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HUMANÍSTICA
Teoria Geral do Direito e da Política
SISTEMA DE ENSINO
Livro Eletrônico
FORMAÇÃO HUMANÍSTICA
Teoria Geral do Direito e da Política
Renato Borelli
Apresentação..................................................................................................................3
Teoria Geral do Direito e da Política.................................................................................4
Parte I: Teoria Geral do Direito........................................................................................4
1. Direito Objetivo e Direito Subjetivo.. .............................................................................4
2. Fontes do Direito. ....................................................................................................... 11
3. Eficácia da Lei no Tempo...........................................................................................35
Parte II: Teoria Geral da Política. ....................................................................................59
1. Noções Introdutórias: Conceitos Básicos. . ..................................................................59
Referências...................................................................................................................83
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Teoria Geral do Direito e da Política
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Apresentação
Olá, pessoal!
Dando seguimento ao nosso curso, na aula de hoje estudaremos a Teoria Geral do Direito
e da Política, pautando-nos no sumário abaixo!
Ótima leitura a todos vocês.
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Tratando-se de institutos basilares, cujos conceitos são aprendidos logo nos primeiros
semestres do curso de Direito, é importante destacar que o direito objetivo e o subjetivo não
subsistem como institutos autônomos e independentes, sendo, em verdade, conceitos in-
trinsecamente interligados – algo como as duas faces de uma mesma moeda –, devendo
ser analisados de forma conjunta, afinal o aspecto subjetivo do direito somente se manifesta
quando ele estiver objetivamente previsto e garantido.
Explico melhor!
É que o direito objetivo é aquele relacionado à positividade, isto é, corresponde ao direito
posto, contido em normas jurídicas, podendo ser apontado como a própria norma ou o con-
junto de normas de conduta positivadas, ou, ainda, como a própria ordem jurídica, fruto da
atividade legislativa.
Segundo Caio Mário da Silva Pereira, o direito objetivo traduz “o comando estatal, a norma
de ação ditada pelo poder público, e é nesta acepção que se repete secularmente que ius est
norma agendi1”.
Para fins didáticos, é comumente classificado em Direito Público e Direito Privado.
Noutra via, o direito subjetivo deriva da aplicação do direito objetivo a uma situação con-
creta, consistindo no direito-poder ou direito-prerrogativa, ou seja, na faculdade de exercer,
em favor do titular, o comando contido na norma. Ele é, assim, o “poder que a ordem jurídica
confere a alguém de agir e de exigir de outrem determinado comportamento”2
Caio Mário da Silva Pereira esclarece ser “o poder de ação contido na norma, a faculdade
de exercer em favor do indivíduo o comando emanado do Estado, definindo-se ius facultas
agendi3”.
1
Numa tradução livre, o Direito é a norma de agir.
2
Francisco Amaral, Direito civil: introdução, p. 181.
3
Numa tradução livre, O direito é a faculdade de agir
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Definido o conceito, apontamos que, ao longo dos anos, surgiram algumas teorias (dou-
trinas negativistas) rechaçando a existência do direito subjetivo. Ganham destaque aquelas
postuladas por Duguit e Kelsen (Teoria Pura do Direito), defendendo este último que:
A obrigação jurídica não é senão a própria norma jurídica. Sendo assim, o direito subjetivo não é
senão o direito objetivo. Reconhece ele somente a existência deste, não aceitando o dualismo di-
reito objetivo-direito subjetivo, que encerra um componente ideológico.4
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conveniência de sua utilização. Ademais, existem direitos em que não existe uma vontade real
do titular, a exemplo dos incapazes, que possuem direitos subjetivos, podendo herdar ou ser
proprietários, muito embora não possuam vontade em sentido jurídico.
Na teoria do interesse protegido, criada por Ihering, o direito subjetivo passa a ser definido
como o interesse juridicamente protegido, de modo que a posição também não passou ilesa a
questionamentos, uma vez que confunde o direito subjetivo com o seu conteúdo.
Por fim, a teoria mista, ou eclética, apoiada por Jellinek, Saleilles e Michoud, define o di-
reito subjetivo como o interesse protegido que a vontade tem o poder de realizar e, em razão
de mesclar os elementos básicos das duas posições anteriormente estudadas, recebe, igual-
mente, as mesmas críticas.
Corretamente, Carlos Roberto Gonçalves, apoiado em Luigi Ferri, elucida que:
O direito subjetivo, em verdade, não constitui nem poder da vontade, nem interesse protegido, mas
apenas “um poder de agir e de exigir determinado comportamento para a realização de um interes-
se, pressupondo a existência de uma relação jurídica. Seu fundamento é a autonomia dos sujeitos,
a liberdade natural que se afirma na sociedade e que se transforma, pela garantia do direito, em
direito subjetivo, isto é, liberdade e poder jurídico”.
Na realidade, direito subjetivo e direito objetivo são aspectos da mesma realidade, que pode ser
encarada de uma ou de outra forma. Direito subjetivo é a expressão da vontade individual, e direito
objetivo é a expressão da vontade geral. Não somente a vontade, ou apenas o interesse, configura
o direito subjetivo. Trata-se de um poder atribuído à vontade do indivíduo, para a satisfação dos
seus próprios interesses protegidos pela lei, ou seja, pelo direito objetivo7.
Não confunda:
7
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
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Certo.
Padrão de resposta oficial:
1. Resposta
Sim. Direito objetivo como conjunto de normas impostas e direito subjetivo como a permis-
são de agir conforme o direito objetivo. Um não pode existir sem o outro. O direito objetivo
existe em razão do direito subjetivo, para revelar a permissão de praticar atos. O direito sub-
jetivo constitui-se das permissões dadas pelo direito objetivo. Teoria circular.
2. Ideia central do conceito
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Direito objetivo é o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento humano, as re-
lações entre as pessoas e entre elas e o Estado. Direito posto. É a norma de agir (norma agen-
di), a qual abrange o direito existente e concretizado em forma de leis. Compreende a série de
direitos existentes e implantados. Conjunto de normas que a todos se dirige e a todos vincula.
Direito subjetivo refere-se à posição do sujeito frente ao direito objetivo. Facultas agendi. É o
poder que a ordem jurídica confere a alguém para agir e exigir de outrem determinado com-
portamento. Permissão dada por meio da ordem jurídica para um sujeito fazer ou deixar de
fazer alguma coisa. Direito de forma concreta.
3. Elementos de definição
Direito objetivo: norma, norma agendi, direito existente e concretizado em normas ou leis,
direito implantado, regulamentação da conduta humana, conjunto de regras que rege os mais
variados setores da vida, previsão abstrata, erga omnes.
Direito subjetivo: invocação da norma, facultas agendi, prerrogativa do sujeito frente à norma,
poder de exigir que vigore a norma; permissão dada por meio da norma jurídica para fazer ou
não algo; previsão concreta. Classificação de direito subjetivo comum da existência (permis-
são de fazer ou não fazer, de ter o u não ter – sem violação de preceito normativo) e direito
subjetivo de defender (autorização de assegurar o uso do direito subjetivo, de modo que o
lesado pela violação da norma está autorizado a opor resistência, a fazer cessar o ilícito, re-
clamar a reparação do dano e processar os violadores da norma com imposição de sanção ou
pena).
4. Abordagem teórica
Dentro do direito subjetivo, são apontamentos teóricos pertinentes:
• Hans Kelsen nega a existência autônoma do direto subjetivo. Estabelece que o direito
deve ser visto como um sistema de normas e o direito subjetivo nada mais é do que o
reflexo de um dever jurídico que existe por parte dos outros em relação ao indivíduo de
que se diz ter um direito subjetivo. Como o dever jurídico é a própria norma, o direito
subjetivo é o fenômeno normativo colocado à disposição do sujeito.
• Três teorias que procuram definir a natureza do direito subjetivo: 1) TEORIA DA VON-
TADE de Savigny e Windscheid: direito subjetivo é o poder da vontade reconhecido pela
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ordem jurídica (críticas: há direitos sem vontade do titular; há casos em que há uma
vontade real, porém o que o ordenamento jurídico protege não é a vontade do titular,
mas seu direito; o direito pode existir sem a vontade). 2) TEORIA DO INTERESSE de Ihe-
ring: direito subjetivo é o interesse juridicamente protegido (críticas: há interesses pro-
tegidos que não se confundem com direitos subjetivos; direitos subjetivos em que não
existe interesse por parte do titular). 3) TEORIA MISTA de Jellinek, Saleilles e Michoud:
direito subjetivo seria o poder da vontade reconhecido e protegido pela ordem jurídica,
tendo por objeto um bem ou interesse. Críticas: igual a acima. Direito não é objeto.
Obs.: sob uma outra perspectiva, a classificação em absolutos ou relativos pode estar asso-
ciada ao fato de o direito em questão estar, ou não, sujeito à exceção. Nesse sentido,
absoluto seria o direito subjetivo que não admite exceção, enquanto o direito relati-
vo comportaria exceção. Há quem sustente, por exemplo, que a vida seria um direito
subjetivo absoluto. No entanto, prevalece na doutrina o entendimento de que não há
direito absoluto, inclusive o direito à vida, porque, em casos de guerra declarada, por
exemplo, admite-se a pena de morte
Reais e pessoais: reais são os direitos que o homem exerce sobre a coisa (a exemplo do
direito de propriedade, da posse, entre outros) e pessoais são os direitos que atuam necessa-
riamente sobre uma pessoa. O direito real pode ser definido como o poder jurídico, direto e
8
Nos termos do art. 1.228 do Código Civil: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de
reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
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imediato, do titular sobre a coisa. Já o direito obrigacional, ou pessoal, consiste num vínculo
jurídico pelo qual o sujeito ativo pode exigir do passivo determinada prestação.
Transmissíveis e intransmissíveis: aqui a classificação diz respeito à aderência do direito
ao seu titular. Nessa esteira, no direito subjetivo transmissível, como a própria terminologia
revela, a titularidade é suscetível de alteração, como é o caso dos direitos reais, que são susce-
tíveis de transferência. Nos intransmissíveis, a titularidade é imutável, a exemplo dos direitos
personalíssimos, que, por serem inerentes a cada pessoa, não podem ser repassados a outrem.
Públicos e privados: direitos públicos são aqueles exercidos em face do poder público.
São os direitos relativos à liberdade, ao direito de ação, direito de petição e direitos políticos.
O direito subjetivo privado, por sua vez, é exercido contra um particular e, nesse sentido, pode
ser patrimonial ou não patrimonial.
Principais ou acessórios: principais são os direitos que possuem existência autônoma,
independente de outro. Já os acessórios dependem da pré-existência de outro direito e com
ele se relaciona. Por exemplo, no contrato de compra e venda que possua uma cláusula de
pagamento de multa diante do inadimplemento, o direito principal seria o direito ao pagamen-
to do valor da dívida, enquanto o pagamento da multa seria um direito acessório ao contrato.
É importante que não sejam confundidos os conceitos de direito subjetivo e direito potes-
tativo.
Direito subjetivo é a possibilidade (faculdade) de o indivíduo valer-se da lei para defender
seus interesses, podendo exercer este direito com liberdade dentro da legalidade. É aquele
direito cujo exercício enseja um dever imediato de outrem.
O direito potestativo, diferentemente, além de ser unilateral, pois derivado da vontade de
uma só das partes envolvidas, é incontroverso, não admitindo contestações. Destarte, cabe a
outra parte tão somente sujeitar-se ao seu exercício.
