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2024
CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA
FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL –
ORDEM DOS FRADES MENORES
PRESIDENTE
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
DIRETOR GERAL
Jorge Apóstolos Siarcos
REITOR
Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM
VICE-REITOR
Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM
PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO
Adriel de Moura Cabral
PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO
Dilnei Giseli Lorenzi
COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD
Franklin Portela Correia
CENTRO DE INOVAÇÃO E SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CISE
Franklin Portela Correia
PROJETO GRÁFICO
Centro de Inovação e Soluções Educacionais - CISE
CAPA
Centro de Inovação e Soluções Educacionais - CISE
DIAGRAMADOR
Lucas Ichimaru testa
EPIDEMIOLOGIA DESCRITIVA
1
INTRODUÇÃO
Muitas pessoas, mesmo sem saber, já usaram fundamentos e partes da epidemiologia
em seu dia a dia. Com frequência fazemos pesquisas no nosso cotidiano. Talvez a pes-
quisa não tenha um rigor metodológico e científico, mas mesmo assim investigamos
causas e chegamos a conclusões. Esse processo de investigação está próximo do que
iremos estudar neste componente curricular.
A epidemiologia irá trazer ferramentas para avaliar se a pesquisa foi conduzida de maneira
correta para te ajudar a decidir se você muda de conduta ou mantém seguindo a conduta já
estabelecida. Se uma pesquisa disser que para um tipo de linfoma não há necessidade de
realizar quimioterapia já que os efeitos colaterais são mais prejudiciais do que os benefícios
do tratamento. Como médico de um paciente com esse tipo de doença, você manteria o
protocolo atual que é prescrever quimioterapia ou você mudaria a sua conduta por causa da
conclusão da nova pesquisa? Esses dilemas irão acontecer na vida profissional de vocês,
por isso é importante ter os conhecimentos que iremos discutir nesse componente curricular.
Figura 01. Epidemiologia
Fonte: 123RF.
6
1. DEFINIÇÃO DE EPIDEMIOLOGIA
De modo histórico, a epidemiologia conta sobre os eventos relacionados à saúde, como
nascimentos, casos de doenças e mortes. Um exemplo clássico se refere a John Snow, o 1
pai da Epidemiologia moderna, que, no século XIX, investigou a epidemia de cólera em Lon-
dres, avaliando os casos e onde eles aconteceram para que, a partir dessas informações,
conseguisse propor hipóteses causais e estratégias para reduzi-los. Esse marco amplia a
Com o passar do tempo, a epidemiologia ampliou seu objeto de estudo para além das
doenças transmissíveis, investigando o processo saúde-doença. Dessa forma, começa
a busca por fatores de risco ou fatores determinantes para acontecimento de doenças
específicas, como o câncer, por exemplo. Nesse sentido, estrutura-se desenhos de es-
tudos que possibilitam definir fatores causais. Epidemiologia é a:
[...] ciência que estuda o processo saúde-doença em coletividades humanas,
analisando a distribuição e os fatores determinantes do risco de doenças,
agravos e eventos associados à saúde, propondo medidas específicas de
prevenção, controle ou erradicação de doenças, danos ou problemas de
saúde e de proteção, promoção ou recuperação da saúde individual e coletiva,
produzindo informação e conhecimento para apoiar a tomada de decisão
no planejamento, administração e avaliação de sistemas, programas, serviços e
ações de saúde (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 9, grifos nossos).
2. INTRODUÇÃO A PESQUISA
Como a epidemiologia está vinculada a pesquisa científica, é importante que alguns
conceitos e definições sejam explicados.
Quais são as etapas básicas de uma pesquisa? As informações básicas de como estru-
turar uma pesquisa influencia em como avaliar a qualidade e a confiabilidade dela. As
etapas iniciais do planejamento da pesquisa podem parecer simples, mas na verdade
elas são a base fundamental para o sucesso final da pesquisa.
Esse processo se inicia com a escolha de um tema que se pretende estudar. As pesquisas
de base, como investigar característica de uma bactéria que não causa doença, é tão im-
portante quanto as de aplicação como avaliar a eficácia de um novo tratamento. Conversar
com pessoas que atuam com o tema pode ajudar a definir quais são assuntos interessantes
de serem estudados. Ou a partir da sua realidade de trabalho como profissional de saúde,
levantar problemas e situações que devem ser investigadas. Outro fator necessário é bus-
car na literatura o que já foi publicado sobre o tema. A partir disso, deve-se buscar especifi-
car e delimitar o que se pretende estudar sobre o tema. (Bell, 2008, p.31-34)
Essa etapa de refinamento e reflexão, de qual parte estudar, tem como finalidade definir
a questão da pesquisa, a hipótese e os objetivos que espera-se alcançar ao final. Uma
boa pergunta de pesquisa deve ser específica quanto ao tempo, espaço, população e
contexto. Com suas características deve ser possível reproduzir a pesquisa. É recomen-
dado que o assunto tenha algum aspecto novo, mesmo que seja ver se os resultados
encontrados em outros países também acontecem no Brasil. Um exemplo de pergunta
Epidemiologia 7
Epidemiologia descritiva
Durante todo o tempo de realização da pesquisa deve-se lembrar qual é a questão nor-
1
teadora e refletir se as ações realizadas e os dados coletados irão ajudar a responder à
pergunta e confirmar a hipótese. Como as informações são coletas, será que influencia
na capacidade da pesquisa de atingir seus objetivos?
Para responder uma questão de estudo, uma parte importante da pesquisa se refere à
composição e definição das variáveis do estudo. Variáveis são valores ou informações
obtidas diretamente ou podem ser resultado de um agrupamento, classificação ou cál-
culo de medidas coletadas. Elas podem ser características individuais, determinantes
do processo saúde-doença, fatores de risco, eventos clínicos e desfechos, como morte,
presença de doença, deficiência, sintomas e qualidade de vida.
É importante ter um equilíbrio entre coletar pouca informação e depois não conseguir
fazer algumas análises ou coletar muitos dados e acabar só utilizando metade das
informações obtidas. Quanto mais se estuda sobre o tema, mais fácil fica a decisão de
o quê, como, quando e onde coletar. Essas decisões impactam no sucesso da pesquisa
EXEMPLO 1
Se o objetivo é avaliar a associação de entre uma exposição com um desfecho, como consu-
mo de bebida alcoólica e câncer, quais variáveis devem ser coletadas?
Inicialmente pode-se pensar em somente coletar duas informações: quem é bebe e quem
teve câncer nos últimos anos. Mas não detalhar as informações sobre a bebida ou coletar
outros dados que podem contribuir com o surgimento do câncer podem atrapalhar na inter-
pretação dos resultados.
8
2.1 MÉTODO DE PESQUISA
Uma pesquisa tem várias etapas, logo, ao desenvolver o método que será utilizado na coleta
e análise dos dados devemos realizar diversas escolhas. Essas decisões devem ser feitas
com o objetivo de melhorar a qualidade da pesquisa, mas, como nem sempre isso é possível, 1
o pesquisador pode ser obrigado a escolher a opção mais viável e não a mais adequada.
os possíveis vieses que podem acontecer são conhecimentos essenciais para desenhar o
estudo de maneira a contornar as dificuldades.
Ao desenhar uma pesquisa é preciso definir quais variáveis coletar e como conduzir
esse processo. Por exemplo, é possível coletar a idade da pessoa perguntando qual é
a idade do sujeito da pesquisa ou perguntar a data de nascimento. Coletar a data de
nascimento normalmente é mais fiel porque há mais chance da pessoa errar a idade
dela do que a data de nascimento.
Epidemiologia 9
Epidemiologia descritiva
Após analisar a Figura 2, o instrumento amarelo se mostra impreciso e tem baixa valida-
de; o instrumento verde, por sua vez, é preciso porque as aferições estão próximas, mas
tem baixa validade já que estão longe do centro; o instrumento azul tem precisão e acurá-
cia intermediárias; por fim, o instrumento vermelho tem alta precisão e acurácia. O ideal é
utilizar instrumentos com precisão e acurácia minimamente intermediários. É importante
ficar atento para possíveis equipamentos com alta precisão, mas que não tem acurácia.
As escalas são ferramentas utilizadas por muitos profissionais da saúde para avaliar
características dos indivíduos e os fatores determinantes de saúde, como o Mini Exame
do Estado Mental (MEEM). Essas escalas ao serem criadas, traduzidas ou adaptadas
para diferentes populações, devem passar por uma avaliação de validade de conteúdo,
de critério e de construto. A validade de conteúdo refere-se à capacidade que a escala
tem de abranger todos os aspectos do problema a ser medido, assim como a clareza
na medição do problema.
A validade de critério, por outro lado, compara os resultados do teste em questão com
outros exames ou características mensuráveis. Segundo Pasquali (2009), a validade
de construto leva em consideração a consistência interna (correlação entre cada item e
o restante dos itens da escala) e a capacidade do instrumento em medir uma variável
latente (um construto que não pode ser medido diretamente).
10
3. CONCEITOS BÁSICOS EM EPIDEMIOLOGIA
A qualidade de uma pesquisa é avaliada a partir da presença de erros cometidos. Nesse
contexto, viés é um erro sistemático e ao delinear o projeto é preciso pensar em estraté- 1
gias metodológicas que diminuam a chance desse erro acontecer. Existem três principais
tipos de vieses: o viés de seleção, viés de aferição e viés de confusão ou de confundimento.
Fonte: 123RF.
Por exemplo, ao fazer uma pesquisa sobre uma possível medicação que emagrece, a
pesquisa não considerou o grau de atividade física dos sujeitos. Então, aqueles que to-
maram o remédio e emagreceram podem ser fisicamente ativos e os que não tomaram
a medicação sejam sedentários. Como a seleção da amostra nos grupos não conside-
rou a atividade física, não é possível considerar que o emagrecimento de fato foi por
causa da medicação, pois foram comparados grupos com características diferentes.
O viés de aferição ocorre quando o erro é na aferição de alguma variável, como usar
uma balança não calibrada, realizar a técnica incorreta de aferição da pressão arterial
ou usar equipamentos diferentes para aferir alguma variável.
Outra possibilidade de viés de aferição é que cada avaliador pode interpretar de ma-
neira diferente uma mesma situação. Por exemplo, edema de membros inferiores (in-
chaço nas pernas) é avaliado em uma escala de 1+, 2+, 3+ e 4+. Ao avaliar a perna de
um paciente em um mesmo momento, um profissional pode considerar que o edema
é pequeno (1+) enquanto outro acha que ele é moderado (2+). Por isso, sempre que
possível, o ideal é usar critérios objetivos que reduzem o viés de aferição. Nesse caso,
poderia medir a circunferência da perna do paciente.
Epidemiologia 11
Epidemiologia descritiva
Um fator de confusão está associado à exposição, em que deve ter uma associação
causal com o desfecho e não deve ser uma etapa do caminho da exposição gerar o
desfecho. Por exemplo, uma pesquisa demonstra uma associação de depressão como
fator causal para ter câncer de pulmão. Nesse contexto, um fator de confundimento é
o tabagismo, pois fumar causa câncer de pulmão e fumar está associado à depressão,
pois esse é um hábito apresentado frequentemente em pessoas depressivas. Portanto,
o viés de confusão ocorre com a variável tabagismo, que impacta na associação princi-
pal da pesquisa, depressão e câncer de pulmão.
4. TIPOS DE ESTUDOS
Diversas pesquisas têm como objetivos investigar a história natural da doença, fatores
de risco ou compreender como a doença está distribuída na população. Para responder
às perguntas de pesquisas, vários tipos de estudos foram estruturados que permitem
atingir o objetivo de maneira eficaz.
Nessa seção da unidade iremos abordar estudos que conseguem responder essas pos-
síveis perguntas de pesquisa:
12
4.1 ESTUDO TRANSVERSAL, DE PREVALÊNCIA E SECCIONAL
O estudo transversal é um estudo descritivo e observacional. Esse nome tem origem
da definição que as informações são coletadas em um único ponto do tempo, como se
a linha do tempo sofresse um corte transversal ou como uma fotografia. Ele também 1
pode ser chamado de estudo seccional ou de prevalência. A principal característica do
estudo transversal é que as informações das variáveis dependentes e independentes
DESENHO
EXEMPLO
Dessa forma, a principal finalidade deste tipo estudo é medir e descrever frequências de
doenças e fatores de risco. Em geral, esse estudo é utilizado para descrever doenças
comuns e de longa duração, como levantamentos de dados que descrevem dados já
registrados e os inquéritos populacionais de saúde que buscam as informações para
complementar os dados coletados por outros meios.
Epidemiologia 13
Epidemiologia descritiva
Inquéritos populacionais ou outros estudos transversais são ferramentas usadas para re-
alizar pela gestão de serviços e sistemas. A partir dos dados da PNS de 2019, o Ministério
da Saúde poderia pensar em intervenções para redução do consumo de bebida alcoólica.
Na pesquisa há mais detalhamento de quem são essas pessoas (escoloradidade, idade,
sexo, …) que podem direcionar a intervenção para o público que de fato necessita.
Fonte: 123RF.
14
Nesse sentido, as pesquisas transversais são capazes de sugerir associações ou hipóte-
ses para possíveis relações causais entre variáveis. Por isso, é comum que elas conclu-
am que estudos longitudinais devem ser feitos para avaliar se de fato existe associação.
1
IMPORTANTE
Outra limitação é o alto risco de presença de vieses. Isto é, toda vez que uma associa-
ção é sugerida, há sempre um risco de ter viés de confusão, ou seja, outra variável é
responsável pelo evento que não aquela proposta. Outro viés possível é o de sobrevi-
vente, por exemplo, uma pesquisa sobre qualidade de vida para pacientes oncológicos
pode ser tendenciosa, pois, provavelmente, grande parte da amostra é de casos menos
graves e com melhor prognóstico.
Os resultados desses estudos são utilizados para ter um diagnóstico situacional da popu-
lação e, com isso, planejar ações e serviços a partir das demandas levantadas. Por exem-
plo, se um levantamento entre os adultos do território de uma Unidade Básica de Saúde
encontra que 66% dessas pessoas têm sobrepeso ou obesidade, a equipe desse serviço
pode planejar ações para reduzir essa proporção e prevenir doenças cardiovasculares.
EXEMPLO 2
No artigo a seguir você encontrará uma pesquisa com o desenho transversal na qual há uma
descrição de questões de sexualidade e gênero de adolescentes em São Paulo. Leia para
saber mais.
