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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE


CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
CURSO DE LICENCIATURA EM DANÇA

FRANCINE GOMES DA SILVA

A CRIANÇA AUTISTA E A DANÇA NA ESCOLA: INCLUSÃO E AMOROSIDADE

NATAL/RN
2018
FRANCINE GOMES DA SILVA

A CRIANÇA AUTISTA E A DANÇA NA ESCOLA: INCLUSÃO E AMOROSIDADE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Curso de Licenciatura em Dança da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Licenciada em Dança.

Orientadora: Profa Dra Larissa Kelly de Oliveira


Marques.

NATAL/RN
2018
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART

Silva, Francine Gomes da.


A criança autista e a dança na escola : inclusão e
amorosidade / Francine Gomes da Silva. - 2018.
35 f.: il.

Monografia (licenciatura) - Universidade Federal do Rio


Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes.
Licenciatura em Dança, Natal, 2018.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Larissa Kelly de Oliveira Marques.

1. Dança. 2. Autismo. 3. Ensino-aprendizagem. I. Marques,


Larissa Kelly de Oliveira. II. Título.

RN/UF/BS-DEART CDU 793.3

Elaborado por Francine Gomes da Silva - CRB-X


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
LICENCIATURA EM DANÇA

A apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado


A CRIANÇA AUTISTA E A DANÇA NA ESCOLA: INCLUSÃO E AMOROSIDADE,
apresentado por Francine Gomes da Silva, como requisito parcial para a
obtenção do título de licenciado em Dança, contou com a participação da seguinte banca:

________________________________________________
Profª. Drª. Larissa Kelly de Oliveira Marques - UFRN
ORIENTADORA

________________________________________________
Profº. Esp. Ciro de Almeida Sampaio - UFRN
EXAMINADOR

________________________________________________
Prof. Msª. Renata Celina de Morais Otelo - UFRN
EXAMINADORA
AGRADECIMENTOS

Minha eterna gratidão a Deus, por cuidar de tudo nos mínimos detalhes da vida. Ser
supremo e soberano. E que através dEle encontrei forças suficientes para dar continuidade a
esta caminhada acadêmica e pessoal, ao qual me deu a oportunidade em cursar um sonho, que
se tornou realidade ao longo desses quatro anos.
A minha família, base de toda a minha existência. Em especial ao meu Pai, por todos
os dias dedicados à mim, por ter tirado um pouco do seu tempo para me buscar na parada de
ônibus e me proteger silenciosamente em seu coração; e à minha Mãe, autora de toda garra e
determinação em minha vida, melhor amiga, companheira e que de vez enquanto me faz
enxergar a vida com outros olhos, cuidando sempre do meu bem estar e da minha saúde,
mesmo tendo tantas outras coisas para dar conta. Aos meus irmãos e a minha pequena
sobrinha/afilhada, vocês são responsáveis pela realização de mais um sonho, muito obrigada
por acreditarem em mim.
Ao meu noivo, minha gratidão por ter me acompanhado neste processo tão lindo da
minha formação acadêmica, auxiliando-me no que foi preciso e apoiando-me nas decisões
mais árduas. Agradeço também por dividir comigo o amor que sinto pela dança e fazer com
que ele se multiplique cada vez mais.
Ao Batalhão de Amor e à catequese infantil da Paróquia Santa Maria Mãe, onde estou
catequista há alguns anos; e que de modo indireto me deu forças para continuar todos os dias
na luta pela educação de qualidade para as crianças. Também agradeço as minhas alunas do
Ballet infantil onde estou professora atualmente.
À minha orientadora, Larissa Marques, pelos ensinamentos desde o primeiro semestre
do curso, por seu olhar compreensivo e por suas palavras de sabedoria que me conforta, pelo
incentivo e todas as correções que me faz crescer a cada dia.
Aos professores tanto da Licenciatura quanto de todo o meu percurso acadêmico, por
todas as experiências compartilhadas. Muito obrigada pelo tempo em que se dedicam ao
ensino da Arte para crianças.
Aos professores Ciro Sampaio e Renata Otelo, por aceitarem fazer parte da minha
banca examinadora e pelas contribuições ao meu trabalho.
Aos amigos da minha turma 2015.1 pela dança partilhada, companheirismo, sintonia e
amizade durante todos estes anos. E aos que vão se formar decidindo vencer toda a luta diária
na escrita do TCC, gratidão por compartilharem comigo todas as agonias, aflições, textos e
orientações.
E por fim, gratidão àquelas que estão sempre ao meu lado, compreendendo os meus
anseios, me ajudando em cada decisão, suportando cada lágrima e compartilhando as minhas
alegrias ou tristezas em cada dia, sei que posso ligar a qualquer hora e vocês me atenderão
com muito carinho. Minha eterna gratidão àquelas que a Dança me deu de presente e Deus
nos cativou de uma forma única e especial, minhas inspirações de todos os dias: Marina Silva,
Amanda Sousa, Aline dos Anjos, Ana Claudia Lino, Andressa Carla e Ravênia Lopes. Com
vocês aprendo todos os dias a amar e olhar a vida de modo singular e espontâneo. E não posso
deixar de mencionar àquelas que também contribuem bastante para o meu amadurecimento:
Viviane Lima, Maria da Conceição, Adriene Lima (e a pequena Maria Isabel), Mirlla
Dayanne, Jamille Melo, Júlia Gadelha, Mikaella Silva (e a pequena Maria Teresa) e Thayssa
Dantas vocês têm uma parcela única em minha vida, muito obrigada pelas orações e amizade
que me levam para mais perto de Deus.
RESUMO

O trabalho discute sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) na infância e a


inclusão dessas crianças no ensino da dança na escola. Abordamos brevemente em um relato
de experiência, desenvolvido ao longo do processo teórico e prático esse possível diálogo
entre a dança e as crianças com autismo. O estudo parte da curiosidade da discente em
pesquisar sobre o comportamento das crianças autistas em relação à dança nas escolas, para
tanto, dialogamos com autores tais como: Cunha (2017), Melo (apud PILLOTTO;
SCHRAMM, 2001) e Andrade (2018) entre outros. Entendemos que o ensino-aprendizagem
da dança para crianças autistas abrange uma perspectiva de possíveis modos de cognição até
fazê-las compreender o movimento em seu corpo; sendo uma fonte de inspiração, prazer e
criatividade corporal. Conclui-se que as pesquisas apontam que a área de Arte tem uma forte
influência neste processo de aprendizagem da criança autista, considerando as diversas
possibilidades de expressões, em que a criança não se limita a um modo de fazer ou como
fazer. Principalmente no que envolve a linguagem da dança, contextualizada e vivenciada no
ambiente escolar.

