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Workshop da Motility Oral®

Estudo de Caso Clínico de Disfagia Orofaríngea Neurogênica: da


Avaliação ao Desfecho

Camila C. Pereira
Fonoaudióloga CRFa 5-3110-6
Doutoranda em Neuropsicologia
Mestre em Fonoaudiologia
Especialista em Motricidade Oral e
Fonoaudiologia Hospitalar
PARTE II
Posso manter traqueostomo ocluído mesmo não
passando nos preditivos?
FATO

A própria despressurização do sistema leva a
alteração na tosse, no gerenciamento da
secreção e na alteração da ausculta cervical

Basta ter patência de via aérea e tolerar


oclusão sem alterar sinais vitais para manter
ocluído o traqueostomo

IMPORTÂNCIA DAS ORIENTAÇÕES
Paciente não passava nos PREDITIVOS PARA DECANULAÇÃO: ausculta cervical

ruidosa, gerenciamento de secreção comprometido e tosse ineficaz

Qual seria a causa desses achados?

✓ Alteração no jogo pressórico (lábios e língua)

✓ Alteração na elevação laríngea

✓ Disfonia - Hipomobilidade de prega vocal (↓ pressão subglótica)

✓ Sarcopenia

✓ Desuso da musculatura supratraqueal


SESSÃO

❑ Ocluo TQT e avalio preditivos para Protocolo de Decanulação

❑ Não passou: tosse ineficaz, ausculta cervical ruidosa e ausência de gerenciamento de secreção

❑ Deixo TQT ocluído – orientações

❑ Suspendo fotobiomodulação salivar (Escala de Greenberg – nível 1) e performance muscular

❑ Realizo estimulação tátil-térmica (crioterapia) facial

❑ Realizo estimulação ice chip: melhora do TTO e presença de pigarro bem esporádico

❑ Mantenho exercício de língua: isometria

❑ Aplicação de bandagens
A GRANDE PERGUNTA É:

Embora não apresente PREDITIVOS para a decanulação,

posso manter TQT ocluído e realizar a AVALIAÇÃO DIRETA

DA DEGLUTIÇÃO?
SESSÃO

❑ Realizado Avaliação Direta da Degluticão

❑ Mantenho exercício de língua: isométrico

❑ Realizo aplicação de bandagem elástica


DADOS DA REAVALIAÇÃO INDIRETA ❑ Cânula de traqueostomia D.I. 8,0mm ocluída

❑ Hipotonicidade de língua / selamento labial ❑ Tosse fraca

❑ Boa higiene oral ❑ Característica vocal limpa

❑ Boa frequência de deglutição ❑ Não há necessidade de ser aspirado

❑ Sialorreia (Escala de Greenberg – nível 1) ❑ Sinais vitais estáveis / eupneico

❑ Boa elevação laríngea ❑ Afebril / boas condições pulmonares

❑ Pitch vocal hiperagudo normal ❑ Bom sistema imunológico (exames laboratoriais)

❑ Ausculta cervical ruidosa ❑ RASS 0 (calmo e alerta) / ECG 15T (consciente e orientado)
▪ A elevação do pitch e a deglutição compartilham substratos neurofisiológicos anatômicos e periféricos que envolvem
os ramos internos e externos do SLN (iSLN e eSLN)

▪ Pacientes com disfagia secundária a insulto neurológico, que podem ter impactado esses substratos compartilhados,
podem apresentar desempenho comprometido em ambas as funções
Critérios de Elegibilidade para Avaliação Direta

✓ Estabilidade neurológica: ECG ≥ 13 e HASS 0

✓ Estabilidade hemodinâmica

✓ Estabilidade respiratória: em AA, CatO2, NebO2, na VM em parâmetros mínimos

(fração inspirada de O2 (FiO2) ≤ 40%; pressão positiva expiratória final (PEEP) < 10

cmH2O; pico de pressão inspiratória (PIP) < 30 cmH2O

✓ Se IOT ≥ 48hs aguardar 24hs após extubação

✓ 24hs após a traqueostomia

✓ Paciente consegue ser posicionado?


