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Organizadores:
Bianca Luiza Freire de Castro França | Erick Reis Godliauskas Zen | Madalena Marques Dias Grassl
Pablo Rodrigo Bes Oliveira | Patricia da Costa Machado | Ursula Boeck
unidade
1
As Relações Étnico-Raciais
Prezado estudante,
Estamos começando uma unidade desta disciplina. Os textos que a compõem foram organizados
com cuidado e atenção, para que você tenha contato com um conteúdo completo e atualizado
tanto quanto possível. Leia com dedicação, realize as atividades e tire suas dúvidas com os
tutores. Dessa forma, você, com certeza, alcançará os objetivos propostos para essa disciplina.
Objetivo Geral
Apropriar-se do conhecimento etnocultural e suas particularidades nas problematizações de raça e etnia e
demonstrar as mudanças no ensino sobre a cultura afro-brasileira e indígena no Brasil.
Objetivos Específicos
• Compreender as concepções de raça e etnia;
• Entender os aspectos históricos e legais que envolvem as relações étnico-raciais;
• Conhecer o que são as políticas afirmativas;
• Ampliar o reconhecimento e o respeito à diversidade cultural na sala de aula;
• Fortalecer a educação antirracista para o reconhecimento e respeito da cultura;
• Realizar um histórico do ensino da cultura afro-brasileira e indígena.
Questões Contextuais
• Podemos entender raça e etnia como tendo o mesmo significado?
• Que aspectos históricos e legais envolvem as relações étnico-raciais?
• Afinal, o que são políticas ou ações afirmativas?
• Pensando um pouco sobre tudo o que você aprendeu sobre história brasileira, até hoje, como e quando
foram abordados temas sobre a Cultura Afro-brasileira e indígena em sala de aula?
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA: Bianca Luiza Freire de Castro França | Pablo Rodrigo Bes |
12 HISTÓRIA E EDUCAÇÃO INTERCULTURAL Ursula Boeck
GLOSSÁRIO
Uma das primeiras associações do termo cultura, que surge na literatura do século
XV, tem relação com o cultivo agrícola. Até hoje podemos ver, ao percorrer as cidades do
interior, a associação da palavra às plantações que estão sendo cultivadas. Assim, temos as
palavras que daí derivam, como agricultura, suinocultura, floricultura e muitas outras.
O mais curioso é que se considerou, no início da utilização da palavra culter, a palavra
“natureza”, como seu antônimo, como se a cultura se posicionasse como contrária, oposta à
natureza. É importante, neste primeiro momento, guardar essa informação, pois representa
a ideia inicial de cultura como algo que se vale da natureza para criar, produzir algo.
Já a raiz latina da palavra “cultura” está associada a colere, que possui seu
significado associado a cultivar, habitar, adorar e proteger. Esse radical apresenta
aproximações à palavra colonus, a qual gerou “colonização”. Você pode perceber que
essa origem etimológica nos dá pistas de como pensamos o conceito de colonização e de
como esta ocorreu no período das grandes descobertas, por exemplo. No caso específico
do Brasil, ao chegarem em nossas terras e perceberem os índios na sua condição natural,
os portugueses logo pensaram em colonizá-los e transmitir a eles sua cultura.
As Relações Étnico-Raciais | UNIDADE 1 13
A cultura nos mostra que esse conceito vem se modificando ao longo da história.
Porém, a ideia de Cultura (com “c” maiúsculo) pode ser entendida de uma maneira
muita clara. Ela está associada a uma certa elite da população que possui acesso aos
grandes clássicos literários e pode frequentar óperas, peças teatrais, cinema, museus.
Por isso, essa ideia de cultura ainda permanece presente nos dias atuais.
Algumas vezes, você já deve ter presenciado pessoas se referirem a alguém que
não tenha muito conhecimento sobre algo como “ignorante” ou “sem cultura”, certo?
Isso é um reflexo dessa maneira de entender a cultura, que já foi um dia dominante,
algo que mudou em nossa realidade atual.
É importante percebermos que essa virada cultural ocorre ao mesmo tempo que
o mundo se transforma em relação às formas de trabalho, comunicação e mobilidade,
advindas do fenômeno da chamada globalização. Ela reconfigura o conceito de cultura,
a qual passa a abranger também, em seu leque de possibilidades, o que antes era visto
em segundo plano, considerado por alguns autores até mesmo como “baixa cultura” em
relação à “cultura da elite”.
GLOSSÁRIO
Peter Burke (2003) traz um conceito simples para definir cultura quando diz que
esta é um sistema de integração, diferenciação e referência o qual organiza e concede
um sentido à atividade dos seus membros. Isso significa pensar que somos constituídos
pelos elementos de nossas culturas, que nos integram e perpassam nossas vidas desde
o nascimento (ou até mesmo antes), que nos fornecem uma referência, padrões e normas
de como agir, como viver. A cultura atualmente é entendida como esse conjunto de
práticas, que podem ser discursivas ou não, que nos envolvem e fazem com que nossas
identidades sejam construídas.