Palavras-chave: Dança. Autismo. Movimento. Ensino-aprendizagem.


ABSTRACT

The paper discusses Autism Spectrum Disorder (ASD) in childhood and the inclusion
these children in teaching dance at school. We will briefly discuss in an experience report,
developed during the theoretical and practical process this possible dialogue between dance
and children with autism. The study is based on the curiosity of the student to investigate the
behavior of autistic children in relation to dance in schools. Therefore, we have dialogues
with such authors as Cunha (2017), Melo (apud PILLOTTO; SCHRAMM, 2001) and
Andrade (2018) among others. We understand that dance teaching-learning for autistic
children encompasses a perspective of possible modes of cognition until we understand the
movement in their body; being a source of inspiration, pleasure and bodily creativity. It is
concluded that the research shows that Art area has a strong influence in this learning process
of the autistic child, considering the different possibilities of expressions, in which the child is
not limited to a way of doing or how to do. Especially in the language of dance,
contextualized and experienced in the school environment.

Keywords: Dance. Autism. Movement. Teaching-learning.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................9
2. CONHECENDO A CRIANÇA AUTISTA........................................................................12
3. ENSINO DA DANÇA E RELAÇÃO COM O AUTISMO..............................................15
4. DANÇA E INCLUSÃO.......................................................................................................18
5. AMOROSIDADE................................................................................................................25
REFERÊNCIAS......................................................................................................................28
ANEXOS..................................................................................................................................30
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1. INTRODUÇÃO

Podemos dizer que todo conhecimento que vem pelo amor possui a
excelência da perfeição. Acima de tudo, quem aprende e quem ensina precisa
antes do amor. O Amor é a sublimação do saber. Na inclusão, uma palavra de
amor! Eugênio Cunha.

Inicialmente, considera-se relevante o estudo básico sobre a síndrome do Transtorno


do Espectro Autista (TEA), aqui tratado como o autismo na infância observando o
desenvolvimento das crianças com relação à coordenação motora, tornando possível um
diálogo entre a dança e a inclusão das crianças com autismo no âmbito escolar.
O estudo parte da curiosidade da discente em pesquisar sobre o comportamento das
crianças autistas em relação à dança nas escolas, para tanto, dialogamos com os autores como
Cunha (2017), Melo (apud PILLOTTO; SCHRAMM, 2001) e Andrade (2018) entre outros.
Um dos motivos pela qual escolhi tratar desse tema foi o fato do meu percurso na área
da dança iniciar-se ainda quando criança, através do ballet clássico, estendendo-se até os dias
atuais. Venho buscando aperfeiçoar os conhecimentos e o contato com outros tipos de
expressões corporais, partindo dos pressupostos discutidos na graduação de licenciatura plena
em dança. Os conceitos e metodologias dos teóricos da área de dança Rudolf Laban e Edson
Claro forneceram-me subsídios para um amadurecimento tanto pessoal quanto profissional.
O contato com crianças autistas sempre desperta uma certa curiosidade por parte dos
profissionais da educação, pais e amigos que estão envolvidos neste processo de ensino-
aprendizagem; não foi diferente comigo. O contato que venho tendo em uma Escola Privada,
localizada na cidade de Parnamirim – RN desperta em mim, sendo professora de alunos
autistas o incentivo a trabalhar a coordenação motora, sonora e corporal desses educandos,
surgindo assim, um novo olhar ao qual abrange uma perspectiva de possíveis modos para
ensinar as crianças autistas e até mesmo fazê-las compreender o movimento em seu corpo;
sendo uma fonte de inspiração, prazer e criatividade corporal.
Esse interesse em estudar sobre as crianças autistas partiu das experiências que tive
como professora de Ballet clássico infantil no ano de 2014, em que me deparei com uma
situação de uma criança com 3 anos de idade ao qual demonstrava particularidades em relação
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às outras crianças. Nomeio aqui como o meu primeiro desafio dentro da Educação do ensino
da Dança nas escolas, ao qual me levou a estudar sobre os princípios básicos de identificação
dos deficientes.
Embora a criança não apresentasse laudo médico, algumas especificidades em seu
comportamento me chamaram a atenção e percebi a necessidade de trabalhar estimulando a
coordenação motora dessa criança juntamente com as professoras da mesma, e foi através do
Ballet infantil que o meu contato com ela tornou-se possível. A partir de então, acompanhei o
desenvolvimento dela durante três anos. Ao longo desse período a criança foi acompanhada
por profissionais da saúde e diagnosticada como portadora do Transtorno do Espectro Autista
leve.
Na época, o assunto ainda era muito desconhecido para a escola, e tivemos que estudar
possibilidades de ensino para que fosse feita a inclusão de forma satisfatória. Continuamos na
luta durante mais ou menos dois anos, e somente no terceiro consegui fazer com que a aluna
estivesse totalmente inserida no âmbito da dança, através do ballet lúdico infantil,
descobrindo a cada dia, novas possibilidades de movimentos.
De fato, o conhecimento que fui adquirindo na Universidade ao longo do curso de
Graduação em Licenciatura em Dança contribuiu positivamente para que houvesse um avanço
nas atividades propostas pelo ensino-aprendizagem da dança na vida dessa criança. Levando-a
a enxergar novas maneiras de movimentar o seu corpo, ser criativa e ainda interagir com as
demais crianças da sua idade, dentro das suas limitações.
O trabalho ora apresentado tem como objetivo discutir uma abordagem teórica do
ensino-aprendizagem das crianças autistas no contexto da dança na escola, buscando
compreender a linguagem das mesmas através do movimento, dando possibilidades de se
expressarem a partir do corpo que se move, da coordenação motora que lhes atraem no
despertar da criatividade, no ânimo e atenção pelo movimento.
Muitas crianças autistas demonstram danos sensoriais e motores ainda muito cedo, e
as intervenções pedagógicas, em especial a arte, auxiliam positivamente no processo de
aprendizagem dessas crianças, aperfeiçoando os estímulos no sistema nervoso e minimizando
os prejuízos sensoriais.
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Vale salientar que nem todos os autistas têm uma mente prodigiosa. A grande maioria
possui dificuldade de interação social. Entretanto, quanto mais cedo for diagnosticado, o
tratamento e a educação adequada vão melhorar consideravelmente a qualidade de vida da
criança, tornando a interação entre família, escola e amigos relevantes no processo do
desenvolvimento do autista.

