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A REFORMA TRIBUTÁRIA

E SEUS IMPACTOS NO
SETOR DO TRANSPORTE
DEZ PILARES
Sumário
1. Apresentação _________________________________________________ 3
2. Resumo geral das propostas apresentadas ________________________ 4
2.1. PEC 45/2019 ________________________________________________ 4
2.2. PEC 110/2019 _______________________________________________ 4
2.3. PEC 46/2022 _______________________________________________ 5
3. Do contexto atual da tributação brasileira: do cenário de injustiça que
inspira a reforma tributária – a regressividade existente no regime atual __ 5
4. Do contexto do serviço de transporte enquanto um serviço essencial __ 7
5. Os pilares da CNT para a reforma tributária ________________________ 11
5.1. Não aumento da carga tributária global e setorial _________________11
5.2. Creditamento integral para os insumos de transporte ____________ 13
5.3. Folha de salário como crédito _________________________________ 16
5.4. Rejeição a tributos seletivos com oneração do setor de transporte __ 16
5.5. Exoneração integral na exportação ____________________________ 17
5.6. Tratamento diferenciado setorial ______________________________ 19
5.7. Tratamento diferenciado no setor de infraestrutura _______________ 20
5.8. Manutenção do serviço social e de aprendizagem setorial ________ 21
5.9. Necessidade de transparência quanto aos dados ________________ 22
5.10. Prazo de transição ajustado _________________________________ 23
6. Conclusão __________________________________________________ 24
Anexo 1 – Os possíveis impactos das propostas atuais da reforma tributária
no setor de transporte ___________________________________________ 25
1.1. Transporte rodoviário de cargas _______________________________ 26
1.2. Transporte de valores ________________________________________ 27
1.3. Transporte público __________________________________________ 28
1.4. Transporte aquaviário _______________________________________ 32
1.4.1. Navegação de apoio marítimo_____________________________ 32
1.4.2. Agenciamento marítimo _________________________________ 33
1.5. Transporte aéreo ____________________________________________ 34
1.6. Transporte ferroviário ________________________________________ 34
Referências __________________________________________________ 35
1. APRESENTAÇÃO
A CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE (CNT), entidade de grau superior que
representa mais de 164 mil empresas de transporte brasileiras, que geram mais de 2,3
milhões de empregos diretos em todos os seus modais, vem acompanhando com grande
atenção as propostas de reforma tributária em curso no cenário nacional.

Ciente das preocupações que impulsionam toda a sociedade em torno do debate, a CNT
não ignora as distorções estruturais do sistema tributário brasileiro, que prejudicam a
competitividade das empresas e o crescimento econômico do país. Segundo consta no
Relatório OCDE de 2018:

Além das dificuldades para ter acesso a financiamento, o baixo


nível de investimento do Brasil reflete um ambiente de negócios
desfavorável, aumentando custos e cerceando o retorno dos
investimentos. (…) Um dos elementos-chave é o fragmentado
sistema de impostos sobre o consumo (os chamados impostos
indiretos), o qual eleva o custo do capital ao limitar os reembolsos do
imposto pago sobre ativos fixos e faz do Brasil o país com os mais
altos custos de conformidade fiscal (…) Os créditos tributários
para insumos intermediários são acumulados somente se forem
incorporados à mercadoria final vendida, resultando em uso intensivo
de contadores fiscais e frequentes processos judiciais litigiosos.

Uma solução seria consolidar os diferentes tributos sobre o


consumo em um único imposto sobre valor agregado com regras
simples — seguindo o exemplo recente da Índia — como recomendado
no Relatório Econômico da OCDE sobre o Brasil de 2015 (OCDE, 2017c,
OCDE, 2015g). O governo federal poderia sair na frente e consolidar
seus próprios impostos sobre o consumo em um único imposto sobre
valor agregado com uma ampla base, reembolso total para IVA pago nos
insumos e taxa zero para exportações.

Assim é que a CNT, comprometida com o engrandecimento social e econômico


do Brasil, apoia uma reforma tributária ampla, que traga justiça, neutralidade e
simplicidade ao sistema tributário nacional, sem aumento da atual carga tributária
global e setorial.

Todavia, acompanhando as diversas propostas colocadas nas diferentes áreas de


discussão — entre elas (i) a PEC 110/2019, no Senado Federal; (ii) a PEC 45/2019, na
Câmara dos Deputados; (iii) o PL 3.887/2020; e (iv) a emenda substitutiva global da
PEC 110/2019, conhecida como “Simplifica Já” —, a CNT identificou alguns pilares que
devem ser defendidos e apoiados em qualquer uma das propostas.

Uma avaliação correta dos projetos apresentados deve partir de um cenário que se
pretende evitar, caso as proposições avancem em seus processos de tramitação. Por
isso, faz-se necessário, de forma preliminar, apresentar o contexto em que se insere a
tributação no Brasil, para se adotar um modelo que possa, efetivamente, romper com o
cenário de injustiça no qual nos encontramos.

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2.RESUMO GERAL DAS PROPOSTAS APRESENTADAS
2.1. PEC 45/2019

A PEC 45/2019, apresentada à Câmara dos Deputados, em 2019, pelo deputado Baleia
Rossi (MDB/SP) e outros, busca realizar uma reforma tributária com foco na tributação
do consumo. O objetivo, transposto em sua justificativa, é propor uma ampla reforma
do modelo brasileiro de tributação de bens e serviços por meio da substituição de
cinco tributos atuais por um único imposto sobre bens e serviços (o IBS).

Os tributos que serão substituídos pelo IBS são: (i) o imposto sobre produtos
industrializados (IPI); (ii) o imposto sobre operações relativas à circulação
de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e
intermunicipal e de comunicação (ICMS); (iii) o imposto sobre serviços de qualquer
natureza (ISS); (iv) a contribuição para o financiamento da seguridade social
(Cofins); e (v) a contribuição para o Programa de Integração Social (PIS). O IBS terá as
características de um bom imposto sobre o valor adicionado (IVA), modelo adotado
pela maioria dos países para a tributação do consumo de bens e serviços.

Na PEC 45/2019, o IBS seria único, compartilhado entre União, estados e municípios,
com um imposto seletivo federal apresentando regimes especiais de benefícios fiscais
para alguns setores da economia pelo prazo de 12 anos, como atividades agropecuárias,
agroindustriais, pesqueiras e florestais, produtos da cesta básica de alimentos, gás de
cozinha residencial, educação, saúde, medicamentos, transporte público coletivo e
compras de entidades beneficentes de assistência social.

2.2. PEC 110/2019

A PEC 110/2019 foi protocolada meses após a PEC 45/2019, assinada por todos os
senadores da República e formalmente apresentada pelo então presidente do Senado,
o senador Davi Alcolumbre (União/AP). Seu objetivo é simplificar o atual sistema,
permitindo a unificação de tributos sobre o consumo.

A proposta é aumentar gradativamente os impostos sobre a renda e sobre o patrimônio


e melhorar a eficácia da arrecadação, extinguindo nove tributos (IPI, IOF, PIS/Pasep,
Cofins, Salário-Educação e Cide-combustíveis, todos federais, o ICMS estadual e o
Imposto sobre Serviços — ISS municipal).

No lugar deles, cria-se um imposto sobre o valor agregado de competência estadual,


chamado de Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS), e um imposto
sobre bens e serviços específicos (Imposto Seletivo), de competência federal.
O IBS seria criado nos moldes do que existe em países industrializados e sem
tributar medicamentos e alimentos. O Imposto Seletivo, por sua vez, incidirá sobre
produtos específicos, como petróleo e derivados; combustíveis e lubrificantes;
cigarros; energia elétrica e serviços de telecomunicações. Uma lei complementar
definirá quais os produtos e serviços estarão incluídos no Imposto Seletivo. Sobre os
demais produtos, incidirá o IBS estadual. Vincula-se parte das receitas do IBS para o
financiamento da Seguridade Social. Também se destina parte do IBS como fonte de
financiamento dos programas do BNDES.

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Na PEC 110/2019, também foi definido que o IBS subnacional será administrado de
forma centralizada, mediante um Conselho Federativo, por meio do qual o imposto será
arrecadado e regulamentado de forma compartilhada entre estados e municípios, com
ampla participação de todos os entes.

2.3. PEC 46/2022

No ano de 2022, foi apresentada a PEC 46/2022 no Senado Federal, pelo senador
Oriovisto Guimarães (Podemos/PR), tendo sido endossada por 37 senadores, cujo
objetivo é realizar uma reforma do sistema tributário nacional.

Em sua justificativa, a PEC ressalta que seu princípio básico é a simplificação dos
tributos sobre o consumo, bem como de processos e procedimentos tributários,
simplificando a legislação tributária do Imposto sobre Operações Relativas à
Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços (ICMS) e do Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISS), com a ideia de reduzir as obrigações acessórias
das empresas, diminuindo custos e impactando o preço dos bens.

O foco da referida proposta é apresentar soluções para quatro problemas tidos como
centrais na tributação brasileira: a) a desoneração parcial dos tributos daqueles que
mais criam postos de trabalho; b) a reformulação do imposto dos municípios — o ISS;
c) a adoção do PIS Cofins não cumulativa; e d) a reforma do ICMS.

A PEC 46/2022 visa substituir as diversas legislações sobre ICMS e ISS por uma única
legislação para cada imposto, com abrangência nacional, por meio da edição de
duas leis complementares, com normas gerais de direito tributário, não havendo a
unificação de alíquotas, que serão definidas pelos estados, pelo Distrito Federal e
pelos municípios, conforme suas arrecadações. Também estabelece a cobrança de
tais impostos no local de destino do consumo.