Avaliação Direta
da deglutição

Protocolo de Ice Chip

Ocluir a cânula ou adaptar


válvula de fala: será possível?
Desinsuflar cuff
Tem indicação para isso?
OS QUATRO
PILARES DA
ATUAÇÃO NA
FONOHOSPITALAR

AV INDIRETA
ANAMNESE

DESFECHO
AV DIRETA
Uma grande ênfase na avaliação da disfagia é identificar anormalidades fisiológicas na deglutição que
contribuem ou explicam o risco de desnutrição e de aspiração
Protocolo Volume-Viscosity Swallow Test (V-VST)

❑ O V-VST é um método clínico sensível para identificar pacientes com disfagia


em risco de complicações respiratórias e nutricionais e pacientes cuja
deglutição pode ser melhorada com o aumento da viscosidade do bolo
alimentar

❑ A avaliação deve ser feita em três viscosidades (néctar, líquido e pudim) e em


três diferentes volumes (5 ml, 10 ml e 20 ml)

❑ É ofertado volume de dificuldade crescente com intuito de verificar se há sinais clínicos de prejuízo tanto na eficácia quanto na
segurança de cada deglutição. Além disso, o V-VST examina se a eficácia e a segurança da deglutição do paciente são melhoradas com
o aumento da viscosidade
Teste de Deglutição volume-viscosidade (V-VST)

❑ Paciente com V-VST negativo não precisa de nenhuma avaliação adicional para aspiração; em contraste, recomenda-
se uma avaliação mais aprofundada por avaliação instrumental em pacientes com V-VST mostrando qualquer sinal
clínico de segurança prejudicada para avaliar sua gravidade e fisiopatologia

❑ Além disso, o V-VST também pode ajudar a selecionar o volume / viscosidade


do bolus mais apropriado para pacientes com difícil acesso aos estudos VFS
porque a probabilidade de um efeito terapêutico comprovado da viscosidade
em um paciente identificado pelo V-VST é muito alta
O que eu uso?

▪ UTENSÍLIO: colher (5ml/sobremesa e 10ml/sopa) e copo


descartável

▪ ALIMENTO: suco de uva (pela cor e pela adesão)

▪ ESPESSANTE: ThickenUp Clear Nestlé


1 medida (néctar) 3 medida (pudim)

Espessante ThickenUp
Clear Nestle

Colher medida 1,2g


Consistências Ofertadas

▪ CONSISTÊNCIAS:

- Nível 2: ± 1,2 gramas (1 medida)

- Nível 0: sem espessar

- Nível 4: ± 3,6 gramas (3 medida)

Segundo a International Dysphagia Diet Standardisation Initiative – IDDSI, que fornece a terminologia e
definições padronizadas em nível global para descrever as consistências sólidas e líquidas, de acordo com a
viscosidade, método de consumo e habilidades orais necessárias

IDDSI: International Dysphagia Diet Standardisation Initiative [Internet]. 2016. [citado em 2012 Out 26].
Disponível em: https:// iddsi.org/framework/
Como eu faço?

1º) Néctar: 3 colheres de 5ml / 3 colheres de 10ml / 3 goles de 20ml

2º) Líquido: 3 colheres de 5ml / 3 colheres de 10ml / 3 goles livres (volume varia muito)

3º) Pudim: 3 colheres de 5ml / 3 colheres de 10 ml / livre demanda


Dados da Avaliação Direta

❑ Busca e apreensão do utensílio

❑ Ausência de resíduo oral após deglutição

❑ Tempo de trânsito oral adequado

❑ Boa elevação laríngea

❑ Tosse DURANTE para líquido (nas 3 tentativas com 5ml - INTERROMPO)


Dados da Avaliação Direta

❑ Deglutição múltipla ❑ Ausculta cervical ruidosa (mudou após oferta)

