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UNIDADE II – POPULAÇÃO E POVO; NAÇÃO E TERRITÓRIO;

PODER DO ESTADO
02.01 - Conceito de população;
02.02 - Conceito político e jurídico de povo;
02.03 - Conceito sociológico – Nação;
02.04 - Território: mar territorial, subsolo, plataforma continental e
espaço aéreo;
02.05 - Conceito de poder;1
02.06 - O princípio da legalidade e da legitimidade;
02. 07 – Soberania;
02.08 - Doutrinas teocráticas e democráticas.

Estado moderno e sociedade: População e povo; A nação;


Território do estado; O Poder do Estado;

População e Povo

Um conceito de Estado que não merece críticas: “(...) é a corporação


de um povo, assentada num determinado território e dotada de um
poder originário de mando” (Jelinnek citado por Bonavides, p. 71)

Em relação aos elementos constitutivos do Estado, os autores apontam


os de i) ordem formal e ii) os de ordem material. Os de ordem formal é
o poder político, que surge do domínio dos mais fortes sobre os mais
fracos. O de ordem material é o elemento humano (população, povo e
nação) e o território.

Bonavides conceitua população como “todas as pessoas presentes no


território do Estado, num determinado momento, inclusive estrangeiros
e apátridas” (p. 72). A população é assim um dado meramente
quantitativo. O fato de alguém inserir-se no conceito de população “de
um Estado nada revela quanto ao vínculo jurídico entre a pessoa e o
Estado não sendo também necessária a constituição de uma
vinculação jurídica especial para que alguém se inclua numa
população”, assim, concluir Dallari, população não é sinônimo de
povo.

Esta população tanto pode ser um fator positivo quanto negativo tendo
em vista o aspecto econômico. Os Estados do mundo antigo se
limitavam a cidades-estado e não tinham problemas de superpopulação
como têm os países subdesenvolvidos da modernidade. O aumento da
população é tema de preocupação para os cientistas da modernidade:
“não se trata de saber se haverá gêneros bastantes para alimentar a
humanidade, mas de conhecer ou prever a natureza ou média do
padrão de vida que aguardará a sociedade humana, mormente os
povos subdesenvolvidos, em face da explosão populacional na idade
da industrialização” (Bonavides, p. 75)
Mas o que é POVO? Há três perspectivas ou conceitos: o político, o
jurídico e o sociológico. É a partir da Revolução Francesa que o povo
passa da condição de objeto (absolutismo) para a condição de sujeito,
e esta mudança de status se dá por conta do sufrágio, da capacidade
de votar, ainda que limitada.

Conceito político de povo:

“Povo é o quadro humano sufragante, que se politizou (quer dizer, que


assumiu a capacidade decisória), ou seja, o corpo eleitoral. O conceito
de povo traduz, por conseguinte uma formulação história recente,
sendo estranho ao direito público das realezas absolutas, que
conheciam súditos e dinastias, mas não conheciam povos e nações”
(Bonavides, p. 80)

“Povo é aquela parte da população capaz de participar, através de


eleições, do processo democrático, dentro de um sistema variável de
limitações, que depende de cada país e de cada época” (idem)

Conceito Jurídico de povo:

“(...) exprime o conjunto de pessoas vinculadas de forma institucional e


estável a um determinado ordenamento jurídico, ou segundo Renelletti,
o conjunto de indivíduos que pertencem ao Estado, isto é, conjunto de
cidadãos” (Bonavides, p. 81)

“Conjunto de pessoas que pertencem ao Estado pela relação de


cidadania1” (idem), mesmo aqueles se não se acham no território do
Estado, é bom lembrar.

“Deve-se compreender como povo o conjunto dos indivíduos que,


através de um momento jurídico, se unem para constituir o Estado,
estabelecendo com este um vínculo jurídico de caráter permanente,
participando da formação da vontade do Estado e do exercício do
poder soberano” (Dallari, p. 100)

Os autores apontam três sistemas que determinam a cidadania:


Jus sanguinis: a cidadania é determinada pelo vínculo pessoal, do
sangue dos pais;
Jus soli: a cidadania é determinada pelo território;
Sistema misto: admite ambos os vínculos.