3. DO CONTEXTO ATUAL DA TRIBUTAÇÃO


BRASILEIRA: DO CENÁRIO DE INJUSTIÇA
QUE INSPIRA A REFORMA TRIBUTÁRIA – A
REGRESSIVIDADE EXISTENTE NO REGIME ATUAL
Com o advento do Plano Real, o Brasil se integrou a um momento econômico marcado
pelo equilíbrio fiscal, que foi considerado um dos pilares da estabilidade econômica.
Essa circunstância fez com que se observasse um aumento da receita e redução das
despesas públicas, com vistas ao superávit das contas públicas.

A necessidade de aumentar a receita pública fez com que o Poder Executivo optasse
por concentrar grande parte da arrecadação na tributação sobre o consumo, tendo em
vista o potencial arrecadador dessa modalidade de incidência.

De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a


tributação sobre o consumo contribuiu com 40,5% da carga tributária, no ano de 2007,
contra 29% relativo aos impostos sobre a renda, propriedade e patrimônio.

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A renda, o patrimônio e o consumo se destacam como fatos econômicos que denotam
capacidade contributiva do cidadão, ou seja, são sinais exteriores de riqueza que
legitimam a incidência tributária. Todavia, mostra-se de suma importância que exista
uma distribuição equânime da tributação entre esses três sinais de capacidade
contributiva, sob pena de se promover efeitos indesejáveis ao regime democrático.

A concentração da tributação sobre o consumo revela-se contrária ao regime


democrático, porque essa modalidade de incidência mostra-se regressiva. Nesse
caso, os mais pobres terminam por arcar com um peso maior do tributo quando
comparados aos mais ricos.

Essa situação pode ser exemplificada. Suponhamos que duas pessoas, uma com
renda líquida mensal de R$ 500,00 e outra com renda líquida de R$ 5.000,00,
sejam hipertensas e necessitem adquirir um aparelho medidor da pressão arterial.
O aparelho equivale hipoteticamente a R$ 200,00, aos quais deva ser aplicada uma
alíquota de ICMS de 10%. Nesse caso, ambos, ao comprarem o aparelho, contribuirão
com o valor de R$ 20,00 relativos à incidência tributária. Ocorre que isso equivale a 4%
da renda total disponível de quem aufere R$ 500,00 mensais; e a 0,4% de quem recebe
R$ 5.000,00. Ou seja, a mesma incidência representa um ônus muito maior para
quem recebe uma renda menor.

Ora, não é esse o princípio basilar da tributação, que se funda na ideia de justiça,
decorrente da capacidade contributiva. Esse pilar determina que todos devem contribuir
com o custeio das despesas públicas na medida de sua capacidade econômica.

Não é isso que ocorre no caso da tributação sobre o consumo. Conforme exemplificado
anteriormente, aqueles que apresentam menor capacidade econômica terminam por
arcar com um ônus maior quando tributados em suas aquisições.

Por isso, é fundamental que a tributação seja reduzida quando se trata de produtos e
serviços essenciais à coletividade. Afinal, o fundamento do princípio da seletividade
determina que a carga tributária seja inferior nos produtos e serviços essenciais,
elevando-se quando se tratar de supérfluos.

Por meio dessa estratégia, busca-se reduzir o impacto da tributação sobre o consumo
na renda dos mais pobres, que têm a sua subsistência comprometida para arcar com
uma carga tributária excessiva.

Esse excesso decorre não só de alíquotas elevadas aplicadas aos bens e serviços
essenciais, como, também, ao se permitir que o resíduo de tributação seja
incorporado aos preços, pela impossibilidade de um creditamento amplo, que faz
com que o tributo pago na etapa anterior seja reconhecido como custo, onerando a
atividade econômica como um todo.

Além disso, a tributação sobre o consumo possui uma característica própria, o


fenômeno denominado “anestesia fiscal”. Por se tratar de uma forma de tributação
indireta na qual existe um contribuinte de fato e outro de direito, o ônus da
incidência é repassado para o consumidor sem que ele tenha consciência do seu
papel de contribuinte.

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A CNT está comprometida com a defesa do cidadão brasileiro, que não pode ter a sua
renda básica onerada com um aumento da carga tributária, sob o pretexto de se estar
reformando o sistema para gerar competitividade ao setor produtivo brasileiro.

O regime de devolução do imposto pago, chamado de cashback, vem sendo divulgado


como uma possibilidade de reembolsar as famílias de baixa renda em virtude da
tributação incidente sobre os produtos essenciais, principalmente os que compõem a
cesta básica.

Essa sistemática que se apresenta no bojo das discussões dos projetos de reforma
tributária vem sendo apresentada como um mecanismo eficiente para a redução da
regressividade, tão injusta para a população de baixa renda.

Ocorre que, no que tange ao serviço de transporte, essencial para essa população, o
efeito pretendido pode não ser alcançado. Ao contrário do que se observa no caso da
cesta básica, o serviço de transporte de cargas não é adquirido pelo consumidor final,
mas por outra empresa inserida no processo produtivo.

Assim, não é possível determinar, de forma precisa, o quanto foi suportado pelo
consumidor final para que ele tenha um mecanismo de solicitação da restituição.

É preciso considerar, também, que esse regime é adotado em países com


densidade populacional menor que a do Brasil, como o Canadá, com índices de
desenvolvimento humano que concedem à população consciência tributária acerca
de seus direitos e deveres, permitindo que a instrumentalização do mecanismo se
efetive de forma adequada.

O Brasil é um país de dimensões continentais, com profundas desigualdades entre


as regiões e com problemas estruturais graves, como o acesso à internet, que seria o
meio pelo qual o requerimento seria efetivado.

Isso permite concluir que não se afigura razoável trocar um regime seguro — o de
tributação favorecida ou inexistente para os produtos e serviços básicos, como
o transporte — por uma sistemática de devolução de tributo pago. É preciso
considerar o contexto da nossa sociedade, em que a cultura de requisição da nota
fiscal ainda é incipiente.

4. DO CONTEXTO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE


ENQUANTO UM SERVIÇO ESSENCIAL
É imprescindível, para qualquer análise que se faça de reforma tributária, que se
considere os impactos da incidência sobre o setor o qual recairá a tributação.

Assim, é preciso ressaltar a importância do serviço de transporte no bojo da


Constituição da República enquanto um direito social do cidadão brasileiro,
bem como na economia, por se tratar de um setor essencial, relacionado com a
infraestrutura, o direito de locomoção do brasileiro e o desenvolvimento do país.

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Tanto é verdade que a Constituição Federal reconhece o transporte, em seu artigo 6º,
como sendo um direito social de todo cidadão, devendo ser amparado por políticas
públicas para sua efetividade:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o


trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição. (Destaque nosso).

Além disso, a lei 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana,
em atendimento à determinação constitucional, estabelece as diretrizes para o
desenvolvimento urbano, incluindo o transporte, como importante atributo da
infraestrutura e desenvolvimento. Confira-se:

Art. 3º O Sistema Nacional de Mobilidade Urbana é o conjunto


organizado e coordenado dos modos de transporte, de serviços e de
infraestruturas que garante os deslocamentos de pessoas e cargas no
território do município.
§ 1º São modos de transporte urbano:
I – motorizados; e
II – não motorizados.
§ 2º Os serviços de transporte urbano são classificados:
I – quanto ao objeto:
a) de passageiros;
b) de cargas;
II – quanto à característica do serviço:
a) coletivo;
b) individual;
III – quanto à natureza do serviço:
a) público;
b) privado.

Dadas essas circunstâncias, é preciso reconhecer que qualquer projeto de reforma da


tributação, enquanto política pública, deve observância à Constituição, necessitando
reconhecer a importância do serviço de transporte dentro do contexto jurídico e social
brasileiro.

A aprovação de um projeto de reforma tributária sem considerar os impactos sobre


o serviço de transporte pode ocasionar efeitos indesejáveis, contribuindo para o
empobrecimento da população e o aumento das despesas públicas, em diversos
níveis e sentidos.

No caso do transporte urbano de passageiros, o aumento da carga tributária poderá


acarretar um acréscimo da tarifa, paga, principalmente, pela população de baixa
renda, ou a ser subsidiado pelos municípios. Esses, além de perderem competência
e autonomia com a reforma, acarretarão um aumento na despesa pública, devido ao
fato de que o alto valor da tarifa leva à necessidade de subsídio do serviço.

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O transporte rodoviário de passageiros, em viagens intermunicipais e interestaduais,
está estritamente relacionado com a segurança da população, que se vale desse
serviço para se deslocar no âmbito dos estados e/ou fora deles.

Caso se observe um aumento do preço da passagem, em virtude da reforma tributária,


poderá haver um aumento do transporte rodoviário desregulamentado, que já cresce
consideravelmente no Brasil, colocando em risco a vida dos passageiros e deixando
de recolher os tributos devidos. Além disso, aumentará o número de veículos
particulares nas estradas, contribuindo para um aumento das estatísticas relativas
aos acidentes, que tanto oneram o setor público de saúde e o INSS na concessão de
benefícios relacionados à invalidez causada por esses eventos.

Isso sem contar que o desestímulo ao transporte coletivo faz com que se aumente a
frota de veículos automotores particulares, cujos efeitos nocivos ao meio ambiente já
são conhecidos e evidentes.

Com relação ao transporte aéreo, já se observa uma crise do setor em virtude dos altos
custos, em especial do combustível de aviação (QAV), atrelados ao dólar, tornando
o serviço cada vez mais restrito. As passagens também tendem a valores mais altos,
fazendo com que as empresas brasileiras não apresentem competitividade nesse setor.

No tocante ao transporte de cargas, é preciso considerar que, se o objetivo da reforma


é tornar a economia mais competitiva, aumentar a tributação do setor pode levar ao
efeito reverso. Isso implica aumento do custo do frete, um dos mais importantes para
a indústria e o comércio, com impacto direto no preço dos produtos e no chamado
custo Brasil.

