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OPINIÃO DO ESTADÃO

A rebeldia da Justiça do
Trabalho
Inconformados com a reforma trabalhista, magistrados contrariam a lei
estabelecida pelo Congresso e a jurisprudência do STF, sobrepondo sua
concepção de ‘justiça social’ ao Direito
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Por Notas & Informações


14/11/2023 | 03h00

2 min de leitura

Conforme levantamento do Estadão, mais da metade das reclamações


no Supremo Tribunal Federal (STF) neste ano trata de questões
relacionadas ao direito trabalhista. A Corte virou um balcão de
recursos para impor limites ou corrigir decisões da Justiça do
Trabalho.

O fenômeno não é novo. A litigiosidade em geral no Brasil já é


comparativamente aberrante: são mais de 100 milhões de ações, ou
seja, uma para cada dois cidadãos. Os cerca de 2,5 milhões de
processos tramitando na Justiça do Trabalho fazem do Brasil campeão
mundial de passivos trabalhistas.

Historicamente, na legislação trabalhista e, sobretudo, na Justiça


vicejou uma concepção ideológica segundo a qual toda relação entre
empregador e empregado envolve algum tipo de injustiça constitutiva.
Entre os juízes trabalhistas prevaleceu a ideia de que sua missão seria
corrigir essas injustiças. O ônus quase nulo para litigâncias
infundadas, combinado à generosidade dos juízes, generalizou a
percepção de que sempre vale a pena para o trabalhador entrar com
alguma reclamação. O custo da indústria de litigâncias não está
apenas no congestionamento da Justiça, mas no desestímulo às
empresas, sobretudo pequenas e médias, a empregar mais pessoas.
No afã de fazer “justiça social” a cada trabalhador, os juízes ativistas
prejudicam coletivamente os trabalhadores, impondo barreiras à
criação de empregos, estimulando a perpetuação do mercado
informal e, com isso, afastando investimentos e freando o
crescimento.

A fim de reduzir o “custo Brasil”, a reforma trabalhista de 2017


eliminou entraves de uma legislação esclerosada. Os legisladores
definiram, por exemplo, que acordos coletivos concretos prevalecem
sobre leis genéricas, normatizou o trabalho intermitente e remoto e
impôs custos às litigâncias infundadas.

Mesmo após o STF ter decidido pela constitucionalidade de medidas


como essas, os justiceiros sociais togados continuam a decidir
contrariamente à lei. “O órgão máximo da Justiça especializada, o TST
(Tribunal Superior do Trabalho), tem colocado alguns entraves em
opções políticas chanceladas pelo Executivo e pelo Legislativo”,
constatou o ministro do STF Gilmar Mendes.

“A ideia desse grupo (de juízes) é, através da jurisprudência, pressionar


para mudar a reforma trabalhista, mas ele não é legislador”, avaliou o
professor de direito trabalhista da Fundação Getulio Vargas Paulo
Renato Fernandes da Silva. “Então, eles começam a declarar tudo
inconstitucional e a negar a aplicação da reforma trabalhista. Isso tudo
vai parar onde? Para o Supremo.” Em 2018, um ano após a reforma, as
reclamações contra decisões do TST somavam 41% das ações no STF.
Hoje são 54%.

As principais controvérsias se dão em torno das regras que liberam a


terceirização, com a possibilidade de transformação de colaboradores
em pessoas jurídicas. O STF já validou essa modalidade de contratos,
mas, baseada em antigas súmulas, a Justiça do Trabalho insiste em
defini-los como vínculos de emprego.

A insegurança jurídica, com todas as suas consequências para a


credibilidade da Justiça e o ambiente de negócios, se prolifera. A
reforma deveria reduzir o mercado dos litigantes profissionais, mas a
Justiça do Trabalho insiste em mantê-lo lucrativo, contribuindo para
perpetuar um dos maiores, mais caros e mais lentos Judiciários do
mundo. E também um dos mais irracionais.

Os juízes trabalhistas têm todo o direito a cultivar sua concepção de


justiça social e desejar que ela seja consolidada em lei. Para isso têm,
como todo cidadão, o seu voto. Se quiserem ir além, podem abandonar
a toga e partir para o ativismo ou disputar cargos no Legislativo e no
Executivo. Mas valer-se de chicanas para reverter à força de seus
martelos as decisões dos representantes eleitos é coisa que atenta
profundamente contra o Estado Democrático de Direito. Assim como
todo cidadão, inclusive legisladores e governantes, tem a obrigação de
cumprir decisões judiciais das quais discorda, os juízes têm a
obrigação, mesmo a contragosto, de aplicar as leis decididas pelos
representantes eleitos.

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