❑ Presença de pigarro ❑ Estabilidade dos sinais vitais

❑ Característica vocal boa ❑ Não houve saída de alimento pelo estoma


Verificar as alterações durante e após a ingestão do
volume, assim como da viscosidade oferecido ao
paciente, e classificar quanto à presença ou ausência
de segurança e eficácia de deglutição
Após avaliar propor a melhor viscosidade com
suas devidas estratégias compensatórias
A partir das condições de deglutição, o nível funcional de ingestão
de alimentos deve ser graduado pela Functional Oral Intake Scale
(FOIS), para estimativa da prevalência de disfagia

Crary MA, Mann GD, Groher ME. Initial


psychometric assessment of a functional
oral intake scale for dysphagia in stroke
patients. Arch Phys Med Rehabil.
2005;86(8):1516-20.
http://dx.doi.org/10.1016/j.
apmr.2004.11.049. PMid:16084801.
Escala Funcional pra Ingesta Oral (FOIS)

❑ Uma vez concluído o


processo de avaliação da
disfagia e análise dos
resultados, é necessário
definir a disfagia através de
uma escala de severidade
Classificar a severidade da Disfagia
ESCALA DE CLASSIFICAÇÃO DO GRAU DA DISFAGIA

❑ Tem como objetivo auxiliar na identificação do risco, na classificação da disfunção, como instrumento para auxiliar na
definição de condutas ou como parâmetro no controle da eficácia da reabilitação

❑ A maioria valoriza a penetração laríngea e a aspiração laringotraqueal do alimento como a variável que mais acentua o
comprometimento da disfagia, desconsiderando aspectos como o tempo de trânsito oral alterado e que pode levar a
um comprometimento da condição nutricional

Silva et al., 2012. Estudo multicêntrico sobre esclas para grau de comprometimento em disfagia orofaríngea neurogênica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 17(2):167-70
MASA

MASA – tem app, não tem tradução para o Brasil. Nele


concentra anamnese, AI e AD. Faz diagnóstico e não se
concentra apenas se paciente aspira ou não, avalia
portanto, a eficiência. Foi projetado como uma
ferramenta de avaliação clínica para a medição de
distúrbios neurológicos orofaríngeos adquiridos da
deglutição
MASA – Critério de Comprometimento da Deglutição

Normal: Nenhuma anormalidade detectada na deglutição

Suave/Leve: Atraso, distúrbio e/ou fraqueza de pelo menos um dos componentes da deglutição, afetando o
gerenciamento do bolo alimentar e aumentando levemente o risco de dificuldade para deglutir e aspirar.

Moderado: Atraso, distúrbio e/ou fraqueza de vários componentes da deglutição, aumentando moderadamente o risco de
dificuldade de deglutição e aspiração.

Severa: Atraso, distúrbio e/ou fraqueza de vários (geralmente cinco) itens da avaliação clínica, aumentando
substancialmente o risco de dificuldade de engolir e aspiração (pode incluir observação de dificuldade respiratória,
engasgo, tosse, mudança de cor, qualidade vocal rouca - molhada ou retardo do tempo de trânsito oral ou faríngeo).
Qual seria o Panorama do quadro clínico?

❑ Classificação quanto ao Grau de Disfagia: leve (MASA)

❑ Classificação quanto ao Grau da Disfagia (PARD): Disfagia orofaríngea leve a moderada - Existência de risco de
aspiração, porém reduzido com o uso de manobras e técnicas terapêuticas. Necessidade de supervisão esporádica
para realização de precauções terapêuticas; sinais de aspiração e restrição de uma consistência; tosse reflexa fraca e
voluntária forte. O tempo para a alimentação é significativamente aumentado e a suplementação nutricional é
indicada.

❑ Classificação quanto a ingestão de alimentos: dependente de via alternativa com uma consistência via oral – FOIS
nível 3 (transitório*)
Algumas Considerações...