Enquanto o direito subjetivo se contrapõe a um dever, o direito potestativo é o mesmo que
uma sujeição, na medida em que faz imposições a uma das partes sem que a outra tenha
contrapartidas a cumprir.
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2. Fontes do Direito
A teoria das fontes assume relevância quando o direito passa a ser entendido mais como
um produto cultural e menos como um dado da natureza ou sagrado. Falar em fonte do direito
é perquirir a origem do fenômeno jurídico. Em outras palavras, é dizer a forma pela qual as
A expressão “fonte do direito”, portanto, pretende significar origem, gênese, sob a pers-
pectiva histórica e sociológica e, também, a busca pelo fundamento do direito, em uma aná-
lise filosófica.
Contudo, por ser vago e ambíguo, o termo “direito” acaba por conferir à teoria das fontes
uma certa dose de imprecisão, porque tanto pode abranger a origem das normas jurídicas
(isto é, do direito objetivo), como pode se referir ao direito subjetivo e também à própria nas-
cente da ciência jurídica e sua produção teórica (fontes da ciência do Direito).
Para fins de concurso, vamos nos ater aqui a tratar das fontes do direito objetivo e a dou-
trina, classicamente, costuma tratar o tema a partir de duas concepções: fonte material (fonte
de cognição) e fonte formal (fonte de produção jurídica).
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Sob o ponto de vista material, as fontes consistem nos “elementos econômicos, políticos
e ideológicos que perfazem a realidade social e servem de substrato para a produção, inter-
pretação e aplicação da normatividade jurídica”9.
Usando termos mais simples, é possível definir as fontes materiais como todas as moti-
vações de natureza social, econômica, ética, filosófica, entre outras, que tenham influenciado
o legislador na formulação da norma jurídica (direito objetivo).
De outra sorte, as fontes formais correspondem aos modos de formação e de revelação
das normas jurídicas. Em suma, são as estruturas que dão forma ao direito objetivo, a exem-
plo da lei.
Em que pese inexistir consenso quanto à classificação das fontes formais, predomina
em âmbito doutrinário que, a parir do disposto no art. 4º da Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro (LINDB), devem ser assim consideradas a lei, a analogia, os costumes e os
princípios gerais do direito, devendo a primeira (lei) ser reputada como fonte formal principal
e as demais como fontes formais acessórias ou secundárias.
Como fontes não formais, por seu turno, temos a doutrina e a jurisprudência, destinadas
a auxiliar o operador do Direito na utilização das fontes formais.
Usualmente, costuma-se, também, separar as fontes do direito em diretas ou imediatas e
em indiretas ou mediatas. São diretas a lei e o costume, uma vez que gozam de aptidão para,
por si só, gerarem a regra jurídica. São indiretas a doutrina e a jurisprudência, que não sendo
capazes de elaborarem a regra jurídica de pronto, contribuem para a sua elaboração.
Atente-se ao esquema!
9
SOARES, Ricardo Maurício Freire. Elementos de teoria geral do direito, 3.ed. São Paulo:
Saraiva, 2016, p. 63.
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2.1.1. Lei
Conceito
A lei, sobretudo nos sistemas de origem romano-germânico (“civil law”), é a fonte do di-
reito por excelência, instrumento próprio para a promoção de inovações na ordem jurídica.
Em verdade, diante dos reclames por maior certeza e segurança nas relações jurídicas
hodiernas, até mesmo nos países anglo-saxões, de tradição “common law”, vem se notando
uma ascensão da influência do processo legislativo.
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Tomada em seu sentido estrito, “lei é a norma jurídica elaborada pelo Poder Legislativo,
por meio de processo adequado.”
Aprofundando um pouco mais, podemos apontar ser a norma geral e abstrata, com cará-
ter obrigatório, emanada do Poder Legislativo, conforme um processo legislativo específico,
e expressa mediante uma fórmula escrita.
Características
Uma vez conceituada, nota-se que a lei tem como características principais:
• A forma escrita;
• A generalidade, pois, dotada de um comando abstrato, não se digere a um indivíduo
específico, mas, sim, a todos os cidadãos indistintamente;
• A imperatividade, impondo deveres e condutas aos membros da coletividade, não sen-
do próprio das leis aconselhar ou ensinar;
• A permanência, sendo criada para vigorar por tempo indeterminado, enquanto não re-
vogada por outra. Há, contudo, leis temporárias, destinadas a viger somente durante
certo período, tal como ocorre com as leis orçamentárias;
• A complexidade, tendo em vista que a sua edição depende da manifestação de vontade
dos Poderes Legislativo e Executivo;
• É o resultado da manifestação de vontade da autoridade competente, conforme as
competências e os processos legislativos estampados na Constituição Federal;
• Contém um autorizamento, ou seja, a norma jurídica destina-se a autorizar ou não au-
torizar determinada conduta, restando superada a tese defendida por Hans Kelsen pela
qual não haveria norma sem sanção.
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A lei é, portanto, apenas uma das formas pelas quais se reveste uma norma ou um
conjunto de normas dentro do ordenamento jurídico – a lei, para alguns doutrinado-
res, é considerada como o veículo da norma.
Diferenciam-se, também, pelo modo como se revelam aos seus destinatários, uma
vez que a lei possui caráter explícito, informando de modo claro a conduta exigida ou
esperada, ao passo que a norma se revela implicitamente, sendo o fruto da interpre-
tação do texto em que está estampada.
Com efeito, nem toda norma é jurídica, a exemplo das disposições de cunho religioso,
porém, quando expressadas na estrutura de lei, assim serão classificadas.
Destarte, podemos arrematar que toda lei é uma norma, mas nem toda norma é
uma lei.
Reflexões Necessárias
Não se pode olvidar ser a lei uma importante expressão do regime democrático, pois
quanto mais democrático o Estado, maior será a predominância do Poder Legislativo na ela-
boração das leis, porque, se tal poder é exercido pelos representantes do povo, infere-se que
é o próprio povo que está assumindo as rédeas do sistema legislativo, nele refletindo as suas
vontades.
O maior desafio na produção legislativa é formar um conteúdo justo para solucionar os
dissensos sociais, ou seja, é conseguir fornecer critérios materiais, de conteúdo determinado,
para decisões de conflitos atuais ou futuros. Nesse contexto, embora a norma moral também
possa servir à regulação social, apenas a norma jurídica possui caráter cogente, de tal sorte
que uma vez violada enseja consequências jurídicas aos infratores. Ademais, apenas as nor-
mas jurídicas se sujeitam a um processo formal, legal ou constitucional, para serem criadas
e adquirirem validade jurídica.
É válido destacar que estamos analisando a lei em sua acepção estrita, cuja principal pe-
culiaridade é o fato de, por ser expressão da vontade política do povo, poder inovar no sistema
jurídico, elencando novos direitos e/ou obrigações. Por essa razão, a lei somente deverá ser
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entendida como fonte se for constitutiva de direito, isto é, quando introduzir algo de novo no
sistema jurídico vigente.
Assim, na acepção estrita do termo, não é possível considerar decretos e regulamentos
como se leis fossem, já que não podem ir além dos limites colocados pela norma legal (lei)
que lhe servem de fundamento.
Integração
A lei, embora seja o principal ato normativo do nosso ordenamento, não é capaz de prever
e regular todos os pormenores da vida social, surgindo, inevitavelmente, casos em que será
omissa.
Diante disso, o que fazer?
Constatadas omissões, deveremos utilizar as técnicas de integração (colmatação das
lacunas legais).
Maria Helena Diniz, citada por Flávio Tartuce, assevera que “O Direito não é lacunoso, mas há
lacunas.”
A frase, a princípio contraditória, demonstra uma premissa que precisa ser devidamente com-
preendida pelos operadores do Direito. Conforme a lição da doutrinadora, o sistema jurídico
é estruturado de maneira aberta (é um sistema aberto) no qual existem lacunas. Todavia,
as lacunas não são do direito em si, mas da lei, que é omissa em determinadas situações
concreta.10
A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) estabelece que, quando a lei
for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios ge-
rais de direito.
Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os
princípios gerais de direito.
10
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 8. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
MÉTODO, 2018.
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A integração também pode ser feita pela equidade, desde que isso seja expressamente auto-
rizado por lei. A equidade, em suma, seria a realização do sentimento do justo no caso concreto.
Por já ter sido objeto de prova, é válido verificarmos a distinção proposta por Tércio Sam-
paio Ferraz Júnior, que classifica os modos de integração do Direito em instrumentos “quase-
-lógicos” de integração, que são aqueles que exigem alguma forma de procedimento analíti-
co, tendo uma aparência de raciocínio formal, e instrumentos “institucionais” de integração,
que são aqueles que buscam apoio na concepção de instituição, manifestando argumentos
materiais. Os primeiros consistem na analogia, na indução amplificadora e na interpretação
extensiva e os segundos nos costumes, nos princípios gerais do direito e na equidade.
A indução amplificadora é procedimento mais complexo que a analogia. Exige não apenas um juízo
empírico de semelhança e um juízo de valor sobre o caráter mais significativo da coincidência para
efeitos jurídicos, mas também que se extraia da comparação e da valoração um princípio geral.
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Portanto, a distância entre a norma (ou normas) de que se parte e o caso omisso é maior. Por exem-
plo, constatamos que os estatutos sociais de quatro diferentes sociedades preveem o princípio da
maioria para suas deliberações. No entanto, num contrato que as une para a consecução de uma
tarefa comum, não foi prevista essa regra. O contrato é omisso. Por indução amplificadora, constru-
ímos, então, o seguinte raciocínio: se os estatutos, isoladamente tomados, preveem o princípio da
maioria, é possível generalizar a regra geral segundo a qual, com base na lealdade negocial, todas
as partes certamente admitem aquele princípio mormente quando nenhuma delas o exclui para as
deliberações internas. Generalizado o princípio, este é, então, aplicado ao caso omisso. Sentimos
que, na indução amplificadora, cresce a liberdade do intérprete. A força persuasiva do procedimento
depende de consenso menos evidente do que ocorre na analogia sobre a semelhança.11
11
FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 10. ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Atlas, 2018.
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Ou seja, o conceito de lacuna alarga o campo da positividade a partir dele próprio. Ele funcio-
na como uma regra permissiva, doutrinária, que autoriza o intérprete a se valer dos meios de
integração nos limites que a própria doutrina parece reconhecer, mas na verdade estabelece:
em caso de lacuna pode o intérprete... Assim, embora a lacuna seja definida como omissão ou
falta de norma no ordenamento os fatores extra-positivos, como os ideais de justiça, as exi-
gências de equidade, os raciocínios quase-formais. Ou seja, embora o conceito designe falta,
ele oculta a superabundância de normas, assegurando-se, destarte, um dos princípios carac-
terizadores do legislador racional: a omnicompreensividade” (Tércio Sampaio Ferraz Júnior,
introdução ao Estudo do Direito. São Paulo, Atlas, 1996, 2ª edição, p. 307). Em sua abordagem
do tema da interpretação do Direito, Tércio Sampaio Ferraz Júnior, no trecho acima citado,
faz referência à questão da integração do Direito. Relativamente ao entendimento deste autor
sobre o assunto, responda:
a. A que se refere a integração do Direito? Explique.
b. Considerando os diferentes modos de integração do Direito, identifique e explique os cha-
mados instrumentos “quase-lógicos” de integração.
c. Considerando os diferentes modos de integração do Direito, indique e explique os chama-
dos instrumentos “institucionais” de integração.
