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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL

UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DO PARÁ


INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM LETRAS
MESTRADO ACADÊMICO EM LETRAS

A análise do discurso como aporte teórico-metodológico


para investigar as crenças e estados afetivos de uma pré-
professora de língua inglesa na Amazônia.

Trabalho apresentado ao Programa de Pós-


graduação em Letras – PPGL – da Universidade
Federal do Oeste do Pará – UFOPA, como
requisito para avaliação parcial da Disciplina
Teorias Linguísticas: implicações para a pesquisa
na Amazônia, sob a regência da Profª Drª Ediene
Pena Ferreira.

Acadêmica: Rosicléia Pereira de Sousa

SANTARÉM – PA
2022
A análise do discurso como aporte teórico-metodológico para investigar as
crenças e estados afetivos de uma pré-professora de língua inglesa na
Amazônia.

O presente texto tem o intento de expor e justificar o uso da abordagem


linguística Análise do Discurso, doravante citada como AD, que dará base teórico-
metodológica para o desenvolvimento da pesquisa identificada, provisoriamente,
como: Crenças e estados afetivos de um pré-professor de língua inglesa da
Amazônia: um discurso em análise. Embora se saiba que não se trate de uma
metodologia em si, também é sabido que a teoria contém em seu bojo uma
metodologia, da qual pretende-se lançar mão para a análise dos dados gerados por
meio de pesquisa narrativa.
O objetivo da pretensa pesquisa acima citada é investigar como as crenças
e estados afetivos desse professor em pré-serviço, externalizadas em seu discurso,
orientam a construção das perspectivas de atuação docente em contexto escolar
amazônico. Aponta-se aqui a abordagem AD por entender que não se coletará
dados oriundos da interação professor x aluno em sala de aula, hipótese em que a
abordagem sociolinguística seria mais adequada, mas sim por meio de narrativas
geradas por entrevistas recorrentes e gravações de relatos de história de vida.
Assim, esse trabalho procura, nos textos produzidos pelo próprio sujeito objeto da
pesquisa, por discursos que possam influenciar na construção do perfil do professor
em formação, quanto aos aspectos de crenças e estados afetivos relativos a sua
futura prática docente enquanto professor de língua inglesa.
Com o estudo do discurso, observa-se o homem falando, e procura-se
compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico. E o
discurso consiste em utilização da língua por um sujeito em certas
condições de produção; é o lugar em que se pode observar a relação língua
e ideologia, compreendendo-se como a língua produz sentidos por / para
sujeitos. (BARROS, 2004)

A busca por presença de vozes de outros nos textos produzidos pela pré-
professora selecionada procurará entender os sentidos construídos nele a partir
dessa polifonia. Quais as vozes presentes nele? Elas lhe trouxeram crenças,
ensinaram sentimentos? Que sentimentos a iminente atuação docente lhe evoca?
Qual o contexto de produção dos dados? Qual a sua história de vida? Quais
ideologias estão presentes nela? A perspectiva de atuação da professora tem um
caráter ainda voltado para um ensino colonial? Ou há tendência a práticas docentes
decoloniais? São alguns questionamentos que espera-se serem respondidos no
decorrer da pesquisa com o auxílio da corrente de estudos linguísticos Análise do
discurso.
Os corpora analisados serão gerados a partir de instrumentais como a
narrativa escrita da história de vida do sujeito da pesquisa; gravações orais para a
geração de dados mais fiéis quanto ao levantamento de aspectos afetivos. E, após
prévia análise de dados, lançar mão de entrevistas recorrentes para afunilar e
lapidar com fidedignidade os dados apurados.

A análise do discurso. É por intermédio do filósofo Michel Pecheux e do linguista


Jean Dubois que nasce a Análise do Discurso. Nessa abordagem de estudos
linguísticos, trabalha-se os conceitos marxistas de infraestrutura/superestrutura;
Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE), Aparelho Repressivo do Estado (ARE) em:
Ideologia e aparelhos ideológicos do estado do filósofo Althusser (1970) à procura
de investigar o que direciona as condições de reprodução social. Para ele, a
linguagem se apresenta como lugar privilegiado em que a ideologia se materializa
(MUSSALIM, 2001, p. 104). É a teoria do discurso que abraça a missão de convergir
estruturas linguísticas e socioideológicas para entender o funcionamento da
ideologia a partir de sua materialidade - o discurso.
Outro importante elemento que contribuiu para o desenvolvimento da teoria
da AD foi a Psicanálise. Para Lacan “a linguagem é condição do inconsciente”, lugar
de onde emana o discurso do Outro que ocupa um lugar de domínio com relação ao
sujeito, que, por sua vez, se define através da palavra desse Outro (MUSSALIM,
2001).
Segundo Maingueneau (1997, apud MUSSALIM, 2001) a Linguística é
definida em dois campos: o núcleo rígido, que se ocuparia do conjunto de regras e
propriedades formais da língua, e a região de contornos instáveis, que considera a
língua em seu funcionamento, em seu processo de produção interacional, histórico e
cultural. Nessa área instável que se encontra a Análise do Discurso.
Há duas vertentes da Análise do discurso: a Análise do Discurso Francesa,
que privilegia o contato com a História, e a Análise do Discurso Americana, que
privilegia o contato com a Sociologia. Privilegia-se para essa pesquisa as ideias
desenvolvidas na modalidade francesa, por considerar aqui o condicionamento
inconsciente do sujeito como determinante para a identificação dos estados afetivos
e crenças fomentados por discursos ideológicos presentes na fala do sujeito.

