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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas


Departamento de História

Ficha do Trabalho – TR081222

Autores: Luiz H. da Costa Moreira


Matrícula: N.I Ou Sob Sigilo – 2021*******
Curso: Brasil Colonial / Rio de Janeiro Colonial

Professor ª: Márcia Amantino

Email: moreira.luiz@graduacao.uerj.br
Ênfase: Analise Documental, Período Colonial no Brasil, Século XVIII;
Segmento Temático: História Luso-Brasileira, Ouro e Diamantes na Colônia Americana, Impostos,
Contrabando e Revolta, Conjuração Mineira;

“O sol há de brilhar mais uma vez. A luz há de chegar aos corações. O mal será
queimado a semente. O amor será eterno novamente...”

SILVA, A, Nelson – Juízo Final – ODEON Record’s, 1973;


A Febre do Ouro
Da Guerra dos Emboabas à Conjuração Mineira

Vila Rica - óleo sobre tela – Julien Palliáre - 1820

Resumo
“[...]Lá em Vila Rica, junto ao Largo da Bica, local da opressão!” (Império Serrano,
1969). Talvez o samba enredo que traz síntese do misto de tirania e opressão tenha
transpassado as barreiras de uma das maiores manifestações culturais do Brasil e entrado no
hall dos historiadores como referência à busca dos colonos por poder e riqueza e seus
episódios de rebelião.
Silas de Oliveira de fato soube conduzir tal enredo com muita maestria e merece seu
lugar de destaque. Mas com certeza Ângelo Carrara e Júnia Ferreira Furtado merecem ainda
mais reconhecimento no que diz respeito ao que aconteceu nesse período ainda tão
estereotipado e desconhecido em nossa historiografia tradicional, mesmo que tenha sido
representado em um enredo carnavalesco corajoso, belíssimo e marcante. Bem no meio do
período mais sombrio e sanguinário dos anos chumbo.
É sobre, com o conteúdo desta frase, que podemos atribuir ao território onde hoje se
compreende como a Cidade de Ouro Preto no Estado de Minas Gerais uma verdadeira tirania
e opressão por causa do lumiar do ouro. Fruto talvez do desbravar das matas pelos
Bandeirantes ou pela impetuosidade das Tropas Portuguesas, fato é que as minas de ouro,
que fizeram de Vila Rica um dentre vários palcos da disputa pelo metal precioso ser cenário
de verdadeiras batalhas sangrentas.
Sangue fora derramado, revoltas eclodiram e territórios foram conquistados, tudo
pela cobiça do ouro e consequentemente as terras que lhe abrigara. Através da análise de
documentos, podemos observar não só os motivos de tais revoltas, mas também a
sistematização da tributação da Coroa Portuguesa sob o ouro extraído das jazidas de Minas
Gerais, levando ao desgosto da elite burguesa local e provocando momentos de conflito com
tropas leais a coroa. “[...]A cada invasão, uma reação. Pra cada expedição, um brado
surgia!” (E.P. de Mangueira, 2002).
Após a ascensão de Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal à
Secretário de Estado dos Negócios Interiores do Reino de Portugal, o laço no pescoço em
relação à colônia e ao território das Minas só teria a ficar mais apertado. Traçando um
paralelo entre documentos emitidos pela Casa Real de Lisboa que baixavam tributos entre
eles o Quinto e a Derrama e as Cartas das Capitanias podemos relacionar os eventos de
revolta a esses atos normativos legais relacionado a extração de ouro das Minas Gerais.

Palavra-chave: Ouro, Minas, Rebelião, Tributos, Guerra dos Emboabas, Sedição, Bandeirantes;

FICHA TÉCNICA

Objetos de estudo
Conjunto Documental: Cartas régias, provisões, alvarás e avisos;
Notação: códice 952, vol. 14;
Datas-limite: 1703-1709;
Categoria: Ouro, Diamante na Colônia Americana;
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil;
Código do fundo: 86;
Data do documento: 07 de maio de 1703;
Local: Lisboa;

Conjunto Documental: Correspondência dos governadores do Rio de Janeiro com diversas


autoridades;
Notação: códice 84, vol. 14;
Datas-limite: 1730-1733;
Categoria: Ouro, Diamante na Colônia Americana;
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil;
Código do fundo: 86;
Data do documento: 11 de julho de 1731;
Local: Rio de Janeiro;

Conjunto Documental: Correspondência ativa e passiva dos governadores do Rio de Janeiro com a
Corte Registro original.
Notação: códice 80, vol. 03;
Datas-limite: 1729-1731;
Categoria: Ouro, Diamante na Colônia Americana;
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil;
Código do fundo: 86;
Data do documento: 26 de julho de 1730;
Local: Rio de Janeiro;

Conjunto Documental: Correspondência de governadores do Rio de Janeiro. Original e Cópia;


Notação: códice 82, vol. 02;
Datas-limite: 1728-1738;
Categoria: Ouro, Diamante na Colônia Americana;
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil;
Código do fundo: 86;
Data do documento: 12 de agosto de 1732;
Local: Lisboa;

Conjunto Documental: Inconfidência – Minas Gerais – Levante de Tiradentes;


Notação: Cod.05, vol.01;
Datas-limite: 1789 - 1789;
Categoria: Conjuração Mineira;
Título do fundo: Diversos Códices, SN-E;
Código do fundo: SN Ou NI;
Data do documento: 11 de abril de 1789;
Local: Borda do Campo, Minas Gerais;

Documentos para análise dos objetos

FURTADO, J. F. Diálogos Oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do
Império Ultramarino português. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2001.

CARRARA, A. Alves. Amoedação e oferta monetária em Minas Gerais: as Casas de Fundição e


Moeda de Vila Rica. Varia História, 2010.

Enredo, Discussão e Conclusão


Quem muito procura, acha.

Mapa do litoral da Capitânia de São Vicente. 1640.

