudes aplicados em seus
atendimentos podem transcender o campo clínico. Isso ressalta a visão humanista
de que as abordagens psicológicas não devem ser limitadas a contextos
específicos, mas sim serem consideradas modos de ser e atitudes diante da vida
transcendendo o ambiente clínico, e incorporando-se em áreas como educação,
desenvolvimento organizacional e projetos comunitários. Essa perspectiva se alinha
com a ideia central da psicologia humanista, que busca compreender o ser humano
em sua totalidade, considerando o contexto mais amplo de suas experiências e
relações.
Já a Terapia Cognitivo-Comportamental é uma abordagem terapêutica que
iniciou em meados da década de 1960 a partir dos estudos de Aaron Beck. A
Terapia Cognitivo-Comportamental, ou simplesmente TCC, parte do pressuposto de
que os pensamentos, sentimentos e comportamentos estão interligados,
influenciando-se mutuamente. Aaron Beck propôs que as distorções cognitivas, ou
padrões de pensamento negativos e irrealistas, podem levar a estados emocionais
prejudiciais. Assim, a TCC busca identificar e modificar padrões de pensamento
disfuncionais a fim de promover mudanças positivas no comportamento e nas
emoções.
Atualmente, a Terapia Cognitivo-Comportamental é uma das abordagens
terapêuticas mais amplamente utilizadas e estudadas em psicologia. Ela
demonstrou eficácia no tratamento de uma variedade de transtornos psicológicos.
Estudos recentes indicam a eficácia da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)
em diferentes transtornos de ansiedade. Em uma revisão realizada por Cuijpers et
al. (2016), o tamanho do efeito foi considerado elevado em três transtornos
estudados: ansiedade generalizada, ansiedade social e síndrome do pânico. Em
outra análise, comparando a TCC com grupos controles, o mesmo autor observou
um tamanho do efeito também elevado para a TCC (Cuijpers, Cristea, Karyotaki,
Reijnders & Huibers, 2016). Esses resultados destacam a eficácia da TCC em
vários tipos de transtorno de ansiedade, reforçando sua aplicabilidade ampla. Além
disso, a TCC tem sido adaptada para diferentes contextos, como terapia online e
intervenções breves. O constante desenvolvimento dessa abordagem é evidenciado
por pesquisas contemporâneas e a adaptação de suas técnicas a novos desafios
clínicos.

Fundamentos da Psicologia Humanista

Na Psicologia Humanista destaca-se a importância da experiência subjetiva,


do crescimento pessoal e do desenvolvimento humano. Seus princípios centrais são
fundamentados em uma visão otimista da natureza humana, focando no potencial
positivo de cada indivíduo. Um dos princípios centrais é o foco no indivíduo como
um todo. Diferentemente de abordagens mais objetivas, a psicologia humanista
considera cada pessoa como única, enfatizando a compreensão do ser humano em
seu contexto total, incluindo aspectos emocionais, espirituais e sociais. O
autoconhecimento é outro pilar fundamental da abordagem humanista. Acredita-se
que a compreensão profunda de si mesmo é crucial para o crescimento pessoal.
Esse processo envolve a exploração e reflexão das próprias emoções, valores,
crenças e motivações. Ao promover o autoconhecimento, a Psicologia Humanista
busca capacitar as pessoas a tomarem decisões mais alinhadas com suas
verdadeiras necessidades e desejos. Para Rogers, tudo passa pela experiência
pessoal, e portanto é essencial relevar o que o conteúdo que o sujeito traz, de
maneira empática e receptiva, a fim de entender sua maneira de experienciar a vida:

(...) tudo que se passa no organismo em qualquer momento e que


está potencialmente disponível à consciência; em outras palavras,
tudo o que é suscetível de ser apreendido pela consciência. A noção
de experiência engloba, pois, tanto os acontecimentos de que o
indivíduo é consciente quanto os fenômenos de que é inconsciente
(Rogers, 1959/1977a, p. 161).