Conceito Sociológico de povo:

“Desse ponto de vista – o sociológico – há equivalência do conceito de


povo com o de nação. O povo é compreendido como toda a
continuidade do elemento humano, projetado historicamente no

1
Cidadania é a prova da identidade que mostra a relação ou vínculo do indivíduo com o Estado; é um
complexo de direitos e deveres e caráter público; é a soma de direitos e deveres políticos que ele tem
perante o Estado.
decurso de várias gerações e dotado de valores e aspirações comuns”
(Bonavides, 83)

A Nação

Como vários outros termos usados na ciência política, o conceito de


nação também é fugaz, com vários significados:

“(...) é um grupo humano no qual os indivíduos se sentem mutuamente


unidos, por laços tanto materiais como espirituais, bem como
conscientes daquilo que os distingue dos indivíduos componentes de
outros grupos nacionais” (Bonavides, 84).

“(...) o mesmo sentimento derivado da comunhão de tradição, de


história, de língua, de religião, de literatura e de arte, que são todos
fatores agregativos prejurídicos” (idem).

“(...) é uma sociedade natural de homens, com unidade de território,


costumes e língua, estruturados numa comunhão de vida e consciência
social” (Bonavides, p. 85)

Como se verifica dos conceitos, há fatores naturais (território, raça e


língua), históricos (tradição, costumes, leis e religião) e psicológicos
(consciência nacional) que servem de fundamentação à nação.

Elementos formadores do conceito de nação:

É um erro tomar isoladamente alguns elementos formadores do


conceito de nação. O nacional-socialismo de Hitler quis tomar a RAÇA
como característica mais importante do povo germânico e acabou por
perpetrar uma das maiores atrocidades da humanidade com os judeus.
Não pode a raça ser elemento único que caracterize a nação porque “a
verdade é que não há raça pura e assentar a política na análise
etnográfica é montá-la sobre uma quimera”

Seria a RELIGIÃO, o princípio da confissão religiosa esse elemento


explicativo do conceito de nação? Também não pode ser, tendo em
vista que existem religiões que alcançam vários Estados e tem Estados
que englobam várias religiões. O cristianismo da América latina; o
protestantismo da Europa ocidental.

“Já não há religião de Estado; pode-se ser francês, inglês, alemão,


sendo católico, protestante, israelita ou não praticando nenhum culto. A
religião se tornou uma coisa individual, contempla a consciência de
cada um. Já não mais existe divisão de nações em católicas e
protestantes” (Bonavides, 87)

Seria a LÍNGUA o vetor determinante de uma nação ou nacionalidade?


Também não. Há diversos Estados que falam vários idiomas: a Suíça
fala italiano, francês e alemão, e quem recusaria ao povo suíço sua
característica de nação?

E o que seria nação então?

“O homem não é escravo nem de sua raça, nem de sua língua, nem de
sua religião, nem do curso dos rios, nem da direção das cadeias de
montanha. Uma grande agregação de homens, sã de espírito e cálida
de coração, cria uma consciência moral que se chama nação”
(Bonavides, p. 91)

Território do Estado:

O conceito de território não gera tanta polêmica quanto o de nação,


cidadania ou outros termos tão caros à ciência política, havendo
discussão mais em relação a fundamentação jurídica do território em
relação ao Estado, como se verá mais a frente.

Eis alguns conceitos de Território:

“Território é a parte do globo terrestre na qual se acha efetivamente


fixado o elemento populacional, com exclusão da soberania de
qualquer outro Estado” (Bonavides, p. 94).

“Território é o espaço dentro do qual o Estado exercita seu poder de


império (soberania)” (idem).

Mas os autores têm se debatido acerca do seguinte: o território é


elemento constitutivo do Estado?

Não: entendem os autores dessa posição que o território é condição


necessária, mas exterior ao Estado; acham que da mesma forma que
todo indivíduo tem que por os pés em uma porção do solo, o Estado
precisa do território, mas a porção de solo que o indivíduo precisa pisar
não é parte do ser humano, é-lhe exterior.

Sim: o território faz parte do Estado, do contrário ele não existiria. O


território estaria para o Estado assim como o corpo para a pessoa
humana. Uma crítica a posição anterior: suponhamos que todos os
habitantes do principado de Liechtenstein emigrassem para o
estrangeiro, por acaso levariam consigo o Estado?

E uma tribo nômade poderia constituir um Estado? Os estudiosos


afirmam que sim, “desde que cumpridas certas exigências: a primeira
seria o grupo nômade possuir a intenção de ter como seu o território o
objeto de uma ocupação móvel e fugaz. A segunda, a capacidade
material de excluir pelo emprego da força a presença de outras tribos
nômades no espaço geográfico reservado às incursões do grupo.