Como citado no texto anterior do mesmo. Quando Tomé de Sousa é enviado ao Brasil para
expulsar Corsários Franceses da costa da colônia e ocupar de vez a região, o Rei D. João III lhe dá
amplos poderes para efetivar o domínio português na faixa de terra que lhe reservara de acordo com o
Tratado de Tordesilhas (1494) e efetivamente, com o Tratado de Saragoça (1529).
A partir desse período da administração do Governo Geral, as coisas na colônia ficam muito
melhores em relação à metrópole portuguesa com sua sede em Lisboa. Conforme o estabelecimento
régio elaborado pelo C. Antônio de Ataíde e transmitido a liderança para Tomé de Sousa, a colônia
pode enfim começar a pensar em extrair o tão sonhado metal precioso de sua colônia depois de
parcialmente ocupada. Com o estabelecimento de uma população europeia e ibérica majoritariamente
masculina, logo viriam os filhos deles com as mulheres nativas da colônia.
Estes, já na fase da adolescência ou início da fase adulta, vão ser incumbidos de procurarem
ouro e capturarem indígenas no interior das terras da colônia na então Capitânia de São Vicente. Já
versados na utilização de armas de fogo e espadas trazidas pelos portugueses e atentos as condições
geográficas ensinada por seus genitores, eles terão perspicácia maior no quesito detecção de terras
onde possivelmente haveria ouro. Eles, serão conhecidos na história como Bandeirantes. A questão é
que desde a expulsão dos Portugueses do Japão em 1630 pelo Xogunato, o Império Lusitano ansiava
pela descoberta de ouro ou prata em grande escala, eles só não sabiam por onde começar a procurar.
Inclusive, era tamanho o anseio dos portugueses por metais preciosos que outra disputa que
levaria séculos para ser solucionada que foi a questão da Colônia de Sacramento. Pois, através da
descida da Prata das minas de Potosí e desembarcadas no Porto de Buenos Aires se tornara alvo fácil e
perfeito para os portugueses e corsários – mas isso é outra história e quem sabe para um próximo
texto. - Sabendo disso, colocamos em nosso raciocínio que depois desses eventos, Portugal iria querer
de qualquer jeito depois de ocupada as terras da colônia encontrar os “seus” próprios metais preciosos.
Não demora muito para que boatos sobre alguns achados de pepitas em lagos do interior chegarem à
metrópole, isso logo faria as autoridades da coroa ficarem constantemente cobrando os colonos sobre
descoberta de ouro ou prata em suas terras.
Muitos historiadores defendem que o ouro já havia sido descoberto já em 1590 e virada para
1600. Porém, quem deveria ter o trabalho de alardear a descoberta possivelmente “prevaricou” e
acabou deixando bem baixo a notícia do grande achado. Depois de muito procurarem, os destemidos
bandeirantes alardearam sobre uma descoberta que iria animar a Coroa Portuguesa. A notícia que
chegara, dizia que na Cidade de Sabará próximo ao Rio das Velhas no interior da Capitânia de São
Vicente – pasmem - em 1695 fora encontrada minas de ouro. Mas antes que essa notícia pudesse
colocar fogo no palheiro, a própria corte portuguesa faria o trabalho de jogar gasolina no incêndio que
iria arder por séculos.

A Lei é Arbitrária.
Logo nos primeiros anos após a efetividade de tropas e colonos na colônia portuguesa as
primeiras normas legais tributárias foram baixadas. Alguma delas, que iremos citar aqui mais para
frente serão polêmicas e irão causar e proporcionar fúria na população. Mas por enquanto, focaremos
nas leis e não nas revoltas. Quando as Capitânias Hereditárias foram estabelecidas, o Quinto já era
uma forma de taxar os capitães donatários em troca da livre utilização da sua terra, escravização dos
povos indígenas à revelia ou arrendar tais terras para alguém em sesmaria.
Nos primeiros anos do estabelecimento desse sistema, ficou claro para a corte portuguesa que
algumas capitânias eram mais eficientes que outras. Em torno disso, o Quinto foi de suma importância
para que a coroa portuguesa conseguisse arrancar algum lucro naquele “investimento de risco”. Essas
legislações foram um grande empecilho para os colonos nos primeiros anos da sua vigência, conforme
as décadas foram passando, alguns sistemas que burlavam a tributação começaram a ser postos em
prática. Mineradores e detentores de produção agrícola já não mais viam com bons olhos tamanha
opressão fiscal em suas terras. A partir desse momento era questão de mando e de legitimidade.
O Conselho Ultramarino que era o órgão-mor antes da “canetada” final do rei, dava aval a
todos esses impostos. Esse conselho tinha o dever de analisar e julgar todas as decisões pertinentes à
colônia. Com isso, algumas leis que colonos consideravam arbitrárias eram baixadas, e outras nem
mesmo chegavam ao destino final. Independente disso, tenha em mente que embora fosse o
Absolutismo Monárquico, ainda existiam as Câmaras e Cadeias em vilas e cidades pela colônia.
Incumbidas de analisar em “primeira instância” decisões como tributação, arrendamento, posses e
outras questões legais de determinada região, levando a cabo após a decisão final – caso positiva –
para o Ouvidor, e posteriormente ao Governador da Capitânia e somente a posteriori chegando as
mãos dos Conselheiros Ultramarinos.
Devemos ressaltar que tais “vereadores” dessas câmaras eram nomeados e não eleitos por
voto. Não estamos em uma democracia. Estamos na tratativa desse texto ainda no Absolutismo
Monárquico, onde as leis draconianas são exercidas com o maior ardor e sem pudor algum. Tudo
parecia estar indo bem – na perspectiva e ótica da metrópole - Até que portugueses vindos de Lisboa e
descendentes de portugueses estabelecidos nos primeiros anos na colonização de diversas partes da
colônia começassem a questionar a posse dos Bandeirantes Paulistas sobre sua nova descoberta. Os
Bandeirantes, ao fazer a comunicação à coroa sobre a descoberta de ouro em 1695 impuseram uma
condição, que seria a descoberta de mais minas em prol de se extrair com exclusividade todo o mineral
das jazidas pagando somente o tributo do quinto. Obviamente esse acordado não foi para frente e a
coroa portuguesa iria fazer questão de suprimir qualquer insurgência por parte daqueles andarilhos,
pés descalços e acima desses, mestiços carijós1.

Guerra dos Emboabas.