❑ O transporte do alimento baseia-se no mecanismo de bomba propulsora resultante da pressão negativa na cavidade
oral em sincronia com fechamento velofaríngeo, constrição faríngea e fechamento glótico com a elevação e
anteriorização da laringe com proteção de via aérea inferior e abertura do EES (1)

❑ A deglutição é decorrente da ação de válvulas de pressão, com eventos em série, coordenadas e sincronizadas (2)

❑ A alteração no mecanismo da bomba propulsora nas válvulas de pressão pode ocasionar estase alimentar em região
faríngea, que pode resultar em aspiração após a deglutição(3)

1. Sordi M, Mourão LF, Silva AA, Flosi LCL. Importância da interdisciplinaridade na avaliação das disfagias: avaliação clínica e videoendoscopia da deglutição. Braz J Otorhinolaryngol. 2009; 75(6):776-87.
2.Langmore SE, Pisegna JM. Efficacy of exercises to rehabilitate dysphagia: A critique of the literature International. J. Speech-Lang Pathology. 2014; 17(3):222- 9.
3. Logemann JA. Treatments of oral and pharyngeal dysphagia Phys Med Rehabil Clin N Am. 2008; 803–816.
Algumas Considerações...

❑ Depois de apenas quatro a seis semanas de desuso, a massa muscular dos músculos esqueléticos pode
diminuir drasticamente, resultando em uma redução de até 40% na força [1]
❑ Pacientes disfágicos são conhecidos por provocarem deglutições espontâneas de saliva com menos
frequência do que outras contrapartes hospitalizadas, mas não disfágicas [2]
❑ Além disso, os pacientes que dependem de métodos de alimentação não oral têm menos necessidade de
ativar os músculos da deglutição [2]

1. Bloomfield S: Changes in musculoskeletal structure and function with prolonged bed rest. Med Sci Sports Exerc 29(2):197–206, 1997
2. Murray J, Langmore S, Ginsberg S, Dotsie A: The significance of accumulated oropharyngeal secretions and swallowing frequency in aspiration. Dysphagia
11(2):99–103, 1996
O que propor?

EFICIÊNCIA SEGURANÇA
SESSÃO

❑ Realizado Avaliação Direta da Degluticão

❑ Mantenho exercício de língua: isométrico

❑ Realizo aplicação de bandagem elástica

❑ Prescrevo estimulação sensorial com ice chip 2x/dia

❑ Solicito água com gás para a próxima sessão


EXISTEM 3 PILARES PARA A PNEUMONIA POR
ASPIRAÇÃO
Dr John Ashford projetou os "Três Pilares da Pneumonia" para ajudar a determinar quem está em risco de desenvolver a
pneumonia. Desse modo, 3 coisas devem acontecer em conjunto para que um paciente seja considerado “alto risco“. Eles
são os seguintes:

HIGIENE ORAL ASPIRAÇÃO SISTEMA IMUNOLÓGICO

▪ Para o paciente ter uma infecção pulmonar primeiro a aspiração precisa estar presente, estando presente ela não é
suficiente para ser infecciosa, precisa ser acompanhada por um agente patológico (bactéria oral). MAS ATENÇÃO:
mesmo que aspire e a higiene oral seja ruim, se o sistema imunológico for bom, não será considerado um alto risco de
infecção pulmonar
The Ice Chip Protocol

“As membranas das vias aéreas humanas são feitas para facilitar o transporte de fluido no útero enquanto são
preenchidas com fluido. Proteínas que transportam água, chamadas aquaporinas, revestem o epitélio e o endotélio dos
pulmões e facilitam a passagem do fluido pelo revestimento do pulmão. Na idade adulta, altos níveis de aquaporinas
ainda estão presentes e os pulmões permanecem altamente permeáveis à água”

❑ Lascas de gelo são ideais quando o fonoaudiólogo não está confiante na capacidade
do paciente de engolir com segurança e/ou tem doença pulmonar avançada (é
provável que esses pacientes aspirem qualquer coisa, por isso deve-se usar um bolo
benigno, como um pedaço de gelo)
O que poderia ser a CAUSA dos achados?

❑ Perda de força por desuso (língua, suprahióideos, constritores

faríngeos) : ausculta cervical ruidosa → pigarro → deglutição

múltipla

❑ Capacidade pulmonar reduzida: tosse ineficaz → compromete o

gerenciamento de secreção
PARTE III

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