Epidemiologia 15
Epidemiologia descritiva
EXEMPLO 3
Para saber mais sobre o primeiro relato de caso da AIDS, leia o artigo referenciado a seguir.
1
Apesar de ser em inglês, esse é um artigo clássico que conta como a partir de um relato de
caso os profissionais foram percebendo e descobrindo uma nova doença. É importante res-
saltar que lingua da ciência é o inglês.
GLOSSÁRIO
DATASUS é a sigla do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde. Uma de
suas funções é manter o acervo das bases de dados dos sistemas de informações em saúde
e disponibilizar esses dados. Então, nessa plataforma, conseguimos dados agregados de
mortalidade, natalidade, doenças transmissíveis, assistência à saúde, entre outros.
Esse tipo de estudo utiliza três tipos de medidas. As medidas agregadas resumem os
dados dos indivíduos, não sendo possível saber a informação de cada indivíduo da
população. Assim, não é possível saber se uma pessoa que é hipertensa também con-
some bebida alcoólica mais do que uma vez na semana ou se realiza atividade física.
Elas são representadas por médias, proporções ou frequências dos eventos em uma
determinada população e local.
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Além disso, as vantagens são: baixo custo, rapidez e praticidade, já que, em alguns ca-
sos, os dados já estão disponíveis em plataformas. Por outro lado, como desvantagens,
esse estudo leva em conta a média e não a variabilidade da característica dentro da po-
pulação, tem dificuldade em estabelecer temporalidade e fluxos migratórios ou eventos 1
específicos podem mudar a característica da população, atrapalhando a análise.
Dessa forma, o principal viés que pode ocorrer é a falácia ecológica ou viés de agre-
Por exemplo, um estudo ecológico observa uma associação que quanto maior o Índi-
ce de Desenvolvimento Humano (IDH) do município, maior a quantidade de exames
preventivos de câncer de colo uterino (Papanicolau). Além disso, há casos em que as
condições socioeconômicas e o erro de falácia ecológica levam os pacientes a não vol-
tarem a realizarem os exames consecutivos.
EXEMPLO 4
No artigo a seguir você encontrará uma pesquisa com o desenho de estudo ecológico na qual
descreve e investiga a associação entre suicídio e trabalho. Leia para saber mais.
Assim, analisar eventos por características da população tem como objetivo propor
hipóteses de possíveis grupos de risco e características demográficas, comportamen-
tais e socioeconômicas que possam influenciar na frequência do evento. No exemplo
da Figura 6, a proporção de usuários atuais de produtos derivados do tabaco é maior
em homens, em pessoas de 40 a 59 anos e em pessoas de baixa escolaridade (ensino
médio incompleto ou inferior).
Epidemiologia 17
Epidemiologia descritiva
Distribuição de propor-
ção de casos novos de
tuberculose nos municí-
pios do Estado de São
Paulo em 2012.
Fonte: Brasil (2014, p. 55).
18
Desse modo, analisar a distribuição de um evento ao longo do tempo permite acom-
panhar a evolução da doença e associá-la a outros acontecimentos que, em algum
período, fizeram com que a proporção do evento alterasse a tendência. Por exemplo,
na Figura 8 podemos perceber uma tendência a estabilizar o número de casos novos 1
de AIDS. Dessa forma, pode-se associar esse fato com a introdução da terapia antirre-
troviral de alta potência em 1997.
CURIOSIDADE
Uma doença endêmica apresenta taxas constantes de casos novos podendo ou não ter va-
riação sazonal. A malária é endêmica na Região Amazônica, apresentando, de forma geral,
um aumento de casos no período de transição entre as estações úmidas e secas.
A faixa endêmica é uma previsão estatística do possível número de casos que devem ser
encontrados em um período. Para criá-la, primeiramente, fazemos a média dos números
de casos no período e depois consideramos como um intervalo dentro do normal dois
desvios padrões de distância do valor da média. Na Figura 9, as linhas verdes represen-
tam os limites inferiores e superiores da faixa endêmica, já a linha azul apresenta a média
Epidemiologia 19
Epidemiologia descritiva
de casos nos últimos anos. No mês de julho, a média de casos dos últimos anos foi de 30,
mas é esperado que nesse ano a quantidade de doentes varie entre 21 e 39.
Quando o número de casos excede o que é esperado pela faixa, temos uma epidemia.
1
Ela pode ser definida também como um aumento de doentes que excede o que se
espera, normalmente com velocidade rápida e descontrolada. Na Figura 9 é possível
perceber a epidemia a partir de maio, quando os casos ultrapassam o limite.
Figura 09. Gráfico da faixa endêmica
Com limites inferiores e superiores, e média da proporção de casos de uma doença fictícia
além da frequência dos casos que ocorreram de janeiro a junho de 2021.
Popularmente, as pessoas usam surto como sinônimo de epidemia, contudo, para a epide-
miologia, surto é uma concentração de casos delimitados a locais específicos. Por exemplo,
15 crianças apresentaram conjuntivite em uma escola específica, nesse caso, pode-se dizer
que a escola apresentou um surto de conjuntivite. Outro termo semelhante é a pandemia,
que consiste na disseminação e no número excessivo de casos da doença no mundo inteiro.
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Fórmula da prevalência:
número de pessoas acometidas com a doença emuma população eum determinado período
1 Prevalência ×100 1
númerototal de pessoas emuma população eum determinado período
EXEMPLO 5
Cálculo de prevalência
Em uma cidade fictícia “X” com 3.000 habitantes, em 1º de janeiro de 2019, havia 12 pessoas
em tratamento por Hanseníase. Ao longo do mês de janeiro foram diagnosticados mais 3 ca-
sos, e até 31 de junho de 2019 houve 5 altas por cura e não foram identificados mais novos
casos da doença. A partir do princípio de que todo caso da doença está em tratamento, qual
é a prevalência de hanseníase na cidade “X” no primeiro dia de janeiro de 2019; em janeiro
de 2019 e no final do primeiro semestre do mesmo ano?
substituir a fórmula.
12
= dividir.
3.000
= 0, 004 ×100 multiplicar.
= 0, 4%.
Epidemiologia 21
Epidemiologia descritiva
número de pessoas acometidas com a doença emuma população eum determinado período
1 Prevalência =
númerototal de pessoas emuma população eum determinado período
substituir a fórmula.
12 + 3
= somar.
3.000
15
= dividir.
3.000
= 0, 005 ×100 por fim, multiplicar.
= 0,5%.
substituir a fórmula.
12 + 3 − 5
= somar.
3.000
10
= dividir.
3.000
= 0, 0033 ×100 multiplicar.
= 0,33%.
22
que aumenta a sobrevida do paciente e, portanto, as pessoas estão vivendo mais tem-
po com a doença.
número de casos novos deuma doença emuma população eum determinado período
2 Incidência =
númerototal de pessoas emuma população eum determinado período
Ela é expressa pelo número de casos por 1.000 a 100.000 habitantes, dependendo da
frequência do evento. Para chegar no número final da incidência por 1.000 habitantes
é necessário multiplicar por 1.000 o resultado da divisão da fórmula. A decisão se o
indicador será expresso em 1.000 ou 100.000 habitantes tem como objetivo deixar o
número de fácil compreensão. Normalmente, em uma análise de populações de cida-
des, estados e países usamos a cada 100.000 pessoas. Todo indivíduo que está no
denominador pode ser um caso e, também, participar do numerador.
Esse indicador é o único que pode avaliar risco de se ter a doença. Portanto, ele é
capaz de medir o impacto e a magnitude da doença na população, sendo usada para
avaliar relações causais entre as variáveis.
EXEMPLO 6
Cálculo de incidência
1) Em uma cidade fictícia “X” com 3.000 habitantes, em 1 de janeiro de 2019, havia 12 pesso-
as em tratamento por Hanseníase. No mês de janeiro foram diagnosticados mais 3 casos, até
31 de junho de 2019 houve 5 altas por cura no mês de maio e não houve mais casos novos.
Parta do princípio de que todo caso da doença está em tratamento. Qual é a incidência de
hanseníase na cidade “X” no primeiro semestre do mesmo ano?
3
= dividir.
3.000
= 0, 001×1.000 multiplicar.
= 1.
Epidemiologia 23
Epidemiologia descritiva
A incidência de hanseníase no primeiro semestre de 2019 é de 1 caso novo para cada 1.000
habitantes.
substituir a fórmula.
37.308
×100.000 dividir e multiplicar.
210.661.032
= 17, 71.
No Brasil, a incidência de AIDS em 2019 é de 17,71 casos novos para cada 100.000 habitantes.
24
EXEMPLO 7
Se descobrirmos um novo método diagnóstico que é mais sensível a doença, a incidência au-
mentará devido ao aumento do número de casos novos, assim como a prevalência. Na lógica
1
do esquema da Figura acima, o novo diagnóstico abrirá ainda mais a torneira e, portanto, a
pia ficará cheia de água, já que o ralo continua do mesmo tamanho.
CONCLUSÃO
A Epidemiologia traz ferramentas que nos ajudam a realizar corretamente uma pesqui-
sa e nos ajuda a avaliar a qualidade de um estudo. Para garantir uma boa pesquisa é
preciso garantir:
` escolha adequada das variáveis a serem coletadas, para que seja coerente em
atingir os objetivos propostos;
Quanto aos estudos descritivos, sua principal característica é que ele tem só um mo-
mento de coleta de dados, não fazendo acompanhamento das pessoas ao longo do
tempo. Sua principal função é descrever as doenças ou eventos de saúde, podendo
ser uma análise de distribuição ao longo do tempo, por características das pessoas ou
por locais. Ele é usado como instrumento na gestão de serviços e sistemas e ajuda a
levantar hipóteses de possíveis relações causais.
Epidemiologia 25
Epidemiologia descritiva
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BELL, J. Projeto de Pesquisa: guia para pesquisadores iniciantes em educação, saúde e ciências sociais. 4.
ed. Porto Alegre: Artmed, 2008.
1
BRASIL. Ministério da Saúde. Panorama da tuberculose no Brasil: indicadores epidemiológicos e ope-
racionais. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
panorama%20tuberculose%20brasil_2014.pdf Acesso em: 30 nov. 2023
FLETCHER, R. H.; FLETCHER, S. W.; FLETCHER, G. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. 5. ed.
Porto Alegre: ArtMed, 2014.
PASQUALI, L. Psicometria. Revista da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 43, especial, p. 992-
999, 2009. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342009000500002. Acesso em: 23 fev. 2021.
ROUQUAYROL, M. Z.; GURGEL, M. Rouquayrol: epidemiologia e saúde. 8. ed. Rio de Janeiro: Medbook,
2018.
26
Epidemiologia
27
1
INDICADORES DE SAÚDE
2
INTRODUÇÃO
É comum comparar a condição de vida de um país, estado ou município. Pode-se usar vários
critérios e informações para definir qual é a melhor cidade brasileira para se morar, como
qualidade do ar, mobilidade urbana, custo de vida ou qualidade de saúde da população.
Para avaliar as condições de saúde da população usa-se indicadores de saúde. Na unidade
1 deste material vimos incidência e prevalência que são indicadores de medem riscos e
magnitude das doenças ou situações de saúde. As informações abordadas nessa unidade
ajudarão você a entender como as informações foram obtidas para responder às seguintes
perguntas: como saber qual o impacto que as doenças têm na saúde e na expectativa
de vida da população? Quantas pessoas morrem por essa doença? Do que as pessoas
morrem? Qual é a principal causa de morte do estado de São Paulo e do município de
Curitiba? Ao longo do tempo, as causas de morte e a expectativa de vida mudaram?
Desse modo, um indicador de saúde para ser satisfatório, ele deve ser acessível para a
população, de fácil compreensão, capaz de sintetizar as condições de saúde comparadas
as outras realidades, capaz de propor ações de saúde adequadas a partir do acesso aos
dados. Por isso, no mundo inteiro, os indicadores são calculados da mesma maneira, a
partir de regras e consensos internacionais da Organização Mundial da Saúde (OMS).
28
A estratégia tradicional e mais antiga utilizada para avaliar a qualidade de vida da popu-
lação é a análise dos óbitos. A análise estatística das mortes começou no século XVII,
na Inglaterra, quando John Graunt tabulou as principais causas de morte a partir dos
registros de igrejas (Laurenti, 1991, p. 408-410). Nos séculos seguintes, a contagem e 2
a análise dos dados foram se aprimorando até que outros eventos, como nascimento e
doenças transmissíveis, foram incluídos. Assim, a análise dos óbitos e de nascimento é
denominada de estatística vital.
EXEMPLO 1
O coeficiente de mortalidade geral é 0,007 e a taxa de mortalidade é de 7 óbitos por 1.000 ha-
bitantes. As taxas têm fácil compreensão e, por isso, elas são mais usadas. Para calculá-las,
na maioria das vezes, é só multiplicar o coeficiente por 1.000 ou 100.000.
Fórmula da letalidade:
EXEMPLO 2
Em 2019, o Brasil tinha uma população total de 210.659.013 habitantes. Nesse período, o
país apresentou o total de 1.349.802 óbitos, entre eles, 1.434 pessoas tinham como causa
básica a meningite. Em 2019, foram diagnosticados 16.159 casos da doença. Qual é a letali-
dade de meningite em 2019, no Brasil?
Epidemiologia 29
Indicadores de saúde
Letalidade
1.434
Letalidade
= ×100 realizar a divisão e a multiplicação.
16.159
Letalidade = 8,87.
Em 2019, a letalidade no Brasil para meningite é de 8,87%, ou seja, 9% dos casos da doença
irão a óbito.
A taxa de fecundidade total indica o número médio de filhos que uma mulher tem no
seu período reprodutivo (de 15 a 49 anos). Essa taxa é utilizada, principalmente, para
avaliar o crescimento populacional, indicando a possibilidade de reposição populacional,
em que a fecundidade menor do que 2,1 indica uma reposição populacional insuficiente.
As condições sociais e econômicas podem influenciar no aumento ou na redução da taxa.
A taxa específica de fecundidade indica a média do número de filhos que uma mulher
tem em uma determinada faixa etária. A fórmula é o número de nascidos vivos de mu-
lheres com uma faixa de idade específica dividindo pela população total feminina da
faixa etária. Normalmente, essa análise é observada a cada cinco anos, por exemplo,
fecundidade de mulheres 15 a 19 anos, 20 a 24 e assim sucessivamente até a faixa 45
a 49 anos. Podem ser expressas a cada 1.000 mulheres de determinada faixa etária.