A autorrealização é um conceito chave na psicologia humanista e representa


a busca contínua do indivíduo por atingir seu potencial máximo e alcançar uma vida
significativa e gratificante. Em ambientes favoráveis ou desafiadores, o organismo
direciona-se por meio de buscas em direção à autorrealização de metas e respostas
totais, abrangendo tanto o âmbito fisiológico quanto psicológico (Rogers,
1951/1992). A abordagem humanista, portanto, valoriza a promoção do crescimento
pessoal e a realização de metas que se alinhem com os valores e aspirações
individuais.
A psicologia humanista destaca a singularidade e a totalidade do ser
humano, buscando compreender e promover o desenvolvimento pessoal em sua
plenitude. Além da ênfase na subjetividade com o reconhecimento da importância
de estados internos do indivíduo, enfatizando essa experiência subjetiva como
central para a compreensão humana, a psicologia humanista também evidencia o
foco no crescimento pessoal com objetivo de realização do potencial máximo de
cada um. Outro aspecto interessante da psicologia humanista é que se trata de uma
abordagem holística, que considera o indivíduo como um todo, integrando aspectos
físicos, emocionais, sociais e espirituais, de maneira completa e integrada.
Contrapondo abordagens mais patológicas, a psicologia humanista visa
entender e evidenciar o aspecto mais positivo de cada indivíduo, no sentido de que
se encontre o bem-estar e autenticidade na vivência pessoal. A autenticidade é um
ponto fundamental nessa abordagem, porque enfatiza a liberdade de escolha e
capacidade de direcionar o próprio caminho. O terapeuta deve agir com empatia,
aceitação e compreensão incondicional, mas sempre guiando o cliente ao seus
processo individual e autonomo de escolhas. A partir desses princípios, a psicologia
humanista se faz como uma abordagem que busca ir além de diagnósticos e
tratamentos específicos, promovendo uma compreensão mais profunda e rica da
experiência humana.
Além de Carl Rogers, Abraham Maslow também foi um importante expoente
da psicologia humanista, contribuindo significativamente com sua teoria da
Hierarquia das Necessidades. Maslow propôs que as necessidades humanas
podem ser organizadas em uma hierarquia, com as necessidades mais básicas na
base e as mais complexas no topo. Maslow agregou à psicologia humanista a ideia
de que as pessoas são impulsionadas por uma hierarquia de necessidades e que a
vida motivacional pode ser descrita como uma escalada por diferentes níveis de
uma pirâmide que as estrutura. Por exemplo, no nascimento os bebês são
motivados por necessidades mais básicas, como as fisiológicas; na sequência as
necessidades de segurança prevalecem e, quando crescem, dão lugar às
necessidades de filiação e, mais tarde, as de estima. Segundo este autor, é a partir
do início da adolescência quando os indivíduos já podem ser conduzidos em direção
à autorrealização, que se consolida naquelas pessoas mais maduras (Maslow, 1954
in Cavalcanti et al 2019).
Conforme a perspectiva de Maslow, as necessidades humanas são
agrupadas em cinco categorias principais: fisiológicas, de segurança, de afiliação
(ou pertencimento), de estima e de autorrealização. A compreensão é de que essas
necessidades se desenvolvem sequencialmente, desde o nascimento até a idade
adulta (Maslow, 1954 in Cavalcanti et al 2019). Dessa maneira, as necessidades
mais básicas, que formam o alicerce da pirâmide hierárquica (como as fisiológicas),
têm uma prevalência maior no início do desenvolvimento em comparação com as
necessidades mais elevadas na hierarquia (como a autorrealização). Argumenta-se
que quanto mais satisfatórias são essas necessidades, melhor é a saúde mental do
indivíduo (Lester, 2013 in Cavalcanti et al 2019). Essa contribuição de Maslow
ressalta a importância de reconhecer as diversas necessidades humanas e como a
satisfação dessas necessidades impactam o crescimento e a realização pessoal. A
teoria da Hierarquia das Necessidades de Maslow é frequentemente utilizada em
diversos campos, incluindo psicologia, educação e gestão, para compreender e
promover o desenvolvimento humano integral.
A psicologia humanista na prática clínica destaca-se por uma abordagem
centrada na pessoa, concentrada no crescimento pessoal, autoconhecimento e
desenvolvimento integral. Em sua prática utilizam-se técnicas como a entrevista não
diretiva, enfatizando a escuta ativa e, nesse contexto, a empatia e aceitação
incondicional são essenciais para criar um ambiente terapêutico seguro.
Ferramentas como a exploração das experiências presentes e incentivo à
autorreflexão visam focar no "aqui e agora" e promover uma compreensão mais
profunda do cliente, já que um dos objetivos da prática é ser colocado em uma
"postura atual, do presente, do atuante, em curso" (Amatuzzi,0000). Técnicas
expressivas, como arte terapia, facilitam a expressão emocional. O trabalho se
direciona ao desenvolvimento pessoal e auto realização, estimulando os clientes a
identificar objetivos significativos. Essas ferramentas são flexíveis, adaptando-se às
necessidades individuais, refletindo os princípios da psicologia humanista na prática
clínica.

