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Faculdade Cathedral

Curso de Direito
Teoria Geral do Direito
Prof. Mauro Campello
1a. edição
2020.1

Unidade 2:
O Direito e as ciências afins.

1. Introdução:
Ciências culturais, ciências humanas, ciências morais e as ciências sociais
são as que têm por objeto material o comportamento humano, apesar de cada uma delas
ter objeto formal próprio, ou seja, a perspectiva mediante a qual contempla o homem e
estuda os fatos de sua conduta.
A ciência jurídica é uma ciência cultural que estuda o Direito, como objeto
cultural, isto é, como uma realização de espírito humano, com um substrato e um sentido.
A área das Ciências Humanas é o conjunto de ciências que tem como objeto
de estudo o ser humano. Por investigar o homem e a sociedade, essas ciências abordam
sobre diversos aspectos, sejam teóricos, práticos ou subjetivos, como linguagem, cultura e
produção de conhecimento. São áreas das Ciências Humanas: Direito, História, Sociologia,
Ciência Política, Pedagogia, Serviço Social, Psicologia, Administração e outras.
O Direito como ciência, valoriza, qualifica, atribui consequências a um
comportamento, não em função de critérios filosóficos, religiosos ou subjetivos, mas em
função da utilidade social. Portanto, o Direito como ciência se preocupa antes e
principalmente com a ordem e a segurança da sociedade.

Hans Kelsen1, em sua Teoria Pura do Direito2, classifica as ciências sociais


em:
a) causais – as que se ocupam do comportamento do homem segundo o
princípio da causalidade, procurando explicar aquela conduta tal como ela é de fato. Ex:
psicologia, história e sociologia.
b) normativas – as que tratam da conduta recíproca dos homens, não como
efetivamente se realiza, mas como ela, determinada por normas positivas, deve realizar-se.
Ex: ciência moral e Ciência Jurídica.
Obs: As ciências sociais normativas não estabelecem normas para o comportamento
humano, elas descrevem certas normas, postas por atos humanos, e as relações entre os
homens através delas criadas.

1
- Foi um jurista e filósofo austríaco. No ocidente, especialmente nos países europeus e latino-americanos, é
Direito. Por volta de 1940, a reputação de Kelsen já
considerado um dos mais importantes e influentes estudiosos do
estava bem estabelecida nosEstados Unidos, por sua defesa da democracia e pela Teoria Pura do Direito. A
estatura acadêmica de Kelsen excedeu a teoria legal e alargou a filosofia política e teoria social. Sua influência
abrange os campos da Filosofia, Direito, Sociologia, Teoria da Democracia e Relações Internacionais.
2
- A Teoria Pura do Direito é o ápice do desenvolvimento do positivismo jurídico. Para essa doutrina, o conhecimento é
restrito aos fatos e às leis que os regem, isto é, nada de apelar para a metafísica, a razão ou à religião. A ideia é elaborar
uma teoria do direito livre de qualquer especulação extra-jurídica (seja filosófica, ética ou política). Essa obra encontra-se
à disposição para leitura na biblioteca sóciojuridica Procurador de Justiça Mauro Campello (MP/RJ), que funciona na sala
201D, do bloco do Direito na UFRR, de segunda a sexta, das 8h às 12h e das 16h às 18h.
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Devemos deixar claro que o teórico do Direito não é uma autoridade, uma vez
que sua tarefa não é regulamentar a sociedade humana, mas conhecer as normas que
regem, procurando conhecê-las, ensinando como o homem deve comportar-se.
Conclusão: a Ciência Jurídica é uma ciência social normativa.

