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REGRAS GERAIS DE TRANSCRIÇÃO No início de cada fichamento deverá ter o sumário do respectivo capítulo

fichado.
Regramento da forma
03. Da articulação textual
01. Da fonte: arial
02. Do tamanho: 11 O texto precisa ser articulado de forma encadeada (lógica e sequencial), com
03. Da ausência de parágrafo: nunca, jamais. abundância de conectivos. Se apenas se limitar às citações diretas, ficará
04. Do espaçamento: simples + espaço após o parágrafo compreensível apenas para quem o produziu.
05. Do alinhamento: justificado
06. Da margem: 0.75 cm c/ 2 colunas 04. Da citação direta
07. Da legislação: cor azul c/ negrito no art.
SEMPRE entre aspas.
Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de
considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da Regramento do conteúdo
sentença condenatória. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 1. Sempre que o professor citar algum dispositivo legal, é necessário que ele
08. Do uso de vermelho e negrito: ex.; notas; obs.; perguntas/respostas; seja disponibilizado logo abaixo.
inaudível. Este último sempre entre colchetes. 2. Após a transcrição, é necessário que o responsável revise o que escreveu
para: (i) corrigir eventuais deslizes de Português; e (ii) certificar se articulou
Ex.: fulano de tal cometeu o crime de lavagem de dinheiro as ideias da aula de modo compreensível para quem for ler o material.
Nota: fulano de tal cometeu o crime de lavagem de dinheiro Ou seja, é importante se colocar no lugar de quem vai ler a versão final do
Pergunta: o crime de lavagem de dinheiro é permanente ou instantâneo? R: é conteúdo.
permanente. Observa-se que esse entendimento foi alterado quando o STF Lembre-se: chamamos de transcrição da aula porque pressupõe que o
julgou o caso do Dep. Paulo Maluf (...). material ficará com um nível satisfatório de detalhamento, pois, do contrário,
09. Da citação aos autores: sempre em CAPS LOCK. os slides disponibilizados pelo professor bastariam como materiais de estudos.
Então, procure ser o mais fidedigno à aula, mas, ao mesmo tempo, saiba que
Ex.: conforme FULANO, a ciência do direito se distingue do direito positivo, é necessário um certo manejo na articulação das ideias, tendo em vista a
sendo este objeto daquele. transição aula ao vivo → gravação → transcrição → cadernão final.

10. Dos títulos aos assuntos

Sempre que possível, o cadernão terá a indicação de título.

REGRAS GERAIS DE FICHAMENTO

01. Da aplicação subsidiária

As disposições anteriores serão aplicadas aos fichamentos, no que couber.

02. Do sumário

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pessoa com utilidade, com opções de escolha essenciais para te construir, ou
reconstruir, como um ser humano. Liberdade individual, portanto, de
determinação. O direito de ir e vir está dentro da liberdade de determinação,
por exemplo.

17/10/2022 - Prt. ún. - 42 min. - OK Um funcionário público tem tratamento diferente do sujeito privado. O
privado tem direito de fazer qualquer coisa que a lei não os proíba, sua
18/10/2022 - Parte I - 40 min. - OK
limitação é a da legalidade. O funcionário público, só pode fazer o que a lei
18/10/2022 - Parte II - 49 min. - OK determina que ele deve fazer, e isso cria uma série de consequências nos
crimes contra a administração pública, quando a gente fala na prevaricação.
24/10/2022 - Prt. ún. - 41 min. - OK