1
Carijós – Termo designado à indígenas guaranis oriundos da região de São Paulo;
Não demora muito para que um conflito eclodisse no território das Minas. Bandeirantes
Paulistas apelidam aqueles que eram de fora pejorativamente como Emboabas2. Estes, questionavam e
estavam alinhados com a vontade da coroa – que era remover os bandeirantes paulistas que eram
liderados por Manuel da Borba Gato da posse das minas.
Fato é que após o anuncio feito pelos bandeirantes, houve uma corrida gigantesca de todas
as partes da colônia para o território das Minas. Com a frouxidão e pela falta de reconhecimento pelo
achado do mineral de alto valor para a Coroa Portuguesa, os bandeirantes se sentiam ressentidos e
posteriormente mais donos e posseiros do ouro do que a própria terra que o abrigara. Sendo esse o
pontapé inicial para que começasse a carnificina. Os beligerantes tinham diferenças gritantes, sendo
elas o forte aparato bélico em posse dos portugueses, por outro lado, eram os bandeirantes os grandes
conhecedores das matas. Em 1707 ocorreu o primeiro conflito já na região de Arraial Novo do Rio das
Mortes, sendo a primeira zona onde se encontrara ouro em larga escala.
Dois chefes dos bandeirantes foram linchados pelos emboabas e subsequente fogem para a
região de mata fechada. Os paulistas, que protegiam suas “posses” não se furtaram a responder a
covardia dos portugueses e forasteiros, somente fazendo o enterro dos vitimados no linchamento. Essa
atitude dos paulistas só iria por dar mais coragem aos emboabas, principalmente para aqueles que
fugiram para dentro da mata. Dando a impressão para os portugueses e forasteiros que os Paulistas
eram fracos e que nada haveriam de temer. Vila Rica que nesse período ainda estava se desenvolvendo
e próxima de se tornar a Cidade do Ouro, viu diante de seus olhos toda a barbárie. Sobretudo, o maior
combate desse conflito foi em 1708, precisamente em Cachoeira do Campo cidade próxima à antiga
Vila Rica, onde os Portugueses conseguiram expulsar ainda que com muita dificuldade alguns dos
bandeirantes. Um relato de português que estava presente neste conflito de nome Diogo de
Vasconcelos em uma de suas cartas escreve:

“Viajando por ali uns carijós para São Paulo, entraram a beber na venda de um
novato reinol; rivalidade era tema assentado de todas as conversas; os carijós
começam a falar de reinós(sic), defendidos pelo novato, pouco experiente, entre a
bebida, houve altercação, e no ardor da discussão, foi morto o português pelos
carijós. Fugiram estes pelo brejo do vale, saindo assim na lagoa Jucunem(sic), e
houve dois dias de batida para os descobrir – voltaram os do arraial, os moradores
tinham-se reunido e determinado enviar ao Rio uma comissão de procuradores e
pedir a D. Fernando Martins Mascarenhas Lencastre compadecer-se da situação e
lhes mandar autoridade para reprimir malfeitores e bandidos.”
Diogo de Vasconcelos, Relato, 1707

Neste relato, podemos observar como eram as condições de estar nesse conflito. Como
citado por Diogo, alguns índios carijós – leia-se aqui índios hostis – assassinavam portugueses como
se fossem moscas. Para a impassividade de alguns como Diogo, que não dá outro nome aos índios se
não os de bandidos e malfeitores, exclama que o governador das capitânias gerais que lhes fossem
enviados homens e suprimentos necessários para poder estar páreo diante dos inimigos paulistas.
Outra possível causa para este conflito ter eclodido foi o alto preço dos suprimentos. Sendo até mesmo
limitada por pessoa por conta do aumento da demanda. Com o aumento da circulação da prata
espanhola – sendo uma parte dela contrabandeada – houve uma inflação gigantesca na economia
colonial, já que era utilizado o lastro da moeda espanhola para negociar internamente na colônia.

2
Emboabas – Apelido pejorativo para todo ou qualquer colono não oriundo da região das Minas;
Mas nem só de vitórias viviam os Emboabas. Eles também tomavam seus prejuízos. O
mais conhecido deles seria a Traição do Capão. Logo depois de serem derrotados pelos Emboabas na
batalha de Cachoeira do Campo, alguns membros dos Paulistas aceitaram se render com a condição de
sair imediatamente dos territórios das Minas e serem anistiados, passando a impressão de fraqueza.
Devido a isso, diversos Paulistas que haviam se evadido da zona de combate se reorganizaram no alto
de um morro com aclive acentuado de pouca vegetação, porém repleto de abrigos táticos.
A intenção dos paulistas seria de fazer um cerco contra o exército emboaba e assim
exaurir toda capacidade de combate dos portugueses forasteiros. Próximo a localização deles, estava
os portugueses que marchavam em direção ao encontro dos “fujões”. Estes fujões na verdade eram a
isca que os paulistas plantaram na zona de combate e formar um verdadeiro “corta-luz” sobre os
emboabas. Para sorte de uns e azar de outros, eles morderam. Estratégia essa que funcionou,
vitimando diversos emboabas em um cerco desesperado. Tiros de bacamartes e mosquetes eram
ouvidos de cima dos montes, soldados portugueses e forasteiros caiam ao chão como folhas secas.
Nada poderiam eles fazer, se não eles próprios fugirem do cerco.
Na contemporaneidade, conheceremos tais táticas de batalha como Guerra de Guerrilha,
que notavelmente vai ficar marcado na história brasileira no episódio da Batalha dos Guararapes.
Onde índios, negros e portugueses lutaram lado a lado com paus e pedras na expulsão dos holandeses
de Pernambuco. – Embora seja uma construção, é um bom exemplo. - Somente em 1709 tal impasse
se dá por resolvido pela Junta do Rio realizada no dia 16 de janeiro do mesmo ano, com a graça e
benção do Governador da Capitânia do Rio de Janeiro, Antônio Buarque de Coelho Carvalho. Houve
por parte dos beligerantes um acordo de que os paulistas liderados por Manuel da Borba Gato não
mais retornassem as Minas e pela retirada de todos os combatentes rebeldes da região.
Neste mesmo acordo, estava estabelecido – embora quase que de mentirinha e não sendo
seguido pelos bandeirantes – que as regiões das Minas de Ouro estavam separadas das minas
existentes na região de São Paulo formulando a capitania que foi fundada em 1709. Formalmente, isso
só vai virar fronteira após os acontecimentos de 1720, com a criação formal da capitania das Minas
Gerais. Depois de serem derrotados na última batalha da guerra, precisamente na batalha de Rio das
Mortes, os paulistas com “uma mão na frente e outra atrás” fogem em direção ao interior para anos
mais tarde, serem responsáveis por mais descobertas de jazidas de ouro em Goyazes. Apesar desse
conflito passar a impressão de que a partir deste, paulistas e portugueses já não mais se entendiam e
poderiam a qualquer momento sair à guerra, não fora desta maneira. A Coroa Portuguesa ainda iria
requisitar o esforço bandeirante para muito mais do que só ouro. Os bandeirantes não perderam. Só
adiaram sua vitória.