Para isso se multiplica o resultado por 1.000.
número de nascidos vivos de mães de determinada faixa etária residentes em um determinado período e local
3 Fecundidade específica =
população total feminina de determinada faixa etária residente em um determinado período e local
30
O cálculo da taxa de fecundidade total é feito primeiramente somando as taxas especí-
ficas de fecundidade de períodos idade (15 a 19, 20 a 24, 25 a 29, 30 a 34, 35 a 39, 40
a 44 e 45 a 49 anos) de mulheres residentes em determinado local. Os valores a serem
somados são o resultado da divisão antes de multiplicar por 1.000. Depois da soma se 2
multiplica o valor por 5 já que a faixa etária das fecundidades específicas é de cinco anos.
EXEMPLO 3
Natalidade e fecundidade específica e total
Em 2019, o Brasil tinha uma população total de 210.659.013 habitantes, em que 57.055.184
pessoas eram mulheres de 15 a 49 anos. Nesse ano, o país teve 2.849.146 nascidos vivos.
Tabela 01. Distribuição de nascidos vivos por faixa etária materna e população feminina
residente no Brasil em 2019 conforme faixa etária
Nesse contexto, quais são as taxas brutas de natalidade e taxas de fecundidade específicas
e total em 2019 no Brasil?
Taxa de bruta de natalidade:
2.849.146
Natalidade
= ×1.000 realizar a divisão e a multiplicação.
210.659.013
Natalidade = 13,52.
No Brasil, a taxa de bruta de natalidade em 2019 é de 13,52 nascidos vivos a cada 1.000 habitantes.
Epidemiologia 31
Indicadores de saúde
399.922
TFE 15 a 19 = realizar a divisão
8.338.727
TFE 15 a 19 anos = 0,0480
= 0,3348 × 5
Fecundidade
realizar a multiplicação
Fecundidade = 1, 67
Em 2019, a taxa de fecundidade total no Brasil é de 1,67 nascidos vivos a cada mulheres de
15 a 49 anos, sendo que a faixa etária de mulher que mais tem filho é a de 20 a 24 anos.
32
Por fim, a esperança (ou expectativa) de vida ao nascer é o número médio de anos
que a pessoa vive, conforme o ano de nascimento. Esse indicador é muito utilizado para
avaliar e comparar a saúde de um país, nesse sentido, seu valor é utilizado na cons-
trução do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Contudo, embora a expectativa 2
de vida ao nascer no Brasil seja maior do que 75 anos, isso não significa que todas as
pessoas viverão, em média, até os 75 anos. A estatística serve para estimar o tempo de
vida das crianças nascidas naquele ano, logo, para saber qual é sua esperança de vida
Fonte: 123RF.
Com isso, é possível comparar a esperança de vida para faixas etárias. Por exemplo, em
2015, quem tem 10 anos e quem tem 65 anos tem expectativas de vidas diferentes. As-
sim, à medida que se envelhece, a expectativa de vida aumenta. Então, uma pessoa com
10 anos naquele ano terá uma expectativa de vida maior do que 65 anos, uma vez que
já sobreviveu e superou a mortalidade esperada para a mortalidade infantil, por exemplo.
Dessa forma, estimar o tempo de vida não é suficiente, pois não se avalia a qualidade da
vida. Por isso, uma iniciativa internacional que o Brasil participa começou a avaliar o peso
das doenças na longevidade da população. Os estudos da Carga Global de Doenças (em
inglês GBD – Global Disease Burden) tiveram início no final dos anos 1990. Eles desen-
volveram ou difundiram os indicadores: anos potenciais de vida perdidos (em inglês YLL
– years life lost), anos de vida saudáveis perdidos (em inglês DALY – disability adjusted
life years) e expectativa de vida saudável (em inglês HALE – healty life expectancy).
O YLL avalia o impacto que a doença pode ter na vida da pessoa a partir de quantos
anos de vida foram perdidos pela morte precoce. O DALY avalia qual o tempo que a
pessoa viveu com alguma deficiência em decorrência de uma doença, aferindo o impac-
to da doença no sobrevivente. Já o HALE avalia a expectativa de vida antes de desen-
volver uma doença ou condição grave incapacitante, sendo muito útil para avaliar se o
aumento da esperança de vida está associado com mais tempo de vida saudável ou se
esse tempo a mais será com um baixo nível de saúde e qualidade de vida.
Epidemiologia 33
Indicadores de saúde
3. INDICADORES DE MORTALIDADE
A análise das causas de morte é um indicador de saúde. Essa é uma referência para
2 saber quais doenças mais acometem a população ao ponto de levar as pessoas a óbito.
As informações são obtidas na declaração de óbito, que se trata de um documento igual
em todo o país e segue um padrão internacional de descrever as causas da morte, a fim
de possibilitar uma comparação entre países.
A principal análise da mortalidade considera apenas uma única causa. Desse modo,
considere que uma pessoa que tinha câncer de mama há seis anos, com metástase
hepática há dois anos, e que teve insuficiência hepática seguida de falência múltipla dos
órgãos, que a levou ao óbito. Qual dessas doenças seria o mais adequado para entrar
na estatística? A causa que irá para a análise de mortalidade é a causa básica de morte,
ou seja, a doença ou evento que iniciou a cadeia de eventos que levou a óbito. Portanto,
nesse caso descrito, seria o câncer de mama.
Por causa desse raciocínio, algumas doenças podem apresentar uma baixa taxa de morta-
lidade, mesmo sendo frequentemente citadas nos atestados de óbito, como a diabetes e a
hipertensão arterial sistêmica. Essas doenças são muito prevalentes na população adulta,
no entanto, raramente são definidas como a causa básica nos atestados de óbito. Logo, há
prejuízo na identificação do impacto dessas doenças na mortalidade da população.
A taxa de mortalidade geral é o principal indicador, pois, ela resume qual a proporção
de pessoas que morrem em um determinado período e local. Esse indicador é expresso
por 1.000 habitantes e essa taxa é utilizada para avaliar a condição geral de saúde.
34
Além da mortalidade geral, é possível calcular por grupos específicos de causas ou de
idades. Para indicadores de causa, pode-se avaliar apenas uma causa ou um grupo.
Tradicionalmente, as causas são agrupadas por capítulos ou agrupamentos previamen-
te previstos pela CID-10. 2
A taxa de mortalidade específica por causa calcula a proporção de óbitos por uma
causa ou o grupo de causas específicas na população. Esse indicador, por sua vez, é
EXEMPLO 4
A taxa de mortalidade específica por neoplasias malignas expressa a proporção de pessoas, de
um determinado período e local, que tiveram como causa básica de morte uma neoplasia maligna.
número de óbitos por uma ou um grupo de causa de residentes emum determinadolocal e período
6 TM específica ×100.000
populaçãototal residente emum determinadolocal e período
Essa taxa mede a intensidade e magnitude da doença. Ela é uma incidência de morte
e, portanto, avalia risco de a população ir a óbito por uma causa, podendo ser utiliza-
do para ajudar na avaliação das condições de saúde e de planejamento do sistema e
serviços.
Já a mortalidade proporcional por causa calcula a proporção de óbitos por uma cau-
sa ou o grupo de causas específicas entre todos os óbitos. Por exemplo, mortalidade
proporcional por doenças cardiovasculares expressa a proporção dos óbitos de um de-
terminado período e local que tiveram como causa básica uma doença cardiovascular,
sendo expressa por porcentagem de óbitos. Nesse indicador, observe que o denomina-
dor é o número total de óbitos.
número de óbitos por uma ou um grupo de causa de residentes emum determinadolocal e período
7 M proporcional
númerototal de óbitos de residentes emum determinadolocal e período
×100
Uma mortalidade proporcional baixa não significa, necessariamente, que exista um bai-
xo risco de óbito por uma causa específica. Nesse contexto, pode ser que a mortalidade
proporcional esteja baixa porque, naquele período, houve um aumento de outros casos.
Já a taxa de mortalidade específica não é influenciada pelas outras causas. Na Figura
Epidemiologia 35
Indicadores de saúde
(A) por 100.000 habitantes e a mortalidade proporcional (B) por capítulos da CID-10 no Brasil,
Amazonas e São Paulo em 2019. Cap. II: neoplasmas [tumores]; cap. IV: doenças endócrinas,
nutricionais e metabólicas; cap. IX: doenças do aparelho circulatório; cap. X: doenças do aparelho
respiratório; cap. XVIII: sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos e de laboratório,
não classificados em outra parte; e cap. XX: causas externas de morbidade e de mortalidade.
36
EXEMPLO 5
TMG, TM específica e mortalidade proporcional
2
Em 2019, o Brasil tinha uma população total de 210.659.013 habitantes. Nesse período, o
país apresentou 1.349.802 óbitos totais, em que 364.132 desses óbitos ocorreram devido às
doenças do aparelho circulatório e 235.301 por neoplasias. Quais são as taxas de mortalida-
númerototal de óbitos
TMG ×1.000 substituir os valores.
populaçãototal
1.349.802
=TMG ×1.000 dividir e multiplicar.
210.659.013
TMG = 6, 41 .
Logo, a taxa de mortalidade geral no Brasil em 2019 é de 6,41 mortes a cada 1.000 habitantes.
Taxa de mortalidade específica por neoplasia:
235.301
TM esp
= ×100.000 dividir e multiplicar.
210.659.013
TM esp =111, 70.
A taxa de mortalidade específica por neoplasia no Brasil em 2019 é de 111,7 mortes a cada
100.000 habitantes.
Mortalidade proporcional por doenças do aparelho circulatório:
364.132
M prop
= ×100 dividir e multiplicar.
1.349.802
M prop = 26,98% .
Por fim, a mortalidade proporcional por doenças do aparelho circulatório no Brasil em 2019 é de
26,98%. Ou seja, 26,98% dos óbitos têm como causa básica uma doença do aparelho circulatório.
Fonte: DATASUS ([s. d., n. p.]).
Epidemiologia 37
Indicadores de saúde
A mortalidade proporcional por faixa etária consegue indicar o nível de saúde da população,
a qualidade dos serviços e o grau de desenvolvimento do local. Os dois indicadores mais
comuns são a Razão de Mortalidade Proporcional e a curva de Mortalidade Proporcional.
2
CURIOSIDADE
A curva de Mortalidade Proporcional é também chamada de curva de Nelson de Moraes, au-
tor da classificação de quatro tipos de curvas relacionadas ao nível de saúde da população,
descrita em 1959.
A Figura 4 apresenta a representação gráfica dos quatro tipos de curvas (A) e a curva
do Brasil, Amazonas e São Paulo em 2019.
Fonte: (A) Rouquayrol e Gurgel (2018, p. 54) e (B) DATASUS ([s. d., n. p.]).
(A) Representação dos quatro tipos de níveis de saúde diferentes descrito por Nelson de
Moraes. (B) Informações do Brasil, Amazonas e São Paulo em 2019.
38
A Razão de Mortalidade Proporcional, ou o Índice de Swaroop & Uemura, se trata da
proporção de óbitos que ocorreram em pessoas com 50 anos ou mais em um determi-
nado período e local. Ela é expressa em porcentagem.
2
Fórmula da razão de mortalidade proporcional:
Nesse indicador, criado em 1955, quanto maior seu valor, melhores as condições de saúde
do local, pois, espera-se que a grande maioria dos óbitos ocorram em pessoas com mais de
50 anos de idade. Com isso, ele é utilizado para avaliar as condições de países.
Para ajudar a interpretá-lo, criaram-se quatro grupos: índice de 75% ou mais, em que se
considera o país desenvolvido; índice de 50 a 74%, país com certo desenvolvimento eco-
nômico e bom serviços de saúde; índice de 25 a 49%, país com atraso econômico e social;
por fim, índice inferior a 25%, considera-se o país com alto grau de subdesenvolvimento.
EXEMPLO 6
Razão de mortalidade proporcional:
O Brasil, em 2019, tinha uma população total de 210.659.013 habitantes. Nesse período,
o país apresentou 1.349.802 óbitos totais, em que 1.084.425 desses óbitos ocorreram em
pessoas com 50 anos ou mais.
1.084.435
= ×100 dividir e multiplicar.
1.349.802
= 80,34% .
No Brasil, a razão de mortalidade em 2019 foi de 80,34%, no estado de São Paulo foi de
84,28% e no Estado de Amazonas de 64,35%.
Fonte: DATASUS ([s. d., n. p.]).
Além disso, outro indicador que consegue fazer uma associação com as condições de
saúde de um local é a mortalidade infantil. A taxa de mortalidade infantil é como uma
mortalidade específica para uma faixa etária, estimando o risco de morte das crianças
com menos de 1 ano (de 0 a 364 dias de vida). Para estimar esse risco, o correto seria
Epidemiologia 39
Indicadores de saúde
40
Fórmula da taxa de mortalidade pós-neonatal (TMPN):
EXEMPLO 6
Em 2019, o Brasil tinha uma população total de 210.659.013 habitantes. Nesse período, o país
apresentou 1.349.802 óbitos totais, entre eles, 35.293 ocorreram em crianças menores de 1
ano de idade, 18.402 entre crianças com 0 a 6 dias de vida, 6.102 entre 7 e 27 dias e 10.789
entre 28 e 364 dias. Nesse ano, o país teve 2.849.146 nascidos vivos. Quais as taxas de morta-
lidade infantil, neonatal, neonatal precoce, neonatal tardia e pós-neonatal, em 2019, no Brasil?
35.293
=TMI ×1.000 dividir e multiplicar.
2.849.146
TMI =12,39 .
A taxa de mortalidade infantil no Brasil em 2019 é de 12,39 mortes a cada 1.000 nascidos vivos.
Epidemiologia 41
Indicadores de saúde
24.504
TMN
= ×1.000 dividir e multiplicar.
2.849.146
TMN = 8, 60.
A taxa de mortalidade neonatal no Brasil em 2019 é de 8,6 mortes a cada 1.000 nascidos
vivos.
18, 402
TMN p
= ×1.000 dividir e multiplicar.
2.849.146
TMN p = 6, 46.
Já a taxa de mortalidade neonatal precoce no Brasil em 2019 é de 6,46 mortes a cada 1.000
nascidos vivos.
6.102
TMN t
= ×1.000 realizar a divisão e a multiplicação.
2.849.146
TMN t = 2,14.
Então, em 2019, a taxa de mortalidade neonatal tardia no Brasil foi de 2,14 mortes a cada
1.000 nascidos vivos.
42
10.789
TMPN
= ×1.000 realizar a divisão e a multiplicação.
2.849.146 2
TMPN = 3, 79.