Mais importante que a sugestão de exercícios específicos é a comunicação


da essência que deve haver em cada atividade, que precisa atender às
distintas necessidades do aluno, possibilitando ao professor expressar sua
criatividade com sensibilidade e amor (CUNHA, 2017, p. 13).

O artigo se pauta em um estudo qualitativo descritivo que contemplará dados do


desenvolvimento de experiências vivenciadas no ambiente de trabalho da discente, divididos
em quatro tópicos: Um primeiro denominado “Conhecendo a Criança Autista”, abordamos
uma breve contextualização sobre essa deficiência de acordo com a Organização Mundial da
Saúde. Um segundo tópico nomeado “Ensino da dança e relação com o autismo”, expomos
um pouco dessa relação do autismo com a dança. Já no terceiro tópico “Dança e inclusão”,
relatamos a importância da dança na vida de um aluno autista. No quarto e último tópico
“Amorosidade”, sintetizamos este amor que surge em minha segunda formação acadêmica,
mas que me atinge desde um primeiro olhar, onde pretendo aprofundar este estudo ao longo
da minha vida destacando ainda, o diálogo entre autores renomados das áreas de Dança,
Educação e Psicomotricidade; tais como Cunha (2017), Melo (apud PILLOTTO;
SCHRAMM, 2001), Andrade (2018), entre outros.
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2. CONHECENDO A CRIANÇA AUTISTA

Segundo a Lei de nº 12.764/20121, pessoas com deficiência são aquelas que tem
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
Considera-se pertencente ao Espectro Autista todo aquele que possui um diagnóstico
clínico significativo na interação social, manifestada na comunicação verbal e não verbal da
deficiência, ausente da reciprocidade social e padrões restritos e repetitivos de
comportamentos, interesses e atividades manifestadas por comportamentos motores ou
verbais estereotipados.
De acordo com a Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da
Organização Mundial da Saúde - OMS (1993), o autismo infantil foi classificado como
pertencente aos Transtornos Globais do Desenvolvimento, caracterizado por alterações
qualitativas que afetam o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças, como a interação
social, de comunicação, repertório de interesses e atividades restrito e estereotipado, que se
manifestam nos primeiros anos de vida, proveniente de causas ainda desconhecidas, mas com
grande contribuição de fatores genéticos, e cuja incidência é aproximadamente de 2-5
indivíduos para cada 10.000 com predominância de 4:1 no sexo masculino.
Percebe-se na criança o uso insatisfatório de sinais sociais, emocionais e de
comunicação, além da falta de reciprocidade afetiva. Ou seja, o autista possui dificuldades
para compreender-se indivíduo único na sociedade, pois tudo o que vai fazer ou quando quer
algum objeto, utiliza a mão de algum adulto para apanhá-lo.
Estima-se que a cada 110 pessoas, uma seja autista. Ou seja, o Brasil com 200 milhões
de habitantes, possui cerca de 2 milhões de autistas, segundo dados do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística). Dessa forma, a Organização das Nações Unidas (ONU),
instituiu o dia 02 de abril como sendo o dia Mundial de Conscientização do Autismo.

1 Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, também
conhecida como “Lei Berenice Piana”. Decerto, a definição do transtorno no texto da lei compreende com
clareza os aspectos sintomáticos do autismo.
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Apreciando também a alteração da Lei 13.301/2016 e do decreto 8.805/2016 as


crianças autistas, consideradas aqui como deficientes, também estão incluídas para receber o
Benefício de Prestação Continuada – BPC/LOAS2, consoante a Política de Assistência Social,
cujo objetivo é o de garantir a sobrevivência das pessoas que não têm condições de se
sustentar e que vivem em miséria, disponibilizando do valor do salário mínimo àqueles que
atendem aos requisitos previstos pela Lei.

Art 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,


independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por
objetivos: V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família,
conforme dispuser a lei.

No que diz respeito à Lei Orgânica da Assistência-LOAS 8.742/93, para


regulamentar e garantir de direitos através do Benefício de Prestação Continuada, encontra-
se regulamentado no artigo 20:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário


mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70
(setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

Neste contexto, podemos observar que há também um cuidado especial com as


crianças autistas e que os pais enfrentam muitas dificuldades durante o desenvolvimento da
criança. Pouco se sabe dessa Lei que ampara os deficientes e que os pais podem recorrer
para que boa parte dos custos sejam garantidos pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro
Social) junto ao Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.