2. Noção de Filosofia do Direito:


Filosofia é uma palavra de origem grega:

De “philos” + “sophia”
amizade, amor… ciência, sabedoria…

Essa palavra surgiu em virtude de uma atitude atribuída a Pitágoras, que


recusava o título de “sophos” (sábio). Pitágoras foi um grande matemático e pensador, que
não se considerava senhor de todas as verdades. Reconhecia que não era capaz de
resolver todos os problemas do universo e de colocar-se tranquilamente diante deles.
Pitágoras preferia ser apenas um “amigo da sabedoria”, logo, um “filósofo”.
Inicialmente a Filosofia poderia ser vista como dedicação desinteressada e
constante ao bem e à verdade: dedicar-se ao conhecimento, de maneira permanente e não
ocasional, sem visar intencionalmente a qualquer escopo prático ou utilitário, eis a condição
primordial de todo e qualquer conhecimento filosófico.
No que se refere à Filosofia do Direito, seria ela uma perquirição permanente
e desinteressada das condições morais, lógicas e históricas do fenômeno jurídico e da
Ciência do Direito.
O Direito é um fenômeno histórico-social sempre sujeito a variações e
intercorrências, fluxos e refluxos no espaço e no tempo. Logo, o Direito não é estático, ele
é dinâmico, pois está em permanente transformação e mudança.

Sobre essas considerações chegaremos a três ordens de pesquisas, a que a


Filosofia do Direito procura responder:
a) Que é Direito?
b) Em que se funda ou legitima o Direito?
c) Qual o sentido da História do Direito?
A definição de Direito só pode ser obra da Filosofia do Direito. O conceito de
Direito é um problema de ordem filosófica, representando uma das tarefas primordiais de
caráter lógico que cabe ao filósofo do direito resolver.
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Outro problema que interessa à Filosofia do Direito é o relativo à legitimidade


ou fundamento do Direito:
a) Por que o Direito obriga?
b) Basear-se-á o Direito na força?
c) Será porventura o Direito aquilo que se ordena?
d) Pode-se explicar o Direito segundo critérios de utilidade?
e) Fundar-se-á o Direito na liberdade ou terá sua razão de ser na igualdade?
Observa-se das perguntas acima que elas envolvem o problema ético do
Direito (axiológico), isto é, dos valores do Direito.
Outro questionamento importante refere-se ao sentido da experiência jurídica,
tarefa do historiador do direito:
a) Há progresso na vida jurídica?
b) Pode-se afirmar que existem leis governando a experiência do homem nessa sua árdua
faina de fazer e refazer leis?
Em conclusão, o filósofo do direito indaga dos princípios lógicos, éticos e
histórico-culturais do Direito.
A Filosofia do Direito não se confunde com a Ciência do Direito, pois se coloca
perante a indagação científica para examinar as suas condições de possibilidade. O filósofo
do direito não fica adstrito ao tema de ordem lógica, indagando, concomitantemente, dos
valores éticos e históricos da juridicidade.

3. Noção de Sociologia Jurídica:


A Sociologia tem por fim o estudo do fato social na sua estrutura e
funcionalidade, para saber como os grupos humanos se organizam e se desenvolvem, em
função dos múltiplos fatores que atuam sobre as formas de convivência.
A Sociologia Jurídica é uma ciência positiva que procura se valer de rigorosos
dados estatísticos para compreender como as normas jurídicas se apresentam
efetivamente, isto é, como experiência humana, com resultados que não raro se mostram
bem diversos dos que eram esperados pelo legislador.
O objeto da Sociologia Jurídica não é a norma jurídica como tal, mas sim sua
eficácia ou efetividade, no plano do fato social. A Sociologia Jurídica não tem finalidade
normativa, no sentido de instaurar modelos de organização e de conduta, as suas
conclusões são indispensáveis a quem tenha a missão de modelar os comportamentos
humanos, para considerá-los lícitos ou ilícitos.
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4. Noção de Economia:
“Primo vivere, deinde philosophari.”
(“Antes viver e depois filosofar”)
Enunciado de Filosofia Existencial3.
Destaca-se entre os fins motivadores da conduta humana os relativos à nossa
própria subsistência e conservação, tendo as exigências vitais evidente caráter prioritário.
A regra é a satisfação primordial dos interesses relacionados com a vida e o seu
desenvolvimento.
Esse tipo de ação, orientada no sentido da produção e distribuição de bens
indispensáveis ou úteis à vida coletiva, é a razão de ser da economia. O que cabe analisar
é apenas a relação entre o fenômeno jurídico e o econômico, inclusive dado o significado
da concepção marxista4 da história na civilização contemporânea.
Para o materialismo histórico5 o Direito seria uma superestrutura, de caráter
ideológico, condicionado pela infraestrutura econômica. Para Marx é a infraestrutura
econômica que modela a sociedade, determinando as formas de arte, de moral ou de
Direito, em função da vontade de classe detentora dos meios de produção.
Essa abordagem metodológica (materialismo histórico) ao estudo da
sociedade, da economia e da história, entende que quem comanda as forças econômicas,
apropria-se do Estado e do Direito, apresentando suas violações em roupagens ideológicas
destinadas a disfarçar a realidade dos fatos.
Miguel Reale contesta esse pensamento afirmando que não se pode conceber
uma estrutura econômica anterior ao Direito e independente dele. Ainda para Reale, o
Direito está sempre presente em qualquer que seja a ordenação das forças econômicas.
Quando uma nova técnica de produção determina a substituição de uma
estrutura jurídica por outra, a nova estrutura repercute sobre a vida econômica,
condicionando-a.

