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As idéias psicológicas na Antiguidade – Sócrates, Platão e Aristóteles

História da Psicologia

Julio Cesar Cruz Collares-da-Rocha

Introdução

Os filósofos chamados “pré-socráticos” foram importantes para a filosofia dos


pensadores que os sucederam, e que gozaram de grande influência e divulgação no
mundo ocidental: Sócrates, Platão e Aristóteles.

Sócrates (469 – 399 A. C.)

Natural de Atenas, Grécia. É um dos filósofos mais afamados da Antiguidade. Dedicou-


se à educação dos jovens, pois acreditava na educação moral do homem.

Foi condenado a morte por envenenamento (cicuta), por julgarem que ele estaria
corrompendo a juventude ateniense.

Não deixou obra escrita. Sua filosofia é conhecida a partir dos seus discípulos,
especialmente, Platão (Defesa de Sócrates e os diálogos, O banquete, por exemplo) e
Xenofonte (Ditos e feitos memoráveis de Sócrates e Apologia de Sócrates), e por seus
adversários, se destacando, Aristófanes (As nuvens – em forma de diálogo).

Foi erroneamente considerado como fazendo parte do grupo dos sofistas*, visto que,
compartilhava com estes uma nova visão: a passagem do interesse cosmológico,
predominante nos filósofos pré-socráticos, para o interesse antropológico – o estudo do
homem.

* Os sofistas se compunham de grupos de pensadores que viajavam de cidade em


cidade realizando discursos públicos para atrair estudantes, de quem cobravam taxas
para oferecer-lhes educação.

O lema de Sócrates “Conhece-te a ti mesmo” parece estar na base de algumas


abordagens psicoterápicas, como, por exemplo, a Psicanálise, visto que Freud indicava,
na primeira tópica, que o objetivo da análise era tornar consciente o que estava
inconsciente.

Percebemos a influência da máxima socrática também em algumas abordagens


humanistas, como a psicoterapia centrada na pessoa de Carl Rogers, a psicoterapia
existencial de Rollo May e a Logoterapia de Viktor Frankl.

Acreditava que tínhamos um conhecimento imperfeito da realidade, visto que


conhecíamos a realidade pelos sentidos, lançando dúvida acerca de concepções
fechadas sobre a realidade.
Para ele, “jamais podemos estar seguros de que realmente conhecemos alguma coisa”
(WERTHEIMER, 1972, p. 20).

Seu método para testar o conhecimento da realidade era a maiêutica (homenagem a mãe
que era parteira), que objetivava “realizar o serviço de parteira para trazer à luz os
princípios morais inatos na razão prática” (ROSENFELD, 1984, p. 16).

“Sei que nada sei” era seu mote para afirmar a própria ignorância e busca.

“Embora filósofo moral e não psicólogo, contribuiu marginalmente uma espécie de


psicologia da vida moral, através da análise do impulso humano à felicidade e ao bem,
o estudo das relações entre razão e as paixões e a indagação acerca das motivações
humanas” (ROSENFELD, 1984, p. 16)

Platão (427 a 347 A. C.)

Nascido em Atenas, Grécia. Foi o mais famoso discípulo de Sócrates e seu principal
intérprete.

Fez um discurso inflamado e apaixonado em defesa de Sócrates, quando da condenação


à morte por envenenamento.

Sobreviveram cerca de 150 obras dele, entre fragmentos e textos, destacando-se: Sobre a
natureza do homem, Apologia de Sócrates*, O banquete, A república, Górgias.

Platão continua a tradição de Sócrates em considerar que o nosso conhecimento da


realidade é imperfeito e que os sentidos nos enganam.

A perfeição do cosmos era representado pelo mundo das ideias; e a imperfeição era o
mundo objetivo: uma imagem distorcida do que contém o mundo das ideias.

Ele considera que a alma, antes de encarnar, teve acesso e contemplou todo o mundo
das ideias, mas, a encarnação - a união da alma ao corpo (dualismo) – apagou as
memórias dessa contemplação, pois o corpo seria um obstáculo para o conhecimento.

Estabelecendo a divisão entre mundo das ideias e mundo objetivo, Platão indica a
intimidade da alma com o primeiro e a relação do corpo com o segundo. A união da
alma com o corpo produz um esquecimento, logo conhecer para o filósofo não significa
aprender o que está fora, mas lembrar o que está dentro (da alma).

Se o aprendizado em Platão diz respeito a lembrança do que está dentro da alma, qual
seria o papel dos objetos exteriores percebidos pelos sentidos?

Para Platão, os objetos exteriores emitem cópias embaçadas de si mesmos (eidolas) que
penetram nos órgãos sensoriais.
O mito da caverna de Platão, encontrado na obra “A república” ajuda a compreender a
relação entre o mundo das ideias e o mundo objetivo.

O conhecimento das Idéias seria obtido mediante a contemplação (noesis), acessível


apenas à alma (cuja parte mais importante seria a razão, o nous).

Nesse sentido, Platão distingue a evocação, que seria a memória das experiências da
sensibilidade (aisthesis), da memória da contemplação das Ideias, que é referida como
reminiscência.

