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ALGUMA POESIA
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
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ALGUMA POESIA
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
Itabira (MG), 1902 – Rio de Janeiro (RJ), 1987
1. INTRODUÇÃO
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Poética: concepção, ou teoria, da poesia.
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ALGUMA POESIA
Drummond colecionou, ao longo dos anos, críticas, comentários de
jornal, ataques pessoais, paródias – um copioso material referente ao
“poema da pedra”, que reuniu numa antologia publicada em 19672. Haroldo
de Campos, que foi dos que mais esclarecedoramente analisaram o estranho
texto, procurou desvendar o sentido, não da pedra, mas do modo de
composição do poema, particularmente do papel que as repetições
(redundâncias) nele representam3.
Partindo da oposição redundância x informação, que pode ser traduzida
por repetição x novidade, Haroldo de Campos mostra que a repetição
exagerada, por ser surpreendente, cria a novidade, a “informação estética”.
Esse processo de transformação da redundância em informação, da repetição
em novidade ocorre em outras obras de arte modernas, como o quadro
Quadrado branco sobre fundo branco (1918), do pintor russo Kazimir
Malevich. Mas isso não acontece só na arte: num campo de neve,
por exemplo, impressiona a repetição incessante de branco, como num
deserto a insistência interminável da areia. A frase “tinha uma pedra no meio
do caminho”, obsessivamente repetida, carrega-se de sentido inesperado.
A frase nova, que ocupa o centro do poema, apenas contrasta com a repe-
tição para reforçá-la, reintroduzindo-a como registro indelével da memória
(“Nunca me esquecerei que no meio do caminho/tinha uma pedra [...]”).
“No meio do caminho” não foi o primeiro poema que Drummond
publicou, mas foi seu batismo de fogo. Os ataques sofridos foram lembrados
mais de uma vez ao longo de sua obra, consagrada depois como das mais
notáveis de nossa literatura (um dos poucos casos de poesia em português
que merece relevo na literatura internacional). Não obstante a amplitude e
diversidade dessa obra, a imagem da “pedra no meio do caminho”
constituiu-se em seu símbolo mais marcante, pois o cerne da poesia de
Drummond contém, insistente, a expressão do impasse, da dificuldade, do
obstáculo, da frustração, da não transcendência4. Todos esses sentidos estão
presentes na indiferença da pedra.
2
Uma Pedra no Meio do Caminho – Biografia de um Poema, Rio de Janeiro, Editora do
Autor, 1967.
3
Haroldo de Campos, “Drummond, mestre de coisas”, in Metalinguagem & outras metas,
São Paulo, Perspectiva, 1992. Deste ensaio procedem também as citações de Haroldo de
Campos que faremos adiante.
4
Transcendente é o que está além da experiência imediata, o que supera (transcende) a
realidade sensível, circundante.
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• preocupação existencial de pretensões universalistas, com a
exploração, em novos registros, de temas como o tempo, o amor e a morte
(aqui se deve lembrar que a primeira fase modernista é mais ligada a
assuntos nacionais e a temas do cotidiano e da atualidade, afastando-se dos
“grandes temas” existenciais, associados à poesia do passado);
• imagens arrojadas ou oníricas8 em associações inesperadas,
revelando alguma influência do Surrealismo9 e da então recente voga da
psicanálise de Freud, voltada para a exploração do inconsciente (essa
influência surrealista, embora restrita, marcou a obra de poetas importantes,
como Murilo Mendes e Jorge de Lima, e é notável em momentos isolados
da poesia de Drummond);
• envolvimento do escritor na problemática social, através da atitude
de denúncia e revolta diante das injustiças, assim como da expressão de uma
esperança utópica, de fundo socialista;
• reflexão da poesia sobre a própria poesia, ou seja, autoconsciência
do poeta em relação a seu próprio trabalho com as palavras.
Esse programa encontra sua expressão superior na obra de Drummond,
que o foi alargando e aprofundando, de livro em livro. Com A Rosa do Povo
(1945), sua obra atingiu um dos pontos culminantes da estética modernista
na poesia brasileira. A partir de então, numa série de livros que inclui
Claro Enigma (1951), Drummond realizou a mais bem-sucedida tentativa
de casar a linguagem renovadora do modernismo com padrões restauradores
da linguagem poética da tradição (uso de metros regulares, adoção frequente
de uma forma fixa como o soneto, fraseado de gosto clássico).