(Elabore sua resposta definitiva em até 30 linhas).
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para uma determinada situação fática, é aplicável a uma conduta para qual não há norma,
havendo entre ambos os supostos fáticos uma semelhança. A indução amplificadora, conju-
gando os métodos da indução e da dedução, parte de casos particulares para obter uma ge-
neralização, da qual resultam princípios que serão aplicados, dedutivamente, a outros casos.
A interpretação extensiva parte de uma norma existente na sua própria letra ou explicitamen-
te no seu espírito. Estes três instrumentos exigem alguma forma de procedimento analítico e
têm uma aparência de raciocínio formal.
c. Indicação e explicação, segundo a caracterização realizada por Tércio Sampaio Ferraz jú-
nior, dos três instrumentos “institucionais” de integração do Direito: os costumes, os prin-
cípios gerais do direito e a equidade. O costume, que envolve tradições, crenças e opini-
ões, consiste na força conferida ao tempo e ao uso reiterado como reveladores de normas.
Os princípios gerais do direito, diferentemente das normas, não são elementos do repertório
do sistema normativo, mas fazem parte de suas regras estruturais, ou seja, dizem respeito à
relação entre as normas no sistema, ao qual conferem coesão. A equidade pode ser caracte-
rizada como o sentimento do justo concreto, em harmonia com as circunstâncias e adequado
ao caso a que se refere. Estes três instrumentos apoiam-se na concepção de instituição e
expressão argumentos materiais.
2.1.2 Costumes
Conceito
O costume é a fonte mais antiga do direito, gozando de grande expressão no período an-
terior às codificações.
Por meio dele, cria-se, forma-se e impõe-se normas de conduta, de modo que o principal
diferencial em relação aos hábitos sociais é a convicção de sua obrigatoriedade.
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Obs.: costume é a prática uniforme, constante, pública e geral de determinado ato, com a
convicção de sua necessidade.
Classificação
Praeter legem, quando destinados a suprir as lacunas presentes na lei, disciplinando ma-
térias não albergadas por esta.
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Obs.: os costumes praeter legem são utilizados como normas de integração do ordena-
mento jurídico, colmatando lacunas legais.
Secundum legem, quando expressamente reconhecidos na lei, que faz menção a eles.
Obs.: os costumes secundum legem assumem caráter de lei, devendo deixar de serem con-
siderados costumes propriamente ditos.
2.1.3. Doutrina
Conceito
A inclusão da doutrina no âmbito das fontes do direito não é pacífica entre os teóricos.
Para aqueles que assim o fazem, deve ser considera fonte não formal, pois destinada a fa-
cilitar e orientar a aplicação do direito, sendo definida como o conjunto de obras e pareceres
produzidos pelos juristas de um determinado ordenamento jurídico.
Características
A doutrina não influi de forma direta na criação de normas jurídicas, possuindo caráter
meramente opinativo. Portanto, por não haver obrigação de os tribunais se renderem ao en-
tendimento por ela indicado, tampouco de os legisladores acatarem as sugestões dos teóri-
cos, diz-se que ela é uma fonte mediata.
Fato é que a doutrina é um fundamental antecedente lógico para o surgimento da principal
fonte do direito: a lei. A sua missão é desenhar o quadro fático subjacente ao ordenamento
jurídico, traçando as perspectivas e os caminhos a se percorrer juridicamente.
2.1.4. Jurisprudência
Conceito
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Reflexões Necessárias
Nos regimes jurídicos que adotam o sistema do “common law”, o direito é revelado pela
utilização sucessiva dos precedentes pelo Poder Judiciário. Assim, a jurisprudência ocupa
papel de destaque como fonte do direito. De toda sorte, mesmo no caso do Brasil, que adota
o sistema do “civil law”, lastreado na lei como fonte primordial do direito, (embora parte da
doutrina já aponte para uma aproximação com o sistema do “commom law”), a jurisprudência
e os precedentes judiciais estão assumindo uma importância crescente, de modo que não há
como negar que a jurisprudência vem despontando como genuína fonte jurídica, suplemen-
tando e aperfeiçoando a própria legislação.
13
LORDELO, João Paulo. Noções Gerais de Direito e Formação Humanística. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 226.
14
LORDELO, João Paulo. Noções Gerais de Direito e Formação Humanística. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 225.
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Esse apreço maior aos precedentes judiciais pode ser atribuído ao neoconstitucionalismo,
que, dentre tantas mudanças, ao redimensionar o papel do Poder Judiciário provocou, por con-
sequência, a reconfiguração do papel da jurisprudência como fonte formal secundária do direito.
No que tange ao neoconstitucionalismo, esclareço que em tópico específico iremos estu-
dar mais profundamente as modificações que provocou na teoria das fontes.
Fato é que se até pouco tempo a ideia da vinculabilidade dos precedentes judiciais era
um traço peculiar à tradição jurídica do modelo do “common law”; hoje existe uma recíproca
aproximação entre este e o sistema do “civil law”.
No Brasil, a valorização da jurisprudência como fonte do direito pode ser verificada no
Novo Código de Processo Civil que, em seu artigo 927, estabeleceu rol de precedentes de ob-
servância obrigatória por todos os juízes e tribunais:
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a Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, operando
efeitos imediatos desde a sua publicação oficial.
A vinculação produzida pela súmula não alcança o Poder Legislativo (função legislativa), sob
pena de grave violação à separação dos Poderes. Logo, continua reservado ao legislador edi-
tar leis com redação contrária ao disposto em enunciado de súmula vinculante.
O que se está procurando demonstrar é que a partir das súmulas vinculantes rompeu-se
com a tradição jurídica brasileira, pelo menos desde o início da República, de que os enuncia-
dos de súmula tinham apenas caráter persuasivo, não vinculando.
Sobre o tema, é de grande valia a lição de Carlos Roberto Gonçalves:
Malgrado a jurisprudência, para alguns, não possa ser considerada, cientificamente, fonte formal de
direito, mas somente fonte meramente intelectual ou informativa (não formal), a realidade é que, no
plano da realidade prática, ela tem-se revelado fonte criadora do direito. Basta observar a invoca-
ção da súmula oficial de jurisprudência nos tribunais superiores (STF e STJ, principalmente) como
verdadeira fonte formal, embora cientificamente lhe falte essa condição. Essa situação se acentuou
com a entrada em vigor, em 19 de março de 2007, da Lei n. 11.417, de 19 de dezembro de 2006, que
regulamentou o art. 103-A da Constituição Federal e alterou a Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999,
disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supre-
mo Tribunal Federal.
Conceito
LINDB, Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costu-
mes e os princípios gerais de direito.
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá
reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão
judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.
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Muito embora o art. 4º, da LINDB, tenha atribuído aos princípios gerais de direito função
meramente integrativa, não se deve pensar que todos os princípios jurídicos se limitam a este
papel secundário de técnica de solução de lacunas ou antinomias. Isso porque, com o ad-
vento do neoconstitucionalismo, aos princípios foi reconhecida natureza jurídica normativa,
como já ocorria com as regras, devendo ser reconhecidos como normas materiais de obser-
vância obrigatória que se impõe aos destinatários como medida principal e não simplesmen-
te acessória.
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17
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. rev., ampl. E atual. Salvador. JusPODIVM, 2017. p. 231.
18
CANOTILHO, Gomes: Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª edição, p. 1159-1162, 2003 apud FERNANDES,
Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. rev., ampl. E atual. Salvador. JusPODIVM, 2017. p. 231.
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A primeira (tese fraca) considera que regras e princípios se distinguem pela sua gene-
ralidade, sendo os princípios normas dotadas de um grau de generalidade e abstra-
ção maior do que as regras.
A segunda (tese forte), proposta por Alexy amparado na construção de Ronald
Dworkin, postula um critério de diferenciação qualitativo fundando no modo de apli-
cação de cada espécie de norma, isto é, no modo pelo qual o “conflito” é solucionado.
Assim, regras são diferentes dos princípios porque funcionam como mandamentos de
definição, aplicando-se no modelo do tudo-ou-nada (all-or-nothing-fashion). Nesse
sentido, Alexy esclarece que “se uma regra é válida, então há de se fazer exatamente o
que ela exige, sem mais nem menos”19. Havendo conflito entre regras, uma terminará
por invalidar a outra, que deverá ser retirada ordenamento jurídico, salvo se estabe-
lecido que esta regra representa uma situação que excepciona a outra (cláusula de
exceção).
Os princípios, porém, correspondem a mandados de otimização, normas que ordenam
que algo seja realizado na maior medida possível conforme as possibilidades fáticas
e jurídicas do caso concreto. Surgindo colisão entre princípios, deverá ser utilizada a
técnica da ponderação, devendo ser aplicado aquele que possuir maior peso frente a
situação analisada, sem que isso implique a invalidação do princípio entendido como
de peso menor. Portanto, “nenhum desses princípios em choque ostenta primazia
definitiva sobre o outro. Nada impede, assim, que, em caso diverso, com outras carac-
terísticas, o princípio antes preterido venha a prevalecer.”20
Para que fique mais claro, vamos entender melhor o que foi o neoconstitucionalismo.
Não se ignorando a ausência de uma uniformidade de teorias de viés neoconstitucionalista,
apontamos que o neoconstitucionalismo, também conhecido como constitucionalismo contem-
porâneo, constitucionalismo avançado ou constitucionalismo de direitos, é o fenômeno jurídico
surgido num cenário pós Segunda Guerra Mundial como reposta aos regimes totalitários até
19
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 87.
20
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 12. ed. rev. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2017.
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inspiradas por uma teoria de justiça, mas não podem comportar voluntarismo ou personalis-
mos, sobretudo os judiciais. No conjunto de ideias ricas e heterogêneas que procuram abrigo
nesse paradigma em construção incluem-se a atribuição de normatividade aos princípios e
a sua definição de suas relações com valores e regras; a reabilitação da razão prática e da
argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica constitucional; e o desenvol-
vimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre o fundamento da dignidade
humana. Nesse ambiente promove-se uma reaproximação entre o direito e a filosofia.”
Nesse ponto, é necessário aprofundarmos um pouco mais nossos estudos, razão pela
qual iremos, agora, examinar a trajetória de teorizações até o reconhecimento da força nor-
mativa dos princípios, passando pelas fases naturalista, positivista e a atual fase pós-positi-
vista, que, como visto, é o fundamento jusfilosófico do neoconstitucionalismo.
Escola jusnaturalista: consagra a denominação princípios gerais de direito. Para seus se-
guidores, os princípios gerais identificam-se com o direito natural, sendo, então, princípios de
justiça formadores de um direito ideal, caracterizados como valores completamente abstra-
tos e ausentes de normatividade. Com isso, prevalecia que não possuíam aptidão para regu-
lar, por si mesmos, as relações jurídicas, apenas atuando como vetores gerais da produção
normativa.
Os princípios, tomados em sua característica jusnaturalista, tiveram forte influência até o
advento da escola histórica do direito no século XIX.
