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1. Introdução
Se o socialismo quiser sobreviver, ele deve superar sua
agorafobia congênita – que significa, literalmente,
‘medo de mercados’. Tem que aprender a habitar
sistemas e espaços abertos.—Hodgson (1999: 61)
4. A teoria do valor-trabalho
Diante disso, como o preço da mercadoria é determinado em um
sistema de cooperativas de produtores que não usam trabalho assalariado e
cuja produção é apropriada pelos trabalhadores? A teoria do valor-trabalho
pode explicar o processo de precificação em um sistema de cooperativas de
produtores? Antes de responder esta questão, vale a pena mencionar que os
estudos comparativos de Drèze sobre economias capitalistas e geridas por
trabalhadores em contextos perfeitamente competitivos mostraram que os
preços de equilíbrio em ambos os sistemas seriam idênticos no longo prazo
(Drèze, 1976, 1985, 1989). Uma afirmação que é sustentada por Estrin em
seu manual de Microeconomia (2012, cap. 11).
Um dos efeitos das características organizacionais de um sistema de
cooperativas de produtores é que a força de trabalho não é mais uma
mercadoria por duas razões principais: (i) porque não são os capitalistas que
empregam trabalhadores, mas os trabalhadores que empregam capital; (ii)
porque os trabalhadores com habilidades específicas de produção são
remunerados de maneiras diferentes em firmas individuais (trabalho
concreto, não abstrato). Assim, a teoria do valor-trabalho (que mede tudo em
unidades de força de trabalho abstrato socialmente necessária) não se aplica
a um sistema de firmas do tipo LMF, porque nesse sistema a força de trabalho
não é tratada como uma mercadoria e, portanto, não têm valor: e mesmo
onde o valor da força de trabalho deve ser fixado em seu nível de
remuneração, a renda atribuída a determinadas categorias de trabalhadores
não tenderia a nivelar em pontos de equilíbrio subsequentes em firmas
individuais (Vanek, 1970, caps. 2–6). Em outras palavras, na abordagem de
Marx, é o contrato de emprego (a suposição para a existência de força de
trabalho contratado) que desencadeia a transformação do valor adiantado na
forma de dinheiro em capital (uma quantia adicional de valor), e isso explica
por que a teoria do valor-trabalho não explica como os preços são formados
em um sistema com firmas geridas por trabalhadores.
Além disso, a adequação da teoria do valor-trabalho para explicar os
preços em um sistema de firma gerida por trabalhadores também pode ser
negada por pelo menos um motivo adicional: os diferentes níveis de
remuneração de trabalhadores particularmente qualificados em firmas
individuais descartam a possibilidade de que o trabalho concreto seja
reduzido a trabalho abstrato. Em Marx, o trabalho abstrato é igualado ao
trabalho contratado como tal. Segundo Kozo Uno, é apenas no capitalismo
que o trabalho abstrato se transforma em trabalho gerador de valor
(Ishibashi, 1995, 48). Já Fineschi observou que, como em Grundrisse, “o
trabalho vivo de um trabalhador contratado é descrito como trabalho
abstrato ‘em formação’”, a base do trabalho abstrato é a “subsunção real do
trabalho sob o capital” (Fineschi, 2005: 245, 147; 2006, 99–103). Isso
reforça a afirmação de que a teoria do valor-trabalho, que está associada ao
trabalho abstrato, não se aplica a um sistema de firmas geridas por
trabalhadores, onde o trabalho contratado é algo estranho ao sistema
(Miconi, 1981, 163). Arthur (2009, 150) também argumentou que em Marx
o trabalho é reduzido a uma certa quantidade de trabalho abstrato quando há
controle do capital sobre o trabalho (Marx, 1861–63: vol. 30, 71, 93).
6. Considerações Finais
Para finalizar, acredito que todos esses tópicos, além de outros
importantes que não foram tratados aqui (como a questão da alienação), são
muito mais complexos e mereceriam ser abordados em textos separados. No
entanto, deixo aqui essas reflexões metodológicas que oferecem pistas para
uma compreensão de como podemos repensar o marxismo à luz das
cooperativas de trabalhadores como ponto de partida para uma ação prática-
efetiva de libertação da exploração dos trabalhadores e da reivindicação da
responsabilidade de sua própria vida produtiva. Gostaria também de lembrar
que vários artigos foram traduzidos e feitos no meu blog sobre autogestão,
marxismo e firmas geridas por trabalhadores, que podem servir de
complemento para a leitura e de questões aparentemente sem justificações.
Esses textos estarão disponíveis nas referências. O livro de inspiração para
esse texto, que considero mais um editorial, foi “Producer Cooperatives as a
New Mode of Production” (2014) de Bruno Jossa.
Referências
Em breve!