Partes Integrantes do Território:


• Mar territorial: é aquela faixa variável de águas que banham as
costas de um Estado e sobre as quais exerce direitos de soberania.
Alcança certa distância da costa que varia seus limites nem sempre
com critérios uniformes. A primeira doutrina foi a do limite visual, é a
mais antiga, onde o critério era, até onde a vista alcançar; a segunda
doutrina utilizava o critério defensivo, ou seja, até onde as armas
alcançassem; política latino-americana prevê em 200 milhas o limite do
mar territorial; mas entre 3 e 12 milhas há dezenas de Estados que
adotam este limite. O mar Territorial brasileiro, conforme a lei 8.617/93,
no seu "Art. 1º. compreende uma faixa de doze milhas marítima de
largura, que equivale a 22.2 km, medidas a partir da linha de baixa-mar
do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de
grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil". Segundo a
referida lei no seu art. 2º. O Brasil exerce soberania no mar territorial,
ao espaço aéreo sobrejacente, bem como ao seu leito e subsolo. Além
dessa medida, há a zona econômica exclusiva (ZEE) que mede 200
milhas (370 km).
• Plataforma continental: A Plataforma Continental compreende o
leito e o sub-solo das áreas sub-marinas, não obstante as
deformidades existentes no solo sub-marino. Ainda que não exista no
direito exatidão no dimensionamento das áreas acidentadas contendo,
em alguns casos, montanhas submersas, o Estado exerce
exclusividade nos termos da legislação.
• Subsolo e espaço aéreo: a concepção moderna apresenta o
território de maneira geométrica em três dimensões, sob a forma de um
cone.

Fonte: https://www.mar.mil.br/menu_v/ccsm/imprensa/am_azul_mb.htm

Natureza Jurídica do Território:


Paulo Bonavides agrupa em quatro as teoria sobre a natureza jurídica
do território, ou seja, a relação entre território e Estado:

• Território-patrimônio: característica do Estado Medieval concebe o


poder do Estado sobre o território exatamente como o direito de
qualquer proprietário sobre um imóvel.
• Território-objeto: concebe o território como objeto de direito real de
caráter público; a relação entre Estado e território é de domínio.
• Território-espaço: é a teoria segundo a qual o território é a
extensão espacial da soberania.
• Território-competência: considera o território como âmbito de
validade da ordem jurídica do Estado.

Em resumo, Dallari (p. 90) ensina:

a) Não existe Estado sem território;


b) O território estabelece a delimitação da ação soberana do Estado;
c) Além de ser elemento constitutivo necessário, território, sendo o
âmbito de ação soberana do Estado, é objeto de direitos deste,
considerado no seu conjunto.

O Poder do Estado:

O termo poder tem grande abrangência e nos limites da disciplina


tomaremos o conceito de poder político, uma vez que entre os seres
humanos há diversas manifestações de poder, seja entre pais e filhos,
entre irmãos, entre empregador e empregado, entre professor e aluno
ou seja, interessa o poder exercido por alguns no âmbito da sociedade.

Do conceito de Poder:

“(...) o poder representa aquela energia básica que anima a existência


de uma comunidade humana num determinado território, conservando-
a unida, coesa e solidária” (p. 115)

Ou mais sinteticamente:

“(...) é a faculdade de tomar decisões em nome da coletividade” (p.115)

“(...) designa a capacidade ou a possibilidade de agir, de produzir


efeitos” (Bobbio. Vol. II, p. 933)

Os autores diferenciam o poder de fato e o poder de direito:


Poder de fato: é aquele que repousa unicamente na força, e a
sociedade exterioriza em primeiro lugar o aspecto coercitivo com a nota
de dominação material e o emprego freqüente de meios violentos para
impor obediência.
Poder de direito: é aquele que não é imposto pela força, mas sim a
partir do consentimento e aprovação do grupo, tendo em vista que no
Estado moderno há uma ‘despersonalização’ do poder, ou seja, uma
passagem do poder de uma pessoa para o poder das instituições.

E qual a relação entre força, poder e autoridade?