O setor de transporte de cargas apresentou estudos acerca dos impactos das


propostas de reforma tributária no setor, sendo nítido um aumento de carga tributária
da empresa.

Não se pode desconsiderar que o aumento do frete, gerando elevação dos preços,
pode criar um contexto inflacionário nefasto para a economia. A observância da
atividade-meio, realizada pelo setor transportador, é fundamental na lógica de
formação de preço de produtos, serviços e mercadorias.

Por isso, a medida do cashback deve ser devidamente analisada, sendo fruto de uma
profunda reflexão, uma vez que a tributação em patamares únicos, sem considerar as
especificações do setor de transporte, ocasionará aumento do custo das mercadorias
e serviços. Essa estratégia não será suficiente para impedir o processo inflacionário,
pois quem receberá a restituição do tributo será a população, não o empresário. Este
último, para absorver o ônus tributário, terá que embutir os valores no preço do serviço.

Essas ponderações permitem constatar que a tributação do transporte, de forma


indiscriminada, pode ocasionar um gargalo para o desenvolvimento econômico,
apresentando um efeito inverso ao que se pretende e com alto impacto para a
população.

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Diante desse contexto, está demonstrado que é preciso considerar as peculiaridades
do serviço de transporte, levando-se em conta os diversos modais, para que se
estabeleça uma tributação adequada, que contribua para a melhoria do país.

Essa sensibilidade relativa à tributação do serviço de transporte é verificada em


outros países, tanto que os diversos modais são tributados de forma favorecida ou são
isentos, em virtude da sua importância para a sociedade, conforme se demonstra
pela tabela a seguir, elaborada a partir da análise da legislação tributária dos países
em questão.

País Transporte Transporte de passageiros Transporte de Transporte de cargas


coletivo de intermunicipal/interestadual passageiros
passageiros aéreo
Portugal Isentos ou Isentas ou até 5% Isentos ou até Intracomunitário – isentos
até 5% 5% (desde que Demais variáveis de acordo com a
não seja para o circunscrição que realizam – 6%, 5%, 4%
estrangeiro)
Alemanha Isentos ou 7% 7% (aplicando-se Transporte transfronteiriço de
até 7% também para mercadorias de e para países fora da UE
o transporte são geralmente tributados à taxa zero
transfronteiriço)
Espanha Isentos ou 10% 10% 10% e transporte transfronteiriço de
até 6% mercadorias de e para países fora da UE
são geralmente tributados à taxa zero
França 5,5% 10% 10% 2,10% para certas mercadorias (bens
essenciais)

Itália Isentos ou 5% 5% (desde que Entre 5% e 10%


até 5% não seja para o
estrangeiro)

Nas discussões recentes sobre a reforma tributária, muito se tem dito acerca da
uniformidade da tributação sem a concessão de regimes diferenciados para os
setores relevantes da economia.

Entretanto, essa não é uma afirmação verdadeira. A União Europeia (UE) é uma
organização política e econômica composta por 27 países-membros. Conforme
consulta ao seu site oficial, a União Europeia é um “mercado único que opera a nível
mundial e entre os seus países-membros”.

Ainda segundo os dados constantes no portal oficial da UE, este conjunto de países
representa cerca de 14% do comércio mundial de mercadorias.

Cada país pertencente a esse conjunto possui o seu próprio sistema tributário.
Todavia, em decorrência do grande volume de movimentações e operações que
ocorrem diariamente entre os países do bloco, faz-se necessária a criação de
disposições tributárias comuns, com o intuito de evitar problemas como a dupla
tributação e/ou a evasão fiscal.

Os países-membros da UE possuem tributos diretos e indiretos. A tributação direta


recai sobre rendimentos (renda ou lucro). Já a tributação indireta se aplica ao

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consumo de bens ou serviços, por meio de um imposto sobre o valor adicionado
(IVA), harmonizado ao interno do bloco econômico por meio de uma norma
geral, a Diretiva IVA 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006 e suas
alterações posteriores.

O IVA tem como fato gerador a entrega ou a aquisição de bens, além da importação
e prestação de serviços, estando transporte no seu espectro de incidência, por se
enquadrar na prestação de serviços.

Existem quatro espécies de alíquotas aplicadas ao IVA, quais sejam: normal, reduzida,
super-reduzida e intermediária. A alíquota normal tem como limite mínimo a
importância de 15%, sendo que a média entre os países é em torno de 20%. A alíquota
reduzida tem o piso de 5%.

Destaca-se que a legislação que disciplina o IVA estabelece, de forma expressa, a


aplicação de alíquota reduzida quanto ao transporte de pessoas e suas respectivas
bagagens, nos termos do Anexo III da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de
novembro de 2006.

A título de exemplo, segundo o Guia Fiscal 2023 IVA, em Portugal, são aplicadas três
diferentes alíquotas de IVA — 23%, 13% e zero —, bem como as alíquotas reduzidas de
IVA, inclusive no serviço de transporte, quais sejam: 6% no continente, 5% na Ilha da
Madeira e 4% nos Açores.

Portanto, não há que se falar que os sistemas de IVA existentes em outros países
preveem uma alíquota única, com tributação uniforme para todos os produtos e
serviços, sem concessão de regimes diferenciados. As peculiaridades dos setores
e a repercussão econômica dos tributos sobre o consumo exigem a adoção de
alíquotas diferenciadas e específicas, devendo tal circunstância ser considerada
pelas propostas de reforma existentes.

5. OS PILARES DA CNT PARA A REFORMA


TRIBUTÁRIA
Diante dos projetos de emenda constitucional apresentados e de suas respectivas
discussões, e considerando o impacto das modificações para o setor de transporte,
a CNT, por meio de suas entidades filiadas e seu corpo técnico especializado,
sintetizou as 10 questões principais, referidas como os pilares da CNT para a
reforma tributária. Este levantamento consolida os pontos defendidos pelo setor
transportador, diante de qualquer plano, atual ou que venha a ser apresentado como
reforma tributária, no Brasil.

5.1. NÃO AUMENTO DA CARGA TRIBUTÁRIA GLOBAL E SETORIAL

Todas as propostas de reforma tributária apresentadas, a princípio, segundo


informações de seus redatores, estão pautadas na manutenção da carga tributária
global, garantindo, em termos teóricos, que a tributação não aumentará.

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No entanto, não tem sido observada a mesma afirmação com relação ao aumento da
carga tributária setorial.

No caso dos serviços de transporte, em qualquer das modalidades, considerando


as propostas apresentadas, não se faz possível a absorção do aumento nominal da
tributação, uma vez que essas empresas não adquirem insumos que possam gerar
créditos suficientes para a redução ou neutralidade da carga a ser suportada.

Isso porque o principal custo do setor de transporte é a mão de obra. Da forma como
as propostas estão apresentadas, não existe a possibilidade de creditamento relativo
aos valores pagos aos empregados, o que acarreta ônus excessivo para o setor.

As análises efetivadas pelo poder público relativas à carga tributária têm sido
feitas, exclusivamente, quanto ao volume arrecadado. Não tem sido levado em
consideração o impacto setorial que o redesenho da estrutura tributária possui
no aumento da tributação para os contribuintes prestadores de serviço. Especial
atenção deve ser dada aos serviços de transporte, que repercutem sobre todas as
cadeias produtivas no país.

A referida preocupação alcança não apenas a tributação sobre valor agregado,


mas também a pretensão de tributação da propriedade dos veículos automotores
afetados à atividade de transporte.

Assim, a CNT entende ser inconcebível a tributação, nos moldes do IPVA, sobre o
patrimônio de embarcações e aeronaves destinados ao uso comercial para pesca e
para transporte de cargas e de passageiros.

O transporte é integrado às demais cadeias de produção de bens, em especial à


indústria e ao agronegócio, uma vez que os produtos precisam circular no território
nacional.

Qualquer impacto que implique a majoração da tributação no setor de transportes


irá refletir imediatamente no aumento do custo total do setor produtivo brasileiro,
retirando a sua competitividade frente a outros países.

Conforme mencionado anteriormente, o aumento da carga tributária para o setor de


transporte pode acarretar:

a. maior despesa para o poder público municipal, que se verá na obrigação de


subsidiar as tarifas de transporte coletivo de passageiros diante do aumento
dos preços a serem exigidos da população, principalmente a de baixa renda;

b. aumento de acidentes rodoviários, em virtude do crescimento da frota de


veículos particulares e desregulamentados;

c. inflação decorrente do aumento do preço de mercadorias e serviços em


virtude do frete majorado;

d. agravamento das questões ambientais pelo aumento de veículos automotores


em circulação, diante do desestímulo ao setor de transporte coletivo.

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Esses efeitos foram considerados por outros países que adotam o IVA. Nesse sentido,
a União Europeia prevê alíquotas reduzidas para o transporte e, até mesmo, isenção
de impostos, considerando a essencialidade do serviço.

5.2. CREDITAMENTO INTEGRAL PARA OS INSUMOS DE TRANSPORTE

Diante dos projetos apresentados, é possível identificar que, para além da alteração
na estrutura dos tributos sobre valor agregado (IPI, ICMS, ISSQN, PIS e Cofins),
haverá uma restrição quanto à apropriação de créditos de produtos adquiridos pelas
empresas de transporte, principalmente no que se refere à aquisição de insumos.
Tal situação não deve ser admitida, dado o aumento da carga tributária setorial que
essa situação acarreta.

A CNT abraça e apoia a proposta de simplificação da tributação em torno de um


único imposto sobre valor agregado, desde que seja permitida a apropriação integral
de crédito dos tributos pagos no curso da cadeia de produção e circulação de bens e
serviços, em cumprimento ao que determina o princípio da não cumulatividade.

A não cumulatividade foi adotada no Brasil como uma forma de se instrumentalizar


a neutralidade dos impostos incidentes sobre produção, distribuição e
comercialização de mercadorias e serviços. A neutralidade é inerente a essas
espécies impositivas. Sem ela, não há como se garantir um desenvolvimento
econômico combinado com uma tributação justa.