Sedição de Vila Rica.


Embora fizesse parte do passado muitíssimo recente da população de Vila Rica, a Guerra
dos Emboabas acabou pouco menos de quinze anos mais tarde sendo página virada, tanto para as
tropas portuguesas quanto para a própria população. Talvez, em um pensamento bem rápido e levado
por um devaneio, podemos até imaginar que os soldados leais à coroa portuguesa estavam por todo o
lugar. Não é mesmo?
Até que para própria coroa isso seria vantajoso demais. Porém, estamos falando do início
do século XVIII e quem fazia as leis nesses territórios eram os apelidados de régulos/quadrilheiros.
Diríamos hoje que esses homens nada mais eram do que uma milícia formada por homens naturais da
colônia incumbidos de fazer permanecer a ordem em determinadas cidades mais afastadas. Nesse
período, como já mencionamos anteriormente neste mesmo texto, houve uma intensa migração de
pessoas de diversas partes da colônia para o território das Minas de Ouro. Ao passo de que essa
produção só crescia e remessas de ouro eram conduzidas para metrópole em Lisboa. Só que como
também mencionado neste mesmo texto, Portugal vivia levando prejuízo pelas grandes quantidades
que eram extraviadas de sua rota de entrega. O que leva uma das medidas impostas, que foi as Casas
de Fundição em 1719. Tais Casas seriam credenciadas e só seriam abertas em cidades já
predeterminada. Seguindo exemplo das cidades de Sabará, São João del-Rei e propriamente Vila Rica.
Sendo de forma absolutamente obrigatória a passagem de todo o ouro extraído das minas por essas
casas. Em outras palavras, o ouro marcado seria legal e poderia circular livremente, pois já havia
pagado o seu débito: o quinto. Talvez a essa hora, você leitor deve estar se perguntando por que toda
vez que observamos a palavra “Quinto”, é sinal de que barbaridades estarão por vir?
Não estamos enganados e nem mesmo com pressentimento equivocado, estava aqui
novamente armado mais um estopim de revolta no território das Minas, e dessa vez, seriam os próprios
habitantes locais os protagonistas. Consequentemente, o envio de soldados portugueses diretamente de
Lisboa ou das cidades “satélites” de Minas como Rio de Janeiro diretamente para Vila Rica era
inevitável. Já que devido a tanta falcatrua com o que já acontecia a muitos anos em relação ao ouro
extraído das minas que era quase tão certo quanto o barulho do trovão após o forte clarão. Com a
recente nomeação do novo governador da capitânia das Minas, o Conde de Assumar que já provocara
antipatia e aversão da população local à sua persona devido a esse deslocamento de forças militares,
começa a sistematicamente taxar os habitantes de Vila Rica de forma quase que criminosa. A chegada
da primeira leva de soldados portugueses, sinalizava que de alguma forma haveria resistência por parte
da população. Em uma carte, o conde dá algumas terminologias hostis a população mineira.

“Das Minas e seus moradores bastava dizer que é habitada de gente


intratável, sem domicílio, e ainda que está em contínuo movimento,[...] os
dias nunca amanhecem serenos. O ar é um nublado perpétuo; tudo é frio
naquele país, menos o vício, que está ardendo sempre. Eu, contudo,
reparando com mais atenção na antiga e continuada sucessão de
perturbações que nas Minas se veem, acrescentarei que a terra parece que
evapora tumultos; a água exala motins; o ouro toca desaforos; destilam
liberdades os ares; vomitam insolências as nuvens; influem desordens os
astros; o clima é tumba da paz e berço da rebelião; a natureza anda inquieta
consigo, e amotinada lá por dentro é como no inferno[...]”
Conde Pedro Miguel de Almeida e Portugal, 1720.

Logo depois, o Governador Pedro Miguel de Almeida Portugal e Vasconcelos obriga a


todos os mineradores de Vila Rica e arredores a se deslocarem de suas casas em direção às Casas de
Fundição, e custear toda burocracia do próprio bolso. Tais medidas fariam com que mais uma fagulha
de rebelião ascendesse a chama de revolta. Um protesto contra essas medidas acabara por ser
reprimido com violência por soldados leais à coroa. Embora tenham reprimido com violência, a
população ficou ainda mais enfurecida e diante das covardias e injustiças diversas, promovem mais
um levante contra a tirania e opressão portuguesa.
Tais acontecimentos fizeram os principais burgueses locais, como Manoel Mosqueira
Rosa e seus filhos e Pascoal da Silva Guimarães se juntarem a voz mais humilde de liderança do
movimento de rebelião, Filipe dos Santos. Ele, que representava a voz popular unido com uma parcela
da burguesia de Vila Rica a realizar um assalto ao Ouvidor Martinho Vieira e dar um “susto” ao
governo colonial português. Porém, as demandas da burguesia eram divergentes dos brados populares
nas ruas. Alguns burgueses que se aliaram ao movimento acabaram por si só reivindicar pautas em
causa exclusivamente própria. Uns deviam ouro, outros escravos ou até mesmo tributos acumulados
de terras com a coroa. Alguns desses, diante da anistia promovida pelo corte portuguesa e perdão de
dívidas e a manutenção de suas posses, burgueses decidiram colocar a revolta de lado, e entregar o
único humilde e vulnerável para servir de bode expiatório. Mas o Conde de Assumar não poderia fazer
“justiça” sem antes dar o exemplo. Depois de dias de revolta e a tentativa de tomar a câmara da
cidade, o Conde de Assumar fazendo sua residência no Paço da Vila do Carmo um verdadeiro Fort
Apache3, organizara sua vingança contra a população de Vila Rica. Depois de prender os líderes da
rebelião, a cidade foi tomada por todos os soldados leais para conter qualquer tipo de convulsão social.
Tropas da coroa portuguesa sob as ordens do Conde, incendiaram diversas casas, tomaram bens da
população e prendeu mais pessoas revoltosas além dos líderes. Filipe dos Santos, julgado
sumariamente e de maneira solitária como líder máximo da revolta, teve morte por enforcamento
diante de toda Vila Rica, seu corpo esquartejado por tração de quatro cavalos e exposto seus restos
mortais em praça pública. Como um verdadeiro e diabólico exemplo para o próximo que tentasse tal
empreitada. Após a Revolta de Vila Rica, a capitania de São Paulo e as Minas de Ouro serão definitiva
e formalmente separadas formando a capitania das Minas Gerais, essas duas províncias serão as mais
importantes do primeiro e segundo reinado no século XIX.

