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AVALIAÇÃO DA GERMINAÇÃO E CRESCIMENTO INICIAL DE Matayba

guianensis AUBL. SOB DIFERENTES NÍVEIS DE SOMBREAMENTO


Ani Cátia Giotto1, Fábio dos Santos Miranda1, Cássia Beatriz Rodrigues Munhoz2
(1Universidade de Brasília, Campus Darcy Ribeiro, Caixa Postal 04357, 71919-970 Brasília,
DF, Brasil. e-mails: anicatiabio@gmail.com; fabioprometeu@gmail.com 2Universidade
Católica de Brasília, Q.S. 07 lote 01, EPCT, 71966-700 Águas Claras, Taguatinga, DF,
Brasil. cassia@ucb.br).

Termos para indexação: Matayba, espécie nativa, germinabilidade, mudas, cerrado.

Introdução
A hidratação da semente, as trocas gasosas e temperatura são fatores essenciais para
que ocorra germinação, sendo que, para algumas espécies, a luz também é um componente
importante neste processo (Bryant, 1989). Em formações florestais a luz disponível para as
plantas é constantemente alterada pela queda de árvores, movimentação da copa, caducifólia e
pelos movimentos translacional e rotacional, o que pode limitar ou potencializar o
crescimento de muitas plântulas, levando-as a desenvolver adaptação para estabelecer e se
sobreviver nestas condições (Claussen, 1996; Lee et al., 1997).
Em virtude do atual estágio de degradação dos ambientes florestais e do crescimento
do mercado florestal, conhecimentos sobre a germinação e a produção de mudas são de
extrema relevância para os projetos de recuperação de áreas degradadas, arborização urbana,
formação de pomares com espécies nativas e desenvolvimento da atividade florestal
(Monteiro e Ramos, 1997; Salomão et al., 2003), bem como para fornecer subsídios para
trabalhos de conservação e manejo nestes ambientes. O objetivo desde estudo foi analisar a
germinação de sementes de Matayba guianensis Aubl., em condições de laboratório, em
pleno sol e a 50% de sombreamento, e o crescimento de mudas desta espécie florestal em
resposta à diferentes níveis de sombreamento.

Materiais e Métodos
O presente trabalho foi realizado na Universidade Católica de Brasília. Os frutos de
Matayba guianensis Aubl. (Sapindaceae) foram coletados de cinco árvores matrizes em
Colina do Sul, GO. No Cerrado a espécie é encontrada normalmente nas bordas de Matas de
Galeria em ambientes secos e com muita luz (Silva Júnior, 1997).
Em condição de laboratório, 25 sementes foram envolvidas em rolos de papel toalha,
umedecidos com água destilada, e colocadas em seguida em saco de plástico transparente.
Adotou-se quatro repetições, totalizando 100 sementes. Este experimento foi realizado em
temperatura ambiente, em uma estante com luz fluorescente conectada a um temporizador
digital com programação de 12 horas de luz.
Outras 200 sementes foram plantadas diretamente em saco de polietileno preto opaco
de 15 x 25 cm com perfurações laterais, sendo utilizado como substrato uma mistura de
latossolo de Cerrado, esterco, palha de arroz, NPK e calcário. Tanto em pleno sol como em
casa de vegetação (50% de sombreamento) foram utilizados 100 sacos (quatro repetições de
25 sementes em cada tratamento, uma semente por saco de polietileno). A umidificação das
sementes e a avaliação da germinação foi realizada em intervalos de 24 horas. O desenho
experimenetal foi totalmente casualizado. Calculou-se: germinabilidade, tempo médio de
germinação e incerteza (Laboriau, 1983). Para avaliar o crescimento das espécies em plantio
direto, 20 plântulas foram mensuradas quanto à altura, o diâmetro do coleto a 0,5 cm do solo e
o número de folhas e folíolos.
Na germinação e na avaliação de mudas, os dados que apresentaram normalidade e
homogeneidade foram analisados através da análise de variância e do teste de Tukey (α=0,05)
(programa Sisvar). A normalidade foi testada pelo teste de Shapiro-Wilk (germinação) e de
Kolmogorov-Smirnov (crescimento das mudas) e a homogeneidade com o teste de Bartlett.
Alguns dados tiveram que passar por transformações logarítmicas para atender os
pressupostos paramétricos. Para os dados não-paramétricos utilizou-se o teste de Kruskal-
Wallis e teste de Dunn (α=0,05) (programa BioEstat 4.0.).