Fundamentos da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)


A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma abordagem
psicoterapêutica inovadora, que procura compreender e modificar padrões de
pensamento, emoções e comportamentos. Originada na década de 1960, por Aaron
Beck e seus colaboradores, a TCC é fundamentada na premissa crucial de que as
crenças e interpretações de uma pessoa sobre si mesma, os outros e o mundo,
exercem influência direta sobre suas emoções e ações (Braz, 2008). Essa
abordagem colaborativa envolve uma parceria ativa entre terapeuta e cliente, com
foco na identificação e transformação de padrões de pensamento disfuncionais,
substituindo-os por alternativas mais realistas e adaptativas. Ademais, a TCC
enfatiza a importância da modificação de comportamentos mal adaptativos,
empregando técnicas práticas e estratégias para enfrentar desafios e desenvolver
habilidades de enfrentamento eficazes. A eficácia da TCC reside em sua estrutura
altamente organizada, no foco no presente e na orientação para objetivos,
tornando-a uma abordagem funcional para diversos problemas psicológicos, tais
como ansiedade, depressão, transtornos de estresse pós-traumático, entre outros
(Reyes et al, 2017).
A base teórica da TCC fundamenta-se na premissa de que os pensamentos
moldam as emoções e comportamentos e, portanto, a modificação de padrões
cognitivos negativos pode fomentar mudanças positivas na experiência emocional e
na interação com o mundo externo. Técnicas específicas, como o questionamento
socrático, a reestruturação cognitiva e o treinamento em habilidades sociais são
empregadas para modificar padrões de pensamento disfuncionais e
comportamentos prejudiciais (Beck, J. S. 2013 in Silva et al 2014). Aaron T. Beck
ressalta a interconexão entre cognição, emoção e comportamento como a base
fundamental para a TCC, destacando que as cognições, isto é, os pensamentos e
interpretações individuais, desempenham um papel central na determinação das
emoções e comportamentos de uma pessoa. Pensamentos automáticos negativos
ou distorcidos podem conduzir a respostas emocionais desadaptativas e padrões
comportamentais disfuncionais (Beck, 1976).
As principais técnicas da Terapia Cognitivo-Comportamental visam promover
mudanças positivas nos padrões cognitivos e comportamentais dos indivíduos. A
técnica de questionamento socrático, central na TCC, consiste em desafiar os
pensamentos automáticos negativos do cliente, estimulando a reflexão crítica e a
identificação de distorções cognitivas (Santos & Medeiros, 2017). A reestruturação
cognitiva, igualmente essencial, capacita o cliente a substituir pensamentos
disfuncionais por pensamentos mais realistas e equilibrados, promovendo uma
visão mais precisa da realidade. Adicionalmente, a TCC emprega a técnica de
exposição, gradualmente expondo o cliente a situações temidas para reduzir a
ansiedade associada e promover a adaptação a essas circunstâncias (Braz, 2008).
A técnica de treinamento em habilidades sociais busca compreender, não apenas os
padrões de pensamento disfuncionais, mas também promover melhorias nas
interações interpessoais dos clientes. Ao fornecer ferramentas práticas para
aprimorar a comunicação, resolver conflitos e desenvolver relações mais saudáveis,
o treinamento em habilidades sociais visa potencializar a capacidade dos clientes de
estabelecerem conexões significativas, fortalecendo, assim, o impacto positivo em
sua saúde mental e bem-estar emocional (Costa, 2012).
As técnicas da TCC são aplicadas de forma integrada e personalizada,
levando em consideração as necessidades específicas de cada cliente. Ao combinar
a modificação de padrões cognitivos disfuncionais com a adaptação de
comportamentos mal adaptativos, essa abordagem busca promover mudanças
sustentáveis na forma como os indivíduos pensam, sentem e se comportam.