Cidade de Ladrões.
Após a Guerra dos Emboabas e com o reestabelecimento – mesmo que de modo parcial –
da ordem nas Minas Gerais e com a reintegração de posse das jazidas de ouro à coroa portuguesa, as
tributações começaram a ficar cada vez mais pesadas. Ao quinto, que já era instituído desde antes do
Governo Geral de Tomé de Sousa chegara as minas para o descontentamento dos mineradores que
eram fiéis às tropas e coroa portuguesa. Vila Rica, que fora fundada em 1711 em pouco tempo viu sua
população mais que triplicar. Era a Serra Pelada da Colônia. Embora tivesse crescido
proporcionalmente ao fluxo de ouro que saia constantemente das minas, sua população majoritária
continuava pobre e dependente de alimentos fornecido pela coroa. Devemos lembrar também que
nesse período a colônia não poderia negociar com nenhuma outra nação se não Portugal. E estamos
falando de uma Metrópole egoísta, estagnada e com diversos problemas financeiros. Muitos deles
causados por tratados que veremos mais à frente. Fato é que ainda estamos falando de um período de
penúria. Não se passara nem mesmo cinco anos do fim da Guerra dos Emboabas e a população ainda
sofria devido a inflação da moeda espanhola. Talvez, aprendendo um pouco com os Jesuítas da
Colônia de Sacramento, ou por uma lâmpada de óleo de baleia acesa na cabeça de um fundidor,
homens daquele tempo inovaram no quesito picaretagem. Em modus operandi4 muito parecido com
dos jesuítas do sul, Casas de Ourives/Fundição começaram a desviar e lavar o ouro da coroa
diretamente para seus baús de tesouros. No trecho da carta que leremos a seguir, podemos observar
como era o tamanho do desespero dos fiscais da Casa Real da Fazenda Portuguesa, e
consequentemente dos Governadores das Capitânias no momento de comparar a quantidade extraída
para a fundida:

“A El Rei pela Secretaria de Estado


Sobre a administração das Minas
Senhor,
Pela frota de Pernambuco representei a V.M. em carta de catorze do presente mês, da
qual encaminho segunda via com esta, a impossibilidade que considero para se
3
Fort Apache – Filme de 1948 produzido pela MGM. FORD. John;
4
Modus Operandi – Modo como um crime é consumado. Ato do delito evidente em ocasiões diversas
cometido pelo mesmo e/ou diversos autor/autores;
arrecadarem os reais quintos do ouro e diamantes e cada vez que me certifico mais
que será impossível em nenhum tempo arrecadar V.M. a terça parte daquele direito
real, salvo mandando administrar por conta de sua real fazenda as minas que julgar
mais conveniente, proibindo todas as mais, a fim de remediar danos públicos que
causa a desordenada ambição por ouro[...].”
Luís Vaía Monteiro, 26 de agosto de 1730

Neste trecho fica bastante evidente que argumentando contra isso, somente o maior dos
picaretas poderia sair em impunidade. Em uma tradução mais aberta e popular, o Governador da
Capitania do Rio de Janeiro, pedia ao rei para que freasse a abertura de novas jazidas de ouro. Devido
uma má arrecadação do quinto, que não era sinônimo de falta de minas, mas sim em detrimento da
excessividade de contrabando. Em um outro trecho da mesma carta podemos observar um apelo ainda
mais caloroso e gritante:

“[...]lhe comuniquei a mesma matéria por ser homem que toda a vida se criou e
trabalhou em minas, o qual concordou comigo reconhecendo que era o único meio de
uma verdadeira arrecadação dizendo que já dos Goyazes(sic), sendo minas tão novas
e sem mais conhecimento que o da única estrada que há para minas se tinha
extraviado muito ouro porque não entrava na casa de fundição em São Paulo todo o
que tinha registrado nos Goyazes(sic)[...]”
Luís Vaía Monteiro, 26 de agosto de 1730.

No ponto em específico fica claro e transparente o tamanho do rombo que a coroa


portuguesa estava sofrendo com o extravio de ouro. Luís Vaía Monteiro é textual e enfático ao dizer
que as remessas de ouro desviadas eram grandiosas demais a ponto de se comparar com toda extração
feita em uma mina tão nova quando a de Goyazes. – Leia se aqui Goiás. - Em outra carta de anos
depois, podemos também observar alguns alertas de falsificadores e salafrários que extraviavam ouro
sem lastro a caminho das casas de ourives:

“[...]Quando recebi a de vossa excelência em que me fazia aviso de demarcar nesta


capitania com as marcas de São Paulo e Minas andava eu com maior trabalho em
seguimento de Antônio Pereira de Souza que é o delinquente de tal delito: foram tão
ativas as diligências com que o apurei que estou certo haver saído desta capitânia e
nela fica preso Christovão(sic) Cordeiro de Castro um dos seus antigos sócios e na
nau de guerra remeti par a corte o padre Manoel Carneiro, convencido do mesmo
delito e seguro a vossa excelência não pararei obrar tudo o que possa conduzir ao
embaraço da extração do ouro[...]”
Gomes Freire de Andrade, 30 de setembro de 1733.