Concepção positivista: define os princípios gerais de direito como aqueles destinados a
servir de fundamento para a instituição da norma. Na fase juspositivista, os princípios são
normatizados, porém, mais para funcionar como válvulas de segurança para o sistema jurídi-
co do que como algo que fosse superior às leis, de modo que somente adquiriam relevância
quando contemplados expressamente pela norma escrita. Não sendo este o caso, a eles era
reservado somente o papel de suplementar a lei. De um modo geral, restringiam-se a atuar
como pautas genéricas, dotadas de alta abstração, que serviam de norte ao legislador e ao
intérprete. Paulo Bonavides elucida que o juspositivismo:
Ao fazer dos princípios na ordem constitucional meras pautas programáticas supralegais, tem as-
sinalado, via de regra, a sua carência de normatividade, estabelecendo, portanto, a sua irrelevância
jurídica.”
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Diante do exposto, o art. 4º, da LINDB, deve ser lido com adaptações. Onde está escrito
“quando a lei for omissa”, leia-se: quando a norma jurídica for omissa, pois a norma jurídica
pode ser a norma-regra ou a norma-princípio. Ademais, os princípios citados no dispositivo
seriam os princípios gerais ou informativos, única compreensão que não tornaria o diploma
legal em voga contrário a teoria da força normativa dos princípios.
Também visando afirmar o papel dos princípios como efetiva fonte do direito e não como
simples técnica de integração, há autores que costumam distinguir os princípios gerais de
direitos dos denominados princípios constitucionais, estes, sim, dotados de força normativa.
O neoconstitucionalismo, “teoria desenvolvida para um modelo específico de organização
jurídico-politica (constitucionalismo contemporâneo) característico de determinado tipo de
Estado (Estado constitucional democrático)”22, destaca-se, especialmente, pelo(a)23:
• Reconhecimento da força normativa da Constituição e o papel central desta no sistema
jurídico, ocorrendo a constitucionalização do direito por meio da irradiação das normas
e valores constitucionais, principalmente aqueles relacionados aos direitos fundamen-
tais, para todos os ramos do ordenamento jurídico, condicionando a interpretação e a
aplicação do direito como um todo;
22
NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 11. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2012. p. 214.
23
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. rev., ampl. E atual. Salvador. JusPODIVM, 2017. p. 31.
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Noções Iniciais
Para Miguel Reale, as fontes do direito são estruturas normativas que pressupõem a exis-
tência de alguém com poder de decidir. A partir disso, o autor defende que existiriam quatro
fontes do direito:
• Fonte legal: resultado do poder estatal de legislar;
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Conceito
A autonomia da vontade só tem prestígio quando a relação entre as partes for igualitária.
Se, de alguma forma, houver desproporção entre elas, evidenciada pela vulnerabilidade de
quaisquer dos participantes, não será possível caráter normativo às disposições da vontade.
Por fim, importante evidenciar que os atos negociais são comumente utilizados com ca-
ráter praeter legem, isto é, visam a preencher lacunas legais, tornando-se verdadeiras normas
a regularem casos concretos, avocando o papel integrador e disciplinando as relações sociais
carentes de regulação legal.
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Art. 5º Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
À vista disso, cabe examinar o marco temporal que torna a lei uma norma de observância
obrigatória por toda a sociedade.
Nesse sentido, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) estabelece em
seu art. 1º, caput e § 1º, que:
LINDB, Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país 45 (quarenta e
cinco) dias depois de oficialmente publicada.
§ 1º Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia 3
(três) meses depois de oficialmente publicada.
Assim:
Prazo para a vigência de lei no território brasileiro: Prazo para a vigência de lei brasileira no território
estrangeiro:
45 dias 3 (três) meses
Obs.: Não confundir com 90 dias; aqui o prazo é con-
tado em mês, não em dias.
O prazo acima é um prazo material, o que implica dizer que a sua contagem deve incluir
o dia do começo e desprezar o dia final24. Além disso, o prazo é contado de forma igual em
todo o território nacional, de sorte que a lei entrará em vigor ao mesmo tempo em todo o país.
Fala-se aqui do princípio da vigência única, sincrônica ou simultânea.
Observem que o prazo para a entrada em vigor de uma lei sempre terá início a partir da sua
publicação e o período que intermedeia a publicação e a sua entrada em vigência é chamado
de vacatio legis.
24
LC 95/98, Art. 8º, § 1º. A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á
com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação
integral.
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Obs.: vacatio legis é o intervalo de tempo entre a publicação de uma lei e o início da sua
vigência. Se a lei não trouxer disposição em sentido diverso, o prazo de vacatio legis
será de 45 (quarenta e cinco) dias.
Nos estados estrangeiros que admitam a produção de efeitos por lei brasileira, o prazo
de vacatio será, em regra, de 3 (três) meses.
A regra é as leis observarem o período de vacatio legis, até para que a população tome
conhecimento e se adapte à norma. Alinhando-se a essa perspectiva, o art. 8º, da LC n. 95/98,
prevê que devem ser reservadas apenas às leis de pequena repercussão a cláusula “entra em
vigor na data da sua publicação”25. A lógica é simples: se a lei vai gerar pequeno ou irrelevan-
te impacto na vida das pessoas, é desnecessário o período de adaptação, de forma que ela
poderá entrar em vigor tão logo seja publicada. Esse raciocínio, no entanto, não costuma ser
observado na prática. Não é raro ver leis de grande repercussão entrando em vigor na data da
sua publicação.
Publicada uma lei, pode acontecer de ela conter incorreções e erros materiais. Se a lei
publicada ainda não tiver entrado em vigor, a sua correção se fará com a repetição da sua pu-
blicação, sanando-se os erros. Nesse caso, o prazo de vacatio legis será reaberto em relação
aos artigos corrigidos, na forma do art. 1º, § 3º, da LINDB.
LINDB, Art. 1º, § 3º Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto, des-
tinada a correção, o prazo deste artigo e dos parágrafos anteriores começará a correr da nova
publicação.
Por outro lado, se a lei a ser corrigida já estiver em vigor, a sua correção só poderá acon-
tecer com a publicação de uma nova lei, denominada “lei corretiva”. Aqui, a vacatio legis de-
penderá do que estiver previsto na lei corretiva, que poderá, por exemplo, dispensar a vacatio,
entrando em vigor no dia da sua publicação, consoante art. 1º, § 4º, da LINDB.
LINDB, Art. 1º, § 4º As correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.
25
Art. 8º A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha
amplo conhecimento, reservada a cláusula “entra em vigor na data de sua publicação” para as leis de pequena repercussão.
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Ao promulgar uma lei, o Presidente da República não pode acrescentar ou modificar os dis-
positivos aprovados pelo Poder Legislativo, devendo limitar-se a suprimi-los, pois, no Brasil,
é vedado o veto aditivo ou translativo, admitindo-se apenas o veto supressivo.
Quanto ao veto parcial, embora seja admitido, ele somente poderá abranger texto integral de
artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea. Aqui, portanto, cuidado para não confundir o veto
parcial com o controle de constitucionalidade realizado pelo STF. Na última hipótese, a decla-
ração de inconstitucionalidade parcial pode se restringir à fração de artigo, parágrafo, inciso
ou alínea, ou até mesmo sobre uma única palavra da lei ou do ato normativo.
Geralmente, a lei nasce para viger por período indeterminado, isto é, as leis têm efeitos
permanentes, falando-se aqui no princípio da continuidade das leis.
Excepcionalmente, contudo, poderão ser editadas leis de vigência temporária.
Destarte, preceitua o art. 2º, da LINDB, que:
LINDB, Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique
ou revogue.
Nisso consiste o princípio da continuidade das leis: não se destinando a vigência tempo-
rária, uma lei se manterá em vigor até que seja por outra revogada.
Deveras, firmado o sistema jurídico brasileiro na supremacia da lei escrita, tem-se que o
costume e o desuso não possuem aptidão para revogar ou retirar a eficácia de uma lei.
Revogação
Podemos conceituar a revogação como sendo a perda da vigência de uma lei provocada
pela edição de outra.
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Quanto ao modo, a revogação total e a parcial poderá ser expressa (ou por via direta), tá-
cita (ou por via oblíqua) e global (por assimilação):
• Revogação expressa (ou por via direta): existirá quando a lei revogadora indicar expres-
samente os dispositivos da lei revogada que pretende rechaçar. Dispõe o art. 9º, da LC
n. 107/2001, que:
• Revogação tácita (ou por via oblíqua): surge quando, não havendo disposição expressa
determinando a revogação, a nova lei se revelar incompatível, no todo ou em parte, com
a lei anterior, contrariando-a de forma absoluta. A revogação tácita não se presume,
sendo preciso demonstrar a incompatibilidade entre as normas;
• Revogação global (ou por assimilação): será global quando a lei nova regular inteira-
mente a matéria de que tratava a lei anterior, independentemente de existir compatibili-
dade ou não entre elas. É por isso que nesse caso os dispositivos legais não repetidos
serão revogados, ainda que compatíveis com a nova lei.
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Não confunda a revogação tácita ou global com a situação prevista no § 2º, do art. 2º da
LINDB, que assim dispõe:
LINDB, Art. 2º, § 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existen-
tes, não revoga nem modifica a lei anterior.
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Repristinação
A Lei A estava em vigor até que a Lei B a revogou. Em seguida, a Lei C revogou a Lei B.
Nesse caso, a Lei A restaura a sua vigência diante da revogação da Lei B?
Bem, inicialmente, reiteramos que essa possibilidade é chamada de repristinação (o re-
torno da produção de efeitos de uma norma anterior, em razão da revogação da norma que lhe
havia revogado). Como regra, a repristinação é vedada no nosso ordenamento jurídico, po-
rém, admite-se que a lei contenha disposição em sentido contrário. Nesse sentido, vejamos
o art. 2º, § 3º, da LINDB:
LINDB, Art. 2º, § 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revo-
gadora perdido a vigência.
Logo, em regra, a revogação da lei revogadora não faz com que a lei revogada restaure a
sua vigência, salvo expressa disposição legal em contrário.
No exemplo dado, revogada a Lei A pela Lei B, e posteriormente revogada a Lei B (lei revo-
gadora) pela Lei C, não se restabelece a vigência da Lei A, salvo se a Lei C, ao revogar a norma
revogadora (Lei B), determinar a repristinação da Lei A.
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Uma lei nova entra em vigor tão logo esteja superado o seu período de vacatio legis (caso
exista) e uma vez que isto venha a ocorrer o dispositivo legal terá efeito imediato e geral, pro-
duzindo efeitos prospectivos (a partir da data do início de sua vigência), devendo respeitar o
ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
Trata-se das previsões contidas no art. 6º, da LINDB, e no art. 5º, XXXVI, da Constituição
Federal:
LINDB, Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito
adquirido e a coisa julgada.
CF, Art. 5º, XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Essa restrição aos efeitos da lei nova se justifica pelo princípio da segurança jurídica. José
Afonso da Silva explica que:
A segurança jurídica consiste no conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhe-
cimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da
liberdade reconhecida. Uma importante condição da segurança jurídica está na relativa certeza
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que os indivíduos têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem perdurar
ainda quando tal norma seja substituída.
Obs.: o princípio da segurança jurídica visa proteger as relações jurídicas constituídas sob
a égide da lei revogada, bem como as legítimas expectativas dos participantes destas
relações, assegurando a certeza, a segurança e a estabilidade do ordenamento jurí-
dico-positivo.
Destarte, a regra é que as leis são elaboradas para valerem para o futuro (são irretro-
ativas!), sendo a retroatividade (aplicação da lei nova às situações formadas antes da
sua vigência) a exceção.