2 Benefício assistencial, concedido e administrado pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social – órgão
ligado diretamente ao Governo Federal).
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Mais o que é realmente o autismo? Esta pergunta não é tão fácil de responder, pois
ainda não conseguiram encontrar respostas simples para seu contexto complexo característico
de comportamentos em transtorno. De modo conceitual, seus sinônimos demonstram
complexidade dos princípios de esclarecimento existentes até hoje, não havendo um padrão
fixo para a sua manifestação, e os sintomas variam grandemente.
Leo Kanner, psiquiatra austríaco, naturalizado americano, publicou as primeiras
pesquisas relacionadas ao autismo em 1943. Ele constatou uma nova síndrome na psiquiatria
infantil denominada, a princípio, de distúrbio autístico do contato afetivo. A denominação de
Kanner deveu-se à observação de crianças que não se enquadravam em nenhuma das
classificações existentes na psiquiatria infantil (CUNHA, 2017, p. 21). Para tanto, começamos
a compreender sobre este histórico do diagnóstico do autismo permeando as informações
existentes nas patologias diferenciadas da medicina.
O uso atual da nomenclatura Transtorno do Espectro Autista possibilita a abrangência
de diferentes níveis do transtorno, classificando-os de leve, moderado e severo. Por esta razão,
o autismo deixa de ser visto como um quadro específico para ser um conjunto de sintomas
iniciados na infância, em que a capacidade para pensamentos abstratos, jogos imaginativos e
simbolização ficam severamente prejudicada. Com efeito, o autista cria o seu próprio mundo,
exterior ao aprendizado.
Em alguns casos, podem apresentar convulsões, já que o autismo pode vir associado a
diversos problemas neuroquímicos e neurológicos. O desenvolvimento do autista precisa estar
sempre aos olhos especiais dos médicos, professores, fonoaudiólogos, terapeutas, psicólogos e
familiares que lidam com a criança todos os dias; não esquecendo do professor de arte/dança
que também tem um papel fundamental na vida do autista.
Para tanto, de acordo com a Legislação Brasileira, na Lei 12.764, é direito da pessoa
com Transtorno do Espectro Autista, o acesso a: a) educação e ao ensino profissionalizante; b)
à moradia, inclusive à residência protegida; c) ao mercado de trabalho; d) à previdência social
e à assistência social.
Segundo Cunha (2017), a atuação dos profissionais da escola é fundamental, uma vez
que muitos casos de autismo foram percebidos primeiramente no ambiente escolar. Na escola,
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devem-se utilizar o afeto e os estímulos peculiares do aluno para conduzi-lo ao aprendizado,


porque, na educação, quem mostra o caminho é quem aprende e não quem ensina.
E por isso, devemos ter este olhar estudioso enquanto professores para que os direitos
dos autistas sejam garantidos de forma satisfatória no que diz respeito ao ambiente escolar.

3. ENSINO DA DANÇA E RELAÇÃO COM O AUTISMO

Como inspiração para este trabalho, tentarei transmitir a serenidade e conhecimento


que a Universidade Federal do Rio Grande do Norte junto aos Docentes da Licenciatura em
Dança, me proporcionaram ao longo desses anos, onde a teoria e a prática foram de suma
importância para transformar vidas todos os dias, me dando subsídios na prática pedagógica,
ampliando a minha visão didática cotidiana.
As disciplinas vivenciadas ao longo do curso, me fizeram compreender a prática
pedagógica como forma essencial na vida de uma criança. Destaco a importância dos
conteúdos abordados na disciplina de Coreologia (disciplina ministrada no primeiro semestre
do curso), por exemplo, onde realizamos um primeiro contato no âmbito Universitário em
relação ao corpo. Onde entendemos que a dança é encarada como uma linguagem, fazendo-se
necessário esse estado imaterial onde habitam as imagens e as ideias motivando o ser
imaginário do próprio movimento. Assim, o estudo do corpo parte das primícias fundamentais
da conscientização corporal, auxiliadas pelo estudo da Anatomia humana dentre outras
disciplinas que foram experimentadas, ou até mesmo “degustadas” (como diz o professor
Juarez Moniz3).
Começamos a pensar nesta infância que necessita de compreensão, principalmente nos
anos iniciais de sua vida, seja ela afetiva, familiar ou escolar, pois são nestes primeiros anos
que a formação de caráter da criança é eventualmente concretizada e as disciplinas de
Psicomotricidade e Educação Infantil, realizadas no Departamento de Educação Física,
integralizaram o meu contato com o espaço escolar em relação à criança e que é necessário
respeitar cada fase de sua vida, que por sua vez, Miguel Arroyo (1994) considera importante

3Mestre em Artes Cênicas e docente substituto da disciplina de Conscientização Corporal no Departamento de


Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no ano de 2015.2.
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essa infância sendo algo que está em permanente construção, ressaltando ainda que “uma das
coisas mais ricas em nossa sociedade é o conjunto de lutas pelos direitos. Hoje, a criança, pelo
seu momento social, já é considerada como alguém que tem a sua própria identidade, seus
direitos” (1994, p. 89).
A princípio, vamos tratar este diálogo como ponto estratégico de ensino-aprendizagem
da dança para crianças autistas, realizando uma pesquisa teórica sobre o assunto e
possivelmente trazendo elementos reflexivos de inclusão na escola.
Entramos em um contexto de possíveis contribuições da dança na escola com crianças
autistas, em que o professor precisa ser o principal autor desse desenvolvimento, estimulando
o aluno na prática do movimento expressivo, ao qual será como uma ponte entre a dança e a
criança autista, levando em consideração as perspectivas de inclusão.
Segundo Melo (apud PILLOTTO; SCHRAMM, 2001, p. 48), o ensino da arte atua no
processo de aprendizagem, propiciando à criança a compreensão de sua história como ser
humano, estimulando e ampliando a sua percepção do mundo e possibilitando a construção da
autonomia. Concordando com a autora, percebemos que a arte em geral, é uma forte
influenciadora no contexto social e inclusivo para uma criança autista, pois dará novas
possibilidades de compreender, dependendo do grau do autismo, o despertar para movimentar
o seu corpo.
O autista nos faz caminhar por uma utopia de defeitos e de erros que queremos sempre
concertar, mas que pelo menos nos dá uma virtude: a visão de um novo jeito de Amar.
Para Cunha (2017), o sucesso de conhecer e identificar o autismo mostra que o
educador precisa saber o que construir com a criança, oferecer um currículo de atividades
funcionais, falar sobre a família e a escola, facilitar o conhecimento da escola inclusiva,
estando no amor e no entusiasmo movido pela fé que cada criança autista nos proporciona em
diversos momentos.
Dependendo do nível do autismo, conseguimos enquanto professores, trabalhar a parte
sensorial das crianças através de atividades lúdicas em um primeiro momento da aula,
aguçando a curiosidade do aluno para aquela determinada brincadeira, havendo um
dinamismo entre o jogo de coordenação motora e equilíbrio, e atividades para que seja
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despertado o lado artístico; já que a maioria deles têm afinidade com a tinta ou texturas
plasticinas.
A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) no que compete a linguagem da Arte
articula-se nos saberes referentes a produtos e fenômenos artísticos; envolvendo a prática de
criar, ler, produzir, construir e refletir sobre processo de aprendizagem em Arte:

A prática artística possibilita o compartilhamento de saberes e de produções


entre os alunos por meio de exposições, saraus, espetáculos, performances,
concertos, recitais, intervenções e outras apresentações e eventos artísticos e
culturais, na escola ou em outros locais. Além disso, o compartilhamento das
ações artísticas produzidas pelos alunos, em diálogo com seus professores,
pode acontecer não apenas em eventos específicos, mas ao longo do ano,
sendo parte de um trabalho em processo (BNCC, 2016, p. 191).