Ao pensar nos indicadores de saúde, a taxa de fecundidade total e natalidade eram altas
naquela época, a proporção de idosos era muito baixa enquanto a de crianças era alta,
ao mesmo tempo a taxa de mortalidade infantil era alta e a principal causa de morte eram
doenças transmissíveis. As condições de vida eram precárias, as casas não tinham sane-
amento básico, pessoas moravam em cortiços e espaços pequenos e aglomerados, pas-
savam fome e o salário era baixo. Consequentemente, essas situações favoreceram as
doenças transmissíveis e mortalidade infantil por fome, desnutrição e doenças diarreicas.
Conforme o tempo passou, as condições das
Figura 06. Aumento da expectativa de vida
pessoas melhoraram, houve a criação dos
direitos trabalhistas, o investimento no sa-
neamento básico e a melhoria no acesso e
nos serviços de saúde com campanhas sani-
taristas e vacinas. Isso fez reduzir o número
de óbitos por doenças transmissíveis, a taxa
mortalidade geral e infantil. Dessa forma, a
população começou a sobreviver por mais
tempo com aumento da prevalência de do-
enças crônicas. Nesse período, as taxas de
fecundidade e natalidade ainda são altas, e
isso, associado ao aumento da expectativa de
vida, fez a população crescer. Fonte: 123RF.
Epidemiologia 43
Indicadores de saúde
No Brasil no século XXI, as mulheres estão trabalhando e não têm “tempo” para ter e cuidar
de filhos; há aumento no número de famílias com um ou nenhum filho; e com o advento da
reprodução assistida, casais com idade avançada conseguem ter filhos. A população está
em processo de envelhecimento. As crianças, fruto das altas taxas de fecundidade da dé-
cada de 1950 e 1960, estão se tornando idosos e, com o aumento da expectativa de vida,
esse grupo etário só deve aumentar de tamanho. Por outro lado, no futuro, caso a situação
se mantenha, teremos um contingente menor de adultos e crianças.
SAIBA MAIS
O artigo a seguir descreve a mudança populacional no Brasil:
Esses locais têm alta natalidade e baixa expectativa de vida, como é o caso da pirâmide
na Figura 7B. Já os países que já passaram pelo processo de transição têm o gráfico
com um desenho que se assemelha a um barril. A proporção de crianças e idosos são
similares, com alta expectativa de vida e baixa natalidade, esse desenho ocorre em lo-
cais desenvolvidos. Na Figura 7A é possível observar uma pirâmide durante a transição
demográfica, a base está reduzindo enquanto o topo está aumentando de tamanho.
44
Figura 07. Pirâmide populacional de Porto Alegre/RS (A) e Autazes/AM (B), em 2010, comparada com a
do Brasil no mesmo período
A)
2
Fonte: IBGE, [s. d., n. p.]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/panorama. Acesso em: 1 mar. 2021.
As transições acontecem em períodos diferente para cada país ou região. Logo, os mar-
cos sociais que causam a transição podem ainda não ter ocorrido. No Brasil do século
XXI, há locais com uma pirâmide populacional com desenho de pirâmide e locais que
estão mais próximos do desenho de barril.
Epidemiologia 45
Indicadores de saúde
SAIBA MAIS
2 O vídeo: Hans Rosling em crescimento populacional (título original Hans Rosling: Global
population growth, box by box), do canal TED, descreve a distribuição e características ao
longo dos anos da população mundial e quais são os futuros desafios que teremos no futuro.
CONCLUSÃO
Os indicadores de saúde populacionais são ferramentas importantes para a gestão dos
sistemas e serviços de saúde. É a partir dessas informações que é possível avaliar se
uma intervenção de saúde foi bem-sucedida. Por exemplo, é possível mostrar que as
ações do outubro rosa são eficazes porque houve uma redução da mortalidade de cân-
cer de mama depois que elas foram implementadas.
Para os gestores, saber as causas e proporções de morte ajuda a estruturar quais de-
vem ser as doenças que devem ter prioridade para criar e aplicar ações de prevenção.
É função da gestão do sistema rotineiramente fazer uma análise dos indicadores de
saúde para poder nortear suas ações.
46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Panorama da tuberculose no Brasil: indicadores epidemiológicos e operacio-
nais. Brasília: Ministério da Saúde, 2014.
2
DEPARTAMENTO DE INFORMÁTICA DA FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE DO SUS (DATASUS). Ta-
bnet [internet], Disponível em: https://datasus.saude.gov.br/informacoes-de-saude-tabnet/. Acesso em: 25
LAURENTI, R. Análise da informação em saúde: 1893 – 1993, cem anos da Classificação Internacional de
Doenças. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 25, n. 6, p. 407-417, 1991. Disponível em: https://www.scie-
losp.org/pdf/rsp/1991.v25n6/407-417. Acesso em: 15 mar. 2021.
REDE INTERAGENCIAL DE INFORMAÇÃO PARA A SAÚDE (RIPSA). Indicadores básicos para a saúde
no Brasil: conceitos e aplicações. 2. ed. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2008. Disponível
em: http://www.ripsa.org.br/2014/10/30/indicadores-basicos-para-a-saude-no-brasil-conceitos-e-aplicacoes-
-livro-2a-edicao-2008-2/. Acesso em: 3 mar. 2021.
ROUQUAYROL, M. Z.; GURGEL, M. Rouquayrol: epidemiologia e saúde. 8. ed. Rio de Janeiro: Medbook,
2018.
Epidemiologia 47
Epidemiologia analítica UNIDADE 3
EPIDEMIOLOGIA ANALÍTICA
3
INTRODUÇÃO
Como são definidos quais são os fatores de risco para uma doença ou, ainda, quais
são os fatores que significam uma melhor evolução do quadro clínico do indivíduo?
Consumir bebida alcóolica durante a gestação faz mal para a criança? Qual é a chance
de uma pessoa infartar se for hipertensa? Como são avaliadas a eficácia de um trata-
mento? Vacina funciona?
Essa unidade abordará os tipos de estudos que conseguem responder a essas pergun-
tas e como calcular e interpretar as análises estatísticas que medem a intensidade da
associação entre diversas variáveis. Para tanto, serão abordados estudos analíticos e
longitudinais, o que significa que é possível provar associações e causalidade entre as
variáveis e que a coleta de dados acontece em mais de um momento.
Esses tipos de estudo conseguem medir a associação entre variáveis e riscos ou chan-
ces de um evento acontecer. Para ajudar a distinguir os desenhos do estudo é impor-
tante definir quais são as variáveis pesquisadas, como elas foram coletadas e como os
grupos comparados foram divididos.
GLOSSÁRIO
Variáveis independentes são fatores estudados que podem estar associados com a variável
dependente. Trata-se das causas presumíveis ou possíveis fatores de risco, em que pode ser
chamada de exposição, já que é a exposição ao fator de risco pode causar alguma doença
(Rouquaryol; Gurgel, 2018, p. 705). Por exemplo: fumar, bebida alcóolica e aleitamento materno.
Já a variável dependente é o efeito presumível da variável independente. Ela pode ser cha-
mada de desfecho ou variável de interesse. (Rouquaryol; Gurgel, 2018, p. 705). Além disso,
normalmente, ela é dicotômica, ou seja, só tem duas possibilidades de resposta, como ter ou
não ter uma doença. Por exemplo: câncer de pulmão, incapacidade e óbito.
1. ESTUDO COORTE
Entre os estudos observacionais, o estudo do tipo coorte é o que melhor consegue
avaliar o risco. Isso se deve porque, no início da pesquisa, todos os sujeitos não têm o
48
desfecho, sendo assim possível avaliar quantos casos novos aparecerão. Esse estudo
compara dois grupos, um que tem exposição ao fator de risco a ser estudado e outro
grupo que não é exposto. Os sujeitos, por sua vez, são acompanhados ao longo do
tempo para contar o surgimento do desfecho (Rouquaryol; Gurgel, 2018, p. 123-125). 3
O desenho desse tipo de estudo (Figura 1) iniciará pela exposição e, após uma quanti-
dade determinada de tempo, o desfecho é aferido. Desse modo, uma característica que
diferencia o estudo de coorte de outros estudos longitudinais é a pesquisa dividindo os
EXEMPLO
Epidemiologia 49
Epidemiologia analítica
quais consequências essa exposição pode gerar. Nesse sentido, alguns estudos acom-
panham um grupo de pessoas ao longo de vários anos para avaliar a morbidade de uma
exposição ou a associação entre ela e um desfecho.
3
CURIOSIDADE
Um marco nos estudos epidemiológicos é o estudo de Doll e Hill com o acompanhamento dos
médicos britânicos, em que essa coorte conseguiu provar as complicações causadas pelo
fumo. O artigo indicado a seguir resume a trajetória da pesquisa citada e seus resultados.
DI CICCO, M. E.; RAGAZZO, V.; JACINTO, T. Mortality in relation to smoking: the British Doc-
tors Study. Breathe (Sheff), [s. l.], v. 12, n. 3, p. 275-276, set. 2016. Disponível em: https://
www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5298160/. Acesso em: 10 abr. 2021.
Por ser um estudo observacional, a decisão de que sujeitos serão expostos às variáveis
independentes não é do pesquisador.
EXEMPLO 1
Uma pesquisa acompanha quem fuma ou não, o pesquisador não influencia na decisão de
qual participante deverá fumar. Ou, então, uma pesquisa acompanhar os pacientes interna-
dos que tiveram abordagens terapêuticas diferentes para avaliar a cura de uma doença, con-
forme a abordagem terapêutica. Nesse último caso, a variável independente é a abordagem
terapêutica e o desfecho é a proporção de cura da doença. Para alguns tipos de exposição,
esse é o melhor desenho de pesquisa, pois, não é possível fazer estudo experimental.
De acordo com a ética, um pesquisador não pode oferecer a gestantes bebidas alcoólicas,
em razão do risco que isso pode causar à criança. No entanto, ele pode observar quais são
os efeitos encontrados em gestantes que consumiram a bebida.
50
que coleta todas as informações, mostra uma associação entre ser sedentária e ter
depressão. Para definir se de fato uma variável é fator de risco para outra é preciso
um estudo longitudinal de coorte que garanta a ausência de depressão no começo do
acompanhamento dos sedentários e daqueles que praticam atividades físicas. Nesse 3
caso, no acompanhamento se avalia quantas pessoas apresentaram depressão.
As vantagens da coorte retrospectiva são de que é possível ter um alto número de su-
jeito de pesquisa e ela são de curta duração. Isso ocorre porque, como os fatos estão
no passado, não há necessidade de ficar esperando o evento acontecer desde o início
da exposição. Em contrapartida, a grande desvantagem é de que, ao utilizar registros
e informações de prontuário, não é possível garantir a qualidade dos dados e como as
informações foram coletadas. Isto é, quando os dados são coletados em prontuários
que não se pode garantir a qualidade da informação, a pesquisa apresenta um viés de
registro de informação.
A perda de segmento é uma desvantagem de qualquer tipo de estudo, mas é mais fre-
quente em estudos longos, como a coorte prospectiva. A perda do acompanhamento
do sujeito da pesquisa pode ter várias causas, como migração, aderência, desistência e
outro desfecho que inviabilize a continuidade na pesquisa. Isso pode gerar impacto na
análise estatística e resultado.
Desse modo, a primeira informação a se avaliar é a proporção da perda, se ela for maior
do que 10% do número total da amostra da pesquisa, a qualidade dos resultados é
questionável; mas, se ela for maior do que 30%, a validade interna fica prejudicada. Em
seguida, é necessário avaliar as causas e se os grupos se mantêm comparáveis ou se
as pessoas que saíram tinham características diferentes.
Epidemiologia 51
Epidemiologia analítica
EXEMPLO 2
Uma pesquisa para avaliar se consumir bebida alcoólica na gestação faz mal para a crian-
3
ça, na qual 100 mulheres foram acompanhadas em dois grupos. Ao longo do segmento, 20
mulheres desistiram de participar ou mudaram de endereço, entre as desistentes, 18 eram
usuárias de bebida alcoólica e tinham menos de 20 anos. Com a perda do segmento, o grupo
de expostos apresenta características e tamanho diferentes do grupo de não expostas.
Na pesquisa, qualquer pessoa que não saiba dizer a qual grupo o participante pertence, se
ele faz parte do grupo controle, intervenção, caso, exposto ou não exposto, é considerada
“cego”. O problema de não ter o participante “cego” é que ele pode mudar o seu comporta-
mento, o que poderá influenciar na avaliação. Dessa forma, apesar de continuar ingerindo
bebida alcoólica enquanto grávida, a mulher pode começar a comer de forma mais saudável
para garantir que o filho não tenha problemas. Assim, o resultado da pesquisa pode não re-
presentar a realidade. No caso da coorte, o voluntário sabe qual é o objetivo da pesquisa e,
portanto, sabe se ele está no grupo exposto ou não. O ideal é que todo sujeito de qualquer
pesquisa seja cego, contudo, no estudo coorte, dificilmente o sujeito da pesquisa é “cego”.
Esse tipo de estudo não é adequado para avaliar doenças de baixa prevalência. Como
a frequência do evento é baixa, é necessário ter uma amostra muito grande para conse-
guir poucos desfechos, o que, consequentemente, aumentaria o custo sem ter a certeza
de que a quantidade de desfecho seria adequada para análise. Para doenças que tem
um longo período de latência, esse desenho também não é adequado.
` Calcular incidência;
Como em toda pesquisa, é possível que erros sistêmicos ocorram e que enfraqueçam
a validade do resultado. Assim, o viés de amostragem pode acontecer se o grupo
exposto e o grupo não exposto tiverem características diferentes. Isto é, é preciso que
eles sejam similares com exceção pela exposição ou, ainda, pode acontecer quando os
participantes não representam todos as situações de exposição.
PARA REFLETIR
Tendo em mente o exposto até aqui, reflita: será que a pesquisa sobre fumo tem uma amostra
que abrange todos os tipos de exposição? Têm pessoas que fumam desde 1 a mais de 40
cigarros por dia, que fumam cigarro de palha ou elétrico, ou ainda têm pessoas de todos os
sexos e idades?
52
O viés de migração ocorre nos casos de perda de segmento quando os grupos ficam
diferentes do que que eram no início da pesquisa e já não são mais comparáveis. Por
isso, no planejamento do estudo é importante programar estratégias que diminuam as
perdas, como ligações telefônicas para manter contato com os participantes. Ele ocorre 3
com mais frequência na coorte prospectiva.