Aos nomes que aparecem neste trecho da carta de Gomes Freire são de ladrões e
contrabandistas de ouro que tocavam o terror nos comboios que desciam a estrada de Minas para
chegarem à baía de Sepetiba/Paraty ou na Guanabara vindos pelo Caminho Velho ou Caminho Novo.
Mapa atual representando os Caminhos do Ouro dos Portos à Vila Rica e Diamantina

Antônio Pereira de Souza foi um conhecido contrabandista e ladrão de sua época e que
após roubar remessas de ouro ainda sem o lastro, fugia da capitânia que cometeu o delito assim
fundindo o ouro em outro local – talvez uma casa de ourives parceira – mascarando assim o ouro
oriundo de furto. Fato é que até mesmo pessoas ligadas as Instituições Eclesiásticas estavam
cometendo delito dessa natureza, como é o caso do Padre Manoel Carneiro ou o contrabandista
Christovão Cordeiro de Castro que acabara preso em uma nau de guerra. Autoridades como Gomes
Freire de Andrade estavam convencidos de que todos agiam em conluio e que faria de tudo para cessar
os roubos. Como também mencionado na carta, devido a redobrar as atenções com estes criminosos, o
lastro no ouro já saia das respectivas capitânias, impedindo assim que o ouro tivesse um
desaparecimento mais dificultado. Vejamos agora em outra carta, dessa vez enviada pelo próprio rei.
Dessa vez, com recomendações de como deveriam ser aplicadas as penas para os delinquentes que se
aventurassem em desviar o ouro da coroa.
“Eu, El Rei, vos envio muito saudar. Por ser informado que pelas vilas da capitânia
de São Paulo há muitos ourives que fundem o ouro em pó e o convertem em cordões,
joias, e outras peças que se não quintam(sic), o que fazem pela grande utilidade que
disso lhe resulta, e ser preciso dar-se remédio a este dano; pelo que, resulta aos
quintos que tocam a minha fazenda sendo vista esta matéria em junta particular que
para este efeito e para outros pertencentes a este negócio mandei fazer. Fui servido
ordenar que os ourives que se acharem em qualquer das terras dessa capitânia não
possam reduzir a barras, nem fazer obra alguma de ouro que não for quintado; e que
fazendo paguem o nomeado valor do dito ouro e sejam degredados quatro anos para
Angola, e sendo os ourives, escravos. Os senhores deles sendo participantes, ou
cientes do descaminho, pagarão a mesma pena do nomeado e perderão o escravo
para a Fazenda Real; e para que venha a notícia de todos esta minha resolução me
pareceu ordenar-vos a mandeis publicar nas partes necessárias e façais dar a
execução pelo que vos.”
V.M. D. João V, 7 de maio de 1733.

O Terremoto e o Tratado de Methuen.


Para muitos, estes dois nomes juntos nem devem fazer ligação direta com a Colônia
Portuguesa. Mas ao contrário do que pensam, esses dois nomes e acontecimentos são intrínsecos.
Portugal e Inglaterra desde a Reconquista, formalizaram e se aliaram militar e economicamente. O
Tratado de Methuen, que para muitos tem o nome de Tratado dos Panos e Vinhos, trocava com a
Inglaterra suprimentos e materiais em troca de especiarias oriundas da Colônia Portuguesa. Firmado
em 1703 e para alguns pesquisadores e historiadores é a principal medida que vai afastar a coroa
portuguesa do fomento a indústria, este tratado foi responsável não em primeiro plano para Panos e
Vinhos, mas para Açúcar e Tabaco.
Com o passar do período e com a dominação Britânica de algumas regiões que
facilitavam a sua própria produção da monocultura açucareira e tabagista, ela mesma abriria mão do
produto português, levando à um desequilíbrio no tratado. Tendo isso em mente, leve em consideração
que Portugal não tinha indústria têxtil e seu principal produto, o vinho, ficava cada vez mais
desvalorizado, levando Portugal a contrair dívidas gigantescas adquirindo suprimentos materiais da
Inglaterra. É nesse momento que Portugal volta seus olhos para sua “galinha dos ovos de ouro” –
literalmente – a colônia portuguesa nas américas: o Brasil. Vejamos uma breve passagem do livro de
Celso Furtado no qual ele explica sobre:

“[...]Conforme veremos em detalhe em capítulos subsequentes, o acordo comercial,


celebrado com a Inglaterra em 1703, desempenhou papel básico no curso tomado
pelos acontecimentos. Esse acordo significou para Portugal renunciar a todo
desenvolvimento manufatureiro e implicou transferir para a Inglaterra o impulso
dinâmico criado pela produção aurífera no Brasil. Graças a esse acordo, entretanto,
Portugal conservou uma sólida posição política numa etapa que resultou ser
fundamental para a consolidação definitiva do território de sua colônia americana.”
Celso Furtado, A Formação Econômica do Brasil, 2007.

Notem, que até este momento não foi citado o Terremoto de Lisboa, e o laço em relação
no pescoço da colônia já ficava cada vez mais apertado por conta desse tratado que já estava em
desequilíbrio fiscal e sucessivas perdas de arrecadação. Como podemos observar anteriormente na
leitura, a rigidez com que se dava toda a fiscalização com o ouro extraído das minas gerais já era
grande, pois como vimos, Casas de Ourives sediadas Vila Rica e pelo território das Minas e São Paulo
estavam usando o ouro que seria destinado ao quinto para desviar a riqueza da coroa, burlando assim a
tributação. Observamos também que isso gerava até mesmo prisão e degradação em Angola por parte
desses criminosos. Portanto, com esse raciocínio em mente, não há de se pensar que muitos deles
acabaram por criar novos métodos de desvio. Assim que ocorre em 1755 o Grande Terremoto de
Lisboa com a destruição quase que completa da Metrópole Portuguesa, a mão do imposto baixou com
força na colônia.
Aqui vale um spoiler5. Quase todo o ouro que saiu do Brasil para quitar as dívidas do
Reino Português contraída com sua principal parceira e reconstruir Lisboa irá financiar a Primeira e a
Segunda Revolução Industrial na Inglaterra após a Lei dos Cercamentos. O Marquês de Pombal, que
era o Secretário Geral de Estado dos Negócios Interiores do Reino de Portugal desde que assumiu o
cargo em 1750 já no início do Reinado de D. José I estava por modificar toda a estrutura arcaica e
obsoleta de tributação. Em ordem expressa ao então Governador da Capitânia do Rio de Janeiro
Gomes Freire de Andrade, o 1º Conde da Bobadela, a instituir uma cotação anual da extração do ouro
já em 1751, a famigerada tributação apelidada pelos colonos de “Derrama”. Estava armado o caldeirão
da Inconfidência, ou melhor, Conjuração. Agora, a Liberdade ainda que tardia haveria de brilhar.

