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Segundo decisão que acolheu a representação pela prisão temporária subscrita pelo
Delegado de Polícia Civil competente (docs. anexos), no dia 07 de março de 2024, a Investigada, ora
Paciente, seria suspeita de ter praticado o crime de homicídio qualificado.
Ocorre Excelência, conforme será devidamente explanado a seguir, embora grave o crime
imputado a Investigada, ora Paciente, vale observar que os motivos que outrora fundamentaram a
decretação da medida extrema não persistem, revelando a desnecessidade da manutenção dessa
custódia cautelar.
Como também é fato notório, tão logo teve conhecimento que estava sendo investigada
acerca do fato e que havia um mandado de prisão expedido em seu desfavor, procurou ter acesso
ao inquérito no intuito de cumprir sua função e dever legal.
Dentre esses fatos trazidos em profusão, chamou a atenção o relato de uma única
testemunha que cita o nome da Paciente, mas não afirma em momento algum que a mesma foi
autora ou esteve presente na hora dos disparos.
Verifica-se também que esses mesmos fundamentos iniciais são em demasia temerários,
pois que não restaram devidamente confirmadas as informações existentes quanto à investigada
suposta participação da Paciente no crime de homicídio em apuração.
Diante desses fatos, entendemos, com a devida vênia, que a prisão cautelar ora contestada
revela-se completamente excessiva e desnecessária, constituindo verdadeiro constrangimento
ilegal em face da ausência de fundamentação concreta sobre sua necessidade, que figura como
verdadeira antecipação de pena ainda nem aplicada, bem como pela individualização da
personalidade do Investigada, ora Paciente, resta suficientemente necessária e adequada ao fim a
que se destina a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, exclusivamente para garantir o
acautelamento do devido processo legal, senão vejamos:
2. DO DIREITO
É o direito da Paciente ter relaxada a prisão ilegal decretada contra si, garantia esta
prevista constitucionalmente (art. 5º. LXV, CF/88):
“Art. 5º. (...) LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela
autoridade judiciária;”
Com efeito, Nobre Magistrado, é necessário analisar o disposto no art. 1º, inciso III, alínea
“a”, da Lei 7960/89, senão vejamos:
Art. 1º. Caberá prisão temporária: (...) III - quando houver fundadas
razões de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de
autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio
doloso (art. 121, caput e seu § 2º);
Conforme se verifica dos autos, não é possível atribuir com responsabilidade a coautoria
ou participação na morte da vítima a Investigada MARLÚCIA ALVES DOS SANTOS, pois na
verdade, mesmo estando no local em que ocorreu o homicídio, não foi vista praticando nenhum
fato delituoso, pelo que entendemos estar eivada de ilegalidade a decretação da prisão temporária
em seu desfavor, especialmente pela ausência do requisito previsto no art. 1º, inciso III, alínea “a”,
da Lei 7960/89, portanto, merece ser relaxada a referida medida ergastulatória cautelar.
Como é sabido, nossa Constituição Federal prevê que a prisão ilegal será imediatamente
relaxada pela autoridade judiciária, consoante os dizeres do art. 5°, inciso LXV. O referido preceito
constitucional é de eficácia plena e imediata, devendo o Juiz ao verificar que a prisão é ilegal, de
imediato mandar soltar o acusado, sendo dispensável inclusive parecer do Ministério Público.
Excelência, a prisão cautelar é medida extrema, que não se justifica no presente caso,
merecendo a liberdade ser concedida a Paciente porque estão ausentes os requisitos para prisão
temporária (Lei 7960/89).
Consoante o disposto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 7960/89, caberá a prisão temporária
quando imprescindível para as investigações do inquérito policial. Assim sendo, pressuposto
básico é a indispensabilidade para o inquérito policial, para se falar na possibilidade legal da
decretação de prisão temporária.
Ainda que Vossa Excelência não entenda pela ilegalidade da prisão e consequente
relaxamento, verifica-se ainda, quanto à utilidade e necessidade da medida, que não estão mais
presentes os motivos que outrora teriam justificado a decretação da prisão temporária da
Investigada.
Nesse sentido:
É importante salientar que a Paciente é genitora do Mario Lucky dos Santos Brito,
nascido em 23 de abril de 2015, atualmente com nove anos de idade e João Gabriel Alves da
Costa, nascido em 22 de janeiro de 2009, atualmente com quinze anos de idade e conforme laudo
médico acostado aos autos, portador AUTISMO - CID: F84.0, TRANSTORNO
DESAFIADOR/OPOSITOR - CID: F91.3, TRANSTORNO DE HUMOR – CID: F39.
A Paciente tem em seu favor ainda a condição de viver em um ambiente familiar e social
saudável, pautado em ensinamentos religiosos, sendo frequentador assíduo dos cultos semanais
juntamente com a sua família.
O mandado de prisão causou surpresa no meio social em que vive, pois é conhecida como
pessoa de bem e de reputação imaculada por todos, e devastou a sua família por inteira,
principalmente seus filhos, que a admiram e possuem forte vínculo de dependência financeira e
emocional.