8
Onírico: próprio do (ou relativo ao) sonho.
9
Surrealismo: corrente artística de vanguarda, iniciada em 1924, que propunha uma arte
brotada do inconsciente, sem controle da razão.
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1.4. Temas
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1) o indivíduo: “um eu todo retorcido” (o indivíduo, na poesia de
Drummond, é complicado, torturado, fragmentado);
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2.2. Temas
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Epigramático: referente a epigrama, ou seja, a poesia breve, satírica, de humor cortante
e sutil.
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Acinte: provocação.
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a) o indivíduo: “Poema de sete faces”, “Também já fui brasileiro”,
“Europa, França e Bahia”, “Moça e soldado”, “Música”, “Explicação”;
b) a terra natal: “Lanterna mágica”, “Igreja”, “Festa no brejo”, “Jardim da
Praça da Liberdade”, “Cidadezinha qualquer”, “Fuga”, “Cabaré
mineiro”, “Romaria”;
c) a família: “Infância”, “Sweet home”, “Família”, “Sesta”;
d) o choque social: “Política”, “Poema do jornal”, “Nota social”, “Cora-
ção numeroso”, “O sobrevivente”, “Anedota búlgara”, “Sociedade”,
“Outubro 1930”;
e) o conhecimento amoroso: “Casamento do céu e do inferno”, “Toada do
amor”, “Cantiga de viúvo”, “Sentimental”, “Esperteza”, “Quadrilha”,
“Iniciação amorosa”, “Balada do amor através das idades”, “Quero me
casar”;
f) a própria poesia: “Poesia”, “Poema que aconteceu”;
g) exercícios lúdicos: “Construção”, “Política literária”, “Sinal de apito”;
h) uma visão (ou tentativa de) da existência: “No meio do caminho”,
“Cota zero”.
Os sete poemas restantes (“A rua diferente”, “Lagoa”, “O que fizeram
do Natal”, “Papai Noel às avessas”, “Epigrama para Emílio Moura”, “Elegia
do rei de Sião” e “Poema da purificação”) desenvolvem temas diversos,
embora, dependendo da perspectiva de leitura, alguns deles possam ser
associados a um ou outro, ou a mais de um, dos temas elencados.
2.3. O indivíduo
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A fase chamada “heroica” do movimento modernista estende-se de 1922 a 1930. Embora
publicado em 1930, esse poema de Drummond foi composto nos anos 1920 e é típico do
clima literário daquele período.
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Gauche (francês; pronúncia gôch): desajeitado (sentido literal: esquerdo).
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ALGUMA POESIA
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
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ALGUMA POESIA
Na sétima e última “face”, negando ironicamente o arroubo romântico
da estrofe anterior (o “coração maior que o mundo”), o sujeito como que
se desculpa de sua efusão emocional, atribuindo-a ao sentimentalismo
causado por eflúvios lunares e etílicos, como se o que foi dito se devesse à
“emoção do momento” e à bebedeira...
CIDADEZINHA QUALQUER
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Cromo: figura colorida, constituindo pequeno impresso recortado para colagem em álbuns
etc., ou imagem maior para pendurar em parede.
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FAMÍLIA
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ALGUMA POESIA
uma simples estrutura de coordenação aditiva, desemboca no magnífico efeito
cômico final. Trata-se de uma longa enumeração dos “materiais da vida”
provinciana, limitada e satisfeita na mediocridade do aconchego familiar, com
tudo no seu devido lugar, inclusive os preconceitos e as injustiças (os pretos
e mulatos como serviçais, a mulher como factótum20 – por isso presente em
toda parte, concluindo todas as seções da enumeração), resultando o conjunto,
muito ironicamente, na “felicidade” – o ideal pequeno-burguês de felicidade,
que o antiburguês Flaubert21 considerava imoral.
ANEDOTA BÚLGARA
20
Factótum (do latim factotum “faz tudo”): pau para toda obra.
21
Gustave Flaubert (pronúncia: güstav flobérr – sendo o ü uma vogal que fica entre i e u,
um i com os lábios arredondados, e o o fechado, flô): escritor francês (1821-1880), um dos
maiores mestres do Realismo, autor do célebre romance Madame Bovary.
22
Naturalista: estudioso de história natural, ou seja, das ciências naturais; aqui, trata-se de
um amante da natureza.