O viés de aferição, por sua vez, pode acontecer sempre, mas ocorre com mais frequ-
As análises estatísticas principais para esse estudo são: o risco relativo e o risco atribu-
ível, além da incidência. Com elas, é possível avaliar o impacto que se exposto tem o
risco de desenvolver o desfecho.
SAIBA MAIS
O Framingham Heart Study, é um famoso estudo coorte norte-americano que investiga fatores
de risco para doenças cardiovasculares. Para saber mais, leia o artigo, disponível a seguir:
TSAO, C. W.; VASA, R. S. Cohort profile: the framingham heart study (FHS): overview of
milestones in cardiovascular epidemiology. International Journal Epidemiology, [s. l.], v.
44, n. 3, p. 1800-1813, dez. 2015. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/
PMC5156338/. Acesso em: 10 abr. 2021.
2. ESTUDO DE PROGNÓSTICO
O estudo de prognóstico prediz quais são os resultados possíveis de um evento. Por
exemplo, o prognóstico de quem sofre um acidente de carro é 45% de chance da pes-
soa sair ilesa, 25% de sair com alguma lesão que será curada, 15% de ficar com algu-
ma sequela e 15% de ir a óbito em um mês do acidente.
Epidemiologia 53
Epidemiologia analítica
DESENHO
EXEMPLO
Essas pesquisas comparam como alguns fatores influenciam na história natural da do-
ença. Por exemplo, iniciar o tratamento nas primeiras seis horas de um Acidente Vas-
cular Cerebral (AVC) altera a história natural da doença com aumento da sobrevida e
redução das sequelas.
54
EXEMPLO 3
Um novo método tomográfico consegue identificar tumores menores e faz com que o que
antes seria uma classificação grau II, agora seja grau III. Por sua vez, esse processo se 3
chama migração de estágio e altera a análise estatística de cada fator prognóstico. Assim, as
probabilidades de sobrevida de cada fator prognóstico aumentam (Fletcher, R. H.; Fletcher,
Esse estudo é similar ao coorte, no entanto, uma diferença é que, no prognóstico, todos
os indivíduos têm a doença. A coorte investiga fatores de risco que podem causar uma
doença, já o prognóstico investiga fatores que alteram a evolução da doença. Ainda,
no primeiro estudo, o principal desfecho é desenvolver uma doença, já no segundo, o
desfecho é avaliar as complicações da doença que são muito mais frequentes. Além
disso, na coorte, os vieses que mais frequentemente acontecem são de amostragem,
migração e aferição.
A análise estatística principal para esse estudo é a análise de sobrevida que calcula as
probabilidades dos desfechos acontecerem a partir dos grupos de fatores prognósticos.
Para doenças com estigmas associados é comum o paciente perguntar para algum
profissional de saúde qual é o seu prognóstico. Nesse contexto, a oncologia tem grande
quantidade de estudos para avaliar as associações de diversos fatores para dar uma
resposta correta ao paciente e familiares. Contudo, é importante ressaltar que o prog-
nóstico é uma probabilidade e isso não necessariamente acontecerá.
EXEMPLO 4
O artigo a seguir é um estudo de sobrevida que avalia quais são os possíveis fatores prognósticos.
3. ESTUDO CASO-CONTROLE
O estudo de caso-controle é, também, observacional e longitudinal. A diferença com o
estudo coorte é o modo em os grupos de comparação são divididos. Na coorte se com-
para os grupos a partir da presença ou ausência de exposição. Já no caso-controle, os
grupos são presença ou ausência da variável dependente, ou seja, do desfecho.
Epidemiologia 55
Epidemiologia analítica
EXEMPLO
Fumantes
pessoas com câncer
de pulmão
Não Fumantes
Fumantes
pessoas sem câncer
de pulmão
Não Fumantes
56
A definição do controle deve ser alguém da mesma população do caso e que poderia
se tornar um se ficasse doente. Os controles podem ser outras pessoas internadas no
mesmo hospital, mas com outro diagnóstico ou, ainda, pessoas próximas da residência
do caso ou parentes. 3
EXEMPLO 5
O estudo caso-controle é comum por ser rápido e prático de realizar. Além de permitir explorar
múltiplas exposições para uma mesma doença e de não precisar de muitos indivíduos para
provar associações. Apesar de parecer prático e simples, ao fazer uma pesquisa rápida, de-
ve-se ter cuidado para que a qualidade não seja prejudicada por apresentar diversos vieses.
A análise estatística principal para esse estudo é a razão de chances ou, em inglês, odds
ratio (OR). Com ela é possível estimar o risco que a exposição desenvolva o desfecho.
Epidemiologia 57
Epidemiologia analítica
EXEMPLO 6
Para um exemplo de Estudo caso-controle e sua aplicação, leia:
3
GAMBA, M. A. et al. Amputações de extremidades inferiores por diabetes melli-
tus: estudo caso-controle. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 38, n. 3, p. 399-
404, jun. 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0034-89102004000300010&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 10 abr. 2021.
4. TABELA DE CONTINGÊNCIA
Entre duas variáveis podem acontecer comparações, sendo uma variável independente
e outra dependente, ou entre múltiplas variáveis, em que várias variáveis são indepen-
dentes e uma é dependente. Geralmente, as variáveis independentes são as exposi-
ções ou fatores, e a variável dependente é o desfecho, que pode ser desde deficiência,
complicação, morte ou doença.
Para a análise entre duas variáveis é comum organizar os dados em uma tabela de con-
tingência 2 x 2 (Figura 4). Nessa tabela, nas linhas estão descritas as possibilidades da
variável independente e nas colunas as da variável dependente. Como de preferência a
exposição e o desfecho são dicotômicos (presentes ou ausentes), a tabela fica com duas
linhas e duas colunas, por isso, ela tem esse nome. As casas da tabela são nomeadas
como “a”, “b”, “c” e “d” para depois facilitar as fórmulas das medidas de associações.
58
A Figura 4 exemplifica uma pesquisa para avaliar a associação entre fumo e câncer de
pulmão. Nesse caso, primeiramente, deve-se definir que o fumo é a variável indepen-
dente e o câncer de pulmão a variável dependente. Então, pode-se designar que a =
67, b = 9, c = 5 e d = 114 e que os valores totais foram obtidos por uma soma simples. 3
É interessante observar que independentemente do tipo de estudo, se é transversal,
caso-controle ou coorte, a tabela é montada da mesma maneira.
Em uma pesquisa para avaliar a associação do sexo com a chance de ter depressão, no
início do acompanhamento, nenhum dos participantes eram depressivos. Contudo, depois de
10 anos, das 452 mulheres 79 foram diagnosticadas com depressão, enquanto 39 homens
foram diagnosticados do total de 908 participantes do sexo masculino.
Tabela 2 x 2
Para montar a tabela, deve-se considerar que ter depressão é o desfecho e o sexo é a expo-
sição. Como desejamos saber o risco de uma mulher ter a doença, podemos definir que ser
mulher é ter a exposição.
Para calcular “b”: do total de mulheres subtraia aquelas que tiveram depressão = 452 – 79 = 373.
Para calcular “d”: do total de homens subtraia aqueles que tiveram depressão = 908 – 39 = 869.
Epidemiologia 59
Epidemiologia analítica
GLOSSÁRIO
Incidência, ou coeficiente de incidência, é a proporção que descreve o número de casos
novos de uma doença em uma determinada população. O resultado pode ser expresso em
coeficiente com os números decimais resultantes da divisão ou em taxa a cada 1.000 pesso-
as, ou qualquer outra proporção que for adequada.
número de casos novos deuma doença emuma população eum determinado período
1 Incidência =
númerototal de pessoas emuma população eum determinado período
a
Incidência do desfecho nos expostos a+b
2 RR = ou RR =
Incidência do desfecho nos não expostos c
c+d
Considere que, um estudo coorte acompanhou 195 pessoas entre fumantes e não fuman-
tes e, depois de 15 anos, avaliou quantas delas desenvolveram câncer de pulmão. A distri-
buição hipotética dos casos nos grupos está no exemplo da Figura 4. Para calcular o risco
relativo, inicialmente, é preciso calcular a incidência do desfecho nos dois grupos (expostos
e não expostos). Nessa pesquisa, a exposição é o fumo e o desfecho é o câncer. Ao fazer
o cálculo, identifica-se que incidência de câncer de pulmão em fumantes é de 0,8816 e em
não fumantes é de 0,2632. Como usaremos os valores da incidência, podemos mantê-los
na forma de coeficiente. Então, para calcular o risco relativo é preciso dividir as incidências,
na qual se obtém o resultado de 3,35. Como interpretar esse resultado?
60
Esse valor de risco relativo significa que, o risco de ter câncer de pulmão entre fumantes
é 3,35 vezes maior do que entre os não fumantes ou, ainda, pode-se dizer que fumar
está associado a um risco de 3,35 vezes maior de desenvolver câncer de pulmão.
3
EXEMPLO 8
Em uma pesquisa para avaliar a associação do sexo com a chance de ter depressão, no início do
acompanhamento, nenhum dos participantes tinham a doença. Porém, das 452 mulheres ana-
lisadas, depois de 10 anos, 79 foram diagnosticadas com depressão; enquanto apenas 39 ho-
mens foram diagnosticados com a doença em um total de 908 participantes do sexo masculino.
Risco relativo
0,1748
RR = realizar a divisão.
0, 0430
RR = 4, 07
Ou pela outra fórmula
a
RR = a + b substituir o valor.
c
c+d
Epidemiologia 61
Epidemiologia analítica
79
RR = 452 dividir no numerador e no denominador.
3 39
908
0,1748
RR = realizar a divisão.
0, 0430
RR = 4, 07
Logo, o risco relativo é de 4,07. Isso significa que as mulheres têm um risco 4,07 maior do
que os homens de desenvolver depressão.
Caso o risco relativo seja 1,0, a exposição não altera o risco de desenvolver o desfecho.
Quando o risco relativo é menor do que 1,0, pode-se dizer que a exposição é um fator
protetor, pois, a presença dela reduz o risco de ter a doença. Por exemplo, uma pesquisa
sobre aleitamento materno e infecções respiratórias na primeira infância cujo RR=0,2.
Isso significa que, aleitamento materno protege quanto a infecções respiratórias na pri-
meira infância ou que não aleitamento é um fator de risco para a doença.
Quando o risco relativo é menor do que 1,0, é possível fazer uma conta para avaliar o
quanto a exposição reduz o risco. A fórmula, simplesmente, divide 1 pelo valor do risco
1 1
=
relativo. No exemplo = = 5 , ou seja, o aleitamento materno reduz em 5 ve-
RR 0, 2
zes o risco de infecções respiratórias na primeira infância.
Assim, analisando a Figura 4, é possível que um não fumante tenha câncer de pulmão,
mesmo que o risco seja bem menor. Ao usar o risco atribuível, você avaliará o quanto
fumar acrescentou no risco de desenvolver câncer. Para ficar mais fácil de interpretar
62
o resultado é melhor transformá-lo em taxa a cada 1.000 pessoas, ou qualquer outra
proporção que se achar adequada.
EXEMPLO 9 3
Risco atribuível
Risco atribuível
RA 0,1748 − 0, 0430
= subtrair.
RA = 0,1318
Epidemiologia 63
Epidemiologia analítica
Chances, no inglês Odds, é uma medida utilizada que avalia a chance de um even-
to acontecer contra a chance de não acontecer. Essa medida é popularmente usada
em eventos esportivos e apostas. Ela se assemelha a probabilidade, com a diferença
de que o denominador na probabilidade é a totalidade de possibilidades, enquanto na
chance é a frequência do evento não acontecer. Por exemplo, qual é a chance e a pro-
babilidade e sair o número 6 no dado?
n º de eventos esperados 1
` Na probabilidade a conta é = = 0,1667.
n º de eventos possíveis 6
n º de eventos esperados 1
` Na chance a conta é = = 0, 2 .
total de eventos − n º eventos esperados 5
A razão de chances é a divisão das chances (odds) do desfecho acontecer nos dois
grupos (expostos e não expostos). Matematicamente, a fórmula pode ser simplificada
pela divisão dos produtos cruzados.
ad a × d
4 OR
= =
bd b × d
64
Para calcular a razão de chances, primeiramente, é necessário calcular a chance
de o desfecho acontecer em cada um dos grupos. Nesse caso, os grupos são: com
exposição e sem exposição.
3
a
chance nos expostos b
7 Razão
= de chances ou OR =
chance nos não expostos c
d
Uma divisão de frações pode ser solucionada multiplicando a primeira fração pelo
inverso da segunda (o numerador vira o denominador e vice-versa), como na equa-
ção a seguir:
a
a d
8 OR= b = ×
c b c
d
a×d
9 OR =
b×d
Epidemiologia 65
Epidemiologia analítica
EXEMPLO 10
Razão de chances ou OR
3
Em uma pesquisa para avaliar a associação do sexo com a chance de ter depressão, no iní-
cio do acompanhamento, nenhum dos participantes eram depressivos. No entanto, depois de
10 anos, das 452 mulheres 79 foram diagnosticadas com depressão, enquanto 39 homens
foram diagnosticados do total de 908 participantes do sexo masculino.
Razão de chances
a×d
OR = substituir os valores.
b×d
79 × 869
OR = multiplicar.
373 × 39
68.651
OR = dividir.
14.547
OR = 4,72
Logo, estima-se que ser mulher aumenta o risco de ter depressão em 4,72 vezes.
Como o risco relativo mede o risco enquanto a outra medida apenas estima, toda vez
que for um estudo de coorte e for possível, deve-se dar preferência as medidas de risco
relativo em vez da razão de chances.
66
7. ANÁLISE DE SOBREVIDA
As análises de sobrevida são gráficos que descrevem as probabilidades de o desfecho
acontecer ao longo do tempo, podendo ou não ser estratificada em grupos de fatores 3
prognósticos. Trata-se da medida mais completa dos estudos prognósticos, pois é pos-
sível avaliar a probabilidade do desfecho em cada ponto do tempo.
Epidemiologia 67
Epidemiologia analítica
SAIBA MAIS
A Teorema do Produto de Probabilidade fala que, quando se quer saber a probabilidade de
3
dois ou mais eventos acontecerem simultaneamente, é necessário multiplicar a probabilidade
de cada evento acontecer individualmente (Vieira, 2016, p. 177).
Por exemplo, acertar um número na loteria é mais fácil do que acertar três, que é mais fácil do
que acertar seis, porque quanto mais eventos entrarem na conta, menor fica a probabilidade.