O despertar da criança autista precisa partir do interesse constante do professor de


dança em querer ajudá-lo a compreender esta linguagem como parte do seu corpo e
possibilidades de inclusão através da dança, onde somos responsáveis como mediadores pelo
processo de elaboração de conhecimento do aluno.
Diante desse cenário, não podemos deixar de mencionar que as recentes modificações
na legislação brasileira, inclui as artes visuais, a dança, a música e o teatro como linguagens
do componente curricular da educação básica.
A partir da Lei nº 13.278/16, a dança é considerada obrigatória na educação básica:

O § 6o do Art. 26 O ensino das artes visuais, a dança, a música e o teatro


constituirão componentes curriculares obrigatórios, nos diversos níveis da
educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos
alunos.

Assim, segundo os Parâmetros Curriculares Nacional (PCN – Arte), o conhecimento


da arte abre perspectivas para que o aluno tenha uma compreensão do mundo na qual a
dimensão poética esteja presente: a arte ensina que é possível transformar continuamente a
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existência, que é preciso mudar referências a cada momento, ser flexível. Ou seja, dar novas
possibilidades é fundamental para que as condições de aprendizagem sejam contínuas e
positivas.
A persistência em trabalhar com crianças com deficiência é fruto desse amor,
reconhecendo os valores que a Educação Básica proporciona e que as vezes nos faz refletir
sobre a nossa conduta enquanto professores.
Precisa haver uma relação entre o professor de dança e o aluno autista, iniciando assim
uma construção de autonomia corporal, embasado nas dificuldades em compreender a
subjetividade de cada criança. Isso desencadeia possibilidades de ensino de importância
afetiva e cognitiva.
Este olhar de inclusão no ensino da dança contribui positivamente para que os
profissionais da área sejam merecedores de colocar em prática os conhecimentos teóricos,
experimentando utilizar as vivências presentes ao longo da licenciatura. Valorizando a dança
no contexto escolar e na sociedade.
Apesar das dificuldades que permeiam este processo, temos como aliados, a
sensibilidade em estar aberto ao outro, tocar e ser tocado, pelo fato de possuirmos um olhar
especial, entendendo o corpo e como ele se comporta em determinadas situações. Contudo,
sabemos que cada criança possui um tempo, e que é necessário esperarmos o
desenvolvimento cada qual em sua particularidade espontânea.

4. DANÇA E INCLUSÃO

O ensino da dança nas escolas vem permeando diversos caminhos aos quais tornam-se
importantes na aprendizagem motora e sensorial das crianças, no conhecimento do corpo e de
suas potencialidades expressivas.
As pesquisas apontam que a área das artes tem uma forte influência neste processo de
aprendizagem da criança autista, tendo em vista as diversas possibilidades de expressões em
que a criança não se limita a um modo de fazer ou como fazer. Principalmente no que envolve
a linguagem da dança, contextualizada e vivenciada no ambiente escolar.
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É importante observar que a licenciatura me fez compreender este olhar para a


educação em dança ao qual precisamos efetivamente nos dedicar, esforçar e cultivar essa
dimensão da amorosidade nas aulas.
Porém, sabemos também que a Universidade é apenas uma porta de entrada, mas
quem é o gerador de conhecimentos somos nós, por isso, precisamos ir muitas vezes procurar
disciplinas que não são da nossa grade curricular obrigatória (no caso da Licenciatura em
Dança) para podermos nos formar sobre a Educação Especial, que tanto cresce nas escolas
atualmente.
É necessário ter uma visão mais ampla quando tratamos do autismo, pois não podemos
esperar enquanto professores, que o aluno autista chegue para nós e nos fale o que está
acontecendo. A compreensão precisa estar disposta nos contextos comportamentais que
demandará vigilância, sensibilidade e perseverança do educador.
“A criança precisa aprender a função de cada objeto e o seu manuseio adequado”, assim
Eugênio Cunha (2017, p. 52) quer nos mostrar que cada criança tem as suas particularidades,
e de fato, os autistas são atraídos pelos objetos que rodam e balançam, porém muitas vezes
não sabem a finalidade daquele objeto/brinquedo. Para tanto, os professores precisam
aproveitar este momento de encantamento pelo objeto, para fazer de sua aula um mundo
externo, onde a vida é mais colorida e onde o foco precisa estar na aprendizagem daquela
criança e não nos resultados de imediato. Até porque a criança autista requer de nós muita
paciência, dedicação, compreensão e amor.

As abordagens educacionais baseadas tão somente em conceitos científicos


não podem mover as barreiras das dificuldades de aprendizagem, pois elas
não subsistirão sem o amor (CUNHA, 2017, p. 53).