“(...) a força exprime a capacidade de comandar interna e


externamente; o poder significa a organização ou disciplina jurídica da
força e a autoridade traduz o poder quando ele se explica pelo
consentimento, tácito ou expresso dos governados (quanto mais
legitimidade mais autoridade)

Imperatividade e natureza integrativa do poder estatal:

Sociedade é termo genérico que abrange formas específicas de


organização social, “cuja distinção se faz pelos objetivos, pela extensão
e pelo grau de intensidade dos laços que prendem os indivíduos aos
diversos tipos de associação conhecidos, que vão desde as sociedades
religiosas até aquelas de cunho meramente recreativo” (Bonavides, p.
116)

O Estado é uma forma de sociedade, mas não é a mais vasta, posto


que se deva considerar a família ou o cristianismo, que ultrapassa a
extensão de vários Estados. Como distinguir, qual traço característico
que diferencia o Estado das demais sociedades? Responde Bonavides:

“Inquestionavelmente, esse traço fundamental se cifra no caráter


inabdicável, obrigatório ou necessário da participação de todo indivíduo
numa sociedade estatal. Nascemos no Estado e ao menos
contemporaneamente é inconcebível a vida fora do Estado”

Das outras sociedades participa-se se quiser, estando sempre livre aos


seus membros a porta de entrada e saída. O Estado é o único “que
possui o monopólio da coerção organizada e incondicionada, não
somente emite regras de comportamento senão que dispõe dos
meios materiais imprescindíveis com que impor a observância dos
princípios porventura estatuídos de conduta social” (p. 117)

A capacidade de auto-organização

O Estado é uma organização social que possui autonomia


constitucional, portanto, poder que exerce sobre os seus componentes
origina-se de um direito próprio. Há Estado sempre que o poder social
possa elaborar ou modificar por direito próprio e originário uma ordem
constitucional. Existindo poder autônomo financeiro, policial e militar
com capacidade organizadora e regulativa, ai existirá um Estado.

A unidade e indivisibilidade do poder:


A unidade e indivisibilidade do poder significa que somente pode haver
um titular do poder, no caso, o povo (Todo o poder emana do povo, que
o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição, parágrafo único do art. 1º da Constituição
Federal).

É importante diferenciar, no entanto, o titular do poder que é o povo


daqueles que exercem esse poder que são os diversos órgãos estatais:
parlamento, poder executivo, poder judiciário, ministério público, etc.
Essa distinção permite entender a aparente contradição entre o
postulado da unidade do poder em contraposição ao princípio da
separação de poderes consagrado pela teoria de Monstequieu.

“O poder do Estado na pessoa de seu titular é indivisível: a divisão só


se faz quanto ao exercício do poder, quanto às formas básicas de
atividade estatal” (p. 119).

Assim, o que se divide são as funções estatais: função legislativa, a


função executiva e a função jurisdicional.

O princípio da legalidade e legitimidade:

O princípio da legalidade está positivado na Constituição Federal no


art. 5º, inciso II:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa


senão em virtude de lei;

Pode ser conceituado da seguinte forma: “(...) traduz a noção de que


todo poder estatal deverá atuar sempre de conformidade com as
regras jurídicas vigentes, ou seja, é a acomodação do poder que
se exerce ao direito que o regula” (p. 120)

Significa o princípio da legitimidade a valoração que se acresce ao


princípio da legalidade, ou seja, é o critério que se busca para aceitar
ou negar o poder às situações da vida social que ele é chamado a
disciplinar.

O princípio da legalidade nasce da necessidade de se estabelecer na


sociedade humana regras permanentes e válidas, “que fossem obra da
razão e pudessem abrigar os indivíduos de uma conduta arbitrária e
imprevisível da parte dos governantes”. Onde o poder é absoluto reina
a intranqüilidade, a desconfiança, a insegurança posto que o governo
se acha dotado de uma vontade pessoal soberana, ou seja, onde as
regras de convivência não foram previamente elaboradas, nem são
previamente conhecidas.
A Constituição Francesa de 1791 assim prevê: “Não há em França
autoridade superior à da lei; o rei não reina senão em virtude dela e é
unicamente em nome da lei que poderá se exigir obediência” (art. 32,
capítulo II da Constituição Francesa). No outro lado do Atlântico,
Estados Unidos da América, eis o ideal de Thomas Jefferson, um dos
pais fundadores do estado norte americano: “governa da lei em
substituição do governo dos homens”.