A neutralidade está relacionada com o fato de que os operadores econômicos


envolvidos no processo de produção e circulação de bens e serviços não devem
assumir o ônus da incidência relativa aos impostos que recaem sobre as vendas de
mercadorias e serviços. Ou seja, os impostos sobre o consumo não podem ocasionar
um aumento dos preços, sendo que a incidência deve se limitar ao que é agregado
por cada operador nas diversas etapas do processo.

Do ponto de vista da indústria, do comércio e dos serviços, esses impostos devem ser
neutros, não alterando o processo de tomada de decisões desses agentes, que podem
decidir adquirir ou não um produto diante do aumento do preço que a tributação determina.

As empresas devem ser tributadas pela via do imposto de renda, na medida em


que auferem lucro, e não pelos tributos incidentes sobre o processo de produção e
circulação de bens e serviços. Quem deve arcar com esse ônus é o consumidor final. Os
operadores deveriam ser meros repassadores do valor dos impostos ao poder público.

Desta forma, pode-se afirmar que o princípio da não cumulatividade garante que
o contribuinte do imposto seja o consumidor final e que os efeitos econômicos da
tributação no processo produtivo sejam nulos. Assim, todo imposto denominado
não cumulativo tem por objetivo incidir sobre o consumidor final de forma neutra.

Diante desse contexto, a não cumulatividade tem como objetivo proteger os


consumidores finais, impedindo que os impostos incidentes sobre a circulação de
mercadorias e serviços não componham o custo dos mesmos, em virtude de um
processo restritivo de creditamento, como é a modalidade do crédito físico adotado
no Brasil atualmente.

13
Para que a não cumulatividade cumpra o seu papel no contexto da tributação do
consumo, é necessário que o crédito seja financeiro, admitindo um creditamento
amplo, relacionado a todos os custos incorridos pelo setor.

O gráfico a seguir exemplifica, de forma inequívoca quais são os principais custos


incorridos pelos serviços de transporte de passageiros:

Transporte Público por Ônibus: Composição de Custos do Setor (Atualizado em Fevereiro/2023)

Impostos e tributos –
5,0%
Remuneração da prestação Combustível (CMB)
dos serviços (RPS) – 4,5% 30,9%
Locação
(CLQ, CLG, CLA) – 0,2%

Despesas administrativas
(CAD) – 2,1%

Lubrificantes (CLB) – 1,8%


ARLA 32 (CAR) – 0,4%
Rodagem (CRD) – 1,4%
Custos com pessoal
Peças e acessórios (CPA) – 3,7%
(CPS) – 43,9%
Custos ambientais (CAB) – 0,1%
Depreciação (CDP) – 4,1%
Remuneração do capital
Fonte: NTU. imobilizado (CRC) – 1,9%

O gráfico revela que o principal custo do transporte se refere às despesas com pessoal,
sendo acompanhado do combustível, que representa 30,9% do total.

Desta forma, mostra-se evidente a importância do creditamento relativo ao


combustível utilizado na prestação de serviço de transporte, sendo que qualquer
restrição a esse processo impacta diretamente o custo, aumentando o preço.

A princípio, a mão de obra não gera crédito e os outros insumos representam


percentual reduzido dentro do contexto global da formação de preço. Então, assegurar
a apropriação dos valores dos tributos pagos na aquisição do combustível está
diretamente relacionado ao desenvolvimento da atividade de prestação dos serviços
de transporte.

Dessa forma, torna-se inaceitável que, para os principais insumos do setor de


transporte, o referido creditamento seja limitado ou impedido. Como exemplo,
citamos a proposta que consta no PL 3.887/2020, que dá tratamento monofásico aos

14
combustíveis (art. 321), mas impede o creditamento por parte dos adquirentes finais
dos referidos produtos (art. 37 c/c art. 382).

Tal medida, além de atentar contra a lógica do amplo creditamento na tributação


sobre valor agregado, cria injusta e indevida distorção no setor de transporte, com
aumento do impacto da sua tributação.

O crédito relativo ao combustível é de vital importância para o setor, já que diesel,


querosene e energia elétrica (que vem sendo cada vez mais usada no transporte
urbano de passageiros) são indispensáveis para o desenvolvimento desse ramo de
atividade, conforme evidenciado anteriormente.

Caso se estabeleça uma tributação monofásica, sem se permitir o creditamento


amplo, haverá um resíduo de tributação no preço, vez que o tributo pago e não
creditado irá se transformar em custo, penalizando o consumidor final em serviços
essenciais à população.

Essa mesma preocupação se estende à energia elétrica, posto que os metrôs


funcionam à base da eletricidade. Este é o futuro do transporte, dados os impactos
ambientais dos combustíveis tradicionais, fazendo com que o setor esteja em
sintonia com os objetivos do desenvolvimento sustentável da Organização das
Nações Unidas (ONU).

Sensível a esse contexto, os regimes de tributação relativos ao ICMS, na integralidade


dos 27 estados da federação brasileira, concedem a sistemática do crédito presumido
opcional ou contemplam outras medidas que reduzem os efeitos nocivos da
tributação sobre a atividade.

Não se pode reformar o sistema desconsiderando as características do atual, que se


desenvolveram para que o cidadão fosse protegido de uma incidência nefasta sobre
uma atividade que é protegida constitucionalmente.

É por isso que a CNT se mostra contrária a qualquer proposta que signifique restrição
ao creditamento do imposto incidente na aquisição dos insumos utilizados na
prestação de serviço de transporte.

Importante destacar, também, que a exigência do imposto ser efetivamente pago


na etapa anterior equipara-se à restrição de crédito, uma vez que, do ponto de vista
prático, esse mecanismo não se torna possível.

1
Art. 32. A incidência monofásica da CBS aplica-se às receitas decorrentes de operações com:
I – gasolinas e suas correntes;
II – óleo diesel e suas correntes;
III – gás liquefeito de petróleo – GLP, classificado no código 2711.19.10 da NCM, derivado de petróleo ou de gás natural;
IV – gás natural classificado no código 2711.11.00 da NCM;
V – querosene de aviação;
VI – biodiesel;
VII – álcool, inclusive para fins carburantes; e
VIII – cigarros e cigarrilhas classificados, respectivamente, nos códigos 2402.20.00 e 2402.10.00, da NCM.
2
Art. 37. São isentas da CBS as receitas decorrentes da revenda dos produtos sujeitos à incidência monofásica de que trata o art.
32, desde que tenham sido tributados na forma do art. 33.
Art. 38. É permitida a apropriação de créditos vinculados às receitas isentas na forma do art. 37, exceto em relação aos produtos
sujeitos à incidência monofásica de que trata o art. 32 revendidos com a referida isenção.

15
Não cabe ao contribuinte zelar pelo pagamento do tributo devido por outrem. O poder
público tem mecanismos para esse fim cada vez mais precisos e eficazes, tendo em
vista a introdução da nota fiscal eletrônica.

Por fim, deve-se ressaltar que é também fundamental que sejam mantidos os créditos
acumulados dos tributos que serão extintos. Grande parte das despesas do setor de
transporte ocorre com bens do ativo imobilizado, tais como aeronaves, automóveis,
navios e locomotivas. Quando adquiridos no passado, as entidades foram capazes de
se creditarem dos tributos incidentes sobre a operação. Ocorre que eles serão extintos
e os seus créditos terão o mesmo destino se não for assegurada a sua manutenção e
utilização para compensação com o IBS ou alienação para outros contribuintes.

5.3. FOLHA DE SALÁRIO COMO CRÉDITO

As empresas prestadoras de serviço, em especial no transporte, são altamente


oneradas pela folha de salário, conforme demonstrado no gráfico da página 14. As
despesas com pessoal, principal custo do setor, representam quase 44% do total.

Nesse sentido, como forma de mitigação do impacto na adoção de um tributo


único sobre valor agregado, impõe-se que seja permitida a apropriação dos valores
despendidos a título de folha de salário como crédito para fins de dedução do tributo
sobre valor agregado.

Alternativamente, deve ser criado algum mecanismo de redução do impacto negativo


relativo ao fato de que o principal custo do setor não é passível de redução do valor do
imposto a ser recolhido.

Como efeito reflexo, a referida medida relativiza as vantagens da “pejotização”, algo


que o próprio governo federal busca combater. Isso porque, caso não seja adotada tal
sistemática, será mais vantajoso para a empresa prestadora de serviços subcontratar
a sua atividade, apropriando-se de créditos de tributo decorrentes da terceirização, do
que contratar funcionários próprios para o exercício da mesma atividade.

Sendo o transporte um direito social, e considerando que ele é importante atributo


para o desenvolvimento do país, sendo substrato da infraestrutura, é preciso que
sejam formuladas políticas públicas que possibilitem às empresas o exercício da
atividade e o desempenho de seu papel social. Nesse contexto, o crédito relativo à
folha de salário mostra-se como um importante mecanismo para tanto.

5.4. REJEIÇÃO A TRIBUTOS SELETIVOS COM ONERAÇÃO DO SETOR DE


TRANSPORTE

Outro ponto de grande preocupação refere-se às previsões de criação de um tributo


seletivo federal incidente sobre determinados produtos nocivos à população, como
bebida e fumo.

De acordo como a PEC 110/2019, o IBS poderia incidir sobre os combustíveis em geral
e energia elétrica. De acordo com a justificativa dessa PEC, em trâmite no Senado
Federal, o Imposto Seletivo seria monofásico e incidiria “sobre produtos específicos,
como petróleo e derivados; combustíveis e lubrificantes; cigarros; bebidas alcoólicas

16
e não alcoólicas, veículos automotores novos, terrestres, aquáticos e aéreos, além de
energia elétrica e serviços de telecomunicações”. 3

Conforme a transcrição apresentada, o texto, ao citar exemplos, menciona


expressamente o petróleo e derivados, combustíveis e lubrificantes, cigarros, energia
elétrica e serviços de telecomunicações (no caso desse último, incidente apenas
sobre aqueles regulados pela União).