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SOCIEDADE
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ALGUMA POESIA
E todas as quintas-feiras
eles voltam à casa do amigo
que ainda não pôde retribuir a visita.
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SENTIMENTAL
Eu estava sonhando...
E há em todas as consciências um cartaz amarelo:
“Neste país é proibido sonhar.”
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ALGUMA POESIA
POESIA
PROCURA DA POESIA
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ALGUMA POESIA
2.9. Exercícios lúdicos
POLÍTICA LITERÁRIA
A Manuel Bandeira23
O poeta municipal
discute com o poeta estadual
qual deles é capaz de bater o poeta federal.
COTA ZERO
Stop.
A vida parou
ou foi o automóvel?
23
Antologia Poética, Drummond, Record, 2010, p. 93.
24
Tirar ouro do nariz: expressão popular, corrente sobretudo em Minas, que significa tirar
sujeira do nariz.
25
Irascível: que se ira com facilidade, irritável. Vate: poeta (designação solene, já que a
palavra também significa “profeta”).
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3. LEITURA
POEMA DO JORNAL
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ALGUMA POESIA
3.3. “Infância”
INFÂNCIA
A Abgar Renault 26
26
Antologia Poética, Drummond, Record, 2010, p. 93.
27
Robinson Crusoé: herói do romance do mesmo nome, de autoria do escritor inglês Daniel
Defoe (pronúncia déniel difôu), publicado em 1719. Robinson Crusoé é um marinheiro que
naufraga e, graças a sua habilidade e esperteza, sobrevive durante anos numa pequena
ilha nos trópicos.
28
Coser: costurar.
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ALGUMA POESIA
onde você se escondia
da fúria de meu bergantim35.
Mas quando ia te pegar
e te fazer minha escrava,
você fez o sinal-da-cruz
e rasgou o peito a punhal...
Me suicidei também.
35
Bergantim: antiga embarcação a vela e remo.
36
Nesta estrofe, faz-se referência à luxuosa vida na corte do rei francês Luís XIV, no Palácio
de Versalhes (em francês, Versailles, pronúncia versáie), onde vivia, perto de Paris. Com
a Revolução Francesa, Luís XIV, a rainha Maria Antonieta e muitos outros, entre eles
nobres que viviam naquele palácio, tiveram suas cabeças cortadas na guilhotina.
37
Peripécia: incidente, aventura.
38
Nesta estrofe, faz-se referência ao famoso estúdio cinematográfico de Hollywood,
Paramount (pronúncia péramaunt), que teve seu auge nas décadas de 1930 e 1940, com
a produção de filmes, em sua maioria, caracterizados por final feliz.
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Um outro poema sobre relações amorosas, do mesmo autor, também brincalhão, mas
pessimista, é “Quadrilha”.
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ALGUMA POESIA
E os corpos enrolados
ficam mais enrolados ainda
e a carne penetra na carne.
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O tom de paródia, a ótica grotesca e o olhar corrosivo são as tônicas da cena lírica do
poema: a lua romântica é reduzida a uma gravura de mau gosto; os anjos expedicionários
espantam mosquitos; as virgens extraviadas no céu remetem-nos intertextual e
ironicamente a tema explorado por Olavo Bilac. Os elementos do catolicismo são tratados
com irreverência: anjos, diabo, São Pedro. A paisagem estelar, celeste, nada tem com a
moldura platônica de Petrarca e Bilac. Observe que, em meio às situações mais prosaicas,
nem a musa idealizada de Dante Alighieri (Beatriz) escapa.
42
Nessa estrofe, próxima do poema “O Poeta Come Amendoim”, de Mário de Andrade, a
proposição “nacionalista” de Drummond enfrenta os seus limites — a consciência de que
a modernidade apaga uma certa noção “romântica” e idealizadora do passado do país.
43
A associação entre mulher e estrelas, entre a amada e as paisagens celestes é uma tônica
da poesia lírico-amorosa, desde os sonetos de Petrarca até os de Olavo Bilac, o Poeta das
Estrelas. Essa estrofe deixa explícita a recusa ao petrarquismo banalizado, aos clichês
romântico-parnasianos e à tradição clássica.
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A negação do ritmo regular, metrificado, previsível não impede que a poesia drummon-
diana tenha ritmo: é, muitas vezes, um ritmo dissonante, áspero, sincopado, mas existe.