5
Spoiler – Algo que em histórias pode ser adiantado, informações adicionais;
A última cartada, era tudo ou nada.
Como podemos ler ao longo de todo texto, não faltou disposição do povo mineiro em se
rebelar contra a tirania da coroa portuguesa. Só que antes, o que poderia ser só revoltas promovidas
por muita baderna e quebra-quebra e/ou protestos pedindo pela modificação de leis arbitrárias para
ótica da população já não estavam mais fazendo parte das ideias dos homens desta citada revolta.
Quando as minas foram descobertas por volta de 1695, logo foram baixadas as normativas legais para
extração de ouro. Em outras palavras, chegara os impostos. Mas após sucessivas e diversas rebeliões
nesse período e na virada para 1700 e anos que se seguiram desembarca nas minas uma ideia, uma
corrente, uma coisa que estava transformando o velho continente. Era o Iluminismo.
O Iluminismo era uma forma que pensadores e filósofos estavam moldando para livrar o
continente europeu das garras do Absolutismo Monárquico, promovendo a separação de Estado e
Igreja. E com exemplo claríssimo de Montesquieu da separação do Estado em Três Poderes. Era o
embrião da República no raiar do horizonte. E que Belo Horizonte. Homens ao longo de anos de
repressão portuguesa nas minas acabaram por criar apatia pelas tropas e leis portuguesa. Conforme
demonstrado ao longo de todo o texto, não faltaram artimanhas, falcatruas, engenharias e picaretagens
por parte de uma parcela da burguesia e população sobre a taxação do quinto e outros tributos. Estes
mesmos, aprenderam a ler e escrever. Contrabandeavam além de ouro, livros iluministas. Fazendo a
cabeça daqueles mesmos homens que já há muito estavam fartos da violência e da perseguição
sistemática aos mineiros.
Como já citado acima em carta, no reinado anterior estava estipulado que as atividades
fabris com ouro, como confecção de joias e obras de arte sem que tivesse passado pela tributação
necessária estavam proibidas. Ou seja, para que fosse liberada tal atividade, era requisitado que o ouro
fosse taxado, caso contrário o indivíduo seria preso. Fato é que quando se dá a transição no trono
português em 1777 essa lei que proibia a confecção de obras de arte com ouro não é abolida. Deixando
os “súditos” coloniais mineradores insatisfeitos. E para fins de esclarecimento, nenhum tributo foi
retirado, fora acrescentado. Outra ocasião para a queda de arrecadação das minas era que nenhuma
delas seriam eternas e estariam fadadas a um dia terem seu fim. Autoridades portuguesas estavam
longe de compreender tal tipo de argumentação. Achando que, por este motivo citado acima – como os
desvios de ouro das Casas de Fundição – a coroa teria ainda mais impostos a baixar e ainda com mais
pressão sobre os colonos.
Não seria diferente, como também exemplado acima no texto, não faltaram modos para
que fossem desviados ouro para os cofres particulares, mas as minas estavam acabando e achando este
que seria o fim do problema de arrecadação, a Casa Real de Fazenda decide abolir as Casas de
Fundição com alvará do Reino Português e instituir uma cobrança por pessoa. E ainda, avaliando esse
quantitativo sobre sua quantidade de escravos. Ao assumir a capitânia das Minas Gerais em 1783 o D.
Luís da Cunha Meneses que era notável por sua coerção e violência por onde passava, fazia todas as
normas serem seguidas à risca, ou seja, uma quantidade mínima de mil arrobas de ouro para cada
pessoa. Caso contrário, as coisas para o povo mineiro não ficariam nada bem. Pois seria decretada a
Derrama coletiva, havendo uma parcela de toda a população pagar o prejuízo.
Como foi de se esperar, até um período a cota era cumprida exemplarmente. Mas como
argumentado anteriormente, as minas estavam chegando ao seu fim. Levando os mineradores e
burgueses derivados do mesmo ramo de extração ficassem a penúria, e ter que arcar com derramas
coletivas. Essa medida – que por volta do ano de 1788 especulava-se que seria cumprida - deixava os
burgueses auríferos em pânico, e propensos a pensar em qualquer coisa antes de ver seu prezado nome
na lama ou na rua da amargura. Causando bastante ultraje e pânico na população e na elite burguesa
aurífera da região, homens como dito acima, planejam um motim. Um motim diferente, este se
vingasse, separaria o território das minas de todo o resto da colônia. Instituindo uma república mineira
com ideais iluministas. Faltava a união destes burgueses, militares e o povo. Entre os conspiradores
que ocupavam diversos cargos públicos e sociais como padres, literários, mineradores, comerciantes,
burgueses e militares estava o alferes Joaquim José da Silva Xavier. Joaquim, era militar de carreira, e
viu diante de seus olhos, filhos da fidalguia passando a sua frente na hierarquia militar. (Guia P.
Incorreto da H. do Brasil. 2011). Todos estes, se reuniam as escondidas para tramar contra coroa
portuguesa, no que discutiam leis e até mesmo se deveriam ou não abolir a escravidão nas minas. É em
uma dessas reuniões que os líderes da conspiração formulam o lema da revolução Libertas Quae Sera
Tamen6.
Mais um homem entre eles agiria para se tornar o “décimo terceiro discípulo” da
revolução. Joaquim Silvério dos Reis trairia o movimento antes mesmo dele se quer eclodir para as
vias de fato. Com a nomeação real do novo governador geral das minas Luís Antônio Furtado de
Castro, o Visconde de Barbacena, fora enviado para cumprir aquilo que todos temiam: a Derrama.
Com esperança de que com a decretação da mesma o povo iria as ruas e setores militares se
sublevariam o movimento estaria pronto para ir junto deles abolir toda a tirania imposta por quase 100
anos na região das Minas. Silvério dos Reis não deixaria nem mesmo que os lideres fossem avisar a
todos de que a revolução estava sendo posta em prática. Em carta denuncia, ele comunica
expressamente ao Visconde de Barbacena a seguinte mensagem:

“Iluminado. e Excelentíssimo Senhor Visconde de Barbacena.