1. A legitimidade do ponto de vista filosófico: “quando entramos a


fazer reflexões acerca das razões que regem a necessidade ou
inevitabilidade do poder político na sociedade, e indagamos por que
uns obedecem e outros mandam, ou figuramos o caráter de
permanência ou temporariedade do poder estatal como ordem coativa,
estamos na verdade levantando proposições de cunho filosófico”
2. A legitimidade do ponto de vista sociológico: para Weber há três
formas de manifestação da legitimidade, a saber, a carismática que se
assenta sobre as crenças havidas em profetas, heróis e demagogos;
nessa espécie o poder se baseia na direta lealdade pessoal dos
seguidores, mas apesar disso conserva esse tipo de legitimidade o
caráter autoritário e imperativo. A legitimidade tradicional se apóia na
crença de que os poderes de mando e direção comportam a virtude da
santidade, é o governante com autoridade patriarcal, o governante é o
senhor, o governado o súdito e o funcionário o servidor. E por último a
autoridade legal ou racional, que é o poder fundado no estatuto, na
regulamentação da autoridade, o tipo mais puro é o da autoridade
burocrática onde a obediência se presta não à pessoa, mas à regra de
conduta.
3. A legitimidade do ponto de vista jurídico: “intenta demonstrar que
a posse do poder legal em termos de legitimidade requer sempre uma
presunção de juridicidade, de exeqüibilidade e obediência condicional
etc.” (p. 128)

A Soberania: Os autores entendem a soberania atualmente como um


conceito histórico e relativo; surgido com o advento do Estado
moderno, não há nenhuma garantia que lhe assegure um futuro.

O conceito de soberania para Bobbio é o seguinte: “(...) indica o poder


de mando de última instância, numa sociedade política e,
conseqüentemente, a diferença entre esta e as demais associações
humanas em cuja organização não se encontra este poder supremo,
exclusivo e não derivado” (p. 1179, tomo II)

Ensina o mestre italiano que a soberania “pretende ser a racionalização


jurídica do poder, no sentido da transformação da força em poder
legítimo, do poder de fato em poder de direito” (idem)

Soberania do ponto de vista externo é apenas a qualidade do poder,


que a organização estatal poderá ostentar ou deixar de ostentar, ou
seja, há estados soberanos e não soberanos. Do ponto de vista
interno, a soberania fixa a idéia de predomínio que o ordenamento
estatal exerce num certo território e numa determinada população
sobre os demais ordenamentos sociais.

O Estado antigo não conhecia a noção de soberania porque o Estado


grego não conhecia o conflito interno entre poderes sociais, não se via
a rivalidade entre instituições, grupos, facções ou partidos políticos,
com o objetivo de quebrar a unidade monolítica do Estado (Bonavides,
p. 134).

No século XVII, com Bodin, a soberania tinha as seguintes


características: unidade, indivisibilidade, indelegabilidade,
irrevogabilidade e perpetuidade. Isso se justificava porque o Estado
moderno precisa se impor, “sua formação vinha precedida dos
antagonismos da idade média entre o poder espiritual e o poder
temporal, entre o imperador e os novos reis que surgiam da
decomposição dos feudos” e conclui Bonavides: “ A teoria da soberania
como poder supremo, com sede na monarquia, surge então como a
mais fascinante das teorias, a que vence, a que mais proselitismo faz
na sua época. Bodin assenta a doutrina desse poder supremo tendo
em vista sobretudo suas implicações nas relações com outros Estados.
Hobbes por sua vez, procede à teorização do poder soberano para
legitimar internamente a supremacia do monarca sobre os súditos” (p.
137)

Características da Soberania: una, inalienável e imprescritível.


Una: porque não se admite a convivência de duas soberanias no
mesmo Estado;
Inalienável: porque aquele que a detém desaparece quando fica sem
ela, seja o povo, a nação, o Estado;
Imprescritível: porque ela não tem prazo de validade.
E quais as teorias que tratam do titular da soberania? Quem são os
titulares da soberania? Para responder estas perguntas há duas sortes
de teorias, as doutrinas teocráticas e as doutrinas democráticas. As
teocráticas têm em comum a base divina que emprestam ao poder e as
democráticas assentam a soberania na vontade geral, do povo ou da
nação.
Teocráticas:

a) natureza divina dos governantes: é a mais rigorosa e exagerada das


doutrinas porque reconhecem os governantes como deuses vivos,
objeto de culto e veneração: faraós do Egito, imperadores romanos,
príncipes orientais e até mesmo o imperador do Japão até o fim da
segunda guerra mundial;
b) investidura divina: reputam os governantes como delegados diretos
e imediatos de Deus; os monarcas são responsáveis exclusivamente
perante Deus e não sobre os homens: reis franceses como Luis XIV e
XV.
c) investidura providencial: admite apenas a origem divida no poder,
tornando cada vez mais branda a intervenção da divindade em matéria
de política, cuja legitimidade se resume na observância escrupulosa do
bem comum.

Democráticas:

a) soberania popular: é a soma das distintas frações de soberania, que


pertencem como atributo a cada indivíduo, o qual, membro da
comunidade estatal e detentor dessa parcela do poder soberano
fragmentado, participa ativamente da escolha dos governantes.
b) soberania nacional: a nação surge como depositária única e
exclusiva da autoridade soberana; a multidão de indivíduos cada qual
com uma parcela de soberania cede lugar a uma única pessoa, a
nação.