Mas, antes de nos aprofundarmos no tema, questiono: em que consiste o ato jurídico per-
feito, o direito adquirido e a coisa julgada?
Vamos entender melhor!
Ato jurídico perfeito: explicitado no § 1º, do art. 6º, da LINDB, é o ato já concluído segundo
a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
LINDB, Art. 6º, § 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo
em que se efetuou.
Direito adquirido: é o que pode ser exercido desde já pelo seu titular por já ter sido incor-
porado ao seu patrimônio jurídico. Nos termos do § 2º, do art. 6º, da LINDB:
LINDB, Art. 6º, § 2º Consideram-se adquiridos os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa
exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida
inalterável, a arbítrio de outrem.
Coisa julgada: é a decisão judicial de que não caiba recurso. Refere-se, pois, à imutabili-
dade da decisão judicial.
LINDB, Art. 6º, § 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba
recurso.
Alerta-se que a preservação do direito adquirido, da coisa julgada e do ato jurídico perfeito
não impede a edição de leis retroativas. Contudo, a aplicação da lei aos fatos ocorridos antes
da sua vigência apenas é admissível quando atendidos os seguintes requisitos:
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CF, Art. 5º, XL – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
26
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 1: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
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Obs.: é possível a mitigação da coisa julgada amparada em lei ou ato normativo inconsti-
tucional.
Nesse sentido, aliás, é o art. 525, § 12º, do CPC27, ao estabelecer que é inexigível o título
judicial fundado em lei ou ato normativo inconstitucional, assim reconhecido em controle
27
Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para
que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.§ 1º
Na impugnação, o executado poderá alegar: [...] III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; [...] § 12.
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Para o STF:
(...) é cabível ação rescisória fundada em violação a literal dispositivo de lei (art. 485, V,
do antigo CPC), quando a decisão rescindenda tiver se baseado em interpretação cons-
titucional frontalmente contrária à própria Constituição Federal ou em interpretação tida
como incompatível pelo Supremo Tribunal Federal, ainda que seja pela posterior decla-
ração de inconstitucionalidade superveniente da legislação que amparou o título execu-
tivo transitado em julgado, não se aplicando a ratio essendi da Súmula 343 do STF.
(AR 2.572 AgR, voto do min. Gilmar Mendes, red p/ o ac. min Dias Toffoli, P, j. 24-2-
2017, DJE 54 de 21-3-2017).
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IV – Este Tribunal tem buscado, em sua jurisprudência, firmar posições que atendam
aos fins sociais do processo e às exigências do bem comum.
(STJ, REsp 226.436/PR (199900714989), 414113, Data da decisão: 28.06.2001, 4.ª
Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 04.02.2002, p. 370, RBDF 11/73, RDR
23/354, RSTJ 154/403). (Destacamos)
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Doutrina majoritária considera que o Código Civil de 2002 adotou o sistema consagrado
na LINDB, razão pela qual aplicam-se aqui as considerações estudadas no item 3.4.
Destarte, o que é realmente digno de nota no presente tópico é o art. 2.035, do CC/02, cujo
caput assim preceitua:
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CC/02, Art. 2.035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada
em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os
seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se
houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução. (Destacamos)
Por um lado, há quem defenda que o dispositivo acima nada mais fez do que positivar
uma hipótese de retroatividade mínima, impondo aos efeitos atuais de atos jurídico perfeitos
consolidados sob a égide do Código Civil de 1916 os novos regramentos elencados no Código
Civil de 2002. Tratar-se-ia de uma exceção ao regime geral consagrado na LINDB, correspon-
dendo a uma mitigação à proteção conferida ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.
Outros, porém, posicionam-se pela inconstitucionalidade da previsão. No parágrafo úni-
co, do art. 2.035, de forma ainda mais incisiva, temos que:
Na lição de Flávio Tartuce, a novel Lei Civil acolheu o princípio da retroatividade motivada
ou justificada, “pelo qual as normas de ordem pública relativas à função social da proprieda-
de e dos contratos podem retroagir.”28
Segundo o autor:
Não há qualquer inconstitucionalidade na norma, eis que amparada na função social da proprieda-
de, prevista no art. 5º, XXII e XXIII, da Constituição Federal. Quando se lê no dispositivo civil trans-
crito a expressão “convenção”, pode-se ali enquadrar qualquer ato jurídico celebrado, inclusive os
negócios jurídicos celebrados antes da entrada em vigor da nova lei geral privada e cujos efeitos
ainda estão sendo sentidos atualmente, na vigência da nova codificação.
Seria a norma, neste viés, mais um exemplo de relativização à proteção conferida ao direi-
to adquirido e ao ato jurídico perfeito.
Verificada a sucessão de leis penais no tempo, o primeiro passo para ser possível definir
qual norma deverá ser aplicada é saber o tempo do crime, isto é, quando se considera que um
28
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 8. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
MÉTODO, 2018.
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crime foi praticado. Adotada a teoria da atividade no art. 4º, do Código Penal, considera-se
que um crime foi praticado no momento da conduta (ação ou omissão), ainda que outro seja
o momento do resultado.
Assim, por exemplo, considera-se praticado o crime de homicídio no instante em que o
agente desferiu sequência de tiros contra vítima, mesmo que o resultado morte somente te-
nha ocorrido dias depois.
Vejamos:
Tempo do crime
CP, Art. 4º Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja
o momento do resultado
Feito isto, o segundo passo é compreender as regras gerais sobre a eficácia da lei penal
no tempo, que estão elencados nos artigos 1º e 2º, do CP.
Anterioridade da Lei
CP, Art. 1º Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
Lei penal no tempo
Art. 2º Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em
virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos an-
teriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
Deve ser aplicada a lei que estava em vigor no tempo da conduta, salvo se a do tempo do
resultado for mais benéfica ao réu.
A lei penal posterior que seja mais benéfica (lex mitior ou novatio legis in mellius) é retroativa,
alcançando, inclusive, os fatos já definitivamente julgados (prevalece sobre a coisa julgada!).
A novatio legis incriminadora, aquela que passa a considerar típico um fato até então atí-
pico, é irretroativa.
A lei que provoca abolitio criminis (torna atípico um fato tido como típico) é retroativa.
A lex gravior ou novatio legis in pejus, lei posterior mais severa, é irretroativa.
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Nos crimes permanentes, continuados e habituais, aplica-se a lei que estava em vigor
quando cessada a permanência, a continuidade e a habitualidade delitivas, ainda que no início
da atividade criminosa vigesse lei mais benéfica;
Sobre o tema, súmula n. 711-STF:
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dizer que nem todo diploma infraconstitucional perderá vigor com o advento de uma nova
Constituição.
Fala-se aqui no fenômeno da recepção, “que corresponde a uma revalidação das normas
que não desafiam, materialmente, a nova Constituição”30. Logo, um segundo efeito da imple-
mentação de uma ordem constitucional é:
A recepção das normas infraconstitucionais materialmente compatíveis com a nova Cons-
tituição: às vezes, a recepção será expressa, tal como ocorreu na Constituição brasileira de
1937. O mais frequente, contudo, é a recepção implícita, como se dá no atual sistema pátrio.
O pressuposto básico para a recepção é a existência de uma compatibilidade material, ou
seja, de conteúdo.
A compatibilidade formal, por seu turno, não é necessária. Nesse sentido, é válido apontar
que a recepção, a depender da vontade do PCO, poderá se dar com o mesmo status ou com
status diferente. A título de exemplo, se uma matéria tiver sido disciplinada em lei ordinária
na Constituição anterior, mas com o surgimento da nova Constituição passou a ser exigida a
sua regulamentação por meio de lei complementar, a lei ordinária (se materialmente compatí-
vel com a nova Constituição) será recepcionada com o status de lei complementar. Foi o que
ocorreu com o Código Tributário Nacional, originariamente uma lei ordinária, mas recepciona-
do no ordenamento constitucional de 1988 como lei complementar.
Não guardando a norma pretérita compatibilidade material com o novo texto constitucio-
nal, ela deverá ser revogada. Temos aqui o terceiro efeito da instalação de uma nova Consti-
tuição, qual seja:
As normas infraconstitucionais editadas na vigência da Constituição pretérita que forem
materialmente incompatíveis com a nova Constituição serão por ela revogadas: há aqui uma
revogação tácita e automática, não sendo necessário que a nova Constituição detalhe os
dispositivos que com ela são incompatíveis. Essa análise caberá aos operadores do direito.
Quanto a este terceiro efeito, a doutrina constitucional diverge, afirmando uma parte se
tratar de hipótese de não recepção (revogação) em oposição a outra que defende ser o caso
de inconstitucionalidade superveniente.
30
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 12. ed. rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2017.
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Exemplo: uma lei federal pode ser recepcionada como estadual pela nova Carta, mas o con-
trário não é possível, isto é, uma lei estadual não pode ser recepcionada como federal, pois
ensejaria cenário em que teríamos, possivelmente, 27 leis estaduais assumindo o status de
lei federal, o que geraria um caos.32
Explico melhor!
Um dos requisitos essenciais para que uma norma seja recepcionada é que ela seja váli-
da formal e materialmente perante a Constituição de sua época. Nesse sentido, prevalece no
31
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. rev., ampl. E atual. Salvador. JusPODIVM, 2017.
p. 131.
32
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. rev., ampl. E atual. Salvador. JusPODIVM, 2017.
p. 131.
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Para uma lei ser recepcionada pelo novo ordenamento jurídico, deverá preencher os seguintes re-
quisitos:
Estar em vigor no momento do advento da nova Constituição;
Não ter sido declarada inconstitucional durante a sua vigência no ordenamento anterior;
Ter compatibilidade formal e material perante a Constituição sob cuja regência ela foi editada (no
ordenamento anterior);
Ter compatibilidade somente material perante a nova Constituição, pouco importando a compati-
bilidade formal.
33
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 23. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019
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Exemplo: imagine a seguinte situação: com o surgimento de uma nova Constituição, determi-
nadas normas infraconstitucionais editadas (e em vigor) sob a égide do ordenamento cons-
titucional revogado não foram recepcionadas. Ocorre que, posteriormente, mediante nova
manifestação do Poder Constituinte Originário, um novo sistema constitucional foi instaura-
do.
Surgindo uma nova norma constitucional por meio de emenda à Constituição, é necessá-
rio saber que:
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Então, veja: se a norma pretérita for compatível materialmente com a emenda constitucio-
nal, ela será recepcionada e permanecerá em vigor. Por outro lado, se houver incompatibilida-
de material com a emenda constitucional, ela será revogada (não recepcionada).
Mas, tenha cuidado, pois a solução do conflito pelo princípio da recepção somente será
cabível quando estivermos diante de norma anterior à emenda. Se a norma for posterior à
emenda, a controvérsia se resolverá pelo controle de constitucionalidade.
Cabe ressaltar que não há direito adquirido em face de uma nova Constituição, já que o Poder
Constituinte Originário não está submetido a qualquer limitação jurídica. Aliás, quanto aos
efeitos da nova Constituição sobre os fatos que lhe são pretéritos, o STF faz uma distinção
entre três tipos de retroatividade: mínima, média ou máxima.
Vejamos cada uma delas:
• Retroatividade mínima (temperada ou mitigada): a nova Constituição alcançará os
efeitos futuros de atos passados. Um exemplo é a previsão inserta no art. 17, do ADCT,
de que os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os
proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Cons-
tituição serão imediatamente reduzidos aos limites nela impostos, não se admitindo,
neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título;
• Retroatividade média: a nova Constituição atinge efeitos pendentes de atos jurídicos a
ela anteriores (são as prestações vencidas e não pagas);
• Retroatividade máxima ou restitutória: a nova Constituição atinge atos consolidados,
consumados no passado.