Dessa forma, observa-se no bojo das discussões sobre reforma tributária a intenção
de se introduzir um imposto seletivo que teria como objetivo onerar a distribuição
e comércio de combustíveis, seja pelas restrições na apropriação de créditos, já
apontado, com a criação de um tributo monofásico, seja pelo estabelecimento de
uma nova incidência, cujo objetivo é tornar mais caro o principal insumo do setor de
transporte.

Não obstante as polêmicas em torno das questões ambientais envolvendo os


combustíveis derivados do petróleo, deve-se considerar que, quando o combustível
e o derivado do petróleo são parte da cadeia de produção e circulação de outras
mercadorias e serviços, não deve ser onerado de forma mais gravosa. Isto por causa
dos impactos que o aumento pode impor ao custo global de toda a cadeia produtiva.

Ao se aceitar a criação de um tributo seletivo sobre combustíveis e demais derivados


de petróleo, impõe-se, como contrapartida, a autorização para creditamento integral
ou restituição preferencial quando o contribuinte utilizar os referidos produtos como
insumos, como ocorre no setor de transportes.

Importante mencionar, por fim, que há uma perspectiva de aumento do consumo de


energia elétrica como fonte de combustível para o setor de transporte, principalmente
no que se refere ao transporte coletivo urbano, nos grandes centros.

Sendo assim, é importante que essa preocupação envolvendo os combustíveis


derivados de petróleo, enquanto insumos do setor de transporte, também se estenda à
energia elétrica, dada a possibilidade de incremento do seu consumo no futuro.

5.5. EXONERAÇÃO INTEGRAL NA EXPORTAÇÃO

Preliminarmente, deve-se esclarecer a importância da desoneração das exportações


para a economia, de uma forma geral. Na quantificação do Produto Interno Bruto
(PIB), caso seja adotada a perspectiva da demanda, efetua-se o somatório da despesa
de consumo de bens e serviços das famílias e do governo da parcela destinada ao
investimento e das exportações, descontadas as importações.4

Ou seja, a balança comercial favorável, com exportações superiores às importações,


é um dos elementos que medem a riqueza de um país. Sendo assim, faz-se essencial,
do ponto de vista do incremento desse índice, que seja estimulada a exportação, para
que ela seja superavitária no contexto econômico, gerando melhores condições.

3
legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9040770&disposition=inline
4
arte.folha.uol.com.br/mercado/2020/entenda-como-e-feito-o-pib

17
É por esse motivo que, com a implantação do Plano Real, houve uma preocupação
com a melhoria da performance brasileira, no que tange às exportações. Por esse
motivo, foi aprovada a lei complementar 87/1996, conhecida como Lei Kandir, que
desonerou as exportações da incidência do ICMS.

Desde então, essa questão vem sendo amplamente debatida no Brasil, quer seja nos
desafios que o setor exportador ainda enfrenta diante do resquício de tributação na cadeia,
quer seja em função das perdas de receitas incorridas pelos estados com a desoneração.

Helenilson Cunha Pontes, em artigo sobre o tema, destacou essa questão:

“Atualmente, na área tributária, o setor privado exportador enfrenta muitos


problemas, dentre os quais destaco a questão do acúmulo de créditos de
ICMS na exportação e a dificuldade de aproveitar economicamente tais
créditos em face da penúria das finanças estaduais. Na área pública, isto
é, nos Estados com vocação exportadora, a queixa é ainda maior, tendo em
vista o calote que a União Federal deu nestes Estados quando, para aprovar
a desoneração das exportações de produtos primários e semielaborados,
através da Lei Kandir (Lei Complementar 87/96), prometeu que criaria
um Fundo de compensação que indenizaria os Estados com a perda
decorrente do ICMS até então incidente nas exportações.”5

Isso evidencia os entraves que são colocados à exportação, que não consegue
absorver o resíduo de tributação inserido no custo, diante das vedações ao crédito ao
longo do processo. Há também a impossibilidade de recuperação do crédito relativo
ao ICMS pago na cadeia de produção de circulação de bens exportados.

Os projetos de reforma tributária que criam o IBS, tal como o ordenamento atual, no que
tange ao ICMS, reconhecem a imunidade das exportações, asseguram a manutenção
dos créditos acumulados e prometem celeridade na devolução ao exportador.

Entretanto, o que se percebe no presente momento da economia é que esses


direitos não são observados. Os exportadores não conseguem aproveitar os créditos
acumulados, devendo ser baixados nos balanços das empresas exportadoras, por
recomendação das auditorias, diante da baixa perspectiva de recuperação dos valores.

Em virtude dessa situação, mostra-se importante observar as ressalvas efetivadas por


Helenilson Cunha Pontes6, no seguinte sentido:

Para evitar novo calote ao setor exportador, é fundamental que no próprio


texto constitucional que vai aprovar o novo IBS fique assegurada a livre
transferência dos créditos acumulados pelo contribuinte do IBS para
outro contribuinte deste imposto e a sua liberdade de utilizar tais créditos
mediante simples comunicação à autoridade fiscal, para posteriormente
atestar a liquidez e certeza do crédito acumulado, transferido e aproveitado.

5
conjur.com.br/2019-set-25/consultor-tributario-impacto-reforma-tributaria-setor-exportador
6
conjur.com.br/2019-set-25/consultor-tributario-impacto-reforma-tributaria-setor-exportador

18
Os defensores do novo IBS prometem um novo tempo na tributação do
consumo. Se é assim, nada mais adequado do que reconhecer que crédito
acumulado pelo contribuinte do IBS, exportador ou não, é imposto pago
e recolhido aos cofres públicos, de modo que a sua livre transferência
é medida que se impõe por respeito ao contribuinte e que não causa
qualquer prejuízo ao setor público.

Além disso, deve-se considerar os preceitos que regulam o comércio internacional,


no âmbito da Organização Mundial do Comércio que consistem na desoneração das
exportações e tributação das importações, às quais se aplica o princípio da não discriminação.

Seguindo esses preceitos, pelo Tratado do GATT, do qual o Brasil é signatário, que se
encontra em vigor por foça do decreto 76.032/1975, os estados devem exonerar os
tributos incidentes sobre produção e circulação de mercadorias e serviços destinados
à exportação. Devem ser tributadas as operações de importação, com a mesma carga
incidente sobre a produção interna.

Nesse sentido, aplicando-se a mesma lógica atualmente em vigor quanto ao PIS/


Cofins, as receitas decorrentes do transporte de mercadorias e pessoas, assim como
os combustíveis adquiridos com o objetivo de prover o transporte de bens e pessoas
para o exterior, devem ser totalmente desoneradas. Isso permite a apropriação dos
créditos percebidos pela empresa transportadora quanto aos bens adquiridos para a
execução da referida atividade, equiparando o transportador ao próprio exportador da
própria mercadoria.

Diante das questões econômicas narradas, dado o impacto das exportações no


cálculo do PIB, essa desoneração completa vem sendo adotada por vários países — como
exemplo, a União Europeia, que desonera completamente o transporte de bens e pessoas.

5.6. TRATAMENTO DIFERENCIADO SETORIAL

Como já ressaltado anteriormente, no tópico que explica o contexto em que o setor de


transporte se insere, trata-se de um serviço essencial para a população brasileira. Mais
ainda, é reconhecido constitucionalmente como um direito social do cidadão.

Além disso, o setor de transportes está integrado às principais cadeias produtivas


no Brasil, merecendo destacada atenção dos órgãos públicos quanto às atividades
desenvolvidas.

Dadas as deficiências históricas de infraestrutura do Estado brasileiro, as empresas


do setor de transporte rodoviário, ferroviário, aéreo e marítimo enfrentam verdadeiras
dificuldades operacionais. Além disso, o setor de transporte coletivo urbano recebe
diretamente inúmeras restrições e imposições que devem ser atendidas em prol de
toda a sociedade.

Cabe ressaltar, quanto ao transporte coletivo urbano, que o aumento da carga de


tributação irá recair diretamente sobre o valor da tarifa que (i) ou será custeada pelo
usuário (ii) ou será arcada pelo município, que deverá subsidiar o preço do serviço.

19
Nesse sentido, é necessário que seja garantida a manutenção dos regimes
protetivos setoriais do transporte, de forma a permitir a sua manutenção e o seu
desenvolvimento de forma sustentável.

Em estudo comparativo entre os países da União Europeia, é possível perceber a


adoção dessa política, conforme se demonstrou no quadro comparativo na página 10
deste documento.

No regime atual, observa-se, tanto a nível de tributação federal quanto em relação às


tributações estadual e municipal, tratamento diferenciado e favorecido para o setor de
transporte, considerando seus vários modais. Isso é um indicativo de que o setor não
pode ser tratado dentro de um regime único, que não considere a suas especificidades
e a sua importância.

Neste contexto, a Confederação, em conjunto com suas associadas em todos os


modais, preparou um estudo comparativo, apresentado no Anexo 1, da tributação
atual em cada setor considerando os benefícios existentes atualmente e a carga de
creditamento permitida na apuração de PIS/Cofins, ICMS e ISS, com a tributação
que se pretende com a reforma, utilizando como parâmetro um IVA com alíquota de
25%, com a finalidade de demonstrar os efetivos impactos que cada modalidade de
transporte sofrerá.

5.7. TRATAMENTO DIFERENCIADO NO SETOR DE INFRAESTRUTURA

As propostas de reforma tributária têm previsto a extinção dos tratamentos


diferenciados de tributação com a supressão de qualquer regime especial que não se
adeque aos dos padrões propostos.