Meu Senhor. pela forçosa(sic) obrigação que tenho de ser leal vassalo a vossa
Augusta Soberana ainda apesar de se me tirar a vida como logo se me protestou, na
ocasião em que fui convidado para a sublevação que se ententa(sic) e prontamente
passei a por na presença de V. Ex. com o segt. Em o mês de fevereiro deste presente
ano. Vindo da Paulista do meu Regimento encontrei no Arraial da Lage. o Senhor M.
Luís Vas de Tuledo, e falando me em que se botavão(sic) abaixo os Novos Regimentos
porque V. Ex. como assim o havia dito, é verdade que eu me mostrei sentido e
queixei-me de S. M. me tinha enganado, porque em nome da d.ª Snr.ª se me havia
dado. Uma Patente de Coronel Xefe(sic) do meu Regimento com o qual me tinha
desvelado em o regular e fardar muita parte a minha custa, e que não podia levar a
paciencia(sic) ver reduzido à uma inação todo o fruto do meu disvelo(sic), sem que eu
tivesse faltas do real serviço e juntando mais algumas palavras em desafogo da minha
paixão[...]”
Joaquim Silvério dos Reis, 11 de abril de 1789.

Silvério dos Reis, agindo em causa própria, entrega todos os líderes para ter suas dívidas
perdoadas pela coroa portuguesa. Todos os líderes do movimento foram presos. Porém, somente
Joaquim José da Silva Xavier seria condenado a pena capital. D. Maria I, considerada por alguns como
“piedosa” e “louca” para outros, decretou que se enforcassem Joaquim, e depois de esquartejarem seu
corpo que cada membro fosse exposto nas vias das Minas. Piedosa, pois perdoou alguns dos líderes da
revolução. Estes perdoados, seriam muito mais perigosos a ordem e o domínio da coroa portuguesa do
que o Alferes. Mas em nossa historiografia, D. Maria I a Louca que já estava doente, decidiu por si só,
sem levar em consideração as argumentativas dos Ouvidores de punir somente Joaquim pôs o mesmo
assumira toda a responsabilidade e ser o líder máximo da revolução. A última cartada no jogo de poker
de poder foi em vão, o domínio português permanecera. A próxima vez que o Brasil teria algum tipo
de insurreição ainda que fosse de cunho Republicano será na Conjuração Baiana em 1798, na
6
Libertas Quae Sera Tamen – Frase em latim, tradução para o português: Liberdade ainda que tardia;
Revolução Pernambucana em 1817 e a Confederação do Equador no ano de 1824, a Republica só viria
tardiamente em 1889. Todos estes tombaram em berço esplêndido bravamente como heróis.

Considerações Finais.
Após toda essa cronologia de eventos no território das Minas Gerais, fica claro que toda sua
ocupação e desenvolvimento está ligada diretamente com o Ciclo do Ouro. Vila Rica jamais seria uma
cidade mineradora se não fosse suas minas de ouro e diamantes. O Vale do Paraíba ainda nem sonhava
em se tornar o que se tornou nos anos de 1820. Somente o ouro poderia fazer o território das minas
nesse período tão fervente e tão rica. Não é à toa que ao andarmos pela atual Ouro Preto, tudo parece
estar intocado. A cidade é repleta de artes sacras desse período, Igrejas Barrocas ainda do início dos
anos 1700 e repletas de ouro. A riqueza da antiga Vila Rica ultrapassa as barreiras do tempo,
impressionando até hoje. Todas essas rebeliões tinham causa e endereço, todas elas eram contra a
tirania e atuação covarde da Corte Portuguesa que explorava e lucrava em cima dos mineradores de
Vila Rica. Após a Guerra dos Emboabas, a coroa teria a ficar ainda mais violenta. O sistema de
tributação da coroa no período retratado neste texto está ligado diretamente com essas revoltas. Como
por exemplo a Sedição de Vila Rica, que através de tributações excessivas houve por parte da
população e da burguesia um levante desorganizado. Na avaliação da burguesia envolvida nesses
períodos, fica muito claro que eles nada queriam conceder em benefício dos mais pobres. Vide que
todas essas revoltas como a Sedição de Vila Rica e a Conjuração Mineira foram traídas por setores da
burguesia local em causa própria. Dificilmente se caso o levante das Minas em 1789 tivesse dado certo
a escravidão seria abolida das Minas. Pois já estava se formulando aquilo que no período do Séc. XIX
chamaríamos de Sociedade e Economia Escravista. Dificilmente teríamos uma república autônoma em
uma região cercada pelo Absolutismo Monárquico. O sonho era uma utopia e natimorto. Conquistar a
Independência custaria caro, até mesmo no que diz respeito a ouro. Pois mesmo depois de extrair ouro
durante toda a colonização, Portugal ainda exigiria uma quantidade de ouro para aceitar a separação da
colônia de seu reino em 29 de agosto de 1825. Tudo girou em torno do ouro. A Liberdade é Dourada.
E assim terminamos esse texto com citação do grande Silas de Oliveira. “Já raiou a Liberdade, a
Liberdade já raiou. Essa brisa, que a juventude afaga essa chama, que o ódio não apaga pelo
universo. É a Revolução, em sua legitima razão”.
Referências Bibliográficas Complementares

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em: https://multirio.rio.rj.gov.br/index.php/historia-do-brasil/america-portuguesa/8779-introdu
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FONSECA, Gustavo. Histórias do Brasil – Atividade Mineradora. Editora. MultiRio. Disponível


em: https://multirio.rio.rj.gov.br/index.php/historia-do-brasil/america-portuguesa/8781-as-
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MANITTI, José. Carta Denuncia de Silvério dos Reis. Editora. Novo Milênio. Disponível em:
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CARRARA, Ângelo. Impostos, Contrabando e Revoltas. Editora. NI. Disponível em:


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GOUVEIA, Viviane. Conjuração Mineira. Editora. NI. Disponível em:


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FURTADO, Celso. A Formação Econômica do Brasil. Editora. Companhia das Letras. (2007)
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NARLOCH, Leandro. Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil. Editora. Leya. (2011).
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incorreto-da-historia-do-Brasil-by-Leandro-Narloch-z-lib.org_.epub_.pdf Acesso em: 08/12/2022.

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