31/10/2022 - Parte ún. - 30 min. - OK Mas quando a gente fala dos limites contra a liberdade individual que
você tem, falamos da liberdade de fazer aquilo que você tem o direito de
01/11/2022 - Parte I - 01 h 04 min. - OK escolher fazer ou não fazer. Muito mais do que se movimentar, é o seu direito
01/11/2022 - Parte II - 21 min. - OK de escolha. E essa dimensão deixa muito claro que a sua liberdade é física e
psíquica. Física no sentido de se movimentar ou permanecer, e psíquica por
07/11/2022 - Prt. ún. - 47 min - OK tratar suas opções, maneira de pensar, orientação sexual, etc.
29/11/2022 - Parte I - 36 min. - Giocondo OK Mas quando falamos em algumas variações específicas dessa
29/11/2022 - Parte II - 1h - Lucas Machado (OK) e Miguel liberdade, a proteção dada pelo código penal não se resume a esse capítulo
da liberdade individual. Por exemplo, uma vítima de estupro tem sua liberdade
Link para ter acesso às aulas: Aulas de Penal C sexual lesionada, e essa é uma forma de liberdade individual, mas que é
17/10/2022 - Prt. ún. - 42 min. tratada de uma forma específica num capítulo específico do nosso Código
Penal.
Crimes Contra A Liberdade Individual
[Inaudível] a amplitude vai ocorrer tanto na liberdade quanto nesses
Vamos entrar nos crimes contra a liberdade individual, e aqui os mais meios da liberdade. O que eu quero dizer com isso? Se eu te impeço de ter
importantes, porque são de uma casuística mais comum, especialmente no acesso àquelas opções, àqueles espaços aonde você poderia fazer escolhas
que diz respeito à ameaça e ao cárcere privado. específicas, eu também estou violando a sua liberdade individual. Se eu te
impeço de acessar sua universidade, sua igreja, sua casa, eu estou
● Qual é o bem jurídico nos crimes contra a liberdade individual? indiretamente impedindo você de poder fazer escolhas que são
tradicionalmente construídas e constituídas nesses espaços.
Não entendam que a liberdade individual é tomada apenas no direito
de ir e vir, essa é uma das manifestações da liberdade individual. É claro que Claro que, normalmente, as restrições que cogitamos dentro do
essa é uma questão importante, mas ela corresponde a uma questão muito capítulo dos crimes contra a liberdade individual se materializam nas
mais ampla, ela corresponde, ao seu direito de escolha, ao seu direito de restrições do direito de ir e vir, mas, em grande parte das vezes, essas
desenvolvimento, que conduzem, portanto, à construção de você como uma
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restrições do direito de ir e vir são muito mais formas pelas quais você É isso que significa dizer que o constrangimento ilegal é um tipo
restringe as escolhas, e não a movimentação. Você impede que a pessoa residual, se não couber o tipo penal mais grave, então pode ser aplicado o
entre em determinado espaço onde ela poderia desenvolver-se e fazer suas constrangimento ilegal, e como todas as figuras mais graves são punidas com
escolhas. A violação ao direito de ir e vir parece a mais importante, mas penas muito maiores, é natural que a pena para o crime residual seja mais
certamente não é. baixa. É um crime subsidiário, portanto.