De modo geral, conforme já estudamos, todas as normas jurídicas têm eficácia prospectiva.
A norma constitucional, no entanto, também surge com retroatividade mínima. E, se fizer ex-
pressa menção nesse sentido, também poderá ter retroatividade máxima ou média.
No que diz respeito ao Poder Constituinte Derivado, essa mesma possibilidade parece não
existir. Após a promulgação da Constituição de 1988, O STF nunca se pronunciou sobre a
eficácia retroativa das emendas constitucionais ou se elas devem reverência às clássicas
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formas de estabilidade jurídica (ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido). Na
ordem jurídica anterior, o posicionamento da Suprema Corte era favorável à possibilidade de
retroação. No entanto, sob a vigência da atual Constituição, o tema ainda não foi revisitado.
De todo modo, o STF já manifestou que ao menos as Constituições estaduais e as respectivas
emendas devem resguardar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Para que possamos finalizar a primeira parte da aula, precisamos estudar as antinomias
jurídicas.
Antinomias são as contradições, reais ou aparentes, entre normas jurídicas.
Na lição de Maria Helena Diniz, a antinomia é:
(...) o conflito entre duas normas, dois princípios, ou de uma norma e um princípio geral de direito
em sua aplicação prática a um caso particular. É a presença de duas normas conflitantes, sem que
se possa saber qual delas deve ser aplicada ao caso singular.
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Vejamos, então, quais são os três critérios fornecidos pela hermenêutica clássica para a
solução das antinomias aparentes. São eles:
• Critério temporal (cronológico): é conhecido pela máxima “lex posterior derogat lex an-
terior”, que significa: lei posterior revoga a lei anterior. O critério cronológico é contem-
plado pela LINDB em seu art. 2º, §1º, que assim dispõe:
LINDB, Art. 2º, § 1º A lei posterior revoga a lei anterior quando expressamente o declare, quando
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
(Destacamos)
• Critério da especialidade: é representado pela máxima “lex speciali derogat lex genera-
li”, segundo a qual a lei especial prevalece sobre a lei geral;
• Critério hierárquico: é definido pela expressão em latim “lex superior derogat lex infe-
rior”, ou, em português, lei superior revoga lei inferior.
A antinomia de segundo grau, como dito, não se satisfaz com a utilização de apenas um
desses critérios elencados acima. Ela representa um conflito heterogêneo, uma vez que en-
volve a utilização de dois critérios distintos, o que acaba implicando no conflito entre os pró-
prios critérios. Assim, podemos ter as seguintes possibilidades:
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Critério hierárquico versus critério da especialidade Nesse caso, como ensina Maria Helena Diniz, não há
uma meta-regra geral de solução do conflito, tratan-
do-se, em verdade, de antinomia real, cuja solução
dependerá da análise do caso concreto. De acordo
com Noberto Bobbio, “(...) no caso de um conflito no
qual não se possa aplicar nenhum dos três critérios,
a solução do conflito é confiada à liberdade do intér-
prete, poderíamos quase falar em um autêntico poder
discricionário do interprete, ao qual cabe resolver o
conflito segundo a oportunidade, valendo-se de todas
as técnicas hermenêuticas usadas pelos juristas por
uma longa e consolidada tradição e não se limitando
a aplicar uma só regra”. (BOBBIO, 1999, p. 100).
Nas antinomias de segundo grau, o critério cronológico se apresenta como o critério mais
“fraco” dentre os três, porque sempre cede lugar a outro.
1.1. Poder
Buscar impor uma definição ao termo poder é tarefa árdua, uma vez que o conceito não é
uniforme, moldando-se conforme o tempo e a corrente de pensamento adotada.
Vejamos as principais definições utilizadas:
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• Nicos Poulantzas, lastreado em Marx e Lênin, bem como na teoria da luta de classes,
define o poder como “a capacidade de uma classe social de realizar os seus interesses
objetivos específicos”. Essa é uma definição comum entre os adeptos da teoria política
marxista;
• Lasswell, por sua vez, conceitua o poder como “o fato de participar da tomada das de-
cisões”. A visão é recorrente nas teorias de decision-making process, sendo criticada
pelo fato de se apresentar como uma concepção muito voluntarista do processo de
tomada de decisões;
• Para Max Weber, poder é “a probabilidade de um certo comando com um conteúdo
específico ser obedecido por um grupo determinado”. A concepção weberiana se am-
para na visão de uma sociedade-sujeito, resultado dos comportamentos normativos
dos agentes sociais. Desse conceito, ganham destaque as ideias de “probabilidade” e
“comando específico”;
• Já Talcot Parsons parte da concepção funcionalista e integracionista do sistema social
para definir o poder como “a capacidade de exercer certas funções em proveito do sis-
tema social considerado no seu conjunto”.
1.2. Política
Obs.: para Aristóteles, política seria o ramo do conhecimento destinado a examinar a forma
de governo mais apropriada para alcançar o bem comum.
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Obs.: para facilitar os seus estudos, podemos apontar que, numa acepção moderna, a polí-
tica seria a atuação destinada à administração de uma determinada comunidade,
buscando fixar a sua estrutura e organização.
Observe que a política nada mais seria do que uma forma de atividade humana relaciona-
da ao exercício do poder. É por isso que Julien Freund a define como “a atividade social que se
propõe a garantir pela força, fundada geralmente no direito, a segurança externa e a concórdia
interna de uma unidade política particular...”. Essa possibilidade de fazer uso da força, aliás,
é o que distingue o poder político das outras formas de poder.
Para fins unicamente didáticos, destacamos outas definições mais específicas conferidas
ao termo:
a) política como tema genérico, em que se inserem os fatos cotidianos relativos às decisões toma-
das pelos governantes, na administração da coisa pública;
b) política como uma estrutura organizada para um determinado fim social de natureza pública,
confundindo-se com política pública (política educacional, política de saúde etc.);
c) política como a arte de conquistar, manter e exercer o poder, o governo (NICOLAU MAQUIAVEL);
d) política como os meios adequados à obtenção de qualquer vantagem (H0BBE5);
e) política como ciência política, que tem por objeto os sistemas de governo públicos e privados,
é dizer, os sistemas políticos e o comportamento político.
(...) qualquer estudo dos fenômenos e das estruturas políticas, conduzido sistematicamente e com
rigor, apoiado num amplo e cuidadoso exame dos fatos expostos com argumentos racionais. Nes-
ta acepção, o termo ‘ciência política’ é utilizado dentro do significado tradicional como oposto à
‘opinião’.”
Gaetano Mosca afirma que a ciência política seria o estudo da formação e organização do
poder, tendo sido desenvolvida a partir do século XIX, correspondendo ao resultado da
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evolução das ciências históricas. O método da ciência política seria, assim, a partir do estudo
das várias civilizações, o de apanhar o maior número possível de fatos históricos, de modo
que o cientista político deveria dominar toda a história da humanidade.
Destarte, os objetivos da ciência política, segundo o autor, consistiriam em:
• estudar as tendências que determinam o ordenamento dos poderes políticos;
• examinar as leis reguladoras da organização social;
• descobrir e conhecer as leis reguladoras da natureza social do homem e do ordena-
mento político das diversas sociedades humanas;
• examinar, como problema central, as formas pelas quais o poder político se organiza e
se desenvolve.
Obs.: ciência política é a ciência social dedicada ao exame dos sistemas, instituições, pro-
cessos e fenômenos políticos em um determinado Estado.
1.4. Estado
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Para haver um Estado perfeito, o governo deve ser soberano, não encontrando limites ju-
rídicos no plano interno e submetendo-se no plano internacional às regras voluntariamente
aceitas.
Marcello Caetano, quanto à soberania, a define como o poder político supremo, porque,
na ordem interna, não encontra limitações por nenhum outro poder; sendo também um poder
político independente, porque perante a sociedade internacional não precisa acatar regras
que não sejam voluntariamente aceitas.
É o Estado que detém e exerce o poder absoluto de autodeterminação e auto-organização
emanado do povo, titular da soberania (art. 1º, parágrafo único, da CF36).
País: é o território que abriga uma coletividade.
Nação: é o grupo de indivíduos que, tendo a mesma origem ou religião, ou os mesmos in-
teresses econômicos e morais, e, principalmente, um passado comum de tradições, unem-se
em torno de ideais e aspirações comuns. Em resumo: “trata-se do conjunto homogêneo de
pessoas que se consideram ligadas entre si por vínculos de ‘sangue’, idioma, religião, cultura,
ideias, objetivos.”
Assim, não é sempre que um povo constitui uma nação. Além disso, é possível concluir que
a nação pode surgir antes mesmo do próprio Estado e, inclusive, subsistir sem ele, a exemplo
da nação judaica antes da criação do Estado de Israel.
Finalidade do Estado
Há um debate sobre qual seria a finalidade do Estado, se ele seria um fim em si mesmo ou
se seria um meio para o alcance da felicidade humana. Darcy Azambuja se alinha a Ataliba
36
CF, art. 1º. Parágrafo único: Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição.
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Nogueira ao dizer que o Estado “é um dos meios pelos quais o homem realiza o seu aperfei-
çoamento físico, moral e intelectual, e isso é que justifica a existência do Estado”.
De todo modo, é certo que, no plano jurídico, o fim do Estado é a consecução do bem pú-
blico, de sorte a atender às necessidades inadiáveis da população, que serão traçadas segun-
do a doutrina sobre a qual este Estado se embasa e se estrutura.
Pela doutrina abstencionista, também conhecida como laissez-faire, que tem cunho li-
beral e está ligada à corrente de pensamento econômico dos fisiocratas, ao Estado cabe tão
somente a tarefa de manter a ordem, seja ela interna ou externa, de modo que tudo aquilo que
fugir à manutenção da ordem caberá à iniciativa privada. Aqui, o Estado atuaria apenas como
um garantidor da autonomia privada e do livre jogo de interesses (Estado mínimo), apenas
agindo de forma policial para restabelecer, quando necessário, a normalidade. Nesse Estado
de tipo gendarme, há poucas leis regulamentadores e prevalece o livre direito de propriedade.
Outra forma de conceber o Estado é pela visão socialista. Nela, o Estado não só represen-
ta a coletividade, mas assume o papel de agente condutor (conformador) da realidade social,
passando a atuar em todos os ramos de atividade. Os mais radicais da doutrina socialista
defendem que o Estado deve deter a propriedade de tudo o que interessa à população, distri-
buindo-a a cada um conforme critérios fixados por ele mesmo. Aqui, o objetivo seria o fim da
propriedade privada e, em última análise, o fim do próprio Estado.
Uma terceira doutrina, tida por eclética, buscou um meio termo entre o laissez-faire e o
socialismo. Consoante G. Sortais37, o lema levantado pelos ecléticos seria: “em vez de fazer
tudo, como defendem os socialistas, ou de fazer o mínimo, como pregam os abstencionistas,
o melhor é ajudar a fazer”. Sendo assim, para os ecléticos, ao Estado competiria apenas ações
de caráter supletivo, isto é, só atuaria em áreas que aos indivíduos seriam inviáveis.