Resultados e discussão
Não foram observadas diferenças significativas para gernabilidade de M. guianensis,
(Tabela 1), nas condições de laboratório e em plantio direto em pleno sol. Os valores
observados são compatíveis com a amplitude registrada para Myracrodruon urundeuva
Allemão (Dorneles et al., 2005), Bowdichia virgilioides Kunth. (Albuquerque e Guimarães,
2006) e Pseudopiptadenia psilostachya (DC.) G. P. Lewis & M. P. Lima (Fonseca et al.,
2006), em condições semelhantes. Nesses estudos, entretanto, os valores mais altos de
germinação foram encontrados nos experimentos realizados com plantio direto. O
comportamento observado em M. guianensis, com altos valores em diferentes condições,
indicam a possibilidade de germinação de tanto em ambientes onde há incidência direta da luz
solar e onde existe a luz difusa, ou seja, em clareira ou em condição de sub-bosque.
As sementes submetidas ao plantio direto apresentaram tempo médio de germinação
elevado, superior ao encontrado no laboratório. Demais espécies da mesma família em
condição de plantio direto com sombreamento de 50%, com porcentagens de germinação
próximas, apresentaram tempo médio variando de 20,4 dias (Paullinia coriacea Casar.) aos
23,8 dias (Cupania emarginata Cambess.) maiores, portanto, que o da espécie estudada
(Zamith e Scarano, 2004). A maior sincronia ou incerteza foi encontrada no experimento em
laboratório, o qual não diferiu significativamente do plantio direto a pleno sol (Tabela 1).

Tabela 1. Germinação de sementes de Matayba guianensis Aubl. submetidas a três


tratamentos: laboratório, plantio direto em casa de vegetação e a pleno sol.
Medida/Tratamento Laboratório Plantio Direto Pleno Sol Plantio Direto Casa vegetação

Germinabilidade (%) 65,00 ± 11,02 a 72,00 ± 9,57 a 68,00 ± 12,58 a

Tempo médio (dias) 3,15 ± 0,62 a 15,06 ± 4,16 ab 17,63 ± 4,19 b


Incerteza (bits)* 1,84 ± 0,13 a 2,09 ± 0,20 ab 2,26 ± 0,16 b
Médias seguidas de mesma letra na linha não diferem entre si a 5% de significância pelo teste de Tukey* ou pelo método
Dunn. São apresentadas as médias e desvios padrão dos resultados obtidos.

Modificações fenotípicas, como o desenvolvimento de internós, pecíolos e folhas


maiores, menor produção de matéria seca e maior retenção de assimilados na parte aérea, são
características de plantas submetidas a ambientes com pouca disponibilidade de luz, como
forma de escapar mais rapidamente da carência do recurso e que o sombreamento propicia
mudanças mais contundentes nas plantas típicas de ambientes com grande disponibilidade de
luz do que em plantas de sombra (Grime, 1977).
Para os dados de crescimento os tratamentos resultaram em diferenças significativas
na altura e no diâmetro do coleto. M. guianensis apresentou, em todos os níveis avaliados,
maiores alturas e diâmetros no nível intermediário de irradiância (50% de sombreamento),
exceto para o diâmetro aos 30 dias (Tabela 2). O rápido crescimento em altura, juntamente
com outras mudanças anatômicas, pode revelar uma forma de adaptação de plantas que não
conseguem tolerar à baixa disponibilidade de luz somente com o ajustamento das taxas
metabólicas (Moraes Neto et al., 2000). Em relação ao número de folhas, não foram
encontradas diferenças significativas para a espécie estudada (Tabela 2) como em demais
estudos (Souza-Silva et al., 1999; Fonseca et al., 2006).
As mudas de M. guianensis apresentaram uma distribuição de biomassa padronizada
nas diferentes partes da planta, sendo verificado que, independente do nível de
sombreamento, o maior acúmulo de biomassa foi obtido nas folhas, seguido das raízes e, por
último, no caule (Tabela 3). A razão raiz/parte aérea referente à biomassa seca foi maior a
pleno sol do que a 50% de sombreamento, o que implica em um maior acúmulo proporcional
de biomassa seca nas raízes das plantas submetidas ao crescimento a pleno sol (Tabela 3).
Em alta disponibilidade de luz as plantas estão sujeitas a uma maior restrição hídrica
do que as crescidas em ambientes sombreados, ocasionando um aumento do acúmulo de
matéria seca nas raízes com o aumento de luz disponível (Bongarten e Teskey, 1987).
Segundo Salisbury e Ross (1969), outra explicação plausível para o menor acúmulo de
matéria seca com o aumento do sombreamento se encontra no estudo do ponto de
compensação luminosa das plantas. Plantas tolerantes têm pontos de compensação mais
baixos, conseguindo realizar a fotossíntese com pouca quantidade de luz; porém, plantas não
tolerantes possuem pontos de compensação altos e produzem menor quantidade de matéria
seca em situações de baixa disponibilidade luminosa.

