GRELHA DE CORREÇÃO DO TESTE ESCRITO DE DIREITO DO URBANISMO
3.º ANO TURMA A – 20.5.2022
Responda fundamentadamente às seguintes questões:
1. Qualifique quanto à natureza e vinculação jurídicas o Programa da Orla Costeira
Sintra-Sado e o Plano Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas. (2 valores) O Programa da Orla Costeira é um programa especial (artigo 42.º, n.º 1 e 2, do RJIGT) e o Plano Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas é um programa setorial [artigo 39.º, n.º 2, alínea a) do RJIGT]. Ambos os programas territoriais vinculam apenas as entidades públicas, mas não as entidades privadas (artigo 3.º, n.º 1, do RJIGT).
2. Aprecie a ponderação efetuada pela Câmara das participações dos moradores na
discussão pública. (4 valores) O exercício de ponderação obriga a pesar e valorar, em termos relativos, os interesses públicos e privados conflituantes. Existe um dever de justa ponderação que impende sobre a Administração (artigo 6.º, n.º 4, do RJIGT). De um lado, encontramos os interesses privados de defesa do direito de propriedade e do direito à habitação, com assento nos artigos 62.º e 65.º, n.º 1, da CRP e do outro os interesses públicos de defesa dos bens do domínio público, de proteção dos recursos e valores naturais (artigo 12.º do RJIGT) e de defesa das áreas perigosas e das áreas de risco (artigo 13.º do RJIGT), bem como das áreas da estrutura ecológica (artigo 16.º). Cabia à Câmara, no exercício da discricionariedade de planeamento municipal, realizar um juízo de proporcionalidade que permitisse a máxima otimização dos interesses em confronto.
3. A publicação do Plano de Pormenor no Boletim Oficial de Almada confere-lhe
eficácia? (1 valor) Não. A eficácia do Plano de Pormenor depende da respetiva publicação em Diário da República (artigo 191.º, n.º 1, e n.º 3, alínea f) do RJIGT], não bastando a mera publicação no boletim municipal (artigo 192.º, n.º 3, do RJIGT).
4. A ordem de demolição determinada pelo Presidente da Câmara é válida? (3
valores) A medida de demolição apenas deve ser adotada como ultima ratio, caso as outras providências previstas no artigo 102.º, n.º 2, do RJUE não se revelarem suficientes. A ordem de demolição só pode ser decretada após a audiência do interessado e o prazo de pronúncia deste não pode ser inferior a 15 dias (artigo 106.º, n.º 3, do RJUE), pelo que a decisão do Presidente se encontra ferida de vício de forma e de violação de lei. A não previsão de realojamento viola o princípio da proporcionalidade e o direito fundamental à habitação.
5. Analise separadamente as posições de António, Beatriz e Carolina e indique se as
mesmas merecem tutela jurídica, quer no plano da legalidade, quer no da responsabilidade. (5 valores) A posição jurídica subjetiva de António revela-se a que merece maior tutela, uma vez que se encontra titulada em licença e autorização de utilização há um período longo de tempo. No caso de Beatriz, a legalização passou pela emissão de licença, faltando apenas a autorização de utilização. A construção está legalizada, pelo que só falta o título para a utilização. Em contrapartida, Carolina não tem ainda uma licença, mas uma mera aprovação de projeto de arquitetura (ato interlocutório ou endoprocedimental), pelo que ainda não dispõe de um ato final que permita considerar legalizada a construção. Todos beneficiam de atos constitutivos de direitos, mas esses atos podem ser postos em causa por planos urbanísticos supervenientes, desde que as posições jurídicas subjetivas dos particulares sejam acauteladas. No plano da responsabilidade administrativa, à luz do princípio da aquisição gradual de faculdades urbanísticas (artigo 15.º da Lei de Bases da Política Pública de Solos, Ordenamento do Território e Urbanismo), os valores das indemnizações a que têm direito por via do artigo 70.º do RJUE e do artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 do RJIGT são decrescentemente distintos entre António, Beatriz e Carolina. São indemnizáveis os danos do plano e os danos da confiança (artigo 171.º, n.ºs 4 e 7, do RJIGT).
6. Aprecie a validade da declaração de nulidade prolatada pelo Presidente da
Câmara. (3,5 valores) A declaração de nulidade pelo Presidente da Câmara teria sempre de ser precedida de audiência dos interessados, nos termos gerais. E nunca poderia ser praticado o ato, sem a necessária indemnização, de acordo com o princípio geral consagrado no artigo 129.º, n.º 3, do RJIGT para os atos administrativos que violam o plano e que aqui poderia ser aplicado por paralelismo. Sob pena de violação do princípio da proporcionalidade, nas vertentes da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito, não poderia a declaração de nulidade ser adotada sem ponderar as situações jurídicas consolidadas a favor dos particulares.
7. Caso os moradores tenham direito a ser indemnizados, qual a entidade a quem
deve ser imputado o dever de indemnizar? (1,5 valores) Na origem do sacrifício dos direitos dos particulares, determinado pelo plano de pormenor, encontram-se os programas territoriais, especial e setorial, aprovados pelo Estado, pelo que, em primeira linha, cabe-lhe assegurar a indemnização dos particulares (artigo 171.º, n.º 8, do RJIGT). Mas considerando que o Presidente da Câmara contribuiu para a situação através da prática de atos ilegais, nomeadamente as invalidades de que padecem a ordem de demolição e a declaração de nulidade dos atos anteriores favoráveis aos particulares, o município poderá ter de responder solidariamente.