A diferença entre as duas doutrinas democráticas: participação política


do eleitorado, que na nacional se limita àqueles que a nação investir na
função de escolha dos governantes e na popular se universaliza a
todos os cidadãos com o direito que lhes cabe por ser portador ou
titular de uma parcela da soberania.

Revisão do conceito de soberania: há autores modernos que entendem


tratar-se de um conceito já em declínio porque as ideologias pesariam
mais hoje em dia do que o sentimento nacional de soberania; além
desse motivo há outro que é a necessidade de criar uma ordem
internacional, vindo essa ordem ter primado sobre a ordem nacional.

A separação de Poderes: esse princípio apareceu na idade antiga


com Aristóteles que distinguia a Assembléia-Geral, o corpo de
magistrados e o corpo judiciário; na idade média com Marsílio de
Pádua, já se percebia a natureza das distintas funções estatais; John
Locke, bem menos afamado que Monstesquieu já fazia a distinção
entre os poderes executivo, legislativo e judiciário, mas foi em
Monstesquieu que essa doutrina ganhou mais prestígio e
conhecimento, com a publicação da obra “Do Espírito das Leis”.

A grande reflexão dessa obra diz respeito à liberdade, ou seja, fazer-


se tudo quanto permitirem as leis; também do mesmo autor é o
pensamento de que “todo homem que detém o poder tende a abusar
do mesmo”

“Distingue Montesquieu em cada Estado três sorte de poderes: o Poder


Legislativo, o Poder Executivo (poder executivo das coisas que
dependem dos direitos das gentes, segundo sua terminologia) e o
Poder Judiciário (poder executivo das coisas que dependem do direito
civil)” (Bonavides, p. 149). Obviamente que para cada um desses
poderes corresponde uma função distinta: o legislativo faz as leis para
sempre ou para determinada época, bem como derroga as que já
acham feitas; o executivo ocupa-se da paz e da guerra, envia e recebe
embaixadores, estabelece a segurança e previne invasões; o judiciário
cuida da faculdade de punir os crimes ou julgar os dissídios da ordem
civil.

O Estado que contar com essa divisão gozará de liberdade política que
é o sentimento de segurança, de garantia e de certeza que o
ordenamento jurídico proporciona às relações de indivíduo para
indivíduo, sob a égide da autoridade que governa. Se um só detém os
três poderes já deixou de haver liberdade, posto que essa
concentração de poder gera o despotismo, onde não há liberdade
política alguma.

Mas a genialidade de Montesquieu é a seguinte: “(...) não se cingiu a


teorizar acerca da natureza dos três poderes senão que engendrou do
mesmo passo a técnica que conduziria ao equilíbrio dos mesmos
poderes, distinguindo a faculdade de estatuir da faculdade de
impedir, que antecipa a técnica dos checks and balances,
desenvolvida posteriormente na Inglaterra.Exemplo da utilização das
faculdades se dá quando o executivo emprega o veto para enfrentar
determinada medida legislativa, ou seja, está usando a faculdade de
impedir.

Na prática constitucional do Estado moderno é muito comum as


manifestações das técnicas de controle, o executivo exerce o poder de
veto; pode conceder o indulto que é faculdade de modificar uma
decisão judicial; o legislativo por sua vez tem o poder de rejeitar o veto;
o processo de empeachment contra os membros do executivo;
aprovação de tratados; apreciação de indicações oriundas dos outros
poderes para o exercício de outros cargos; o judiciário julga os atos
administrativos do executivo e em alguns Estados cuidam do controle
de constitucionalidade.

Eis um trecho da dissertação de mestrado que este professor defendeu


e trata dessa matéria:

“ O autor de O Espírito das Leis inova em relação a Locke ao tratar da


possibilidade de um poder controlar o outro e esses controles seriam
na lição de Luis Gustavo Melo Grohmann: i) o veto do Executivo sobre
o Legislativo e ii) a compensar a impossibilidade do veto do Legislativo
sobre o Executivo, a capacidade que aquele teria de punir os
funcionários deste poder. É importante ressaltar, no entanto, que a
doutrina da separação de poderes tem viés liberal, na medida em que
se tratava de estratagema para impedir a concentração do poder na
pessoa do rei em detrimento dos interesses dos ricos, senhores de
propriedades, ou seja, a separação de poderes, assim, não era
invocada em nome do povo, mas da elite que se opunha ao Estado. O
cidadão a que se refere o Barão de Montesquieu não é a imensa
massa sem rosto denominada povo:

A liberdade política, em um cidadão, é esta tranqüilidade de espírito


que provém da opinião que cada um tem sobre a sua segurança; e
para que se tenha esta liberdade é preciso que o governo seja tal que
um cidadão não possa temer outro cidadão. Quando, na mesma
pessoa ou no mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está
reunido ao poder executivo, não existe liberdade; porque se pode
temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado crie leis tirânicas
para executá-las tiranicamente. Tampouco existe liberdade se o poder
de julgar não for separado do poder legislativo e do executivo. Se
estivesse unido ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade
dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se estivesse
unido ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor.
Tudo estaria perdido se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos
principais, ou dos nobres, ou do povo exercesse os três poderes: o de
fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os
crimes ou as querelas entre os particulares. 2

Em verdade, toda a história do Estado Liberal, destaca Bobbio, é a


busca incessante da realização do princípio da limitação do poder, uma
obsessão liberal. Esse controle de um poder em relação ao outro
remete ao tema da relação entre poder e direito, discussão travada
entre dois pontos de vista: de um lado aqueles que admitem a
preexistência do poder (soberania, sumo poder) em relação ao direito
ou à ordem jurídica, que não existiria sem um poder que a mantivesse
viva (Bobbio). Em contraposição a esse ponto de vista, existem
aqueles que reduzem o Estado a uma ordem jurídica, ou seja, antes
existe o direito e depois há o poder, aquele controlando este, aquele
domesticando este último, a teoria normativista de Kelsen. E opina
Bobbio sobre o assunto:

Contudo, que se trate apenas de dois pontos de vista distintos, que não
eliminam a ligação indissolúvel dos dois conceitos, pode ser provado
pelo fato de que o problema fundamental dos teóricos da soberania
sempre foi apresentá-la não como um simples poder, como um poder
de fato, mas como um poder de direito, isto é, como um poder também
ele autorizado e regulado, como os poderes inferiores, por uma norma
superior, seja esta de origem divina, seja uma lei natural ou então uma
lei fundamental (hoje diríamos constitucional), derivada da tradição ou
de direito consuetudinário. O problema fundamental do normativista, ao
contrário, é mostrar que um sistema normativo pode ser considerado
direito positivo apenas se existirem, em várias instâncias, órgãos
dotados de poder capazes de fazer respeitar as normas que o
compõem. O poder sem direito é cego, mas o direito sem poder é
vazio”. 3

E como estaria o princípio da separação dos poderes atualmente?

A separação de poderes já foi apontada como o melhor remédio para


garantia das liberdades individuais, mas desde que se desfez a
2
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Baron de. O Espírito das Leis. São Paulo: Mart ns Fontes, 1993, Livro XI,
capítulo VI.
3
BOBBIO, Norberto. Teoria geral da política. 12. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. p.
239-240.
ameaça de retornar o Estado ao absolutismo da realeza e a valoração
passou do plano individual para o social findaram as razões para uma
separação absoluta dos poderes do Estado moderno.

Bonavides faz uma indagação: “Como conciliar a noção de soberania


com a de poderes divididos e separados? O princípio vale unicamente
por técnica distributiva de funções distintas entre órgãos relativamente
separados, nunca porém valerá em termos de incomunicabilidade,
antes sim de íntima cooperação, harmonia e equilíbrio, sem nenhuma
linha que marque separação absoluta ou intransponível” (p. 158)

ADENDO SOBRE A PAZ DE WESTFÁLIA:

A Paz de Westfália

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» A Paz de Westfália: princípios Entre os dias de 15 de maio a 24 de
outubro de 1648, os principais plenipotenciários europeus assinaram nas
cidades alemãs de Münster e Osnabrück um grande tratado de paz que
fez história: a Paz de Westfália. Com ela puseram fim a desastrosa
Guerra dos Trinta anos, tida como a primeira guerra civil generalizada da
Europa, como igualmente lançaram as bases de um novo sistema de
relações internacionais. Acordo este baseado no respeito ao equilíbrio
dos poderes entre os estados europeus que passou a imperar no mundo
desde então.