Tabela 2 - Avaliação da altura, diâmetro do coleto e número de folhas das mudas de 20


indivíduos de Matayba guianensis Aubl. nos períodos de 30, 60, 90 e 120 dias, submetidas a
duas condições de sombreamento durante seu desenvolvimento: casa de vegetação com 50%
de sombreamento (50%) e a pleno sol, com 0% de sombreamento (0%).
Sombreamento 30 dias 60 dias 90 dias 120 dias
(%) Altura (mm)
0 31,91 ± 9,86* a 37,83 ± 10,51* a 45,19 ± 12,27* a 45,83 ± 10,92 a
50 41,12 ± 11,55* b 47,49 ± 8,63* b 56,73 ± 14,89* b 63,98 ± 16,86 b
Diâmetro do coleto (mm)
0 0,83 ± 0,16 a 1,21 ± 0,22 a 1,25 ± 0,25 a 1,37 ± 0,29* a
50 0,81 ± 0,19 a 1,36 ± 0,11 b 1,71 ± 0,41 b 1,99 ± 0,43 b
Número de Folhas
0 2,55 ± 1,00 a 4,60 ± 1,19 a 6,80 ± 2,48 a 8,00 ± 2,36 a
50 2,60 ± 0,68 a 4,50 ± 1,10 a 7,25 ± 1,52 a 8,55 ± 1,43 a
Médias seguidas da mesma letra não diferem entre si a 5% de significância pelo teste de Tukey* ou pelo método de Dunn.
São apresentados as médias e desvios-padrão dos resultados obtidos.

Espécies pioneiras apresentam grande plasticidade ao longo de gradientes ambientais,


fato evidenciado pela variação marcante na relação raiz/parte aérea (Canham, 1989). Contudo,
Gonçalves et al. (1992) afirmam que espécies pioneiras desenvolvem sistemas radiculares
mais extensos e em maior quantidade, ao contrário das plantas clímax, que possuem raízes
atrofiadas e espessas.

Tabela 3 - Massas secas das raízes, caules, folhas e totais, juntamente com as respectivas
razões raiz/parte aérea (caule + folhas) das mudas de 12 indivíduos de Matayba guianensis
Aubl. submetidas a duas condições de sombreamento (0 e 50%), 120 dias após o plantio.
Sombreamento 0% Sombreamento 50%
Massa seca da raiz (g) 0,29 ± 0,11* a 0,78 ± 0,39* b
Massa seca do caule (g) 0,10 ± 0,05* a 0,33 ± 0,15* b
Massa seca das folhas (g) 0,46 ± 0,18 a 1,51 ± 0,58 b
Massa seca total (g) 0,85 ± 0,32* a 2,61 ± 1,07* b
Razão raiz/parte aérea (caule + folhas) (%) 0,53 ± 0,12 b 0,41 ± 0,08 a
Médias seguidas da mesma letra não diferem entre si a 5% de probabilidade pelo teste de Tukey ou pelo método de Dunn*.
São apresentadas as médias e desvios-padrão dos resultados obtidos.
Conclusões
Matayba guianensis apresenta alta germinabilidade e velocidade de germinação em
condições de laboratório, com melhor rendimento em condições intermediárias de irradiância
(50% de sombreamento), caracterizando-se como espécie pioneira ou heliófila de fases
iniciais de sucessão, podendo assim ser utilizada nos plantios de recuperação de áreas
degradadas juntamente com espécies pioneiras de rápido crescimento. São necessários demais
estudos com o acompanhamento das espécies em ambientes naturais.
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