O espaço onde deve haver a proposta de ensino da dança, precisa ser muito agradável,
para que a criança possa se sentir à vontade. Despertando o interesse para as atividades
motoras, sensoriais e inclusivas. Mas, o professor também precisa estar disposto a aprender a
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se relacionar com este mundo autístico. É essencial atrair a criança pelo olhar para educá-la,
pois ensinaremos a devida importância que o autista tem sob este mundo.
Os elementos físicos são de suma importância neste processo, pois eles concentram o
olhar da criança. Seja com um balão, ou um jogo de motricidade, haverá um contato maior
entre o autista e o objeto quando são bem estimulados. Com isso, podemos trabalhar os níveis
espaciais baixo, médio e alto na competência de explorar os movimentos na dança, mesmo
que a criança autista não perceba.
É interessante o quanto as pesquisas sobre o TEA e as suas principais características vem
sendo recorrentes em relação à primeira descrição em 1943 em que os avanços contribuem
positivamente para que haja um diagnóstico precoce do transtorno, facilitando o tratamento
específico e eficaz na vida da criança.
Partindo do pressuposto de que tudo o que é novo para um autista, torna-se um desafio,
pois quebrar a rotina diária requer muito esforço e atenção, um mundo repleto de
responsabilidade e surpresa pode ser confuso para ele. Entretanto, esta rotina pode ser
transformada em uma ferramenta, criando possibilidades de ensino-aprendizagem.
Paralelo a este ensino, relatamos aqui a eficiência dessa rotina aplicada em uma criança
autista com 08 anos de idade, recém-diagnosticado. A escola propôs fazer uma rotina diária de
atividades, e a dança como estímulo corporal está incorporada a esta rotina durante 30 min a
cada duas vezes por semana, agindo de modo a complementar na vida dessa criança.
Atualmente, trabalho a dança com este aluno testando as habilidades cognitivas,
desenvolvendo o equilíbrio e a coordenação motora através da psicomotricidade4.
“A nível prático, a psicomotricidade objetiva desenvolver e compreender a linguagem do
corpo e o controle corporal. A capacidade de coordenar e dissociar os diversos segmentos
corporais”, a partir do que a autora Gonçalves (2004, p. 12) nos revela, podemos pensar nesta
capacidade de coordenação do corpo de uma criança autista, onde o seu principal déficit é em
coordenar a sua fala oral. No entanto, como professores somos esta ponte que liga o aluno ao
seu objetivo de falar com o corpo aquilo que não consegue expressar pela voz.

4 Integração das funções motoras e psíquicas em consequência da maturidade do sistema nervoso. Ampliando a
capacidade criativa nos exercícios de coordenação motora e equilíbrio aliados às aulas de dança nas escolas.
Pensando na participação de todos os alunos, juntamente a inclusão de crianças com necessidades especiais, aqui
tratados como portadores do Transtorno do Espectro Autistas.
21

Em alguns casos de crianças com autismo leve ou moderado (que já sabem falar ou não
tem muitas dificuldades na dicção), os movimentos explorados em seu corpo, nos dá uma
visão de liberdade; envolvendo alegria e superação dos seus limites. Porém, são muito
sensíveis ao som e por isso, as aulas de dança a princípio precisam partir do pressuposto de
não haver músicas, para que sejam trabalhadas as percepções corporais de cada criança.
Sendo uma das características do autismo, a sensibilidade ao ambiente sonoro, precisa
ser respeitada diante de quaisquer sons, pois são inconvenientes aos seus ouvidos, geralmente
eles não gostam de realizar atividades que contenham muita poluição sonora ou até mesmo
sons ambientes.
Para tanto, as aulas de dança se dão em uma determinada escola no Município de
Parnamirim, no Rio Grande do Norte, onde além de acompanhar uma criança autista
individualmente, tive também a oportunidade de aplicar algumas vivências em dança na turma
do Ensino Infantil com 25 crianças, sendo 1 autista. Com ajuda das professoras, tínhamos um
encontro semanal (segundas-feiras), com a durabilidade de trinta e cinco minutos cujo
objetivo foi trabalhar a coordenação motora e conhecimento corporal dos alunos.
Para trabalhar com o ensino da dança com crianças autistas, precisamos de uma
organização pontual na elaboração das atividades, destacamos a importância dos
planejamentos de aulas, que logo mais citarei um exemplo, partindo do pressuposto de três
premissas fundamentais aos quais utilizo como meio de metodologia do ensino da dança nas
escolas: a) Práxis na realização do trabalho (é importante as crianças perceberem neste
primeiro momento, o que vai acontecer na aula do dia), b) a realização da práxis (observação
do processo durante a aula para que assim possamos realizar uma reflexão futura com os
demais professores daquela turma, caso haja modificações, trabalhar para que sejam
adaptadas nas próximas aulas), e o c) Roda final de partilha (aqui os alunos vão expressar os
seus sentimentos através da palavra, dizer o que mais gostaram da aula, o que não gostaram e
o que pode ser acrescentado/mudado. Facilitando a minha prática pedagógica nas aulas
seguintes, havendo uma aproximação entre professor – aluno).
Vale ressaltar, que os alunos autistas, dependendo do nível da deficiência, provavelmente
não participarão desse último momento, estando sentados e concentrados. Pois qualquer outra
coisa poderá chamar atenção dele, e na maioria dos casos eles não têm a fala definida, o que
22

não fará sentido para ele este momento de conversa com a turma. Logo, observamos que as
crianças autistas de fato, vivem no mundo diferente do nosso, e que necessitamos
compreender que todos os dias eles trarão algo novo para que possamos aprender com eles o
real sentido da nossa prática pedagógica, de maneira que este conhecimento se efetive
compartilhando com seus pares5 os sentidos e significados das propostas de dança para gerar o
advindo da relação das teorias e das práticas a fim de estabeler uma fonte de saber.
Como mencionado, as aulas são divididas em três importantes momentos em que
estabeleço o contato com os alunos e prossigo em uma aula de dança de acordo com a turma
(segue plano de aula em anexo). Como exemplo, destaco uma das aulas cujo principal
objetivo foi realizar uma atividade motora utilizando um elemento (neste caso, um balão),
expliquei para a turma que o balão é o nosso “coração” e que ele neste primeiro momento não
poderia ser solto pelo chão. Logo após o aquecimento do membros superiores e inferiores,
dividi a turma em dois grandes grupos. O primeiro, precisaria explorar os movimentos dos
membros superiores (cabeça, mão, braço e cotovelos) de modo que o “coração” não caisse no
chão. Já o segundo grupo precisou explorar os membros inferiores (coxa, joelhos, pernas e
pés). Quando todos já tiverem explorado todos os membros, foi hora de executar os mesmo
movimentos, só que agora seria sem o balão. De modo que ao final desse processo, eles
estivessem dançando com estas várias possibilidades que foram descobertas ao longo da aula.
Durante a aula, houve também o processo de apreciação corporal (enquanto um grupo
executava, o outro observava as possibilidades de movimentos) e experiência com os níveis
espaciais alto, médio e baixo; fazendo com que os alunos ampliassem o vocabulário corporal
de modo divertido e sem reservas.
Para a turma do Ensino Infantil, o primeiro passo foi fazer com que a criança autista
escolhesse um balão de sua preferência, obviamente a cor escolhida foi a sua preferida. Ao
longo do processo, foi pedido para que o restante da turma percebesse também o silêncio
(com uma dinâmica do silêncio) para que a amiga autista participasse da aula de forma
satisfatória. E de fato, isto ocorreu. Com a ajuda da professora de sala, conseguimos fazer

5 Princípio afetivo, cognitivo e psicomotor, aqui considerada como disponibilidade corpórea e criatividade
inventiva da criança. Segundo as autoras Stephen L. Cone e Theresa P. Cone.
23

com que as crianças percebessem a importância do silêncio para uma criança autista, e mesmo
que houvesse, porventura algum susurro não afetaria tanto a atividade.