No entanto, o desenvolvimento da infraestrutura do transporte no Brasil somente será


alcançado com a manutenção dos regimes protetivos de investimento. Vale citar o
Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi).

Criado pela lei federal 11.488, de 15 de junho de 2007, o Reidi tem como objetivo
a desoneração da implantação de projetos de infraestrutura. Dentre os seus
beneficiários, estão as pessoas jurídicas que tenham projeto aprovado para
implantação de obras de infraestrutura nos setores de transportes, portos, energia,
saneamento básico e irrigação.

É imprescindível a manutenção de tal sistema para o desenvolvimento do setor de


transportes, bem como a efetividade do mesmo como um direito social básico que
deve ser tutelado pelo Estado.

Suzana Soares Melo discute a necessidade de a tributação promover o adequado


tratamento da prestação de serviços de infraestrutura. Em seu trabalho, utilizou-se a
abordagem estrutural-funcionalista, afirmando que é preciso que o Direito Tributário
estabeleça atuações de forma a induzir condutas que protejam determinados setores,
dada a importância dos mesmos, na sociedade:

20
“A prestação de serviços de infraestrutura é, nessa senda, um serviço de
interesse público orientado ao desenvolvimento, alinhando-se, em um
Estado Social e Democrático de Direito, com os objetivos fundamentais
da República. Reconhecendo-se que a dicotomia público-privado não é
critério hábil a delimitar as normas jurídicas, constata-se que a prestação
de tais serviços por meio de concessões, parcerias público-privadas e
permissões também pode ser alvo da função promocional, que tem nos
mecanismos tributários, observados os princípios constitucionais a eles
subjacentes, um dos meios para sua implementação. (…)

À vista da análise estrutural-funcionalista empreendida, conclui-se que


os mecanismos tributários relacionados à prestação descentralizada dos
serviços de infraestrutura podem ser utilizados como instrumentos aptos
à promoção do desenvolvimento.”7

Fundamentada nesses preceitos que reconhecem a importância dos serviços de


infraestrutura no contexto da sociedade brasileira é que a CNT se manifesta em defesa
deles, no sentido de que os projetos de reforma tributária promovam e estimulem a
sua prestação, por meio de mecanismos tributários que os resguardem.

5.8. MANUTENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL E DE APRENDIZAGEM SETORIAL

A criação do Serviço Social do Transporte (SEST) e do Serviço Nacional de


Aprendizagem no Transporte (SENAT) foi uma das grandes conquistas do setor, com
impactos diretos na melhoria e qualidade de vida dos trabalhadores no setor de
transporte.

O SEST realiza um amplo atendimento com cobertura nacional para auxílio e proteção
dos trabalhadores do setor de transporte que, como peculiaridade, encontram-se
frequentemente fora do seu local de residência. Atendimentos na área de saúde,
esporte, lazer, prevenção de acidentes e despoluição são providos a todos os usuários
do sistema, nacionalmente.

O SENAT, por sua vez, é destaque na formação de profissionais habilitados ao


desenvolvimento de atividades do transporte, sendo, em muitos casos, a entidade
credenciada para certificação de atividades essenciais no setor. Segundo a resolução
nº 168, do Conselho Nacional de Trânsito, para exercer as atividades de motorista
de ônibus, de veículos de emergência, de transporte de escolares e de transporte de
produtos perigosos e de cargas indivisíveis, é necessária a certificação por parte do
SENAT.

Com foco na oferta de serviços de qualidade ao setor de transporte, o SEST e o SENAT


avançaram na oferta de serviços de saúde e capacitação profissional. Para tanto,
investiu-se a quantia de R$ 1,17 bilhão somente no ano passado.

O SEST SENAT está presente e próximo da comunidade a partir de uma rede de mais
de 160 unidades, distribuídas em todo o país, gerando impacto em aproximadamente
5.300 municípios.

7
teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-23032017-090848/pt-br.php

21
No ano de 2022, alcançou-se a marca de 12,31 milhões de atendimentos, uma alta
de 14% em relação ao ano anterior. Destes, mais de 6,42 milhões de atendimentos
foram referentes aos serviços de saúde e qualidade de vida e cerca de 5,89 milhões
tiveram foco no desenvolvimento profissional do setor de transporte. De janeiro a
maio de 2023, mais de 5,96 milhões de atendimentos já foram realizados, sendo 3,36
milhões de atendimentos em saúde e qualidade de vida e outros 2,6 milhões em
desenvolvimento profissional.

É necessário, assim, em qualquer instância, assegurar a manutenção do SEST SENAT


como mecanismo de garantia da segurança da própria população, beneficiária do
serviço de transporte.

5.9. NECESSIDADE DE TRANSPARÊNCIA QUANTO AOS DADOS

Para uma discussão clara, franca e transparente em torno da reforma tributária,


é necessário que os estudiosos e autoridades responsáveis pela apresentação,
desenvolvimento e análise das propostas, em especial a Receita Federal do Brasil,
compartilhem os dados a partir dos quais as referidas medidas estão sendo
apresentadas.

Não é concebível, no Estado democrático de direito, que as propostas venham


desacompanhadas de estudos de impacto econômico segundo os quais foram
elaboradas.

Além disso, não se prevê, em nenhuma proposta apresentada, o estabelecimento de


parâmetros para avaliar os resultados da reforma, considerando, principalmente, a
perda de competitividade de alguns setores.

Outra questão relacionada à segurança jurídica refere-se ao fato de que os preceitos


estabelecidos nas emendas constitucionais serão regulamentados por leis
complementares, de cujos projetos não se apresenta sequer o rascunho.

Na experiência atual, a Constituição adota uma redação de maneira a proteger


os contribuintes. Entretanto, na regulamentação por lei complementar, restrições
podem ser impostas, negando vigência ao próprio texto constitucional. Por isso, é
importante que os projetos de lei complementar sejam apresentados juntamente com
as emendas, para que os setores envolvidos se sintam seguros nesse processo de
transformação da tributação no Brasil.

A CNT não se furta e nem se omite à análise dos dados trazidos pelas autoridades
quanto ao desenvolvimento dos projetos de reforma, seja no nível constitucional,
seja no nível legal. Mas acredita e defende que, somente por meio da apresentação
ampla de referidos dados, se conseguirá viabilizar a reestruturação efetiva do sistema
tributário.

22
5.10. PRAZO DE TRANSIÇÃO AJUSTADO

Por fim, a CNT se opõe à adoção de um prazo de transição tão longo como o apresentado
nos projetos de reforma tributária, principalmente no que se refere à PEC 45/2019.

A CNT entende que um dos principais entraves ao crescimento econômico e ao


estímulo dos negócios no Brasil é a falta de segurança jurídica. Ainda existem
incertezas sobre quanto, quando e como pagar os seus tributos.

A manutenção simultânea de dois regimes diferentes por um longo espaço de tempo


aumenta a referida insegurança, atrasando o pronto crescimento e desenvolvimento do
país, que são os objetivos principais da reforma.

Todos os projetos apresentados fundam-se na necessidade de simplificação da


legislação tributária relativa aos tributos sobre o consumo. Estabelecer o cumprimento
de obrigações tributárias acessórias em duplicidade, e por 10 anos, tendo em vista a
vigência de dois regimes, contraria toda a lógica de simplificação proposta.

De acordo com as estatísticas dos organismos internacionais, o custo de conformidade


no Brasil é elevadíssimo. O convívio com dois sistemas tributários onerará ainda mais
esse índice, por um longo período.

Hoje, as administrações fazendárias, como a Secretaria da Receita Federal do Brasil,


possuem ferramentas avançadas fundadas na tecnologia, que permitem introduzir as
novas regras, em tempo recorde, com relativa facilidade. Por exemplo, o projeto da nota
fiscal eletrônica, que equipou o poder público de todos os instrumentos necessários à
efetivação das mudanças propostas.

No entendimento da CNT, seria suficiente o período de vacatio legis determinado


pelo princípio da anterioridade, que determina que o aumento ou a criação de tributo
somente terá eficácia no exercício seguinte ao da publicação da norma que o alterou.

A esse período, deve-se acrescer mais um ano-calendário, que seria o tempo razoável
para que as mudanças sejam operacionalizadas, inclusive com relação ao poder
público, que já poderia refletir as alterações nas normas orçamentárias. Isso não
inviabiliza um prazo de transição maior de ajuste entre os entes federados.

23
6. CONCLUSÃO
Um grupo de trabalho destinado a debater os textos que reformam a Constituição,
promovendo uma ampla e consistente mudança no regime de tributação, deve ter
como principal função promover um debate qualificado sobre o tema. Serão ouvidos,
no caso, representantes daqueles que seriam afetados, em grande monta, pelas
alterações, como abordado anteriormente.

Somente por meio do diálogo e da dialética é possível construir soluções para o país
comprometidas com a democracia e a proteção de direitos fundamentais dos cidadãos,
que serão os grandes impactados pelas propostas de alteração do sistema tributário.

Nesse contexto, a CNT se manifesta como apoiadora das propostas de reforma


tributária, desde que se observe os pilares ora estabelecidos, reservando-se à análise de
cada uma das propostas de forma acurada, conforme os relatórios sejam apresentados.

Confederação Nacional do Transporte (CNT)

24
Anexo 1 – Os possíveis impactos das propostas
atuais da reforma tributária no setor de
transporte
Com o fim de apresentar ao governo, materialmente, os efetivos impactos da reforma
tributária nos moldes que se pretende instituir, com aplicação de alíquota única para
todos os setores da economia, incluindo todas as modalidades de transporte, a CNT,
em conjunto com suas associadas, elaborou um estudo comparativo da tributação
atual em cada setor, considerando os benefícios existentes e o creditamento
permitido na apuração de PIS/Cofins, ICMS e ISS, com a tributação que se pretende
com a reforma, utilizando como parâmetro um IVA com alíquota de 25%.