3
- Existencialismo é um termo aplicado a uma escola de filósofos dos séculos XIX e XX que, apesar de possuírem
profundas diferenças em termos de doutrinas, partilhavam a crença que o pensamento filosófico começa com o sujeito
humano, não meramente o sujeito pensante, mas as suas ações, sentimentos e a vivência de um ser humano individual.
No existencialismo, o ponto de partida do indivíduo é caracterizado pelo que se tem designado por "atitude existencial",
ou uma sensação de desorientação e confusão face a um mundo aparentemente sem sentido e absurdo.
4
- Karl Marx foi um filósofo e revolucionário socialista alemão. Criou as bases da doutrina comunista, onde criticou o
capitalismo. Sua filosofia exerceu influência em várias áreas do conhecimento, tais como Sociologia, Política, Direito e
Economia. Uma das mais significativas contribuições de Marx ao pensamento contemporâneo se deu na sua forma de
compreender a história. Ao lado da crítica à sociedade capitalista, industrial ou burguesa, está a noção de história em
Marx a iluminar a produção do conhecimento na contemporaneidade.
5
- Foi elaborado por Karl Marx e Friedrich Engels, apesar deles nunca terem empregado essa expressão. Trata-se de
uma abordagem metodológica que procura as causas de desenvolvimentos e mudanças na sociedade humana nos meios
pelos quais os seres humanos produzem coletivamente as necessidades da vida. As classes sociais e a relação entre
elas, além das estruturas políticas e formas de pensar de uma dada sociedade, seriam fundamentadas em sua atividade
econômica.
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Reale conclui que entre economia e Direito há uma interação constante, não
se podendo afirmar que a primeira cause o segundo, ou que o Direito seja mera “roupagem
ideológico” de uma dada forma de produção.
Há uma interação dialética entre o econômico e o jurídico, não sendo possível
reduzir essa relação a nexos causais, nem tampouco a uma relação entre forma e conteúdo.
O filósofo do direito Rudolf Stammler6 se contrapôs ao materialismo histórico,
ou seja, a ideia do entendimento de que o Direito seria uma forma abstrata e vazia casada
a um conteúdo econômico, uma vez que o Direito está cheio de regras que disciplinam atos
totalmente indiferentes ou alheios a quaisquer finalidades econômicas.
Para o jurista italiano Tullio Ascarelli7, o Direito recebe os valores econômicos,
artísticos, religiosos etc, sujeitando-os às suas próprias estruturas e fins, tornando-os
jurídicos na medida e enquanto os integra em seu ordenamento.
Para os juristas aqui mencionados, assim como o fator econômico atua sobre
o Direito, este resulta também de elementos outros, de natureza religiosa, ética,
demográfica, geográfica etc. Para eles isto demonstra a unilateralidade e a inconsistência
de todas as teorias que enxergam no homem apenas uma de suas múltiplas dimensões.
O Direito, por destinação ética, converte em jurídico tudo aquilo em que toca,
para dar-lhe condições de realizabilidade garantida, em harmonia com os demais valores
sociais.