Convergências e divergências das abordagens

As abordagens humanistas e a terapia cognitivo-comportamental (TCC)


compartilham pontos de convergência, destacando a valorização do processo
terapêutico como um elemento fundamental. Ambas reconhecem a importância de
criar um ambiente terapêutico seguro e empático, no qual o cliente se sinta
compreendido e aceito. Na perspectiva humanista, isso se reflete na abordagem
centrada na pessoa de Carl Rogers, que enfatiza a empatia, a congruência e o
respeito incondicional como facilitadores do crescimento pessoal. Na TCC, o
estabelecimento de uma aliança terapêutica positiva é crucial para colaborar com o
cliente na identificação e modificação de padrões de pensamento disfuncionais e
comportamentos prejudiciais.
Ambas as abordagens valorizam o papel ativo do cliente no processo
terapêutico. Na terapia humanista, o cliente é visto como o especialista de sua
própria experiência, e o terapeuta atua como um facilitador que ajuda o cliente a
explorar e compreender seus sentimentos, pensamentos e comportamentos. (Araújo
& Freire, 2014). De maneira semelhante, na TCC, os clientes são encorajados a
desempenhar um papel ativo no seu próprio tratamento, colaborando com o
terapeuta na identificação de pensamentos automáticos negativos, crenças
disfuncionais e na aplicação de estratégias comportamentais para promover
mudanças positivas (Martins et al, 2018).
Outro ponto de convergência entre as abordagens é a ênfase a promoção do
autoconhecimento e a capacidade do cliente de assumir responsabilidade por seu
próprio processo de mudança. Ambas reconhecem que o crescimento pessoal e a
superação de desafios envolvem uma compreensão profunda de si mesmo e a
disposição para fazer escolhas conscientes. Tanto a abordagem humanista quanto a
TCC buscam capacitar o cliente a desenvolver uma maior autoconsciência,
promovendo uma transformação positiva e duradoura em sua vida.
A abordagem humanista e a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)
representam duas perspectivas distintas no campo da psicoterapia, diferindo em
suas visões fundamentais sobre a natureza humana, em relação ao sofrimento
psicológico e à técnicas terapêuticas específicas. A TCC se concentra na
identificação e modificação de padrões de pensamento e comportamentos
considerados patológicos, estruturando-se para tratar problemas psicológicos
específicos e distúrbios mentais, visando a redução de sintomas e a promoção de
mudanças comportamentais a curto prazo. Em contraste, a Psicologia Humanista
destaca o desenvolvimento pessoal e a busca pela autorrealização, evitando uma
perspectiva patologizante. Sua abordagem não diretiva valoriza a singularidade de
cada indivíduo, promovendo um ambiente terapêutico de aceitação incondicional,
permitindo uma exploração mais profunda e aberta das experiências do cliente ao
longo de uma jornada terapêutica mais processual e de longo prazo.
Na abordagem humanista, destaca-se a crença na capacidade inata do ser
humano para o crescimento e auto realização. Os terapeutas humanistas enfatizam
a importância do autoconceito positivo e do desenvolvimento pessoal. Por outro
lado, a TCC clássica baseia-se na ideia de que padrões de pensamento
disfuncionais contribuem para o sofrimento psicológico, buscando modificar esses
padrões por meio de suas técnicas. Nesse ponto, a TCC clássica apresentava uma
limitação no aspecto de se voltar mais para a patologia do que para os pontos
positivos das vivências do cliente, tal como acontece na psicologia humanista.
Embora a TCC tenha historicamente sido associada a uma abordagem mais focada
na patologia, é importante notar que as linhas atuais da TCC incorporam uma
compreensão mais ampla da experiência humana. As abordagens contemporâneas
da TCC reconhecem a importância de considerar não apenas os sintomas
patológicos, mas também os fatores contextuais, emocionais e cognitivos que
contribuem para a complexidade do bem-estar psicológico.
A evolução da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) nas linhas atuais
inclui diversas ramificações que refletem uma compreensão mais profunda dos
processos psicológicos. A TCC Baseada em Processos explora os elementos
subjacentes aos sintomas, investigando cognições, emoções e comportamentos em
um nível mais profundo. A incorporação do Mindfulness na TCC enfatiza a
consciência plena e a aceitação para lidar com pensamentos e emoções. A TCC
Transdiagnóstica transcende diagnósticos específicos, concentrando-se em
processos comuns que contribuem para diversos distúrbios psicológicos. A TCC
Centrada no Esquema aborda padrões persistentes de pensamento e
comportamento, explorando questões mais profundas que podem influenciar
dificuldades emocionais. A TCC de Terceira Onda, incluindo abordagens como ACT
(Terapia de Aceitação e Compromisso), MBCT (Terapia Cognitivo-Comportamental
Baseada em Mindfulness), DBT (Terapia Dialética Comportamental), entre outras,
amplia o escopo da TCC tradicional, enquanto a TCC Integrativa combina técnicas
de diferentes abordagens terapêuticas para atender às necessidades específicas de
cada cliente, refletindo a adaptação contínua dessa abordagem.
No que diz respeito ao sofrimento psicológico, a TCC se destaca por sua
abordagem mais direta e focada em sintomas específicos. Essa terapia é muitas
vezes vista como "rápida" e orientada para resultados, concentrando-se na
resolução de problemas imediatos e na promoção de mudanças comportamentais.
Por outro lado, a abordagem humanista, como a Terapia Centrada na Pessoa,
oferece um espaço mais aberto para a exploração das emoções e experiências do
cliente, permitindo um processo mais lento e holístico. Mas há uma tendência
crescente em direção a uma abordagem mais integrativa dentro da TCC nas novas
concepções que vêm sendo praticadas, considerando o indivíduo em sua totalidade,
promovendo não apenas a redução de sintomas, mas também o crescimento
pessoal e a melhoria da qualidade de vida, o que aproxima à psicologia humanista e
suas postulações. Isso envolve a aplicação de técnicas cognitivas e
comportamentais para não apenas tratar patologias específicas, mas também para
promover o desenvolvimento de habilidades adaptativas, a resiliência emocional e
estratégias eficazes de enfrentamento.
No entanto, é importante considerar as limitações percebidas em ambas as
abordagens. A TCC, por sua natureza direta, pode negligenciar aspectos mais
profundos da experiência humana e focar apenas nos sintomas observáveis. Sua
ênfase na funcionalidade imediata pode deixar de abordar as raízes subjacentes
dos problemas. Por outro lado, a abordagem humanista, ao ser não diretiva, pode
parecer vaga e pouco estruturada, levando a uma falta de foco em questões
específicas e tangíveis, como por exemplo no tratamento de uma fobia específica e
pontual.
Em suma, as duas abordagens têm seus aspectos positivos e negativos. A
pesquisa e a prática clínica mostram que a TCC é efetiva na redução de sintomas e
taxas de recorrência, com ou sem medicação, em uma ampla variedade de
transtornos psiquiátricos (Reyes et al, 2017), enquanto a abordagem humanista
oferece um espaço valioso para a exploração emocional, autoconhecimento e
autodesenvolvimento. Ambas as abordagens têm suas limitações, e a escolha entre
elas dependerá das necessidades e preferências individuais do cliente. Encontrar
um equilíbrio entre a eficácia prática da TCC e a riqueza da abordagem humanista
pode ser crucial para uma prática terapêutica abrangente e personalizada.