Muito embora as propostas de reforma não tenham instituído a alíquota única do IVA,
fato é que também não se vislumbra nas respectivas, até agora, a possibilidade de
alíquotas diferenciadas para os diversos segmentos econômicos. Nesta linha, utilizou-
se como parâmetro a alíquota de 25%, que até então é ventilada oficiosamente pelos
grupos de discussão. A referida alíquota foi utilizada tanto como base de saída quanto
de creditamento, comparando-a com a carga efetiva atual.

Ademais, para alguns segmentos, mesmo com incertezas e limitações dos textos
legislativos, considerando a realidade tributária atual, especialmente com benefícios
de crédito presumido, alíquota zero, subsídios, dentre outros, tentou-se demonstrar
a média da alíquota que deveria ser aplicada para que não haja aumento de carga
global, tampouco setorial, como proposto pela reforma.

Nesta linha, temos que ressaltar que se trata de uma análise complexa e específica
por setor, e a interpretação dos dados aqui demonstrados não pode se dissociar
destes fatores e se ater em interpretação de conceitos globais. Afinal, estamos
tratando de um setor que representa o transporte brasileiro, seja na modalidade de
transportar pessoas das diversas formas, seja na de transportar bens e mercadorias,
ou seja, um dos pilares do desenvolvimento de um país.

Assim, pontuamos que, em razão da especificidade de cada setor e suas


particularidades, segregamos a análise considerando:

• transporte rodoviários de cargas;

• transporte de valores;

• transporte rodoviário de passageiros;

• transporte aquaviário;

• transporte aéreo;

• transporte ferroviário.

25
1.1. Transporte rodoviário de cargas

Para a modalidade de transporte de cargas, o estudo contou com o auxílio das


federações de transporte de cargas, especialmente a Federação das Empresas de
Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar), entidade que representa
a categoria de movimentação de mercadorias e bens em geral no mercado interno e
externo, além da prestação de serviços logísticos, armazenagem e integração multimodal.

Para espelhar a realidade do setor, a análise utilizou como parâmetro duas empresas
do transporte de cargas no ano de 2022, uma com atividade preponderante de
subcontratação de serviços de transportes com outras transportadoras e outra com
atividade predominantemente de transporte com frota própria. Em ambos os casos,
consideramos apenas as atividades relacionadas aos serviços de transporte de cargas
no mercado interno.

De forma geral, temos um modal que conta com benefícios, dentre eles:

• ICMS com isenção e diferimento em vários estados;

• opção por crédito presumido de ICMS na proporção de 20%;

• alíquota média de ISS de 3%;

• Opção de crédito presumido na apuração do PIS/Cofins não cumulativo,


com o crédito na subcontratação dos serviços de transporte de autônomos e
empresas do Simples Nacional.

• Crédito presumido de PIS e Cofins sobre a aquisição do óleo diesel adquirido


com alíquota zero.

• Impacto direto na redução de alíquotas e benefícios relacionados aos


combustíveis, principal insumo do setor.

Vejamos o cenário atual e o cenário de aplicação do IVA:

Cenário Atual
Débito – PIS/ Apuração – % Carga
% Carga
Modal Faturamento Cofins; ICMS PIS/Cofins; tributária
débito
e ISS ICMS e ISS efetiva
Subcontratação 1.767.025.860,25 265.980.926,29 15,05% 128.613.405,35 7,28%
Transporte de cargas:
Frota própria 1.176.988.648,81 190.780.117,80 16,21% 86.534.706,15 7,35%

Reforma - Alíquota IVA 25%


% Carga
% Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
débito de créditos IBS
efetiva
Transporte Subcontratação 1.767.025.860,25 265.980.926,29 15,05% 128.613.405,35 137.420.569,89 7,28%
de cargas: Frota própria 1.176.988.648,81 190.780.117,80 16,21% 86.534.706,15 97.178.892,95 7,35%

26
Temos, para ambos os casos analisados, um aumento da carga tributária efetiva. Para
transporte de cargas com predominância na subcontratação, um aumento de 41% dos
tributos em sua apuração e 6% no valor efetivo de recolhimento. Já para o transporte
de cargas por frota própria, o aumento é de 29% e 12%, respectivamente:

Diferença Prevista

% Diferença % Diferença no
Modal
no débito recolhimento

Transporte Subcontratação 41% 6%


de cargas: Frota própria 29% 12%

Tal aumento refletirá não apenas em alíquota global acima da média atual, mas,
principalmente, na revogação dos benefícios fiscais concedidos, especialmente no
âmbito do ICMS.

1.2. Transporte de valores

Para a modalidade de transporte de valores, o estudo contou com a colaboração da


Federação Nacional das Empresas de Transporte de Valores (Fenaval) e teve como
metodologia a apuração média de PIS/Cofins, ICMS e ISS em função da quantidade de
estados e municípios apresentados pelos associados da entidade.

Importante pontuar que o setor, embora não faça jus a benefícios fiscais expressivos,
conta com peculiaridades que impactarão diretamente na imposição de alíquota
única. Dentre elas, destacam-se:

• adoção de regime cumulativo de PIS e Cofins com alíquota de 3,65%;

• opção por crédito presumido de ICMS na proporção de 20,0%;

• alíquota média de ISS entre 2,0% e 2,5%;

• impacto direto na redução de alíquotas e benefícios relacionados aos


combustíveis, principal insumo do setor.
Vejamos o cenário atual e o cenário de aplicação do IVA:

Cenário Atual
Apuração – % Carga
Modal Faturamento PIS/Cofins; tributária
ICMS e ISS efetiva
Transporte de valores 2.030.822.177,07 227.405.815,04 11,20%

Reforma – Alíquota IVA 25%


% Carga
% Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
no débito de créditos IBS
efetiva
Transporte de valores 2.030.822.177,07 507.705.544,27 25,00% 694.183.851,66 334.159.581,35 16,45%

27
Os dados mostrados demonstram que a reforma tem o potencial de elevar a carga
tributária em aproximadamente 47%, o que está diretamente relacionado ao fim da
sistemática cumulativa de apuração do PIS/Cofins e às limitações de creditamento
relacionada à atividade cujo grande insumo (custo) da operação é a folha de salário,
que não gera créditos.

Assim, para que se cumpra o objetivo da reforma — que é justamente modificar e


simplificar o sistema tributário atual sem que isso implique majoração de carga
global e setorial —, há que se reconhecer a necessidade de implantação de alíquotas
diferenciadas para o setor de transporte e, especialmente, para esta modalidade. O
percentual de 17% de IVA mantendo as condições de creditamento atualmente aceitas
pela legislação do PIS e da Cofins seria apto para neutralizar esses efeitos.

Reforma – Alíquotas Diferenciadas


% Carga
% Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
no débito de créditos IBS
efetiva
Transporte de valores 2.030.822.177,07 345.239.770,10 17,00% 694.183.851,66 227.228.515,32 11,2%

1.3. Transporte público

Um dos grandes desafios para o presente estudo é demonstrar os efeitos que uma
reforma geral e não direcionada às especificidades dos segmentos econômicos
poderia causar no sistema de transporte de passageiros. Isto porque, dentro deste
modal, temos subdivisões com características e particularidades importantes que
influenciam diretamente na prestação de serviços essenciais à população.

Neste contexto, baseou-se a análise de impacto da reforma a partir do estudo elaborado


pela Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), publicado em 2020, que
relata os possíveis impactos da reforma tributária no custo do transporte público.

O estudo contemplou a tributação atual com as desonerações do setor de transporte


público urbano nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre
e Curitiba, comparando-a com a proposta de reforma da instituição de IVA com
alíquota de 25%.

Em termos gerais, o estudo teve como metodologia um comparativo da tributação no


período de 2020 — aplicável aos dias atuais — nas referidas cidades que contam com
maior expressividade de frota de ônibus e população urbana, partindo do cenário de
tributação com os seguintes benefícios:

• PIS/Cofins – alíquota 0%;

• ISS SP – isento;

• ISS POA – isento;

• ISS CURITIBA – alíquota 2%;

28
• ISS BH – alíquota 0%;

• ISS RJ – alíquota 0,01% (subsídio).

Ademais, para fins de demonstrar o impacto real sobre a composição das tarifas de
transporte público, o estudo demonstra o impacto da implantação do IVA de 25% sobre
a composição dos custos variáveis e fixos, dentre eles:

• combustíveis;

• lubrificantes e ARLA;

• rodagem (pneus novos e recauchutagem);

• peças e acessórios;

• edificações e instalações;

• serviços de manutenção e de comercialização terceirizada.

Neste contexto, aplicando a nova alíquota de 25% sobre os referidos custos, o estudo
elaborado apurou que o maior impacto nos preços das tarifas de transporte urbano
decorrerá da incorporação na cadeia produtiva.

Vejamos os índices e impactos apresentados8:

Impactos no Fornecedor e Impacto Final para o Concessionário, por Cidade de Estudo

Cidade Impacto no fornecedor Impacto final no concessionário

São Paulo 2,87% 20,52%


Belo Horizonte 4,81% 20,05%
Curitiba 2,10% 19,94%
Porto Alegre 0,23% 18,44%
Rio de Janeiro 2,91% 18,25%

Fonte: Cálculos próprios.