A interpretação da cauda da curva deve ser feita com cuidado. Isso se deve pelo fato de
que, quando a probabilidade está baixa, o número de pessoas vivas é baixo e qualquer al-
teração terá um impacto muito maior, mas essa mudança não necessariamente representa
o que pode acontecer. Por exemplo, a probabilidade de morrer quando se tem 1 morte:
No entanto, continua sendo uma única morte, mas dependendo da amostra ela tem
um impacto muito maior na estatística. Por isso, no final da curva, em que o número de
pessoas é baixo, é importante utilizar a probabilidade com cautela.
Essa é a análise estatística principal dos estudos de prognósticos. Por ser comum o
paciente perguntar para algum profissional de saúde qual é o seu prognóstico, deve-se
refletir o que isso significa para o indivíduo e seus familiares. Nesse contexto, é impor-
tante ressaltar que a resposta é uma probabilidade e que isso não, necessariamente,
acontecerá. Desse modo, pode ser que a média de sobrevida das pessoas, após o diag-
nóstico de câncer de mama bilateral, seja de 1,5 ano. Na maioria dos casos, as pessoas
irão viver um tempo próximo a esse, mas é possível que o seu paciente sobreviva 1
mês ou 7 anos. As exceções são raras, mas elas podem acontecer. Ao conversar com o
paciente e familiar é importante considerar diversos fatores e não só números.
SAIBA MAIS
Estes artigos mostram curvas de sobrevidas:
68
` MIGOWSKI, A.; SILVA, G. A. Sobrevida e fatores prognósticos de pacientes com câncer
de próstata clinicamente localizado. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 44, n. 2, p.
344-352, abr. 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0034-89102010000200016&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 10 abr. 2021. 3
8. ENSAIO CLÍNICO
EXEMPLO
Epidemiologia 69
Epidemiologia analítica
O grupo controle pode ter outra intervenção diferente da estudada. Por princípios éti-
cos de que devemos tratar o paciente, raramente o controle não tem intervenção. Se a
pesquisa é de um medicamento novo para uma doença que não tem tratamento, nor-
3 malmente se administra um placebo para que o sujeito não reconheça qual grupo ele
faz parte. Entende-se como placebo uma substância que não tem princípio ativo, mas
que apresente características como cor, cheiro e formato semelhantes à intervenção.
EXEMPLO 11
Ao testar uma vacina contra malária, o controle deverá ser com placebo, já que não existe outra
medicação preventiva. Se a vacina é vermelha, com via de administração intramuscular, dose tes-
tada de 0,5 ml e disponibilizada em frasco único, o placebo deve ter essas mesmas características.
Existem dois tipos de ensaio clínico: ele pode ser de superioridade ou de não infe-
rioridade. É de superioridade quando o objetivo do estudo é avaliar se a intervenção
testada é melhor do que o controle. Ele é de não inferioridade quando o objetivo é so-
mente comparar se uma intervenção tem um efeito minimamente igual ao do controle.
Normalmente, estudos sobre medicamentos genéricos ou com um custo inferior são de
não inferioridade, já que o objetivo é garantir que o novo remédio não seja pior que a
medicação comercial.
SAIBA MAIS
Para conhecer mais acerca dos tipos de ensaio clínico, recomendamos as leituras de:
Superioridade
Não inferioridade
70
Uma característica importante desse estudo é o controle e o gerenciamento das variá-
veis com a finalidade de reduzir o viés de confundimento. Os grupos devem ser os mais
semelhantes possíveis em suas características e tratamento, exceto pela intervenção
pesquisada. Esse controle rigoroso das diversas variáveis aumenta a validade interna 3
da pesquisa.
Considere uma pesquisa sobre um novo tratamento para emagrecer. É preciso contro-
Esses três fatores associados com a melhora do quadro do paciente devem ser iguais
nos grupos controle e intervenção. Dessa forma, é ideal que todo o cuidado seja se-
melhante nos dois grupos para que o único fator diferente seja o efeito da intervenção.
Epidemiologia 71
Epidemiologia analítica
EXEMPLO 13
Se foi incluído um homem de 35 anos com peso adequado para idade no grupo intervenção,
no grupo controle deve ser incluído também uma pessoa com essas mesmas características.
O pareamento pode ter uma ou mais variáveis em comum, normalmente o sexo e a idade,
mas, dependendo da característica do estudo outras podem ser incluídas. Normalmente, o
número de pessoas no controle é a mesma que na intervenção, mas, às vezes, a proporção
pode ser de 1:2, sendo que o grupo controle tem o dobro de pessoas que a intervenção.
Para reduzir o viés de confundimento, a amostra pode ser bem controlada, como
em algumas etapas de estudos clínicos cuja população da pesquisa seja somente in-
divíduos adultos saudáveis sem comorbidades e com hábitos de vidas saudáveis. Ao
restringir participantes com possíveis fatores de confusão é mais fácil garantir a eficácia
do tratamento.
Para reduzir o viés de migração, são necessárias estratégias que garantam adesão ao
tratamento e que o sujeito siga os cuidados corretamente. É importante assegurar que
o sujeito não esteja realizando outro tratamento além do protocolado na pesquisa. Por
exemplo, em uma pesquisa de uma nova medicação para ansiedade é preciso garantir
que o único tratamento que os participantes estejam recebendo para ansiedade seja a
72
medicação proposta. Então, é preciso reforçar que práticas complementares, como me-
ditação e uso de plantas medicinais não podem ser realizadas. Essas cointervenções
podem influenciar no resultado da pesquisa.
3
Outro risco que se corre é de o participante trocar de grupo por conta própria. Se ele
sabe que está no grupo controle e tem acesso ao grupo intervenção, é possível que ele
busque o tratamento experimental em vez de manter com o que foi solicitado.
O sigilo da alocação é o cegamento nesse processo. Isso ocorre quando quem faz a
alocação não sabe dizer qual indivíduo foi para qual grupo. Logo, ao fazer o processo, a
pessoa não pode saber que está decidindo onde essa pessoa vai estar. Saber quem é
o sujeito pode influenciar na decisão de escolher qual grupo alocar. Para facilitar o sigilo
desse processo, a seleção é feita com frequência com a ajuda do computador.
Epidemiologia 73
Epidemiologia analítica
O sujeito da pesquisa também deve ser cego para que ele não seja tendencioso nas
suas condutas. É possível que a pessoa busque outras intervenções ou mude para
hábitos mais saudáveis para querer ajudar o resultado da pesquisa. Já para os sujeitos
3 que sabem que estão no grupo controle isso pode estimular a não adesão ao tratamen-
to ou a uma maior taxa de desistência.
IMPORTANTE!
Uma dificuldade em cegar o sujeito da pesquisa é a obrigatoriedade do Termo de Consenti-
mento Livre e Esclarecido (TCLE) que todo participante deve ler e assinar para poder parti-
cipar do estudo. No TCLE está descrito o objetivo da pesquisa, o que pode fazer com que a
pessoa saiba qual é o grupo que ela está.
O profissional que realiza o cuidado também precisa ser cego para que ele preste a
mesma atenção, independentemente do grupo que o paciente está. Esse profissional
pode ser alguém do serviço onde a pesquisa está realizada ou mesmo algum pesqui-
sador. Mas é importante que o cuidado seja o mesmo para que o efeito Hawthorne seja
igual nos dois grupos.
É essencial o profissional que faz a avaliação ser cego, já que a avaliação pode ser
tendenciosa e muito mais detalhada no grupo intervenção. O avaliador pode ser alguém do
serviço onde a pesquisa está sendo realizada ou pode ser algum pesquisador. Mas é impor-
tante que ele siga o protocolo de avaliação da mesma maneira para todos os indivíduos.
No caso da pesquisa de curativo em que a avaliação é por fotos, quem faz a análise
das imagens deve realizá-la sem saber qual foi a pomada aplicada. Assim, a pessoa
não será tendenciosa em procurar algum critério de melhora ao saber que o sujeito é
do grupo intervenção.
74
IMPORTANTE!
Um estudo pode ser cego em um ou mais momentos: na alocação, com o sujeito da pesqui-
3
sa, o profissional que realiza o cuidado e o profissional que realiza a avaliação.
Um estudo randomizado é quando a alocação dos sujeitos nos grupos, intervenção ou con-
Um estudo duplo cego tradicionalmente indica que o sujeito e o pesquisador são cegos. Nes-
ses casos, normalmente o pesquisador será o cuidador e o avaliador. O ideal é o pesquisador
deixar claro as estratégias para cegar as pessoas.
A RRR é a diferença das incidências do desfecho entre os grupos dividido pela incidên-
cia do grupo controle. A RRA representa o risco absoluto com a diferença da incidência
do desfecho entre cada grupo. O NNT informa quantas pessoas são necessárias tratar
para evitar um desfecho ruim.
A medida que as pessoas comumente vão utilizar no ensaio clínico é a eficácia do tra-
tamento, que é a redução do risco relativo em porcentagem. Para fazer esse cálculo,
basta multiplicar por 100 o valor de RRR.
EXEMPLO 14
Um ensaio clínico para avaliar a efetividade de uma vacina na prevenção de COVID-19 uti-
lizou como desfecho as possíveis classificações de gravidade da doença. A pesquisa acom-
panhou 724 pessoas do grupo intervenção e 706 do grupo placebo. No grupo intervenção
85 foram sintomáticos e 7 tiveram casos mais graves que necessitaram de assistência. No
grupo placebo 167 foram sintomáticos e 31 tiveram casos mais graves que necessitaram de
assistência.
Epidemiologia 75
Epidemiologia analítica
Casos sintomáticos
Tabela 07. Tabela 2 x 2 completa
3 ASSINTOMÁTICOS +
SINTOMÁTICOS TOTAL
NÃO DOENTES
INTERVENÇÃO 85 639 724
0, 2365 − 0,1174
RRR = realiza a subtração
0, 2365
0,1191
RRR = realiza a divisão
0, 2365
Eficácia = 50,36%
A vacina reduz em 50,36% a chance de uma pessoa ser caso sintomático de COVID-19,
quando comparado a pessoas não vacinadas.
A análise dos dados pode ocorrer pela intenção de tratar ou pelo tratamento que de fato
os sujeitos receberam (denominada análise explanatória). Essa escolha deve ser defi-
nida e ser clara nos resultados da pesquisa. É uma decisão que acontece quando há
cruzamento de grupos, ou seja, apesar de a pessoa estar no grupo controle ela recebeu
o tratamento intervenção.
Normalmente, a análise é pela intenção de tratar, já que é esse o olhar que importa para
o profissional de saúde. Por exemplo, um médico precisa saber qual é a eficácia do
remédio que ele prescreve para o paciente, mesmo que se tenha o risco de o paciente
usar outros tratamentos e não fazer uso da medicação indicada.
A análise explanatória é importante para saber, de fato, quão eficaz é tratamento quan-
do o paciente realmente o realiza. O grande problema dessa análise é que a amostra
76
pode estar enviesada, uma vez que a análise dos grupos não segue a alocação definida
no início da pesquisa.
GLOSSÁRIO
Eficácia refere-se ao impacto que uma ação tem, por exemplo, condições ótimas ou experi-
mentais (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 688).
Efetividade avalia o efeito que uma ação alcança em aplicação prática ou condições habitu-
ais (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 688).
A validade externa define o quanto o resultado pode representar a população. Está associa-
da à capacidade de generalização da pesquisa (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 161).
A pesquisa clínica para avaliar novos tratamentos medicamentosos passa por quatro
fases. Antes dessas etapas são realizados estudos pré-clínicos em laboratórios e com
animais. O ensaio clínico de fase I avalia a faixa terapêutica de segurança e os possí-
veis efeitos colaterais. Ela descreve as características do fármaco como qual é a via de
eliminação e a meia-vida da substância. O número de participantes é muito pequeno,
com menos de 100 pessoas, e não é necessário um grupo controle.
Epidemiologia 77
Epidemiologia analítica
Por ser um estudo experimental, as duas principais desvantagens são o custo elevado
e a logística complexa. O gasto é alto, já que tudo deve ser fornecido pela equipe da
pesquisa. A logística é maior do que nos estudos observacionais, uma vez que é preciso
realizar a intervenção e não somente avaliar o que já foi feito. Outro fator que influencia é
as diversas etapas necessárias para manter as pessoas “cegas”. Além disso, outro motivo
que dificulta a execução é a participação das pessoas. Se for um estudo de eficácia, atu-
almente é difícil conseguir pessoas saudáveis. Também, as pessoas podem ter medo de
fazerem parte do grupo intervenção ou não quererem participar se for controle.
IMPORTANTE!
O ensaio clínico randomizado duplo cego é considerado o padrão-ouro dos estudos científi-
cos. Entende-se como padrão-ouro a indicação mais robusta, que é um padrão de referên-
cia, seja ele um estudo, método diagnóstico ou tratamento (Fletcher, R. H.; Fletcher, S. W.;
Fletcher, G. S., 2014, p. 117). Então, deve-se sempre almejar realizar um ensaio clínico para
avaliar uma intervenção em vez de estudos observacionais.
CONCLUSÃO
Essa unidade descreve os desenhos de estudos mais clássicos. Uma hipótese de pes-
quisa pode ser investigada com diversos desenhos. A escolha do tipo de estudo depen-
de dos recursos e acessos disponíveis além de questões éticas.
Por exemplo, uma pesquisa tem como hipótese que fazer atividade física reduz o risco
de ter câncer de mama. A seguir podemos colocar os diversos tipos de estudos e como
seria a coleta de dados:
78
` Estudo caso-controle: escolha de pessoas com câncer de mama e de alguma
familiar como grupo controle. Avaliar a atividade física que as pessoas fizeram
nos 10 anos anteriores. Esse estudo é observacional, longitudinal e que inicia
identificando pessoas com a variável dependente (desfecho) e depois avaliando 3
possíveis fatores de risco.
` Ensaio clínico: por 10 anos fornecer atividade física para jovens com 40 a 45
Epidemiologia 79
Epidemiologia analítica
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA FILHO, N.; BARRETO, M. L. Epidemiologia e saúde: fundamentos, métodos e aplicações. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
3
FLETCHER, R. H.; FLETCHER, S. W.; FLETCHER, G. S. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. 5.
ed. Porto Alegre: ArtMed, 2014.
ROUQUAYROL, M. Z.; GURGEL, M. Rouquayrol: epidemiologia e saúde. 8. ed. Rio de Janeiro: Medbook,
2018.
80
Epidemiologia
81
3
INTRODUÇÃO
Um novo teste foi desenvolvido que diz ser mais confiável para a detecção de HIV/AIDS.