Durante a vida, experimentaríamos essas duas formas de memória, mas, a


reminiscência não ocorre com a mesma presteza que a evocação.

Daí o recurso à dialética, entendida como forma de discussão, que propiciaria a


reminiscência.

A validade dos conteúdos da reminiscência seria superior aos da evocação, pois, esta
última estaria relacionada a opiniões (doxai), ao passo que a reminiscência seria a
memória do invariante (episteme).

A doutrina platônica da alma é entendida como substância constituída de três partes (nous –
razão localizada na cabeça, thymós – bravura / vontade localizada no coração e
epithymeticon – apetites inferiores localizado na barriga) distintas, porém, interligadas, é
complementada por sua concepção social, descrita na República, um de seus principais
Diálogos.

“Ensinava Platão que os homens beneficiam-se profundamente um dos outros; que


como disse John Donne, dois milênios mais tarde, homem algum é uma ilha dentro de si
mesmo. O homem é um ser social, bastante influenciado pelos que estão a sua volta”
(WERTHEIMER, 1973, p. 21).

Essa ideia de influência do meio (ambientalismo), surge em Demócrito, perpassa toda a


filosofia moderna e, tem seu auge nas formulações comportamentais de John B. Watson
e Skinner.

A ideia de benefício uns dos outros, aparece no conceito de Zona de Desenvolvimento


Proximal de Vigotski, que considerava que o aprendizado/desenvolvimento seria
propiciado pelo contato de uma criança/pessoa mais capacitada com uma
criança/pessoa menos capacitada que, numa relação de apoio, ajudaria no
desenvolvimento um do outro.

A questão do dualismo alma-corpo, alimentou discussões sobre a diferença entre mente


e corpo durante todo o século 20 e até hoje.

Aristóteles (384 – 322 A.C.)


Nascido em Estagira, na Macedônia, Foi discípulo e opositor de Platão, visto que aprendeu
por vinte anos com ele, mas produziu um conhecimento novo.

O zeitgeist (espírito do tempo) da Atenas da época era propício para o desenvolvimento da


Filosofia e também para o florescimento de novas ideias filosóficas.
Ele também foi Mestre de Alexandre, o Grande, soberano que levou ao começo da
decadência da civilização grega.

Quando Atenas foi invadida, ele fugiu de barco temeroso pela própria vida e, olhando para
trás, sentenciou: “Não podem matar a Filosofia!”, que seria ele mesmo.

Foi considerado por diversos autores como um dos primeiros cientistas, fundando o
pensamento científico.

Se interessou por temáticas como: sonhos, aprendizagem, pensamento, envelhecimento e


relação entre o homem e a sociedade. Alguns historiadores da Psicologia o consideram
como o primeiro psicólogo.

A solução de Aristóteles para o problema alma – corpo é a concepção do hilemorfismo.


Esta palavra significa a unidade substancial entre matéria (hylé) e forma (morphé). Nesse
sentido, há uma vinculação estreita e completa entre o corpo e a alma, sendo esta
entendida como princípio vital, existente em qualquer corpo animado, até mesmo em
vegetais.

Assim, a alma estaria presente em todos os organismos, não importando sua espécie
ou gênero. Segundo Aristóteles, haveria três tipos de alma: a vegetal; a animal; e, a
humana.

O principal atributo da alma vegetal é a nutrição; a animal, além da nutrição, seria


sensível; e, a humana, além dos atributos anteriores, seria inteligente.

No De Anima, Aristóteles distingue a inteligência passiva da inteligência ativa: a


primeira seria meramente receptora de impressões sensoriais, cabendo à inteligência
ativa a função abstrativa.

Aristóteles mantém a diferença proposta por Platão entre sensação e pensamento,


porém, sem admitir o inatismo das Ideias.

Sobre a imortalidade da alma humana, os argumentos de Aristóteles não são conclusivos.

Ele considera o ser humano como zoón politikón (animal político), e a tese da katharsis,
quer dizer, da purificação, da transformação de paixões negativas em sentimentos
positivos.

O termo catarse foi tomado por Freud para explicar o processo de produção de alívio
psíquico pela fala.
Indicava também que todo o conhecimento provém da natureza. Para ele, ao nascer a
mente é uma tábula rasa (placa de cera intacta), e a experiência é escrita sobre essa
placa.

Ideia elaborada mais tarde por Jonh Locke, e seguida por John B. Watson, com o
Behaviorismo.

A influência dos filósofos pensadores no Cristianismo

As ideias de Platão e Aristóteles foram retomadas e revistas pelos chamados


“Doutores da Igreja”, como São Tomás de Aquino e Santo Agostinho.

Em especial, São Tomás de Aquino tentou reconciliar a filosofia aristotélica com os


dogmas religiosos.

Referências

RIBEIRO, I. Raízes da Psicologia. 15 ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

ROSENFELD, A. O pensamento psicológico. São Paulo: Perspectiva, 1984.

WERTHEIMER, M. Pequena história da Psicologia. São Paulo: Companhia Editora


Nacional, 1972.

CIVITA, V. (Ed.) Os Pensadores. Vol. 2, 3 e 4. São Paulo: Abril Cultural, 1973.

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