8
A Importância Macroeconômica e Social Ambiental do Transporte Público por Ônibus no Brasil. Capítulo 3: Impacto da Reforma
Tributária no custo do Transporte Público. Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Série: Cadernos técnicos,
volume 27. Março de 2020. Disponível em: files.antp.org.br/2021/2/10/caderno-tecnico-27--a-importancia-macroeconomica-e-
socioambiental-do-transporte-publico-por-onibus-no-brasil.pdf

29
Impacto Total para o Concessionário (%), por Cidade de Estudo
Custos variáveis Impacto do item no aumento total - concessionário (%)

SP POA Curitiba BH RJ
Aumento total % 20,52% 18,44% 19,84% 20,05% 18,25%
Participação dos itens 4,33% 1,70% 2,59% 5,93% 3,12%
Combustível 4,26% 1,57% 2,51% 5,43% 3,04%
ARLA 0,00% 0,00%
Lubrificantes 0,01% 0,01% 0,01%
Rodagem – pneu 0,01% 0,01% 0,04% 0,14% 0,09%
Rodagem/recapagem 0,09% 0,10% 0,16% 0,36% 0,22%
Peças/acessórios (0,05%) 0,00% (0,13%)

Fonte: Cálculos próprios.

Impacto Total para o Concessionário – Custos Fixos, por Cidade de Estudo


Custos fixos Impacto do item no aumento total no concessionário (%)
SP POA Curitiba BH RJ
Aumento total % 20,52% 18,44% 19,84% 20,05% 18,25%
Participação dos itens 0,52% 0,69% 0,66% 1,49% 1,88%
Depreciação da frota 0,52% 0,38% 0,62% 1,49% 1,88%
Depreciação de
(0,01%)
validadores e AVLS
Depreciação de
instalações e (0,01%)
equipamentos
Depreciação de
0,06% 0,04%
edificações
Depreciação de
(0,01%) 0%
equipamentos
Depreciação de
0%
veículos de apoio
Manutenção de
0,01%
validadores
Manutenção de
0,01%
equipamentos
Comercialização 0,26%

Fonte: Cálculos próprios.

30
Impacto para o Concessionário – Custos Fixos, por Cidade de Estudo
Custos fixos Impacto do item no aumento total no concessionário (%)

SP POA Curitiba BH RJ
Aumento total % 18,09% 15,55% 18,43% 10,89% 17,04%
Participação dos itens 16,55% 14,68% 16,93% 10,22% 13,61%
Despesas com pessoal 11,62% 11,09% 11,71% 9,20% 12,01%

Desoneração da folha 0,53% 0,46%

Despesas
2,06% 1,19% 1,28% 1,02% 1,60%
administrativas
Operação com bilheteria 0,12%
Lucro 2,21% 1,36%
Remuneração do capital 0,59% 2,85%
Taxa de gerenciamento 1,09%

Fonte: Cálculos próprios.

Impacto para o Concessionário – Custos Fixos

Custos fixos Impacto do item no aumento total no concessionário (%)

SP POA Curitiba BH RJ
Aumento total (%) 20,52% 18,44% 19,94% 20,05% 18,25%
Participação dos itens 16,22% 16,72% 16,71% 13,01% 13,47%
% dos itens no todo 76,21% 85,93% 80,69% 62,33% 69,84%

Fonte: Cálculos próprios.

Concluiu-se para o modal em referência — transporte público urbano — a expectativa


de majoração significativa, caso não se mantenham as desonerações e isenções
vigentes e a alíquota seja fixada em percentual único de 25%, majorando os custos
de insumos da cadeia.

Neste contexto, o setor precisa ser entendido em sua função social constitucional-
mente reconhecida e como serviço público de caráter essencial à população, sendo
certo que a instituição de alíquota diferenciada (reduzidas — próximas a 5% — e com
manutenção de créditos) e desonerações são essenciais para a manutenção dos
serviços de forma acessível à população.

31
1.4. Transporte aquaviário

A modalidade de transporte aquaviário, assim como outros modais, possui segmentos


diversos que precisam ser analisados de forma apartada, a fim de entender a
importância de cada setor.

Assim, neste estudo, contemplaremos a modalidade de navegação de apoio e


agenciamento marítimo.

1.4.1. Navegação de apoio marítimo

A navegação de apoio marítimo tem grande expressividade e atualmente conta


com 419 embarcações em operação em águas jurisdicionais brasileiras, das quais
377 de bandeira brasileira e apenas 42 de bandeira estrangeira, conforme dados de
fevereiro de 2023. A frota é operada por 45 empresas brasileiras de navegação e são
gerados 17 mil empregos diretos (14.500 marítimos e 2.500 em terra), perenes e de
alta qualificação e salários. Além disso, também geram empregos indiretos e renda
para brasileiros e demanda para os setores da indústria naval e de navipeças, na
construção, jumborização, modernização e reparo das embarcações no país.

Assim, com o apoio da Federação Nacional das Empresas de Navegação Aquaviária


(Fenavega), estimou-se que os impactos da reforma constituiriam um aumento da
carga tributária efetiva de 6,10% para 10,18%, caso se instituísse uma alíquota única
de IVA de 25%. Vejamos:

Diferença Prevista
Aumento
Modelo
Modal Modelo atual Diferença de carga
proposto
sem IS
Tributação federal,
Apoio 6,10% 10,18% 4,08% 66,89%
ICMS, ISS / IVA
marítimo
IPVA 0,00% 2,50% 2,50% 2,50%

Além da majoração na arrecadação decorrente da mudança do regime dos tributos


incidentes sobre o consumo, há um aumento de 2,5% em razão da instituição do
IPVA sobre embarcações, que não está previsto na atual legislação.

Desta feita, para que não recaia sobre o setor um expressivo aumento e a carga
tributária permaneça nos patamares atuais, é necessário que se reconheça a
necessidade de alíquota diferenciada nos seguintes moldes:

Reforma - Alíquotas Diferenciadas


% Carga
%Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
no débito de créditos IBS
efetiva
Apoio marítimo* 100,00 14,75 14,75% 58,71 6,09 6,1%

*O total de custos, serviços e mão de obra do setor equivale a 78,19% e, para fins de apuração, considerou-se como
base de creditamento custos materiais e serviços na ordem de 58,71%.

32
Reitera-se novamente que, para a manutenção do setor, bem como a fim de atrair
novos investimentos com fomento na oferta de empregos, é essencial que, além da
manutenção efetiva da carga tributária, não seja instituído qualquer outro tributo
sobre o setor e que na reforma da tributação da folha seja retomada a possibilidade
de adesão à substituição da tributação da folha pela CPRB.

1.4.2. Agenciamento marítimo

Outro setor expressivo e que orientou a presente análise é o de agenciamento


marítimo, responsável pela logística marítima do país, uma das principais formas
de troca de mercadorias entre os continentes.

Para tanto, a CNT se valeu de dados de uma grande associada do setor privado,
cujas receitas no mercado externo e interno são divididas igualitariamente. Nesta
linha, um dos maiores benefícios do setor está na não incidência tributária sobre a
exportação de serviços.

Da análise, extraímos os seguintes dados:

Cenário Atual
Débito – PIS/ Apuração – % Carga
% Carga
Modal Faturamento Cofins; ICMS PIS/Cofins; tributária
no débito
e ISS ICMS e ISS efetiva
Agenciamento marítimo 92.126.517,00 9.414.135,00 10,22% 9.153.409,00 9,94%

Reforma – Alíquota IVA 25%


% Carga
% Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
no débito de créditos IBS
efetiva
Agenciamento marítimo 92.126.517,00 23.031.629,25 25,00% 2.818.664,00 22.326.963,25 24,24%

Temos, a partir dos dados apresentados, uma variação na carga tributária efetiva de
9,94% para 24,24%, representando uma diferença de 14,30% e aumento de 143,92%,
caso se institua um IVA com alíquota única de 25%.

Diferença Prevista
Aumento
Modelo
Modal Modelo atual Diferença de carga
proposto
sem IS
Agenciamento marítimo 9,94% 24,24% 14,30% 143,92%

33
A expressiva majoração decorre da eventual revogação da desoneração da
exportação de serviços, que representa metade do faturamento do setor; bem
como na base restrita de creditamento relacionada à prestação de serviço e folha
de salário. Assim como nos demais modais, para que se evite esta expressiva
oneração e a carga tributária permaneça nos patamares atuais, deve-se reconhecer
a necessidade de alíquota diferenciada nos seguintes moldes:

Reforma – Alíquotas Diferenciadas


% Carga
% Carga Base de cálculo Total apuração
Modal Faturamento Débito IBS tributária
no débito de créditos IBS
efetiva
Agenciamento marítimo 92.126.517,00 9.396.904,73 10,20% 2.818.664,00 9.109.401,01 9,9%

1.5. Transporte aéreo

Em relação ao modal de transporte aéreo, a presente análise chama atenção para


o fato de que, de acordo com dados fornecidos pela Associação Brasileira das
Empresas Aéreas (Abear), se considerarmos a alíquota de 25% e dados de 2019, o
setor sofrerá um acréscimo expressivo na carga tributária de R$ 3 bilhões a R$ 3,7
bilhões por empresa se aplicado às receitas de voos domésticos e internacionais.

A expressividade da majoração de carga tributária se justifica, como nos demais


casos analisados, pela revogação de benefícios relacionadas à atividade, bem como
em relação aos benefícios concedidos sobre combustíveis, exportação e importação
de bens e serviços.

1.6. Transporte ferroviário

O transporte ferroviário brasileiro, além de movimentar pessoas, é o maior


responsável pela movimentação de produtos da indústria siderúrgica, cimenteira
e de construção civil, além das commodities, exercendo um papel de destaque na
logística brasileira.

Com expressivo crescimento desde o início das concessões ferroviárias — cerca


de 171% desde 1997, de acordo com dados da Associação Nacional dos Transportes
Ferroviários (ANTF) —, o setor conta com benefícios fiscais atrelados à exportação,
além do Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da
Estrutura (Reporto) e Reidi.

Neste contexto, considerando o cenário de reforma em que haverá a implementação


de alíquota única de 25%, estima-se um aumento da carga efetiva de 2,65% para 5,63%,
em razão da revogação dos benefícios fiscais diretamente relacionados ao setor, mas
também os indiretos, relacionados à exportação e à importação de serviços.

34
Referências

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