Assim, o que diferencia a Análise do Discurso de origem francesa da


Análise do Discurso anglo-saxã, ou comumente chamada de americana, é
que esta última considera a intenção dos sujeitos numa interação verbal
como um dos pilares que a sustenta, enquanto a Análise do Discurso
francesa não considera como determinante essa intenção do sujeito;
considera que esses sujeitos são condicionados por uma determinada
ideologia que predetermina o que poderão ou não dizer em determinadas
conjunturas histórico-sociais. Essa é, entre outras, uma das diferenças
teóricas entre as duas linhas (MUSSALIM, 2001, p. 113).

No livro intitulado “A Invenção da Amazônia” (GONDIM, 2007), a autora


faz análises críticas dos relatos das cartas dos viajantes que inventaram um
Amazônia para corresponder ao interesses europeus do momento das grandes
navegações. Legitimaram a invasão e escravidão dos habitantes quando os
julgaram como preguiçosos e inábeis para gerir suas riquezas, bestas que
precisavam ser salvas pelo gentil povo europeu. Os desaculturalizaram, afinal eram
“homens que em estado de natureza não tinham ainda ascendido ao estado de
sociedade”. Quanto dessa ideologia inventada pelo europeu ainda perdura nos
discursos atuais? A Amazônia é o território construído mediante nossos atos de
fazer e falar, mas quem está legitimado para discursar? Ou ainda: quem tem
“autoridade” para falar e ecoar, e por quê? (VIEIRA, 2013).
Levando em consideração o objetivo da pesquisa, a teoria da análise do
discurso deverá ajudar a encontrar quem está falando dentro do discurso de nossos
futuros professores. A quem estão servindo? Há indícios de que a ideologia
inventada a respeito do povo da Amazônia, ainda perdura. De acordo com o trabalho
de GIL e SOUZA, 2016, levantou-se a seguinte relação de estados afetivos
relatados pelos professores de língua inglesa: "frustrado", "vazio", "lacuna",
"incompetente", "vergonha", "excluído", "perdido" e "inseguro". Nota-se assim que a
imagem inventada pelo europeu a respeito do amazônida, talvez ainda esteja
perdurando nos discursos de inferioridade reproduzidos.
Os estudos discursivos não separam forma e conteúdo, pois, para tais
estudos, a língua não só é percebida como uma estrutura, mas sobretudo como um
acontecimento. Assim, soma-se a estrutura ao acontecimento, resultando na forma
material vista como acontecimento do significante (língua) em um sujeito afetado
pela história (BARROS, 2004, p. 1720). Identificar como essa história construiu e
disseminou crenças e estados afetivos que de alguma forma puderam influenciar na
formação e na perspectiva de atuação de nossos professores como sujeito afetados
dessa história, pode ajudar a entender onde atuar para a melhoria do ensino de
língua inglesa nas escolas públicas na Amazônia.

REFERÊNCIAS:

CUNHA, Maria Angélica Furtado da. BISPO, Edivaldo Baduino; SILVA, José
Romerito. Linguística Funcional Centrada No Uso: Conceitos Básicos e
Categorias Analíticas. IN Linguística centrada no Uso: uma homenagem a Mario
Martellota. MARIA MAURO CEZÁREO E MARIA ANGÉLICA FURTADO DA CUNHA
(ORGs). 1. Ed. – Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2013.

MUSSALIM, Fernanda. Análise do discurso. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES,


Anna Christina (orgs.). Introdução à linguística: fundamentos epistemológicos. Vol.2.
São Paulo: Cortez, 2001, p 165-218.

NEVES, Maria Helena de Moura Alfa. Uma Visão Geral da Gramática Funcional.
Alfa São Paulo, 38: 109-127, 1994.

PEZATTI, Erotilde Goreti. O Funcionalismo em Linguística. In: MUSSALIM,


Fernanda; BENTES, Anna Christina (orgs.). Introdução à linguística: fundamentos
epistemológicos. Vol.3. São Paulo: Cortez, 2004, p 165-218.

SOUZA, Francisco Elton Martins de. Teorias Linguísticas e suas concepções de


Gramática: Alcances e Limites. IN LINGUAGEM EM FOCO. Revista do Programa
de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da UECE V. 6, N. 1, ano 2014.

BARROS, M. E. R. A. B.. O Percurso da Análise do Discurso: um


estudo da contrapropaganda do PT. In: XX Jornada Nacional de Estudos
Lingüísticos, 2004, João Pessoa. XX Jornada Nacional de Estudos
Lingüísticos. João Pessoa: Idea, 2004. p. 1719-1731

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