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Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN

Faculdade de Letras e Artes – FALA


Pró-Reitoria de Ensino e Graduação - PROEG
Departamento de Línguas Estrangeiras – DLE
Disciplina: Sociolinguística
Professor: Adalberto Júnior

Ana Clara Oliveira de Sousa


Luciana Maria Vieira do Nascimento
Tafnes Laís da Silva Gomes

RESENHA CRÍTICA

BAGNO, Marcos. A Língua de Eulália – novela sociolinguística. São Paulo:


Contexto, 2000. 11ª edição.

Marcos Bagno, professor do Departamento de Línguas Estrangeiras e


Tradução da Universidade de Brasília, doutor em filologia e língua portuguesa pela
USP, tradutor, escritor, contista, poeta e autor de livros infantis. Tem diversos
prêmios e mais de 30 títulos publicados, entre literatura e obras técnico-didáticas.
Atua mais especificamente na área da sociolinguística e literatura infanto-juvenil,
bem como questões pedagógicas sobre o ensino de português no Brasil. Em 2012
sua obra As Memórias de Eugênia recebeu o prêmio Jabuti, em A Língua de Eulália
trata a sociolinguística como ela deve ser tratada: com seriedade e leveza.
A Língua de Eulália retrata a história de Vera, Silvia e Emília, três amigas que
decidem passar as férias na casa de Irene, tia de Vera. Irene é uma professora
aposentada, linguista que após a aposentadoria se dedica a projetos de
alfabetização no sítio onde mora com Eulália, sua grande amiga. Eulália é uma
pessoa simples, com pouco estudo, e possui uma fala diferente das visitantes, e é
justamente sua maneira de falar que desperta a atenção delas.
Em consequência do preconceito linguístico cometido pelas meninas, para
com Eulália, sua amiga, Irene propõe um estudo acerca das variedades da língua
portuguesa. Tal reflexão provocou consequências imensamente relevantes, tanto é
que com o conhecimento adquirido, elas sugerem explanar sobre o assunto durante
toda a permanência na casa da professora.

Através dos diálogos discorridos entre as quatro mulheres, o autor faz uma
forte crítica sobre o preconceito linguístico, que muitos apresentam devido à falta de
conhecimento sobre a origem da língua portuguesa. O autor explana de forma clara
a diferença entre o português padrão (PP) e o português não-padrão (PNP),
valorizando nossa língua através da cultura, embasando aspectos importantes
dentro das variedades linguísticas desde o início da história da língua.

A língua de Eulália é uma obra que nos instiga a fazer uma análise, com uma visão
diferente e crítica sobre o uso da língua dentro da norma padrão e não-padrão,
indiscutivelmente, esse ponto se encaixa perfeitamente para nós, acadêmicos do
curso de Letras, tendo em vista a relação com a nossa formação. O livro traz
abordagens fundamentais sobre o uso das variedades adotadas por cada indivíduo
no seu âmbito social, e ainda sobre a postura do professor de língua portuguesa.

No decorrer do diálogo, é explicado as transformações do ND em N e MB em


M que acontecem decorrentes das assimilações. Explica que o -N e o -D são
fonemas dentais, ou seja, são produzidos pela língua na mesma região da boca,
onde a assimilação, por sua vez, tenta transformar os dois sons similares num
mesmo som. Pois, o -ND acaba sendo pronunciado como -N e o -MB como -M.
Existem também os casos bilabiais, que ocorre com as consoantes -M e-B, acontece
com os movimentos dos lábios para pronunciá-los. Vale ressaltar que a assimilação
contribuiu ativamente na história da formação da língua portuguesa, e que a
diferença entre a língua falada e escrita ocorre em todas as línguas.
A personagem Irene em uma de suas aulas, fala sobre a redução do -E, e
átonos pretônicos, explica mais esse fenômeno da língua, onde o -E sofre a redução
em -i, causando a substituição do -E pelo -I na pronúncia como pipino ao invés de
pepino, o que é bastante comum no PNP. No diálogo a personagem esclarece que a
escrita é só uma representação da fala, por isso, cada falante terá um modo
particular de pronunciar. Abordando a explicação do “caso das pretônicas”, que é a
sílaba antecessora à tônica ca -va -lo e postônica é a que vem depois ca- va -lo,
explica também a influência quanto a pronuncia das palavras que se mantinha na
convivência social formando hábitos linguísticos, as moças também refletem sobre
a contração das proparoxítonas em paroxítonas, visto que é bem frequente no
português não-padrão.
O autor explica que, o nosso país é composto por arcaísmos que são tidos
como “erros linguísticos”, como é o caso das palavras: abastar, alevantar, alembrar,
ajuntar etc. Porém, na verdade esses supostos “erros” são heranças de outros
tempos, com o nome de arcaísmos. Comprovados pelos versos de Camões, vimos
que todos estes verbos iniciados com -a, ainda bastante vivos nos falares regionais,
e o PNP nada tem de “errado”, apenas “saíram de uso”. Adentra também na
influência quanto a pronúncia das palavras que se mantinham na convivência social
formando hábitos linguísticos.
Depois de várias explicações dadas pela personagem Irene, as moças
levantam indagações sobre a percepção das variações linguísticas, perceberam que
não ocorre da mesma forma em todos os lugares, citando exemplos dos paulistanos
e outras regiões. Partindo dessas observações, Irene fala sobre essa diversidade,
propondo que essa diferença de pronúncias, dava-se ao processo de colonização,
especificando São Paulo, como cidade sede dos italianos como seus colonizadores,
por isso a língua não apresentava reduções e que as palavras eram faladas como
eram escritas.
Dando continuidade as suas apresentações, Irene constrói comentários sobre
as formas das transformações das palavras do PNP, pois, acredita que elas
necessitam de adaptação, e assim, se encaixarem no ritmo vivo da língua.
Apresentando semelhanças entre as línguas, Bagno discorre sobre a história e
evolução da língua, mostrando que elas podem levar à criação de novos vocábulos,
ao tentar encaixar outros fenômenos às mesmas regras, dizendo da sua eficiência e
o declínio das variações. Ele mostra também, a hipercorreção, que faz o sujeito errar
quando tenta falar mais “corretamente” e acaba por “errar”. Afirmando que no PNP,
a semelhança cria outras formas regulares, que não se adequam ao PP.
Segundo Bagno, existem inúmeras variedades linguísticas não-padrão e que
as mesmas precisam levar em consideração alguns fatores sociais, e não apenas os
linguísticos, dentre outros. Ele faz menção a outras línguas derivacionais como
línguas vivas e que estão em frequente evolução.
O livro a Língua de Eulália, deixa evidente que a língua é algo vivo em
constante processo evolutivo, assim como o português deve ser ensinado da mesma
forma que outras disciplinas. Tendo em vista, que muito do que um professor fala
hoje em suas aulas, pode e certamente, será modificada no futuro. Exaltando o fato,
que nos deixa bem claro que não existe o “falar errado”, mas sim, diversificado.
Vimos que cada pessoa tem características e comportamentos diferentes, e isso, se
reflete na língua, mostrando que devemos aceitar as variações linguísticas como
personificação da evolução da língua e da humanidade. Assim, aprendemos que
devemos plantar em várias terras, porém, cultivando sempre a raiz.

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