DESTAQUE
Assim, podemos dizer que possuímos hoje diversas culturas que compõem os
inúmeros grupos sociais dos quais as pessoas participam, o que nos traz pistas da
importância de entendermos o conceito da diversidade cultural, que trataremos mais
adiante em nossos estudos.
Vamos imaginar, a partir de agora, que, entre nós, na sociedade, existem inúmeras
culturas que coabitam o mesmo espaço geográfico e que interagem entre si; porém,
nem sempre compartilham das mesmas ideias sobre as coisas e sobre o mundo. Com
certeza, o não entendimento do quanto a cultura é elemento importante na constituição
da pessoa pode ser uma das explicações que nos leva a cenas terríveis de preconceitos
e intolerâncias em relação a alguns costumes, tradições ou práticas culturais.
Por esse motivo, nosso próximo passo será analisar brevemente o histórico do
ensino da cultura afro-brasileira e indígena, para que possamos identificar de maneira
mais certeira o que deveremos abordar em sala de aula.
consciência coletiva de
Nação
valores e tradições
Povo
Grupo de pessoas que possuem
Fonte: Adaptado
unicamente um ponto em comumpor Universidade La Salle (2020) com base em Gomes (2011).
GLOSSÁRIO
DESTAQUE
DESTAQUE
No século XIX, o acesso à Educação foi pensado pelas elites e executado por meio
de ações institucionalizadas que visavam educar apenas seus pares, e esse fato fez com
que, até os dias de hoje, se perpetue todo o preconceito e o racismo, individualizados e
institucionalizados em nossa sociedade.
Por outro lado, a população indígena não fica para trás. Dizimados aos montes,
ora pela violência da colonização, ora pelas doenças do contato, esses povos foram
escravizados, violentados, usurpados de suas terras e riquezas, assimilados, tutelados e
criminalizados. Porém, o índio retratado na historiografia oficial era o nosso antepassado
valoroso e celebrado no 19 de abril (Dia do Índio), amigo e guardião das matas. Muito
distante dos caboclos, mestiços e ribeirinhos massacrados nos rincões do país.
Ao negar Educação formal igualitária aos povos negros e indígenas, dá-se início
também ao processo de definhamento dessas culturas. Pois, uma vez que os escravizados
e os indígenas possuíam culturas oralizadas, ou seja, suas histórias e tradições eram
passadas através das gerações pela fala, pelo contar histórias e repassar conhecimentos
orais, pois não sabiam escrever e/ou ler, não tinham como registrar suas Histórias de
forma oficial, como os brancos europeus.
Buscaremos, então, novas alternativas, fontes e pesquisas, além da tal Historiografia
Oficial, que não dá conta da complexidade das culturas Afro-brasileira e Indígena. Assim,
iniciaremos um breve histórico destas culturas analisando aspectos negligenciados
sobre as mesmas.
Fonte: Adaptado por Universidade La Salle (2019) com base em Freepik (2019).
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA: Bianca Luiza Freire de Castro França | Pablo Rodrigo Bes |
20 HISTÓRIA E EDUCAÇÃO INTERCULTURAL Ursula Boeck
VÍDEO
Para que você compreenda ainda mais as temáticas que estamos estudando até
agora, assista ao debate “A obrigatoriedade do estudo da história e cultura
afro-brasileira e indígena”, comandado pelo jornalista Luis Nassif no canal da
TV Brasil. O link está aqui: http://gg.gg/fyp0e.
No final do século XIX, logo após a Lei Áurea (1888), surgiram as primeiras leis
a respeito da obrigatoriedade do ensino fundamental não contemplando negros.
As Relações Étnico-Raciais | UNIDADE 1 21
DESTAQUE
SAIBA MAIS
• Lei n.º 11.645, de 10 de março de 2008, que altera a Lei n.º 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, modificada pela Lei n.º 10.639, de 9 de janeiro de 2003.
Atualmente, no Brasil, vivem mais de 800 mil índios, cerca de 0,4% da população
brasileira, segundo dados do Censo de 2010 (IBGE, 2012). Eles estão distribuídos
entre 683 Terras Indígenas e algumas áreas urbanas. Existem, ainda, grupos que estão
requerendo o reconhecimento de sua condição indígena junto ao órgão federal indigenista.
A diversidade étnica e linguística brasileira está entre as maiores do mundo. São cerca
de 220 povos indígenas e mais de 70 grupos de índios isolados, sobre os quais ainda
não há informações objetivas. No entanto, dentre as cerca de 1300 línguas diferentes
que eram faladas no Brasil há 500 anos, permanecem apenas 180, pertencentes a mais
de 30 famílias linguísticas diferentes, número que exclui aquelas faladas pelos índios
isolados, que ainda não puderam ser estudadas e conhecidas (FREIRE, 2011).