A Guerra dos Trinta Anos

A Defenestração de Praga, católicos imperais são jogados pelas janelas


(1618)Entendida também por muitos historiadores como a Primeira
Guerra Mundial, ao ter envolvido praticamente todos os reinos europeus
(com exceção da Rússia), a Guerra dos Trinta Anos foi uma catástrofe
humana de dimensões até então desconhecidas no Velho Mundo.
Nenhum dos conflitos anteriores, dos tempos romanos ou medievais,
atingiu a extensão geográfica daquela Glaubenskrieg, a guerra das
confissões, como os alemães a denominaram. Dos Alpes ao Mar Báltico,
do Vístula ao Atlântico, as sucessivas e violentíssimas batalhas
arrastaram para dentro do seu caldeirão de morte, fome e peste, todos os
príncipes e os povos do Velho Mundo.
Iniciada em 1618, a partir do episódio conhecido como Der Prager
Fenstersturz, a Defenestração de Praga, quando alguns integrantes da
nobreza tcheca lançaram os representantes do imperador Fernando II
pela janela, a guerra logo disseminou-se pelo resto da Europa.
Envolvendo católicos contra protestantes, organizados partidariamente na
Liga Católica contra a União Evangélica (dividida entre luteranos e
calvinistas), atraiu ainda, numa sanguinária voragem, o Reino da Suécia
e o Reino da França, encerrando-se pela exaustão geral dos
contendores, trinta anos depois, em 1648, com a Westfälische Friede, a
Paz de Westfália. Neste período, a Alemanha, até então uma das regiões
mais prósperas da Europa Central, ao perder 1/3 da sua população (40%
da rural e 33% da urbana), tornara-se um país devastado, onde os lobos,
encorajados pela fraqueza geral dos habitantes, substituindo o terror
provocado pelos saques e rapinas dos lansquenetes e dos mercenários,
atacavam as cidades e vilarejos em alcatéias.

A Paz de Westfália: princípios

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» A Paz de Westfália: princípios Estima-se que estivessem presentes nas
duas cidades da Westfália onde o congresso de paz se reuniu, Münster e
Osnabrück, mais de 300 legatários, representando eles quase todas as
forças políticas importantes da Europa (exceto o Papado e o Reino da
Rússia). O primeiro ponto em que os diplomatas acordaram era de que as
três confissões religiosas dominantes no Sacro Império, o catolicismo, o
luteranismo e o calvinismo, seriam consideradas iguais. Revogava-se,
assim, a disposição anterior neste assunto, firmado pela Paz de
Augesburgo, em 1555, que dizia que o povo tinha que seguir a religião do
seu principe (cuius regios, eios religio). Isto não só uma brecha no
despotismo dos chefes como abriu caminho para a concepção de
tolerância religiosa que, no século seguinte, tornou-se bandeira dos
iluministas, como John Locke e Voltaire.

Atrocidades da Guerra dos Trinta Anos ( quadro de Nicholas Collot)

O segundo ponto do grande tratado procurou resolver os conflitos entre o


Imperador do Sacro Império e seus súditos, dando a estes maior
autonomia frente aos princípios do Absolutismo, ao tempo em que
reconheciam a independência definitiva da Holanda e da Suíça. Desde
então, o Sacro Império Romano das nações Germânicas manteve apenas
uma fachada de unidade, até que Napoleão Bonaparte o dissolvesse
definitivamente em 1806.
Por último e mais importante, sob o ponto de vista do direito internacional,
a Paz de Westfália assegurou um novo ordenamento jurídico entre os
reinos europeus. Além disso, formou uma nova ideologia do estado
soberano: a chamada Razão de Estado. Esta nova doutrina extraída das
experiências provocadas pela Guerra dos Trinta Anos, exposta e
defendida pelo Cardeal Richelieu, primeiro-ministro de Luís XIII, da
França, dizia que um reino tem interesses permanentes que o colocam
acima das motivações religiosas. Segundo tal doutrina, se for preciso, um
soberano católico devia aliar-se com um protestante, como a coroa da
França fizera com o rei sueco Gustavo Adolfo, um luterano, se isso for
melhor para os seus objetivos estratégicos gerais.
O antigo sistema medieval, por sua vez, que depositava a autoridade
suprema no Império e no Papado, dando-lhes direito de intervenção nos
assuntos internos dos reinos e principados, foi substituído pelo conceito
de soberania de estado, com direitos iguais baseados numa ordem inter-
governamental constituída por tratados e sujeitos à lei internacional.
Situação que perdura até os nosso dias, apesar de haver hoje,
particularmente da parte dos Estados Unidos e dos seus aliados da
OTAN, existir um forte movimento supranacional intervencionista, com o
objetivo de suspender as garantias de privacidade de qualquer estado
frente a uma situação de emergência ou de flagrante violação dos direitos
humanos.

Fonte:
http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/2003/01/13/000.htm

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