Vale notar, o Paciente faz jus a sua liberdade cumulada com aplicação de medida cautelar
diversa da prisão, posto que não existem motivos que demonstre a necessidade imperiosa da
medida extrema, bastando a aplicação de outra medida cautelar diversa para a finalidade do
instituto, qual seja, a garantia da investigação que servirá de base do futuro processo e obediência
às suas regras democráticas.
Na mesma linha, cumpre observar que, caso seja posta em liberdade, a Paciente não
acarretará qualquer embaraço para a solução do presente feito e nem pretende se evadir do
distrito da culpa ou mesmo intimidar eventuais testemunhas, e muito menos cometer qualquer
delito, pretende sim, e tão somente, responder ao processo em liberdade como lhe é de direito,
inclusive submetido a outra medida cautelar, vez que, no presente caso, a prisão temporária
revela-se totalmente excessiva, pois incabível e desnecessária ao fim a que se destina.
Com a devida vênia, cumpre observar que a respeitável decisão que decretou a prisão
temporária da Investigada/Paciente carece de fundamentação concreta quanto à necessidade da
manutenção da medida, bem como carece de proporcionalidade e adequação, fazendo mera
menção aos dispositivos legais e supostas considerações sobre os fatos, sem de fato amoldá-los
individualmente a elementos firmes de convicção.
Excelência, atente-se não caber a esse Tribunal fundamentar, em sede de Habeas Corpus
não originário, a decretação da prisão temporária, mas sim analisar, tão somente, se houve ou não
a devida fundamentação na decisão proferida pelo Juízo a quo, sob pena de odiosa supressão de
instância.
Esta ressalva, faz-se necessária, pois não é incomum, muito pelo contrário, encontrarmos
em processos como tais, verdadeiras decisões que, a propósito de denegarem a ordem, substituem
o Juízo de 1º. grau, decretando fundamentadamente a prisão temporária, subvertendo de forma
absurda uma garantia constitucional da liberdade de locomoção. Em outras palavras: o Habeas
Corpus passa a ser uma garantia constitucional para se prender (!) e não para se analisar a
constitucionalidade de uma decisão de 1º. Grau não fundamentada.
Ora Excelência, em que pese as condições subjetivas favoráveis da Paciente, por si só, não
ser garantidora da concessão de liberdade provisória, tal entendimento somente pode ser aceito
quando devidamente demonstrada a presença concreta dos requisitos que autorizam a prisão
temporária, o que não ocorre no caso em apreço.
Risco maior verifica-se do envio desta cidadã a qualquer das unidades prisionais do
Estado, pois além de não garantir sequer a integridade física e psicológica dos custodiados, servem
apenas de depósito humano e antro de aprendizado do crime e transformação de uma pessoa que
eventualmente cometeu um erro isolado na vida, em um criminoso verdadeiramente contumaz e
perigoso.
Aliás, nesse sentido, é a mens legis disposta no art. 321, do Código de Processo Penal, ora
interpretado analogicamente:
Diante desta análise, como não há risco para a investigação policial, nem para eventual
futura instrução processual penal, tampouco para a futura aplicação da lei penal, tampouco para
a garantia da ordem pública ou da ordem econômica, deve a Paciente responder em liberdade à
imputação que lhe é feita, principalmente porque os cidadãos têm em seu favor o PRINCÍPIO
DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA esculpido na Constituição Federal de 1988.
Logo, nos termos da legislação positiva em vigor, a Paciente faz jus ao restabelecimento
da liberdade, para que desta forma acompanhe o desenrolar da controvérsia penal em pleno
gozo da sua liberdade, já que esta é a regra no estado democrático de direitos, sendo a prisão
cautelar uma exceção, não aplicável ao presente caso.
O art. 282 do Código de Processo Penal, com a modificação dada pela Lei 12.403/11, passou
a uma nova ótica, pois, somente em último caso, a medida extrema (prisão) é aplicada, e somente
quando não cabível a aplicação das medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP.
Ora, Excelência, neste último parágrafo, verifica-se que a própria norma determina que, a
prisão preventiva só será decretada quando não cabível a substituição por outra medida cautelar,
pelo que interpreta-se extensivamente à prisão temporária, o que não ocorre no presente caso.
Cuida-se o presente para requerer à Vossa Excelência que se digne em impor tão somente
medida cautelar diversa da prisão (art. 319, CPP), na forma do artigo 282, §2º, do Código de
Processo Penal, vindo, primeiramente, a não restringir diretamente a liberdade de locomoção da
Paciente, implicando na não decretação da sua custódia cautelar sem a devida motivação e
necessidade, como já explanado acima, e na consequente concessão da liberdade para que possa
responder à investigação e futuro processo em liberdade, como lhe é de direito.