As Relações Étnico-Raciais | UNIDADE 1 25
OS ÍNDIOS NO 180
BRASIL HOJE línguas reconhecidas
Fonte: Adaptado por Universidade La Salle (2019) com base em Instituito Socioambiental ISA (2019).
É fundamental que, todos juntos, busquemos uma nova narrativa que critique
preconceitos e intolerâncias, além de difundir os valores e tradições dos povos Afro-
brasileiro e Indígena. Assim, será possível criar estratégias e pontes para um país
melhor e uma sociedade mais justa.
A partir da nossa leitura, até aqui, você conseguiu perceber a importância dessa
disciplina? Até agora, pudemos ver que ao negro e ao índio, até a metade do século
passado, ficaram relegados os papéis de subalternos, escravizados e seres estereotipados,
sem acesso à educação e sem direito a reafirmação de suas Histórias e Culturas.
O negro brasileiro foi, desde sua chegada ao Brasil, o grande responsável pelas
resistências à escravidão e às lutas pelo acesso à educação.
DESTAQUE
As três fases desse movimento apresentam como premissa básica a luta pelos
direitos dos negros, diferenciando-se apenas na dimensão dos temas e na
organização dos integrantes dos grupos. Na primeira fase, são estabelecidos
métodos de luta, com a criação de agremiações negras, palestras, atos públicos
e publicações de jornais. Na segunda fase, há um foco no teatro, na imprensa,
nos eventos acadêmicos e nas ações que visam à sensibilidade da elite branca
para os problemas enfrentados pelos negros no país. Já a terceira fase ocorre
a apoderação de manifestações públicas, imprensa, formação de comitês de
base e movimentos nacionais (SEEDF, 2012, p. 12).
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA: Bianca Luiza Freire de Castro França | Pablo Rodrigo Bes |
28 HISTÓRIA E EDUCAÇÃO INTERCULTURAL Ursula Boeck
DESTAQUE
VÍDEO
Assista o documentário Pisa Ligeiro, dirigido por Bruno Pacheco, que apresenta
um painel da variedade de bandeiras e estratégias de luta que orientaram o
movimento indígena brasileiro, especificamente após a Constituição de 1988.
Veja mais no vídeo disponível no link: http://gg.gg/fyp5d.
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA: Bianca Luiza Freire de Castro França | Pablo Rodrigo Bes |
30 HISTÓRIA E EDUCAÇÃO INTERCULTURAL Ursula Boeck
Ou seja, é somente por meio da pesquisa e do ensino que a revisão dos processos
históricos e a construção de novas trajetórias tornam-se possíveis. E é fundamental
apostar na contribuição da formação dos professores e a ação dos mesmos promovendo um
diálogo mais profícuo com os seus estudantes, possibilitando que eles se compreendam
como sujeitos históricos capazes de reinventar as suas trajetórias.
SAIBA MAIS
1.5 Conclusão
Chegamos ao fim de nossa primeira Unidade. Esperamos que, ao final das leituras
e sugestões de vídeos, você possa refletir sobre o conceito de Cultura, a importância
dos estudos culturais e de como a História e Educação brasileiras foram construídas
nesses quase duzentos anos de nação.
Através da luta do Movimento Negro e dos Povos Indígenas é que suas demandas
por direitos humanos são atendidas, apenas, e de forma mais ou menos efetiva, a partir
da segunda metade do século XX, no período de redemocratização do Brasil. A partir
da década de 1990, e já no século XXI, mais precisamente nos anos 2000, é que de fato
leis são criadas para assegurar a obrigatoriedade da abordagem da História e Cultura
Afro- brasileira e Indígena nas salas de aula.
Síntese da Unidade
Nesta Unidade buscamos entender a diferença entre raça e etnia, tema um tanto
confuso no entendimento popular. Além disso, buscamos compreender os aspectos
históricos e legais que envolvem as relações étnico-raciais e o que são, realmente, as
políticas afirmativas.
Finalizamos esta etapa com a reflexão sobre a colaboração das lutas sociais
desses povos para a construção e execução de ações afirmativas governamentais para
acesso à educação e abordagem da História e Cultura Afro-brasileira e Indígena em
sala de aula, em favor de uma educação antirracista.
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA: Bianca Luiza Freire de Castro França | Pablo Rodrigo Bes |
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Bibliografia
ALMEIDA, E. A. de; SILVA, J. F. da. Abya Yala como Território Epistêmico: pensamento
decolonial como perspectiva teórica. Revista Interritórios. Pernambuco, v. 1, n.° 1,
2015. Disponível em: http://gg.gg/fyp7v. Acesso em: 24 out. 2019.
HALL, G. M. Escravidão e etnias africanas nas Américas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.