Seu paciente mostra o resultado do exame para você. Caso o resultado seja positivo,
você confia no resultado ou tem chance de ser falso-positivo? Para ajudar a interpretar
resultados de exames e, portanto, ajudar na decisão de qual exame realizar, há ferra-
mentas que avaliam os testes diagnósticos.
1. ESTUDOS DIAGNÓSTICOS
Os estudos diagnósticos são pesquisas que avaliam a qualidade dos testes e exames.
Considera-se como teste diagnóstico qualquer exame, escala ou procedimento cujo
objetivo é avaliar e definir um diagnóstico. A pesquisa descreve as características do
teste como capacidade de medir corretamente e quantidade de acertos e erros com
proporções de verdadeiro e falso positivo. Além disso, o estudo é capaz de ajudar na
interpretação do resultado.
82
SAIBA MAIS
Para aprofundar ainda mais seus conhecimentos acerca do tipo de pesquisa, confira o
4
artigo abaixo:
DUARTE, Geraldo; et al. Teste rápido para detecção da infecção pelo HIV-1 em gestantes.
Figura 01. Cruzamento do resultado do novo teste nos grupos doente e sadio
com as possibilidades dos quatro desfechos
Epidemiologia 83
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
valor que tanto indivíduos sadios como os doentes apresentaram como resultado. Na
Figura 2B, existe um pouco de sobreposição e em alguns valores há indivíduos sadios
e doentes. Na Figura 2C, a sobreposição é total e, portanto, o exame não é adequado
4 como método diagnóstico.
84
Na Figura 2A, o ponto de corte entre o exame normal e o alterado pode ser 10 ou 11. Na
Figura 2B, é mais difícil decidir apenas graficamente. Já na Figura 2C, o teste diagnós-
tico não é eficaz e, portanto, não necessita decidir. Para ajudar na definição de qual é o
melhor ponto de corte, algumas medidas de testes diagnósticos são necessárias. Além 4
disso, o objetivo e as consequências do teste também contribuirão na tomada de decisão.
Sensibilidade e especificidade
A sensibilidade e a especificidade são características do teste diagnóstico que não
sofrem alteração com mudanças de outras variáveis, como a prevalência da doença.
São informações importantes a serem consideradas antes de solicitar o exame para o
paciente. Dependendo do objetivo do exame pode ser interessante escolher um teste
com alta sensibilidade ou com alta especificidade.
A confiabilidade dos valores das medidas depende da amostra. A população deve ser
representativa e com um número amostral grande para que o valor real esteja perto do
valor estimado pelo cálculo.
Verdadeiro Positivo VP
1 S= ou S =
total de doentes (Verdadeiro Positivo + Falso Negativo ) VP + FN
Um teste com alta sensibilidade significa que ele irá detectar a grande maioria dos do-
entes. Por essa característica, exames com alta sensibilidade são utilizados quando se
quer garantir que todos os doentes sejam identificados. É comum para doenças trans-
missíveis, porque se quer ter certeza de que não existe algum doente com exame falso
negativo e que continuará transmitindo a doença.
Outra característica dos testes com alta sensibilidade é que se confia no resultado ne-
gativo. Isso acontece uma vez que a proporção de falsos negativos é baixa e, portanto,
um exame negativo tem grande chance de ser um verdadeiro negativo.
Epidemiologia 85
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
Verdadeiro Negativo VN
2 E= ou E =
total de sadios (Verdadeiro Negativo + Falso Positivo ) VN + FP
Um teste com alta especificidade detectará a grande maioria dos sadios, ou seja, rara-
mente se classificará alguém como doente sendo que, de fato, a pessoa é sadia. Sua
principal característica é que se confia no resultado positivo, uma vez que a proporção
de falsos positivos é muito baixa.
O principal uso de testes com alta especificidade é para confirmação diagnóstica. Ele
também é utilizado quando um resultado positivo pode ser nocivo para o indivíduo. Por
exemplo, se um exame positivo significa que a pessoa deverá passar por uma cirurgia,
é importante ter certeza que o paciente não sofrerá uma intervenção desnecessária, já
que o resultado era, na verdade, um falso positivo.
EXEMPLO 1
Uma pesquisa com o objetivo de avaliar se um novo marcador sorológico é capaz de identi-
ficar precocemente o câncer de mama realizou 200 testes e comparou com os achados da
mamografia. Dos 100 casos positivos na mamografia, 95 foram positivos no novo exame.
Dos 100 casos negativos na mamografia 20 foram negativos no novo exame.
DOENTE SADIO
TOTAL
(MAMOGRAFIA +) (MAMOGRAFIA -)
TESTE POSITIVO 95 80 175
TESTE NEGATIVO 5 20 25
86
Sensibilidade
VP
S= substituir o valor 4
VP + FN
95
95
S= realizar a divisão
100
S = 0,95
realizar a multiplicação para transformar em porcentagem
S 0,95 ×100
=
S = 95%
Especificidade
VN
E= substituir o valor
VN + FP
20
E= fazer a soma do denominador
20 + 80
20
E= realizar a divisão
100
E = 0, 20
realizar a multiplicação para transformar em porcentagem
E 0, 20 ×100
=
E = 20%
A sensibilidade desse teste é de 95% e a especificidade é de 20%. Como tem alta sensibili-
dade, pode ser um teste de rastreamento adequado. Como tem baixa especificidade, não é
um teste adequado para confirmar o diagnóstico de câncer de mama.
Como mencionado no final do tópico anterior, para decidir qual é o melhor ponto de cor-
te entre exame normal e alterado é preciso calcular a sensibilidade e a especificidade
de cada ponto e, a partir disso, decidir qual é o melhor ponto.
Epidemiologia 87
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
88
é claro o momento em que o trajeto passa de vertical para horizontal, que é o primeiro
ponto do gráfico com sensibilidade de 90%. Na curva 2, seria possível usar três pontos,
os que têm sensibilidade de 65%, 80% ou 85%
4
Considerando o exame da curva 2 (Figura 3) descrito na Figura 4, calcularemos a sen-
sibilidade e a especificidade de dois pontos de corte com definição de doente para
resultados ≥11 ou ≥13 .
Ponto de corte ≥ 11
Tabela 02. Dados fictícios de uma pesquisa que avaliou um novo teste diagnós-
tico que considerou o ponto de corte ≥ 11
TESTE NEGATIVO 15 60 75
Sensibilidade
VP 85 85
S= = = = 0,85 = 0,85 ×100 = 85%
VP + FN 85 + 15 100
Especificidade
VN 60 60
E= = = = 0, 60 = 0, 60 ×100 = 60%
VN + FP 60 + 40 100
Ponto de corte ≥ 13
Tabela 03. Dados fictícios de uma pesquisa que avaliou um novo teste diagnóstico
que considerou o ponto de corte ≥ 13
Epidemiologia 89
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
Sensibilidade
VP 65 65
4 S= = = = 0, 65 = 0, 65 ×100 = 65%
VP + FN 65 + 35 100
Especificidade
VN 90 90
E= = = = 0,90 = 0,90 ×100 = 90%
VN + FP 90 + 10 100
Com os cálculos, usar a definição de exame positivo com resultados ≥ 11, significa que
o teste diagnóstico terá alta sensibilidade, ou seja, ele será capaz de detectar quase
todos os doentes e será possível confiar no resultado negativo. Caso a definição seja
≥ 13, o teste diagnóstico terá alta especificidade, ou seja, ele será capaz de detectar
quase todos os sadios e será possível confiar no resultado positivo.
Para escolher qual desses pontos utilizar, é preciso pensar qual é o objetivo do teste.
Se o propósito for um teste de rastreamento ou avaliação inicial, deve-se escolher um
padrão com alta sensibilidade que, nesse caso, é definir como positivo ≥ 11. Também
se escolhe esse ponto caso um resultado positivo, mesmo que falso positivo, não tenha
impacto na vida do sujeito.
SAIBA MAIS
Conheça mais sobre a Análise de ponto de corte e sua aplicação no artigo abaixo:
O valor preditivo positivo (VPP) é a proporção de pessoas do grupo que testaram po-
sitivo que são doentes. Seu valor está associado à quantidade de falsos positivos e com
o valor da especificidade. Essa é a probabilidade de se confiar no resultado positivo.
90
Fórmula do Valor Preditivo Positivo (VPP):
Verdadeiro Positivo VP
3 VPP = ou VPP = 4
total de positivos (Verdadeiro Positivo + Falso Positivo ) VP + FP
Verdadeiro Negativo VN
4 VPN = ou VPN =
total de negativos (Verdadeiro Negativo + Falso Negativo ) VN + FN
EXEMPLO 2
Uma pesquisa com o objetivo de avaliar se um novo marcador sorológico é capaz de identi-
ficar precocemente o câncer de mama realizou 200 testes e comparou com os achados da
mamografia. Dos 100 casos positivos na mamografia, 95 foram positivos no novo exame.
Dos 100 casos negativos na mamografia 20 foram negativos no novo exame.
Qual é o Valor Preditivo Positivo e o Valor Preditivo Negativo desse novo teste?
Tabela 04. 2 x 2 completa
DOENTE SADIO
TOTAL
(MAMOGRAFIA +) (MAMOGRAFIA -)
TESTE POSITIVO 95 80 175
TESTE NEGATIVO 5 20 25
VP
VPP = substituir o valor
VP + FP
95
VPP = fazer a soma do denominador
95 + 80
Epidemiologia 91
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
95
VPP = realizar a divisão
175
4
VPP = 0,5429
VN
VPN = substituir o valor
VN + FN
20
VPN = fazer a soma do denominador
20 + 5
20
VPN = realizar a divisão
25
VPN = 0,80
= 0,80 ×100
VPN realizar a multiplicação (transformar em porcentagem)
VPN = 80%
O valor preditivo positivo desse teste é de 54,29% e o valor preditivo negativo é de 80%.
92
CÁLCULO DOS VALORES PREDITIVOS EM POPULAÇÕES
COM PREVALÊNCIAS DIFERENTES DA DOENÇA
4
Considere que a pesquisa realizou um novo teste sorológico para câncer de próstata em
duas populações diferentes. A primeira população era de pessoas que faziam acompanha-
mento com o urologista e apresentavam alguma queixa de alteração ao urinar. A segunda po-
Qual é a prevalência de doentes com câncer de próstata em cada grupo? Quais são os Valo-
res Preditivos Positivos e Negativos para cada população?
Prevalência
VP 179 179
VPP = = = = 0,9040 = 0,9040 ×100 = 90, 40%
VP + FP 179 + 25 198
Valor Preditivo Negativo
VN 101 101
VPN = = = = 0,8016 = 0,8016 ×100 = 80,16%
VN + FN 101 + 19 126
Grupo generalista sem queixa urinária
Tabela 06. Dados fictícios de uma pesquisa que avaliou um novo teste diagnóstico em uma amostra de
pacientes do médico generalista que não apresentavam queixa urinária
Epidemiologia 93
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
Prevalência
VP 79 79
VPP = = = = 0, 6870 = 0, 6870 ×100 = 68, 70%
VP + FP 79 + 36 115
Valor Preditivo Negativo
VN 198 198
VPN = = = = 0,9474 = 0,9474 ×100 = 94, 74%
VN + FN 198 + 36 209
O grupo do urologista que tem uma prevalência maior que o grupo do generalista. O Valor
Preditivo Positivo (VPP) é maior no grupo com maior prevalência (urologista) enquanto o Va-
lor Preditivo Negativo (VPN) é maior no grupo com menor prevalência (generalista).
A sensibilidade e a especificidade são iguais nos dois grupos já que elas são inerentes ao
exame. A sensibilidade é de 87,78% e a especificidade é de 84,61%.
Para aumentar a prevalência da doença e conseguir confiar mais no resultado positivo, várias
estratégias são possíveis, como mostra o exemplo acima. Pacientes com sinais e/ou sinto-
mas, histórico familiar da doença, presença de antecedentes pessoais ou outras característi-
cas individuais têm um risco maior de desenvolver a doença. Isso significa que a prevalência
dela em grupos com alguma dessas características é maior do que na população geral.
94
Os testes em paralelos referem-se a quando os exames diagnósticos são realizados
simultaneamente. Normalmente, eles ocorrem em situações de emergência ou quan-
do o paciente tem dificuldade de locomoção e se pretende reduzir a ida a serviços de
saúde. Eles aumentam a sensibilidade e o VPN, além de reduzirem a especificidade e 4
o VPP de cada teste se ele tivesse sido realizado isoladamente.
Uma vantagem é melhorar a sensibilidade quando os testes disponíveis não são pouco
Esses testes são usados quando há testes caros ou com maior risco de complicações.
A realização do teste caro ou com maior risco só acontece caso um exame prévio tenha
sido positivo. Por ser condicionante ao exame anterior positivo, quando se realiza testes
em séries, menos testagens são realizadas.
EXEMPLO
Uma pesquisa, que avaliou a nota dos alunos em uma disciplina, teve como resultado a taxa
de reprovação de 50%, e que os alunos do sexo masculino reprovaram muito mais do que
os do sexo feminino. A conclusão dessa pesquisa foi que o sexo influencia na aprovação da
disciplina. Ao ler esses resultados é preciso avaliar a probabilidade de eles serem represen-
tativos ao que acontece na população total e, portanto, generalizar as informações obtidas.
Epidemiologia 95
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
Outra possibilidade é que o erro da pesquisa seja em decorrência ao acaso. Define-se como
acaso um erro aleatório que é inerente a qualquer observação. Não existe estratégia capaz de
eliminar a ocorrência do acaso (Fletcher, R. H.; Fletcher, S. W.; Fletcher, G. S., 2014, p. 189).
Todo resultado de pesquisa, como o caso de uma medicação ser eficaz em um grupo
de pessoas, deve sempre ser questionado se, de fato, é o que acontece no mundo real
(natureza) ou se o que foi encontrado é justificado pelo acaso. A estatística consegue
ajudar na definição se a cura foi em decorrência do tratamento ou ela pode ser justifi-
cada pelo acaso, ou seja, a pessoa iria curar independentemente da administração da
medicação. Toda análise estatística tem a incerteza inerente do acaso.
Para decidir se os resultados são confiáveis e que se pode generalizá-los, existem méto-
dos que conseguem avaliar o acaso, os quais estimam os efeitos da variação aleatória.
Os dois métodos mais utilizados são os testes de hipóteses e os intervalos de confiança.
O teste de hipótese tem como resultado o p-valor que é a probabilidade do resultado en-
contrado na pesquisa não ser o que de fato acontece na natureza. Existe um consenso
na ciência que é se a probabilidade de errar for menor do que 5%, deve-se considerar que
a associação entre as variáveis estudadas é verdadeira. Por isso, p-valores menores do
que 0,05 indicam uma associação entre as variáveis estatisticamente significante.