Imagem 1 – Aula de dança, alunos fazendo o primeiro contato com o balão através de um
breve aquecimento corporal. Fonte: Arquivo da Pesquisadora.

E como resultado desse trabalho, podemos perceber junto à equipe pedagógica da escola,
situada no Município de Parnamirim; no qual as crianças têm apresentado mais disposição
corporal e atenção nas disciplinas recorrentes da rotina escolar. As crianças autistas vem
interagindo mais com os demais colegas de sala, tem se organizado melhor com os seus
pertences, e percebe-se uma melhoria na obediência em sala de aula.
As descobertas dos autistas são muito influenciadas pelas sensações com pouca
inferência cognitiva. Contudo, o estímulo com materiais lúdicos torna-se fundamentais neste
processo de ensino e aprendizagem.
24

Imagem 2: Aula de dança com material lúdico Balangandã6 desenvolvido junto com o aluno para um melhor
aproveitamento no processo de aprendizagem. Fonte: Arquivo da Pesquisadora.

Imagem 3: Aula de dança com material lúdico (balão), explorando o nível alto.
Fonte: Arquivo da Pesquisadora.

6 Material lúdico produzido em uma das aulas de dança durante o processo de ensino-aprendizagem.
25

5. AMOROSIDADE

“É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir [...].”
(Trecho da música: “Tocando em frente” – Almir Sater e
Renato Teixeira)

Imagem 4: Amorosidade. Fonte: Arquivo da Pesquisadora.

É este amor que me move todos os dias, que me inspira neste processo de ensino-
aprendizagem, com essa busca incansável de um mundo paralelo ao meu, e de perguntas que
podem não serem respondidas neste exato momento, mas me fazem acreditar que é possível
sim aprender e ensinar a dança para estes pequenos seres humanos chamados de Amor,
nomeados de Autistas.
O amor pela dança iniciou-se ainda quando criança, inocente e pura trouxe para o meu
corpo influências do ballet clássico, em que é recorrente até os dias atuais. De modo mais
concreto, consciente e apaixonante pude compreender que através dessa arte consigo
transformar a realidade de outras crianças, que assim como eu, tem a oportunidade de
conhecer a dança através do seu corpo.
A arte em mim começa a ser mais nítida no ensino fundamental II, onde tive o privilégio
de ter professoras encantadoras, responsáveis pela minha decisão em tornar-me professora.
26

Eles me fizeram acreditar que o Ensino da Arte em escola pública é muito mais do que
desenhar ou pintar, é transmitir o que temos de mais precioso dentro de nós, e expressar no
corpo tudo aquilo que as palavras não conseguem falar.
De modo singular, tento repassar tudo aquilo que aprendi durante a minha formação de
caráter para os meus alunos, e mais ainda, tento contribuir positivamente na vida dessas
crianças que necessitam de um olhar especial, pois precisamos alimentar nossa ação
pedagógica com amorosidade.
Cada vez que danço, sinto-me como uma flor que apesar de não possuir asas para voar,
ela consegue exalar um cheiro de amadurecimento todas as vezes que desabrocha. Neste
sentido, a criança autista me faz desabrochar em um trabalho de coragem, desafios e
superação do meu próprio eu. De um caminho sem volta, podendo oferecer a esta criança a
visão de um mundo diferente, tornando-se algo mágico em sua vida, permitindo que este
coloque para fora sensações que só a dança transmite, e só o amor transforma.
Verificando assim, que é sempre um novo desafio ensinar e aprender com o autismo,
solicitando do professor estudo, preparação e dedicação. Que segundo Cunha (2017), muito
além das nossas atribuições de ensinantes, estará a nossa capacidade de educar pelo nosso
exemplo e amor.
Acredito que jamais devemos desistir diante dos desafios que a vida ou a sociedade nos
impõe, isso prova o quanto somos capazes no modo de agir, pensar, falar e desenvolver coisas
incríveis. Foi por este incrível que me apaixonei pela dança e pelo mundo das crianças
autistas, de modo geral, das crianças com deficiência, pois todos os dias aprendo algo novo.
Me submeto a compreender cada fase, cada processo e cada desenvolvimento para além do
movimento nas aulas de dança. Carrego em mim o dom de acreditar que sou capaz e que
dessa forma, sou feliz.
A partir desse estudo, foi possível compreender que o trabalho com crianças autistas vai
muito mais além do que podemos imaginar, a prática diária nos faz entender que envolver a
dança na rotina desses alunos é de suma importância para que assim, eles compreendam o seu
corpo como matéria viva de movimentos.
Sugere-se que novos estudos possam ser realizados, pois o assunto carece de autores
interessados na defesa do ensino da dança para crianças com Transtorno do Espectro Autista,
27

bem como outras deficiências espalhadas pelo mundo. E que apesar de não haver cura, há
tratamentos específicos para o processo de aprendizagem das crianças autistas, ao qual quanto
mais cedo for diagnosticada, melhor será o avanço neurológico do aluno; jamais esquecendo
que a colaboração de especialistas e professores são de suma importância, bem como a
dançaterapia, desenvolvida para otimizar o comportamento neuropsicomotor de crianças e
jovens autistas. Tema este, que pretendo me especializar futuramente para que as perspectivas
enquanto professora, somem em minha prática pedagógica neste processo de construção de
ensino-aprendizagem com crianças com deficiência.
28

REFERÊNCIAS

ANDRADE, C.R.; GODOY, K.M.A. Dança com crianças: propostas, ensino e


possibilidades. 1. ed. Curitiba: Appris, 2018.

ARROYO, M.G. O significado da infância. Anais... Seminário Nacional de Educação


Infantil. Brasília: MEC/SEF/COEDI, 1994.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Propostas Ensino


Fundamental: arte. 2º ed. Brasília: MEC, 2016.