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ALGUMA POESIA
A Itália explora conscienciosamente vulcões apagados,
vulcões que nunca estiveram acesos
a não ser na cabeça de Mussolini.
E a Suíça cândida se oferece
numa coleção de postais de altitudes altíssimas.
Chega!
Meus olhos brasileiros se fecham saudosos.
Minha boca procura a “Canção do Exílio”.
Como era mesmo a “Canção do Exílio”?
Eu tão esquecido de minha terra…
Ai terra que tem palmeiras
onde canta o sabiá! 46
45
A recusa dos modelos europeus (“Meus olhos brasileiros se enjoam da Europa”) e a busca
de uma identidade brasileira são elos de ligação entre Drummond e os primeiros
modernistas. A decadência da França, o imperialismo inglês, os prenúncios do nazismo
alemão e do fascismo italiano, o absenteísmo da Suíça são ironizados pelo poeta.
Significativamente, ele poupa a Rússia, que “tem as cores da vida”, mas cujo coração
“não bate igual ao da gente”.
46
Parodiando Gonçalves Dias, Drummond exorciza a tendência estrangeirizante, invocando
a emblemática “Canção do Exílio”. Nessa linha de valorização e (re)leitura do Brasil,
seguem-se os oito poemas de “Lanterna Mágica” (“Belo Horizonte”, “Sabará”, “Caeté”,
“Itabira”, “São João del-Rei”, “Nova Friburgo”, “Rio de Janeiro” e “Bahia”).
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Aqui, a ironia se estabelece na situação esdrúxula do Papai Noel que rouba presentes.
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ALGUMA POESIA
3.9. “Explicação”
EXPLICAÇÃO
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Essa reflexão sobre a própria poesia ainda está distante da densa posição metalinguística
de “O Lutador”, “Mãos Dadas”, “Consideração do Poema” e, principalmente, “Procura da
Poesia”, síntese da arte poética drummondiana.
49
Subsiste ainda uma visão subjetiva e evasionista do que é poesia, subordinada ao
individualismo narcisista.
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A atomização da palavra, tônica do livro Lição de Coisas, faz aqui seus primeiros ensaios.
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Se meu verso não deu certo, foi seu ouvido que entortou.
Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?
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A catilinária antieuropeizante não implica a exaltação ufanista da terra natal, onde “tudo
é uma canalha só”.
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4. EXERCÍCIOS
TOADA DO AMOR
Mariquita, dá cá o pito,
no teu pito está o infinito.
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CIDADEZINHA QUALQUER
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ALGUMA POESIA
9. (FUVEST) –
Chega!
Meus olhos brasileiros se fecham saudosos.
Minha boca procura a “Canção do Exílio”.
Como era mesmo a “Canção do Exílio”?
Eu tão esquecido de minha terra…
Ai terra que tem palmeiras
onde canta o sabiá!
(Carlos Drummond de Andrade, “Europa, França e
Bahia”, Alguma poesia)
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1. Sim, o tom brincalhão com que o poeta trata o tema amoroso é típico
da fase dita “heroica” (1922-1930) do movimento modernista. Uma
das inovações do Modernismo, no Brasil, consistiu em misturar
registros estilísticos, ou seja, tratar assuntos considerados sérios e
elevados (o amor entre eles) com um tom debochado e uma linguagem
zombeteira. O exemplo mais sintético dessa tendência modernista
encontra-se no seguinte poema de Oswald de Andrade, cuja influência
está presente no primeiro livro de Drummond:
amor
Humor
(Note-se que o poema está completo: uma palavra de título, com inicial
minúscula, e uma palavra de texto.)
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ALGUMA POESIA
vive-se ou vivemos), “se não fosse ele, também / que graça que a vida
tinha?” (em vez de sem ele, que graça teria a vida?), “dá cá o pito”
(em vez de dá-me o pito). Esta última palavra, por sinal, também é um
vulgarismo para indicar cachimbo.
5. O último verso do poema (“Eta vida besta, meu Deus.”) opõe o poeta,
irônica e criticamente, ao universo provinciano e monótono da cidade-
zinha qualquer. Nesse verso, está implícita uma ideologia cosmopolita,
das grandes cidades, com vida moderna, informação rápida, valores
dinâmicos; portanto, o avesso da mesmice da cidadezinha do interior.
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