Conclusão
A ideia humanista pode ser aplicada dentro de outras abordagens, porque
trata-se mais de uma atitude de agir do terapeuta, do que de uma abordagem em si,
como escreve Amatuzzi, 2010:

No fundo existe uma crença no homem, uma confiança no que nele


se manifesta. A expressão teórica disso é a tendência atualizante de
Rogers, ou o conceito de auto-atualização de Maslow. O que está na
raiz do humanismo não é, pois, apenas um postulado teórico, ou
uma hipótese, mas uma atitude concreta em favor do homem. Isso é
mais fundamental que as teorias que a partir daí se constroem.

Dessa forma, a possibilidade de enxergar o outro como um ser completo e


singular pode ser aplicada em qualquer contexto terapêutico, inclusive na TCC.
Mesmo com as técnicas e propósitos da abordagem, é possível que, assim como na
psicologia humanista, o psicólogo cognitivo comportamental se coloque em uma
posição de acolhimento e compreensão, no sentido de ajudar a desencadear o
movimento autônomo da pessoa em direção ao seu crescimento.
O psicólogo, segundo Rogers (in Amatuzzi, 2010), é um facilitador no
processo do paciente da busca por si mesmo e deve, criar uma relação pessoal com
o paciente no contexto da terapia, para que a sessão vá além de uma relação
técnica- instrumental e não importa o que o terapeuta faça, mas sim suas reais
disposições. Conclui-se que, mesmo com as técnicas da TCC, durante a sessão, a
escuta ativa é a base para o entendimento da demanda. Ainda que, diferente da
psicologia humanista, em que não são determinados atos específicos do psicólogo
que são terapêuticos; as abordagens psicológicas convergem no princípio da
psicologia humanista que é a qualidade humana da relação oferecida pelo
profissional. Segundo Amatuzzi, 2010 "o ser humano é um ser de relação e a
terapia recria esse contexto", possibilitando assim que ali ele se desenvolva. Dessa
forma, independente da abordagem, o ponto de convergência de qualquer
psicoterapia é o auxílio a pessoa, a fim de promover uma maneira efetiva de lidar
com seus dilemas e progredir em todos os âmbitos da sua vida.

Referências

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