______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: arte


Brasília: MEC/SEF, 1997.

______. Parâmetros curriculares nacionais. Adaptações curriculares. Estratégias para a


educação de alunos com necessidades educacionais especiais. Brasília: MEC/SEESP, 1999.

______. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da


educação nacional. Diário Oficial da União, dez; Brasília, 1996.

______. Lei nº 13.301/2016, de 27 de junho de 2016 e o Decreto 8.805/2016 Altera o


Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto no 6.214, de 26
de setembro de 2007. Diário Oficial da União, jun; Brasília, 2016a.

______. Lei nº 13.278/16, de 2 de maio de 2016. Altera o § 6º do art. 26 da Lei nº 9.394, de


20 de dezembro de 1996, que fixa as diretrizes e bases da educação nacional, referente ao
ensino da arte. Diário Oficial da União, mai; Brasília, 2016b.

______. Lei nº 8.742/93 LOAS, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da


Assistência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, dez; Brasília, 1993.

______. Lei nº 12.764 de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção


dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista; e altera o § 3 o do art. 98 da Lei
no 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Diário Oficial da União, dez; Brasília, 2012.

CONE, S.L.; CONE, T.P. Dançando na escola. 3 ed. São Paulo: Editora Manole, 2015.

CUNHA, E. Autismo e inclusão: psicopedagogia práticas educativas na escola e na família.


7ª ed. Rio de Janeiro: Wak Ed, 2017.

GONÇALVES, A.A. Psicomotricidade na educação infantil, a influência do


desenvolvimento psicomotor na educação infantil. Monografia (Especialização em
Educação Infantil) - Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2004.
29

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Rio de Janeiro: IBGE, 1998.

OMS. Organização Mundial de Saúde. Classificação de Transtornos Mentais e de


Comportamento da CID-10: descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1993.
PILLOTTO, S.S.D.; SCHRAMM, M.L.K. Reflexões sobre o ensino das artes. Joinville
(SC): Univille, 2001.

ONU. Assembleia Geral das Nações Unidas. Dias e semanas internacionais. 2007.
Disponível em <https://nacoesunidas.org/calendario/dias-e-semanas/>. Acesso em 15 Nov.
2018.
30

ANEXOS
31

ANEXO A
IMAGENS DO ARQUIVO DA PESQUISADORA, CAPTURADAS DURANTE AS AULAS
DE DANÇA

Imagem 5: Aula de Dança com a turma do Ensino Infantil. Momento inicial.

Fonte: Acervo da Pesquisadora.

Imagem 6: Aula de Dança com a turma do Ensino Infantil. Momento da práxis.

Fonte: Acervo da Pesquisadora.


32

Imagem 7: Aula de Dança com a turma do Ensino Infantil. Momento da apreciação. Fonte: Acervo da
Pesquisadora.

Imagem 8: Aula de Dança com a turma do Ensino Fundamental I. Dançando sem os balões.

Fonte: Acervo da Pesquisadora.


33

ANEXO B – PLANO DE AULA

Plano de aula aplicado na turma de Nível V (Educação Infantil) e no Ensino


individualizado em Dança (Autistas com 5 anos e 8 anos de idade respectivamente):

I. Plano de Aula:

Data: 20 de Novembro de 2018.


Duração: 35 minutos.

II. Dados de Identificação:


Facilitadora:
Francine Silva;

Disciplina: Dança para Criança.


Instituição: Escola Privada localizada no Município de Parnamirim - RN.
Turma: Nível V/Ensino Infantil e Aluno do Ensino individualizado em Dança.
Faixa etária: 05 anos e 08 anos de idade (Respectivamente).

III. Tema: O corpo que se mexe e remexe.

IV. Assunto: Expressão corporal através do Balão.

V. Objetivos:

Fazer com que os alunos mergulhem em um processo prático, utilizando o balão como
principal elemento para a dança lúdica e conhecimento dos membros superiores e
inferiores do nosso corpo, a partir do uso da interpretação criativa.

*Observação geral:
34

Será o primeiro contato dos alunos com a interpretação criativa utilizando o elemento
lúdico (balão).

VI. Justificativa

A dança para crianças possui grande influência hoje, principalmente no âmbito escolar,
e o balão é um elemento lúdico capaz de mexer com todo o corpo. Auxiliando nas
habilidades psicomotoras, motoras, no qual todo o corpo é capaz de se expressar como
lhe convém. Quando a dança chega ao espaço escolar como linguagem e conteúdo,
transformamos o olhar sobre seu ensino, não somente pela formação de bailarinos, mas
por dar oportunidade aos alunos conhecerem mais sobre dança e a criança autista
interagir no ambiente escolar, através dos afetos (visíveis e invisíveis), considerando a
subjetividade do ser.

VII. Conteúdos:

Expressividade corpórea;
Níveis espaciais;
Prática do equilíbrio;
Movimento criativo;

VIII. Metodologia da aula:

1º momento: Abrindo a ciranda (conversa inicial… ideias sobre os membros superiores


e inferiores);
2º momento: Aquecimento lúdico (Com o balão, considerando que é o nosso coração,
não podemos deixa-lo solto pela sala. Vamos passar o balão por todo o nosso corpo);
3º momento: Prática corporal – Dividindo em dois grupos, vamos explorar os
movimentos com o balão sem deixa-lo cair, e cada grupo movimentará o seu balão de
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acordo com o comando da professora (primeiro grupo: Explorar movimentos de mãos,


braços, cabeça e cotovelo. E o segundo grupo: Trabalhar com a coxa, joelhos, pernas e
pés);
4º momento: Criação e apreciação de partitura, a partir das movimentações exploradas
em exercícios durante a aula; Realizar também movimentos sem o balão.
5º momento: Fechando a ciranda (conversa final… avaliação da aprendizagem pelas
crianças).

IX. Recursos Didáticos:

Sala ampla;
Balão.

X. Avaliação:

Pelos pares (princípio afetivo, cognitivo e psicomotor), considerando ainda a


disponibilidade corpórea e criatividade inventiva.

XI. Bibliografia:

CONE, S.L.; CONE, T.P. Dançando na escola. 3 ed. São Paulo: Editora Manole, 2015.

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