Dessarte, a partir dessas ideias e da crítica ao Estado forte dos socialistas e ao Estado
mínimo do laissez-faire, emerge a proposta do Estado regulador e fiscalizador.
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Ideologias
Observe que a missão de apontar o fim para qual um Estado se presta está umbilicalmen-
te relacionado a ideologia predominante.
E o que seria ideologia?
A origem do termo se deve a Destutt de Tracy, que criou a palavra e lhe deu o primeiro de
seus significados: ciência das ideias. Posteriormente, esta palavra ganharia um sentido pejo-
rativo quando Napoleão chamou os adeptos de “ideólogos” no sentido de “deformadores da
realidade”. No entanto, os pensadores da Antiguidade Clássica e da Idade Média entendiam
ideologia como o conjunto de ideias e opiniões de uma sociedade.
No geral, a palavra acaba por desembocar em duas concepções opostas: uma neutra e
outra crítica. Na primeira acepção, usualmente utilizada no senso comum, o termo ideologia é
sinônimo de ideário (em português), contendo o sentido neutro de conjunto de ideias, de pen-
samentos, de doutrinas ou de visões de mundo de um indivíduo ou de um grupo de indivíduos,
orientado para suas ações sociais e, principalmente, políticas. Noutra via, para autores que
utilizam o termo sob uma concepção crítica, ideologia pode ser considerado um instrumento
de dominação que age por meio de convencimento (persuasão ou dissuasão, mas não por
meio da força física) de forma prescritiva, alienando a consciência humana.
Uma forma bastante conhecida, e crítica, de compreender a ideologia pode ser atribuída
a Karl Marx, por exemplo. Em sua obra “A Ideologia Alemã”, coescrita com Friedrich Engel,
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Marx concebe a ideologia como uma consciência falsa proveniente da divisão entre o traba-
lho manual e o intelectual. Nessa divisão, os ideólogos ou intelectuais operariam em favor da
dominação de uma classe social sobre a outra por meio de ideias que representavam uma
falsa compreensão sobre o modo como se processam as relações de produção. Com isso,
a ideologia, enquanto falsa consciência, camuflaria a realidade em prol dos interesses da
classe dominante.
Entretanto, não é apenas em “A Ideologia Alemã” que Marx trata do tema ideologia e, de-
vido a inconsistências entre seus escritos sobre o tema, não seria correto afirmar cabalmente
que possui uma única e precisa definição o sobre o termo.
Depois de Marx, vários outros pensadores se debruçaram sobre o tema, muitos comun-
gando do seu entendimento, mas outros abordando a ideologia como sinônimo de “visão de
mundo”, filiando-se a uma concepção neutra.
A Revolução Francesa foi um importante marco histórico, uma vez que por meio dela se
deu o surgimento de diversas ideologias, havendo quem afirme ter sido a responsável por
uma “tripla” revolução, eis que, embutidas nos seus valores de liberdade, igualdade e frater-
nidade, acabou por lançar as sementes do liberalismo, do socialismo e do nacionalismo. Não
bastasse, ela também fomentou o aparecimento de ideologias contrarrevolucionárias, como
o conservadorismo. O anarquismo também se inspirou na Revolução Francesa.
Mas a Revolução Francesa não foi a única responsável por deflagrar tais ideologias. A Re-
volução Americana, a Revolução Industrial e a crise na Europa do século XX também tiveram
papel nesse processo.
A seguir, delineia-se, de forma sumária, as principais ideologias contemporâneas.
Conservadorismo: surgiu como reação à modernização da sociedade, na época do Ilumi-
nismo, e preza pela manutenção do status quo social (ou seja, é a favor de manter as coisas
como estão), valorizando as tradições, inclusive as de governo, sobretudo o monárquico. No
entanto, ante a impossibilidade de conter os avanços da modernidade, surgiu o Neoconserva-
dorismo, que não se opõe à modernidade, mas defende que as mudanças devem ser operadas
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Uma vez examinada as suas possíveis finalidades e ideologias, vamos nos dedicar a en-
tender como o Estado atua para concretizá-los, ou melhor: como o poder político do Estado
se desenvolve?
Nas sociedades primitivas, o poder do Estado se concentrava em uma única pessoa ou
em um único grupo, de modo que todas as competências estatais eram deliberadas por um
único órgão supremo, a quem incumbia a tarefa de cuidar da defesa externa, da ordem interna
e do controle dos bens e serviços de caráter coletivo, inclusive das questões religiosas.
Acontece que o desenvolvimento da sociedade e o aumento de sua complexidade, aliados
à extensão territorial sob domínio de um único gestor, foram reclamando a necessidade de que
o poder fosse desenvolvido de maneira desconcentrada, até porque o exercício concentrado
deste motivou e justificou as mais diversas arbitrariedades no curso da história humana.
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O filósofo, no entanto, justificado pelo contexto histórico em que estava inserido, defendia
a concentração das citadas funções nas mãos de uma única pessoa, o soberano. Com isso,
a sua grande contribuição na teorização dos Poderes do Estado foi ter constatado a existên-
cia de três funções estatais distintas.
Montesquieu, por seu turno, muitos anos após as ideias aristotélicas, mas partindo do
pressuposto de que três seriam as funções estatais, inovou em seu “O Espírito das Leis” ao
afirmar que estas não deveriam ser da competência de uma só pessoa ou órgão, mas, sim, que
estariam umbilicalmente ligadas a três órgãos distintos, autônomos e independentes entre si.
Com efeito, defendia que o exercício do poder do Estado se dividiria em três órgãos: o Poder
Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário, cada qual responsável por uma função
estatal, assim definidas:
• Ao Poder Legislativo caberia a edição de normas gerais que por todos deveriam ser
cumpridas (função legislativa);
• Ao Poder Executivo caberia a aplicação das normas gerais editadas ao caso concreto
(função executiva);
• Ao Poder Judiciário caberia o julgamento dos conflitos surgidos com aplicação das
normas gerais, aplicando o direito ao caso concreto (função jurisdicional).
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O objetivo era superar os ideais absolutistas até então vigentes, o que acabou servindo
de substrato para o surgimento dos mais diversos e importantes movimentos, a exemplo das
Revoluções Francesa e Americana.
Mas, tenha cuidado, pois, além das bases teóricas lançadas por Aristóteles, as ideias con-
sagradas por Montesquieu também encontraram (grande) respaldo nos escritos formulados
por John Locke, que contribuiu para a separação dos poderes por meio das instituições ado-
tadas pela Grã-Bretanha em razão da Revolução Gloriosa de 1968. Consoante lição de Mano-
el Gonçalves Ferreira:
(...) a divisão funcional do poder — ou, como tradicionalmente se diz, a ‘separação de poderes’ —
que ainda hoje é a base da organização do governo nas democracias ocidentais, não foi invenção
genial de um homem inspirado, mas sim é o resultado empírico da evolução constitucional inglesa,
qual a consagrou o Bill of Rights de 1689. De fato, a ‘gloriosa revolução’ pôs no mesmo pé a au-
toridade real e a autoridade do parlamento, forçando um compromisso que foi a divisão do poder,
reservando-se ao monarca certas funções, ao parlamento outras e reconhecendo-se a indepen-
dência dos juízes. Esse compromisso foi teorizado por Locke, no Segundo tratado do governo civil,
que o justificou a partir da hipótese do estado de natureza. Ganhou ele, porém, repercussão estron-
dosa com a obra de Montesquieu, O espírito das leis, que o transformou numa das mais célebres
doutrinas políticas de todos os tempos (Destacamos)38
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de sua competência. Por isso mesmo, mais que uma forma de racionalização da atividade es-
tatal, o projeto de Montesquieu traz uma preocupação política e de proteção da democracia.”
1.5. Governo
Sistemas de Governo
Os sistemas de governo surgem a partir das diferentes relações que podem ser estabele-
cidas entre os poderes políticos do Estado, sobretudo entre o Executivo e o Legislativo.
São as principais espécies de sistema de governo: parlamentarismo, presidencialismo e
diretorial.
O sistema de governo parlamentar (ou parlamentarismo), também conhecido como go-
verno de gabinete, tem origem na Inglaterra do século XVIII, caracterizando-se pela divisão
do Poder Executivo entre o Chefe de Estado e o Chefe de Governo, este último escolhido pelo
Poder Legislativo e cuja manutenção na função depende do apoio do parlamento, que poderá,
por motivos éticos ou políticos, exigir a sua destituição do cargo.
Ao Chefe de Estado incumbe funções protocolares, de representação simbólica do Estado,
podendo ser desenvolvidas pelo Presidente da República, se adotada a forma republicana de
governo, ou pelo Monarca, se adotada a Monarquia40.
Quanto ao Chefe de Governo, função em regra exercida pelo Primeiro Ministro, cabe o
efetivo exercício do governo, com o auxílio do seu gabinete (conselho de ministros), sendo,
assim, o responsável pela execução das políticas públicas, o gerenciamento da máquina pú-
blica e a liderança da política nacional.
40
NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 11. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 643.
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O sistema presidencialista, por sua vez, tem origem nos Estados Unidos, em 1787, sendo
marcado pela existência de uma certa independência entre os poderes Executivo e Legislati-
vo, muito embora eles sofram interferências recíprocas, o que pode ser visto como expressão
da teoria dos freios e contrapesos.
O traço fundamental do sistema presidencialista é o exercício do Poder Executivo de ma-
neira autônoma pelo Presidente, que acumulará as chefias do Governo, do Estado e da Admi-
nistração Pública, sendo escolhido por meio de eleição direta (é a regra) ou indireta pelo povo,
o que denota a legitimação popular como uma das virtudes do presidencialismo.
Outra virtude, igualmente, é a definição de mandatos presidenciais com prazos fixos, re-
sultando numa maior estabilidade de governo.
Entre os pontos negativos, porém, está a concentração de poder num só agente, o que
pode fomentar regimes autoritários, bem como a necessidade de o presidente, a posteriori,
no curso do seu mandato, precisar formar uma maioria no parlamento para garantir uma boa
governabilidade.
Por fim, fala-se, também, no sistema diretorial ou governo de assembleia, regime identi-
ficado pela inteira subordinação do Poder Executivo ao Poder Legislativo, sendo o Executivo
constituído por uma comissão escolhida pelo Legislativo, correspondendo a um mero repre-
sentante deste.
No governo de assembleia, destarte, é o Legislativo o órgão que efetivamente dirige o
Estado.
Com origem na Revolução Francesa, hodiernamente esse peculiar sistema de governo
somente existe na Suíça, pelo menos de maneira formal. É que, apesar de a Constituição
determinar como responsabilidade da Assembleia Federal a eleição e a supervisão dos sete
membros do órgão Executivo, formado pelo Conselho Federal, este último paulatinamente
alcançou papel de destaque na direção do processo legislativo, além de sua atribuição na
execução da lei federal, surgindo uma forma de regime com muitas semelhanças com os Es-
tados parlamentares.
Resumindo:
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e grupos que habitam o interior do Estado, com imperatividade e força cogente. Embora tal
concepção carregue a ideia de “poder”, alguns autores rechaçam que a soberania seja um
poder, preferindo reconhecê-la como uma qualidade superior do Estado.
Por outro lado, a soberania externa é a autodeterminação e independência que determi-
nado Estado impõe em relação aos demais Estados; tem a ver, portanto, com a relação de
igualdade entre os Estados e com a ideia de não intervenção.
Duas teorias sobre a soberania ganham destaque: as teocráticas e as democráticas.