IMPORTANTE!
O p-valor não mede magnitude ou intensidade da diferença ou associação. O teste de hipótese
e o p-valor medem apenas presença ou ausência, diferente ou igual, sendo associação ou não.
GLOSSÁRIO
Medidas de associações
` Risco relativo (RR) é uma razão das incidências de um evento no grupo com a variável de
interesse presente contra um grupo sem essa variável (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 701).
` Razão de chances ou Odds ratio (OR) é a divisão das chances de um evento acontecer
entre dois grupos, aqueles com a variável de interesse presente contra aqueles com a
ausência da variável (Fletcher, R. H.; Fletcher, S. W.; Fletcher, G. S., 2014, p. 94).
96
Para entender o intervalo de confiança, vamos usar como exemplo a pesquisa eleito-
ral. Durante o período de antecede a eleição diversas pesquisas são feitas avaliando
as proporções de votos em uma amostra. Quando o jornal divulga os resultados, ele
sempre fala em margem de erro. A pesquisa teve como resultado que 22% das pesso- 4
as da amostra iriam votar no candidato A, mas esse número pode variar na população
entre 20 a 24%. Interpreta-se o intervalo de confiança dizendo que há 95% de chance
do valor real a ser encontrado na população inteira estar dentro do intervalo, 20 a 24%.
IMPORTANTE!
Ao interpretar o intervalo de confiança do risco relativo e da razão de chances é preciso
considerar se a característica da interação mudou. A interpretação dessas duas medidas
acontece de forma similar. Se o valor for maior do que 1,0, indica aumento do risco ou chance
do desfecho acontecer. Se for igual a 1,0, não existe associação entre as variáveis e se for
menor do que 1,0, indica que a exposição reduz o risco ou chance de ocorrer o desfecho.
É importante que todos os valores dentro do intervalo estejam dentro do mesmo grupo, ou
seja, todos maiores ou todos menores do que 1,0, para que ser considere que o resultado
tem significância estatística.
3. CAUSALIDADE
Definir uma relação de causa e efeito é mais complexo do que apenas mostrar uma asso-
ciação estatística, sendo que a matemática é só uma parte do processo. É preciso avaliar o
conjunto e garantir que todos os procedimentos e etapas sejam conduzidos de forma correta.
Uma pesquisa tem resultados que irão descrever e analisar os eventos investigados.
Com os dados é possível estimar e predizer a probabilidade de um evento acontecer,
mas é preciso lembrar que estamos tratando de uma probabilidade, e não de uma
garantia. O acaso também influencia nas possibilidades que um quadro pode evoluir.
Definir o que causa uma doença é complexo. Ao longo dos séculos, a definição do pro-
cesso saúde-doença mudou muito e, atualmente, a teoria predominante é que a saúde
tem determinantes e condicionantes. Ficar doente, portanto, é complexo e tem influên-
cia de múltiplos fatores.
O impacto dos elementos de risco para uma doença é influenciado pela presença de outros
fatores e, às vezes, é mais importante a soma desses fatores os quais o paciente apresenta.
IMPORTANTE!
É indispensável reforçar que não é porque a pessoa é diabética que ela terá um infarto agudo
do miocárdio; cada doença tem uma grande variedade de fatores que estão associados, ape-
sar de algumas condições serem mais específicas e com uma relação mais forte. Morar em
uma casa sem abastecimento de água pela rede geral tem uma associação muito maior com
doenças diarreicas, mas pode também contribuir para o surgimento de outras enfermidades.
Epidemiologia 97
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
As relações causais não são explicadas somente pela matemática. A maneira como os
dados foram coletados tem um impacto muito grande. Será que houve algum viés que
pode impactar na associação estatística encontrada? Viés é um erro sistemático que
pode acontecer em diversos momentos e há diferentes estratégias que são capazes de
ser implementadas no método da coleta de dados que reduzem a chance de ele acon-
tecer (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 705). Esses erros sistemáticos podem ocorrer na
seleção da amostra quando os grupos que serão comparados não são similares porque
houve alguma falha na amostragem.
O viés de aferição acontece quando o equipamento ou a técnica utilizada para aferir uma
variável foi executada errada ou não é confiável. Já o viés de confusão ocorre quando há
uma associação estatística entre a variável explanatória e o desfecho, só que ela aconteceu
por influência de uma terceira variável que realmente é o fator associado ao desfecho.
CURIOSIDADE
“Consumo de Chocolate, função cognitiva e prêmio Nobel”
Esse artigo ficou famoso por ser uma publicação em uma das revistas mais conceituadas na
área da saúde. Ele faz uma correlação entre o consumo de chocolate por habitante e o número
de prêmios Nobel que os países têm. Estatisticamente, há uma correlação forte com um p-valor
de < 0,0001 e r de 0,791. Na discussão, é abordado que existe uma plausibilidade biológica,
uma vez que chocolate melhora a função cognitiva, o que pode levar a ganhar um Nobel.
Mas será que se o consumo de chocolate dos alunos da universidade reflete em uma melhor
nota nas provas?
Como vários fatores influenciam em uma associação com significância estatística entre
duas variáveis, é difícil determinar com certeza que “A” causa “B”. Definir a causalidade
tem um enorme impacto em diversos setores da sociedade. Falar que agrotóxicos ou de-
fensivos agrícolas causam câncer terá consequências nos setores agrícola e alimentícios
e na economia. Em 1965, Austin Bradford Hill, um dos pesquisadores que descobriu a
associação entre cigarro e câncer de pulmão, sistematizou quando se pode definir uma
relação causal. Fletcher, R. H., Fletcher, S. W. e Fletcher, G. S. (2014, p. 214-216), a partir
da leitura de Hill (1965), apontam que os oito critérios de Bradford Hill (figura 5)
98
Figura 05. Critérios de Bradford Hill
Epidemiologia 99
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
EXEMPLO
Em 1854, John Snow – médico conhecido como o pai da epidemiologia –, descobriu que a água
4 fornecida por uma bomba específica de Londres causava morte por doença diarreica, mesmo
quando na época não se sabia da existência de bactérias e das vias de transmissão da cólera.
Os critérios de Bradford Hill são importantes para provar que a relação é causal e não
apenas uma associação estatística ao acaso. Não é preciso ter todos os critérios pre-
sentes, mas quanto mais números deles forem contemplados, mais credibilidade terá o
estudo. Nem mesmo o cigarro – que hoje em dia está bem claro que fumar mata – tem
todos os critérios, visto que a especificidade não é contemplada.
Com esse rigor de definição é difícil um artigo concluir uma relação causal, portanto,
cabe ao leitor analisar se aquela associação tem muitas ou poucas chances de ter
causalidade. Para isso, deve-se avaliar o rigor metodológico e a presença dos critérios,
assim, com todas as informações você será capaz de julgar quais são as chances de a
associação ser verdadeira.
EXEMPLO
Um exemplo da diferença entre associação estatisticamente significante e causalidade é a
discussão se a vacina de Sarampo Caxumba e Rubéola (SCR) causa autismo. No final dos
anos 1990, o movimento antivacina ganhou força com a publicação de um artigo científico
da revista The Lancet. Esse artigo concluía que a vacina de Sarampo Caxumba e Rubéola
(SCR) causava autismo e doenças gastrointestinais. Ele foi usado como a prova científica de
que a vacina faz mal. A publicação em uma das principais revistas de área da saúde fez com
que os profissionais de saúde e leigos questionassem a qualidade e a eficácia das vacinas,
principalmente da SCR. Em 2010, a The Lancet fez uma retratação, mas as consequências
da publicação ainda estão presentes.
100
Para contrapor esse ideal de que a vacina faz mal, há uma revisão sistemática sobre a eficá-
cia e os danos da vacina SCR que avalia artigos de 1966 a 2019:
PIETRANTOJ, C. D.; RIVETTI, A.; MARCHIONE, P.; DEBALINI, M. G.; DEMICHELI, V. Vac- 4
cines for measles, mumps, rubella, and varicella in children. Cochrane Database of Syste-
matic Reviews, v. 4., n. CD004407. Disponível em: https://www.cochranelibrary.com/cdsr/
doi/10.1002/14651858.CD004407.pub4/full. Acesso em: 15 jun. 2021.
4. REVISÃO SISTEMÁTICA
As revisões sistemáticas são um tipo de estudo que resume outras pesquisas sobre um
determinado tema (Rouquayrol; Gurgel, 2018, p. 157). Normalmente, elas ocorrem para
avaliar a eficácia de um tratamento ou estabelecer que as evidências até o momento
não são suficientes. Como os ensaios clínicos randomizados são o padrão-ouro para
avaliar um tratamento, há revisões sistemáticas que restringem a amostra para somen-
te esse tipo de estudo.
Existe um rigor metodológico no processo de seleção dos artigos. A coleta de dados, que
nesse caso são os artigos, é sistemática. Os artigos selecionados devem ser publicados
em revistas científicas com parecer de outros pesquisadores para garantir a qualidade.
Essas revistas são indexadas em bancos de artigos, bibliotecas e repositórios, como a
BIREME e a MEDLINE/PubMed. Os pesquisadores selecionam descritores que definem
o escopo da pesquisa com a finalidade de restringir a busca para o que somente eles
estão procurando. Depois dessa primeira seleção, os critérios de inclusão são aplicados.
EXEMPLO
É fundamental não excluir muitos artigos, porque isso pode deixar a amostra não represen-
tativa. Então, mesmo que o artigo seja pago, ou em outra língua, deve-se tentar incluir ele
na pesquisa.
Com frequência, dois avaliadores fazem a seleção dos artigos e, depois, os resultados
são cruzados. Caso haja um artigo que só um avaliador selecionou, um terceiro pesqui-
sador decide se ele deve ser incluído na amostra.
Todo o processo de seleção dos artigos deve ser descrito da mesma maneira que o
método de seleção dos sujeitos da pesquisa é descrito. Normalmente, um fluxograma
resume o processo (figura 6).
Epidemiologia 101
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
EXEMPLO
A título de exemplo, combina-se o risco relativo de cada artigo para se chegar em um risco
relativo total. Cada artigo tem um peso diferente na composição da estimativa final a depen-
der da característica da amostra e dos resultados individuais.
A metanálise pode ser apresentada pelo gráfico de Forest (Forest plot, em inglês). A
Figura 7 é um exemplo do gráfico com resultados fictícios de oito estudos. Sempre ha-
verá uma tabela com as informações e o gráfico com a representação da estimativa de
ponto e o intervalo de confiança. A última linha é a estimativa de ponto combinada que
no gráfico é representado pela imagem de losango, que também descreve o IC.
102
Figura 07. Exemplo de gráfico Forest
No gráfico de Forest, há uma linha vertical no 1,0 para visualmente ficar claro quais
estudos há dentro do IC com o valor 1,0. Na Figura 7, os estudos B, D, E, F e G estão
nessa condição em que não se pode garantir associação, mas seus resultados são
usados para gerar o valor combinado de associação.
Vamos considerar que o gráfico de Forest (Fig. 7) resume estudos que comparam a
associação do uso de um medicamento com morte por determinada doença. Mesmo
que só os estudos A e C concluam associação, o valor combinado de OR foi de 0,53 e
o seu intervalo de confiança (IC95% 0,39 A 0,73) só tem valores menores do que 1,0.
Isso significa que essa metanálise tem evidência estatística de que o uso da medicação
reduz a chance de morte.
Epidemiologia 103
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
SAIBA MAIS
4 Aprofunde seus conhecimentos acerca de revisão sistemática com a leitura do artigo abaixo:
A qualidade dos estudos também precisa ser avaliada. Se a revisão sistemática resume
artigos de baixa qualidade, seu resultado não será confiável. Existem diversas escalas
para avaliar a qualidade do artigo. É possível colocar como critério de exclusão artigos
que pontuaram pouco nas escalas e, assim, fazer sua revisão e metanálise somente
com pesquisas fortes.
Assim como existem escalas que avaliam os estudos primários, há as que avaliam a
qualidade da revisão sistemática. As duas escalas mais utilizadas são a AMSTAR, com
14 itens, e a PRISMA, com 27 itens. É importante conhecer quais são os critérios utili-
zados para que, ao escrever o artigo, o pesquisador deixe claro o que foi feito a fim de
que o avaliador possa pontuar.
SAIBA MAIS
104
` Health Evidence é um repositório atualizado constantemente com pesquisas
acerca de gestão, finanças e prestações de serviços em sistemas de saúde. Dis-
ponível em: https://healthevidence.org/ (Acesso em: 15 jun. 2021).
4
01. Revisão sistemática: com metanálise por resumir os estudos primários e agru-
par características diferentes.
Epidemiologia 105
Teste diagnóstico e saúde baseada em evidência
IMPORTANTE!
Os estudos ecológicos não entram na lista porque as associações concluídas neles não po-
dem ser inferidas para indivíduos.
As recomendações são classificadas pela força em (1) forte ou (2) fraca. As evidên-
cias são divididas em quatro níveis de qualidade: (a) alta, (b) moderada, (c) baixa, (d)
muito baixa. Dessa forma, uma intervenção classificada pela GRADE como 2c é uma
recomendação fraca com evidências de baixa qualidade. Há também uma avaliação da
clareza da relação risco/benefício.
CONCLUSÃO
Como profissionais de saúde, é nosso papel questionar se o que está sendo divulgado
e realizado é de fato correto, ou seja, é nossa função procurar as respostas baseadas
em evidências. Mas não se deve acreditar em qualquer evidência – precisa ser cientí-
fica, com métodos definidos e análises estatísticas, além disso, a pesquisa precisa ser
transparente e sem conflitos de interesse. É preciso julgar qualquer pesquisa, mesmo
que ela seja feita por pessoas famosas ou publicadas em revistas importantes.
É necessário que exista evidências robustas que comprovem que sua conduta é eficaz
e a mais adequada para o seu paciente
106
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA FILHO, N.; BARRETO, M. L. Epidemiologia & Saúde: Fundamentos, Métodos e Aplicações. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011.
4
FLETCHER, R. H.; FLETCHER, S. W.; FLETCHER, G. S. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. 5.
ed. Porto Alegre: ArtMed, 2014.
ROUQUAYROL, M. Z.; GURGEL, M. Rouquayrol: epidemiologia & saúde. 8. ed. Rio de Janeiro: Medbook,
2018. 752 p.
Epidemiologia 107