Como autorizado pelos artigos 282, § 4° e 312, parágrafo único, do Código de Processo
Penal, somente com o descumprimento da medida cautelar diversa da prisão imposta, deve o Juiz
decidir pela segregação cautelar da liberdade.
Outro não é o posicionamento do STJ que, ante a falta de comprovação válida e
consubstanciada do periculum in mora, entende que não se justifica a manutenção da prisão
processual (6ª T., HC 5.247/RJ, rel. Min. Willian Patterson, j. 16-12-1996, v.u., DJU, 4 ago. 1997, p.
34886).
Dessa forma, nos termos da legislação pátria em vigor, imperiosa a concessão da liberdade
à Paciente a fim de resguardar seu direito Constitucional subjetivo de colaborar com a investigação
ou eventual ação penal em liberdade, pois, repita-se, a mesma não causará qualquer embaraço e
empenhará esforços para colaborar na elucidação do ocorrido que testemunhou.
Ora, não há motivos autorizadores para a decretação da custódia cautelar, vez que assiste à
investigada, por suas condições objetivas e subjetivas, o direito de responder ao inquérito e futuro
processo em liberdade provisória vinculada, sem ônus, vez que os pressupostos constantes nos
artigos 323 e seguintes do CPP (Redação Alterada Pela Lei Federal nº 12.403/2011) militam
favoravelmente ao seu favor, não se olvidando da regra inserta no art. 5º, inciso LXVI, da
Constituição da República.
Tecendo comentários acerca do art. 282, II, CPP, Guilherme de Souza Nucci leciona:
“Quanto aos requisitos de adequabilidade, o primeiro deles concerne à
gravidade do delito. É preciso avaliá-la concretamente (....) Deve-se
avaliar a gravidade real da infração, podendo-se decretar – ou não –
medidas cautelares em crimes como roubo, extorsão, homicídio, etc.
Aliás, se tais delitos atentarem diretamente contra a segurança pública
(garantia da ordem pública), cabe a prisão preventiva e não medidas
cautelares alternativas. (...) As condições pessoais do indiciado ou
acusado são as inerentes ao modo de ser do indivíduo ou as qualidades
jungidas à pessoa humana, tais como menoridade relativa (menos de 21
anos) ou senilidade (maior de 70 anos), primariedade ou reincidência,
bons ou maus antecedentes, personalidade, conduta social, dentre outros.
Nota-se, neste quesito, a mais apegada comparação à individualização a
pena, considerada, para fins processuais, como individualização da
medida cautelar.” – grifei.
Tecendo comentários acerca dos critérios para a escolha e decretação das medidas
cautelares restritivas, Renato Marcão leciona:
O disposto nos arts. 317 usque 319, CPP, não é uma imposição legal, mas sim faculdade do
magistrado quando considerar pertinente e suficiente aquela substituição, haja vista que só pode
ser concedida quando favoráveis ao agente suas condições pessoais e as circunstâncias em que se
deram o crime a ele imputado, conforme ocorre no caso. Portanto, a melhor solução é a concessão
do presente pleito para que a Paciente possa responder ao inquérito e futuro processo em
liberdade, sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, conforme lhe
permite a lei.
De outra sorte, conforme consta da decisão ora guerreada, de forma até cautelosa pontuou
a necessidade de observação pela autoridade policial das exigências da Lei nº 7.960/89, quanto aos
direitos dos presos.
Ante o exposto, requer-se a concessão da ordem de habeas corpus ora impetrada, para
substituir a custódia temporária do Paciente por outra medida cautelar, caso não se entenda pela
expedição de alvará de soltura em razão da ausência de fundamentação idônea e de necessidade
do decreto prisional.
Ainda que inexista previsão legal de concessão de medida liminar em habeas corpus, tal
prática vem sendo reiteradamente admitida pelos tribunais pátrios, desde que configurados o
fumus boni iuris e o periculum in mora.
Com efeito, há fumus boni iuris, pois o direito subjetivo da Paciente à liberdade está sob
patente violação, demonstrando, assim, a verossimilhança do alegado. Quanto ao periculum in
mora, se a medida liminar não for concedida, haverá prejuízo para a Paciente, pois estará
privada de sua liberdade de ir e vir mediante evidente constrangimento ilegal que merece
imediata cessação, bem como, sujeito à condenação social.
Ora, Excelência, está claro que o caso da Paciente não se enquadra em qualquer dos
requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não sendo legalmente permitida a decretação
de sua prisão preventiva, que merece ser imediatamente revogada.
Por fim, a decisão atacada é nitidamente abstrata, descrevendo as questões legais atinentes
ao instituto da prisão sem apontar, como haveria de ser, as circunstâncias do caso concreto que
tornassem imperiosa a segregação cautelar.
Inclusive, nada impede que, caso descumpridas as medidas cautelares impostas, o juízo a
quo determine novamente a prisão da Paciente, conforme autoriza o parágrafo único do artigo 312
do Código de Processo Penal.
3. DO PEDIDO
Nesses termos,
Pede deferimento.