05. Noção de Ciência do Direito:


A Ciência do Direito tem por objeto o fenômeno jurídico tal como ele se
encontra historicamente realizado. Ela estuda o fenômeno jurídico tal como ele se
concretiza no espaço e no tempo. Isto significa que a Ciência do Direito é sempre ciência
de um Direito Positivo, isto é, positivado no espaço e no tempo, como experiência efetiva,
passada ou atual.
Em síntese, a Ciência do Direito é uma forma de conhecimento positivo da
realidade social segundo normas ou regras objetivas. O Direito Positivo é o Direito que, em
algum momento histórico, entrou em vigor, teve ou continua tendo eficácia. Assim, a
positividade do Direito pode ser vista como uma relação entre violência e eficácia.

6
- Foi um filósofo do direito alemão. Inspirador da corrente neokantiana no âmbito jurídico, conferiu à ciência do direito e
atribuiu-lhe metodologicamente os instrumentos do “fim e dos meios” contrapostos aos de “causa e efeito” das ciências
naturais. O mérito de Stammler reside na sua tentativa de superar o positivismo da sua época. É autor da teoria do
chamado Direito Natural de conteúdo variável.
7
- Foi um economista, jurista e professor italiano que viveu no Brasil de 1941 a 1946, expulso por sua condição
judaica pelas leis raciais do regime fascista na Itália. Lecionou na Faculdade de Direito da Universidade de Roma,
na Faculdade de Direito da Universidade de São Paul o e na Faculdade de Direito da Universidade de
Bolonha. Em 1947, recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade de São Paulo.
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06. Introdução à Ciência do Direito:


Para Miguel Reale, Introdução ao Estudo do Direito “é um sistema de
conhecimentos, recebidos de múltiplas fontes de informação, destinado a oferecer os
elementos essenciais ao estudo do Direito, em termos de linguagem e de método, com uma
visão preliminar das partes que o compõem e de sua complementariedade, bem como de
sua situação na história da cultura.”
A Introdução ao Estudo do Direito não é uma ciência no sentido rigoroso da
palavra, por faltar-lhe um campo autônomo e próprio de pesquisa. Trata-se de um sistema

de conhecimentos logicamente ordenados segundo um objetivo preciso de natureza


pedagógica.
Trata-se de uma ciência introdutória, ou seja, uma ciência propedêutica, um
sistema auxiliar e preparatório de conceitos posto na base das disciplinas jurídicas.

São fontes primordiais da Introdução ao Estudo do Direito:


1. Filosofia do Direito;
2. Sociologia Jurídica;
3. História do Direito; e
4. Teoria Geral do Direito.
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Fonte bibliográfica:
1. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2002.

Questionário sobre a Unidade 02.


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Responder as perguntas abaixo utilizando-se do texto da Unidade 02: O


Direito e as ciências afins.

1. A Ciência Jurídica pode ser considerada como uma Ciência Cultural? Justifique.
1. A Ciência Jurídica pode ser considerada como uma Ciência Social? Justifique.
2. Defina Ciência Social Normativa.
3. Dê o conceito de Filosofia do Direito.
4. Considerando o Direito como um fenômeno histórico-social, estaria ele sujeito a
variações e intercorrências no espaço e no tempo? Justifique.
5. A quem compete definir Direito?

6. Quais são as principais funções do filósofo do direito?


7. Qual a diferença entre Filosofia do Direito e Ciência do Direito?
8. Dê o conceito de Sociologia Jurídica.
9. Qual o objeto da Sociologia Jurídica?
10. Explique as ideias dos filósofos alemães Karl Marx e Rudolf Stammler sobre a relação
entre o Direito e a Economia.

11. Qual é o objeto da Ciência Jurídica?


12. Defina Direito Positivo.
13. Dê o conceito da Teoria Geral do Direito?
14. Qual a diferença entre Teoria Geral do Direito e Introdução ao Estudo do Direito?
15. Explique: “o Direito, por destinação ética, converte em jurídico tudo aquilo que toca,
para dar-lhe condições de realizabilidade garantida, em harmonia com os demais valores
sociais.”

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