Para os teocráticos, amparados na teoria do direito divino, o poder soberano tem origem
em Deus e é pela vontade de Deus que há uma hierarquia entre governantes e governados.
Já a doutrina democrática, nascida na Idade Moderna, confere ao povo ou à nação o poder
soberano. São partidários desta concepção Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-
1704) e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778).
Para Thomas Hobbes, antes da vida em sociedade, o homem vivia em anarquia e violência,
no chamado estado de natureza. Era um cenário em que não havia hierarquia, mas um cons-
tante estado de beligerância, um guerreando contra o outro. O estado de natureza consistia
numa vida solitária, sórdida e brutal e só foi abandonado quando, por meio de um contrato
social, a soberania, antes dispersa, passou a ser exercida pela autoridade criada (o Estado).
Houve, portanto, uma transição entre o estado de natureza e o estado de sociedade.
O contrato social, segundo Hobbes, era irrevogável, sob pena de a humanidade retroceder
ao estado natural. O Estado, tal como o representou Hobbes, é um monstro alado – Leviatã –
que “abriga e prende para sempre o homem”. Na lição de Darcy Azambuja:
John Locke parte de uma premissa distinta. Para ele, o estado de natureza não era de
caos, mas de ordem e razão. Assim como Hobbes, Locke era contratualista, isto é, acreditava
que a sociedade política surgiu a partir de um contrato social. No entanto, a finalidade do Es-
tado seria a de assegurar a lei natural, bem como manter a harmonia entre os homens. Nesse
sentido, na pactuação do contrato, sustentava não ter havido qualquer abdicação ou cessão
de direitos naturais ao Estado.
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Como visto, foi de Locke a primeira formulação da separação dos poderes Executivo, Le-
gislativo e Judiciário, cada qual assumindo uma função essencial ao Estado. Em relação à
forma de governo, Locke tinha predileção pela democracia, mas também era simpático à mo-
narquia em que o Poder Legislativo fosse independente do rei.
Jean Jacques Rousseau, igualmente, adere à premissa do estado de natureza. No entanto,
o estado de natureza não era de caos, tampouco ordeiro e racional, como queria Locke. No
estado de natureza de Rousseau, o homem era livre e feliz. O progresso da civilização é que
trouxe a divisão do trabalho e da propriedade, segregando o homem entre ricos e pobres, po-
derosos e fracos. Nesse contexto, a sociedade política surge como um mal necessário para
evitar o recrudescimento das desigualdades e manter a ordem.
Rousseau entendia que, ao criar o Estado, por meio do contrato social, o homem cedia
parte dos seus direitos naturais em nome de uma entidade superior a todos, detentora de uma
vontade geral. No entanto, ao participar das decisões do Estado, o indivíduo retoma a parcela
de soberania que transferiu por força do contrato social. Para Rousseau, portanto, o verdadei-
ro titular do poder de Estado é o povo.
As teorias de Hobbes, Locke e Rousseau inspiraram diversas outras teorizações. As ideias
de Hobbes serviram de fundamento ao poder absoluto dos reis. Locke, por seu turno, influen-
ciou as declarações de independência e as Constituições dos Estados Americanos, assim
como a construção do pensamento democrático e individualista. Já a compreensão de Rou-
sseau sobre o contrato social serviu de lampejo para a fase rigorosa da Revolução Francesa.
Chegamos ao último tópico da nossa aula e para encerrarmos, após termos examinado os
principais conceitos relacionados à política e os pontos de interseção nas teorias concernen-
tes ao Estado, vamos entender melhor a relação entre a política e o direito.
O homem é um ser que, por natureza, é social. A sociedade está na base do indivíduo, uma
vez que as pessoas só constroem e se tornam autônomas na relação com os outros. Não é
por menos que Aristóteles, há muito, já afirmava o homem como um animal político, porque é
da sua natureza viver em sociedade. Aliás, o que distingue a sociabilidade humana da animal
é o discernimento entre o bem e o mal, o justo e o injusto.
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Posto isto, é da necessidade de regular a vida em sociedade que surge o direito, um con-
junto de normas cujo objetivo é harmonizar e disciplinar a convivência social. A sua existên-
cia, portanto, somente se justifica pela sua finalidade: solucionar os conflitos entre os indiví-
duos e os grupos sociais, promovendo o bem comum.
No Estado, o Direito define-se como o seu ordenamento jurídico, habitando num ambiente
onde prevalece a razão pública que, não raro, é contramajoritária e impositiva. Denota-se,
aqui, entre as finalidades do Direito, a imposição do respeito à ordem jurídica.
A política, porém, é a arte (porque requer sensibilidade e imaginação) ou ciência (porque
exige o uso de um método) de governar e direcionar os rumos do Estado. Com efeito, os fun-
damentos da política repousam sobre dois pilares: a soberania popular e o princípio majoritá-
rio. A política é pautada pela vontade (consenso) de uma maioria estabelecida.
Apesar das contradições teóricas, Direito e política se interconectam, especialmente em
dois momentos: na elaboração do direito e na aplicação do direito. O primeiro momento, que
envolve o processo legislativo de criação das normas jurídicas, tem maior destaque e dele
infere-se que a política é a raiz do direito. Nessa linha, a Constituição representa o ponto de
contato entre as duas searas, pois, em que pese ser o documento que alicerça toda a ordem
jurídica de um Estado, é fruto da política, tendo como missão instituir os poderes políticos e
demarcar o espaço de cada um deles.
Noutra via, não se discute que uma das marcas do mundo jurídico é a coerção, resultado
do poder político, que confere efetividade à ordem social de controle.
Assim, o direito é uma forma de dominação organizada pelo poder político, que também
sofre ingerências do poder econômico.
Para ficar mais claro, vamos nos debruçar sobre questão de concurso abaixo.
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Teoria Geral do Direito e da Política
Renato Borelli
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do direito e Teoria geral do direito e do Estado), Direito é uma ordem de conduta humana,
um conjunto de normas que formam uma unidade, um sistema. Política é a esfera de ações
relacionadas à conquista e ao exercício do poder em uma comunidade de indivíduos sobre
um território. A Política, para Aristóteles, não é apenas a ciência do Estado, mas é a maior de
todas as ciências, a arquitetônica das ciências (REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 19ª ed.
São Paulo, 2002, p. 625).
Para a Enciclopédia Jurídica da PUCSP:
Desse modo, as conexões entre Direito e Moral, Direito e Política, ou Direito e Economia encontram
sua razão de ser, objetivamente, nos nexos que os comportamentos exteriores revelam; mas, de um
ponto de vista subjetivo e correlato, residem na própria unidade espiritual, razão última e verdadei-
ra daquelas conexões. (idem, p. 305).
Para Bobbio, política e Direito se envolvem, uma vez que a ação política se exerce por meio do
Direito, ao passo que o Direito delimita e disciplina a ação política. Assim, a ordem jurídica é o
produto do poder político. Não deve haver outro direito que não seja o estabelecido ou reco-
nhecido pelo poder político, segundo Bobbio.
Portanto, leva-se em consideração a abordagem feita pelo candidato quanto à caracterização
da política e do Direito, podendo-se utilizar de correntes doutrinárias e teorias variadas em
sua argumentação, desde que sempre faça essa caracterização distinta e a íntima relação
entre esses conceitos.
O poder é definido como uma relação entre dois sujeitos, na qual um impõe ao outro a própria
vontade ou mesmo os meios que permitem alcançar os efeitos desejados. A Segundo
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Norberto Bobbio, a tipologia moderna das formas de poder estabelece três tipos: o poder eco-
nômico, o ideológico e o político. O poder econômico é “aquele que se vale da posse de certos
bens necessários para induzir aqueles que não os possuem a terem certa conduta”. O poder
ideológico é o domínio sobre as ideias e funda-se na influência de algumas ideias sobre a
conduta dos consociados, quando formuladas de determinado modo, emitidas em certas cir-
cunstâncias por uma pessoa investida de autoridade e difundidas por meio de determinados
procedimentos. Cumpre-se, assim, o processo de coesão e integração do grupo. O poder po-
lítico assenta-se na posse dos instrumentos por meio “dos quais se exerce a força física”; é o
poder coativo, o uso exclusivo da força para condicionar os comportamentos. Essa tipologia
é apresentada por Norberto Bobbio, na obra Teoria Geral da Política (a Filosofia Política e as
Lições dos Clássicos. Trad. Daniela B. Versiani. 12ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000).
Obs.: considerando que o enunciado da questão é expresso sobre “a tipologia moderna das
formas de poder estruturada por Norberto Bobbio, e os três tipos de poder segun-
do esse autor”, a abordagem de outras teorias ou de outros autores, como Niklas
Luhmann ou Max Weber, a exemplo, somente será levada em consideração para fins
argumentativos e de demonstração de domínio do conhecimento.
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Não obstante, aos pensamentos jurídicos acima, sem dúvida, no atual debate sobre a relação
entre Direito e Política, encontram-se as teses substancialistas, ou seja, na materialidade
dos direitos fundamentais e de teses procedimentalistas, as quais assegurem, de forma só-
lida, o processo democrático para que a própria participação defina as prioridades a serem
realizadas.
Colhe-se da doutrina:
Com efeito, muito embora procedimentalistas e substancialistas reconheçam no Poder Judi-
ciário (e, em especial, na justiça constitucional) uma função estratégica nas Constituições do
segundo pós-guerra, a corrente procedimentalista, capitaneada por autores como Habermas,
Garapon e John Ely, apresenta consideráveis divergências com a corrente substancialista,
sustentada por autores como Cappelletti, Ackerman, Tribe, Perry, Wellington, e, em alguma
medida por Dworkin, pelo menos na leitura que dele faz Robert Alexy, e no Brasil por juristas
como Paulo Bonavides, Bandeira de Mello, entre outros. Para mim – e por isto sou substan-
cialista – as teses procedimentalistas afastam o caráter dirigente-compromissário da Cons-
tituição (vejam-se as críticas de Habermas e Ely à legitimidade das decisões intervencionistas
dos Tribunais Constitucionais; já Garapon vai dizer que a invasão da sociedade pelo Judiciá-
rio serve para o enfraquecimento da democracia representativa). Por tudo isto, acredito que
temos que refletir acerca das tensões que exsurgem do embate entre procedimentalismo e
substancialismo e que consequência isto terá na sobrevivência da ideia de Constituição Diri-
gente (STRECK, L.L. Intervenção. In: J.N. MIRANDA COUTINHO (Org.). Canotilho e a Constitui-
ção Dirigente. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 80-81).
O debate entre as teses substancialistas e procedimentalistas também fazem refletir, de forma
interligada, sobre as correntes interpretativistas e as não interpretativistas, pois, para estes,
os juízes e os tribunais controlam a legislação por meio de opções valorativas do conteúdo
da Constituição, que só se revela por meio de procedimento que instaura o direito e lhe dá le-
gitimidade, e para aqueles as decisões judiciais devem ter como base o pensamento original
daqueles que elaboraram a Constituição.
Neste sentido, Bernardo Gonçalves Fernandes (In. Curso de Direito Constitucional. 9ª ed. Sal-
vador: Juspodivm, 2017, p. 195-225) relaciona correntes de pensamento que analisam o direito e
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nação. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.
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ro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.
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15. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017.
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Sortais, G. Andrea del Verrocchio. The Catholic Encyclopedia. Robert Appleton Company.
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ção, 2019.
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