O capítulo fala em proteger liberdade, sendo ela dividida em quatro O constrangimento ilegal se torna um pouco mais complexo quando
seções: liberdade pessoal, inviolabilidade de domicílio, inviolabilidade de analisamos gramaticalmente o tipo.
correspondência e inviolabilidade de segredo.
Primeiramente, é preciso entender que o verbo fala em constranger a
Entre os tipos referentes à liberdade individual, vamos trabalhar alguma coisa, portanto, não é simplesmente constranger a pessoa no sentido
primeiro o constrangimento ilegal, que é um tipo importante – embora não do de deixá-la constrangida, mas submetê-la a alguma coisa, constrange-la a que
ponto de vista da casuística, já que tradicionalmente ele é absorvido por tome determinada conduta ou deixe de tomar a conduta que deseja.
outros tipos –, mas é preciso entender seu conteúdo, pois se trata de crime
residual, um crime que permanece quando outros não são reconhecidos. É um constrangimento dirigido; constranger a significa que você tem
que obrigar a vítima a não fazer o que a lei permite ou fazer o que ela não
Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou manda. O constrangimento tem um objetivo, não é um mero constranger ou
depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de submeter a vítima, é submeter a vítima a; elemento do tipo, portanto,
resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: obrigatoriamente esse direcionamento do constrangimento tem que estar
presente. Se não estiver presente, não se tem a figura típica.
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.
Em geral, a doutrina tende a classificar esse tipo no que chamamos de
Não é nada mais do que você, com violência, constranger ou obrigar vis absoluta ou vis compulsiva (vis significa força em latim). Força absoluta, ou
alguém a fazer alguma coisa que ele não está obrigado a fazer ou a deixar de força corporal, é segurar, amarrar, impedir. Quando você amarra sua vítima
fazer alguma coisa que ele poderia fazer. para que ela não consiga sair do lugar ou quando você empurra a vítima, você
está usando uma vis absoluta, vis corporae, força física.
● Isso pode ser grave?
Uma vis compulsiva, por sua vez, é uma força exercida
Quando imaginamos o constrangimento ilegal grave, em geral estamos psicologicamente. Por exemplo, “se você fizer isso, eu vou te dar uma surra”,
imaginando algum outro tipo, porque, por exemplo, constranger a vítima a é uma ameaça que constrange psicologicamente, não fisicamente.
fazer um ato libidinoso é uma forma de constrangimento ilegal, mas o
legislador sabe que é uma fora mais grave, por isso tipifica esta forma de Contudo não são apenas a violência física ou psicológica muito
constrangimento ilegal de maneira específica no crime de estupro; quando um elaborada que podem configurar constrangimento ilegal.
assaltante aponta uma arma para a vitima e fala pra ela “me entregue seu
relógio”, também está praticando um constrangimento ilegal, mas esse Pergunta: Professor, e enquanto a esses patrões que estavam
constrangimento ilegal é punido na forma do artigo 157 como crime de roubo. constrangendo os funcionários a votar no candidato da presidência? R.:
Caberia o constrangimento, mas cuidado, existe um tipo específico no código
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eleitoral para isso, que é um constrangimento ilegal, porém específico na Se um sujeito quer dar um flagrante por constrangimento ilegal, o
relação de trabalho dentro da questão eleitoral, mas é exatamente a mesma flagrante deve ser dado depois da ação da vítima constrangida. Se o flagrante
coisa que a gente tem nos crimes de estupro e roubo, um constrangimento é dado antes da ação da vítima, configura crime tentado, não consumado,
ilegal especializado. portanto, é um crime onde existe a forma tentada.

Pergunta: Não fazer o que a lei permite é a mesma coisa que falar Aumento de pena
fazer aquilo que a lei proíbe, ou há diferença? R.: Se a lei te permite, você
pode escolher. Se a pessoa te constrange a não fazer o que a lei te permite § 1º - As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando, para a
execução do crime, se reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de
fazer, caracteriza o constrangimento. Fazer o que a lei não manda não
armas.
necessariamente seria cometer um crime, mas pode ser. Constranger alguém
a fazer o que a lei manda não configura constrangimento ilegal. Se o constrangimento for realizado nas condições do § 1º, as penas
previstas no caput (detenção ou multa) serão aplicadas de maneira cumulativa
Aqui temos um elemento subjetivo especial do tipo, porque eu e dobrada.
constranjo a, portanto demanda elemento subjetivo especial do tipo,
constranger para que a vitima faça ou deixe de fazer. Aqui é necessária a Atenção!!! e isso vale para qualquer crime que criminalize de forma
minha direção da vontade; se eu não dirijo a minha vontade para constranger mais grave, ou que criminalize especificamente a conduta de pessoas se
a vítima àquilo, a minha conduta não pode ser subjetivamente típica. associarem. Menores e inimputáveis contam nesse número. É preciso mais de
três pessoas para configurar o previsto no § 1º, podem dois adultos e dois
Exige-se que o sujeito deseje algo além disso? Não, o direcionamento menores. Claro, nós só vamos reconhecer o crime para os adultos, pois
da vontade é para não fazer o que a lei permite ou fazer o que ela não manda. menores não praticam crime, mas eles compõem o número de pessoas
Se fazer o que ela não manda, no caso específico, é crime ou ilícito, pouco necessário para reconhecer a causa de aumento.
importa. Não é isso que é exigido como elemento subjetivo.
Mas o que o nosso legislador quer alcançar com esse reconhecimento
O que é exigido como elemento subjetivo é que o agente constranja a de que, apesar de inimputável, a pessoa soma para a configuração de
vítima a uma dessas duas circunstâncias (não fazer o que a lei permite ou associação criminosa? É que o maior número de pessoas causa mais
fazer o que ela não manda). Se essa circunstância é mais ou menos temibilidade na vítima, facilitando a prática do crime nessas condições,
específica, pouco importa, o importante é que essas duas circunstâncias portanto, pouco importa se os autores são adultos ou não, a culpabilidade está
estejam presentes. presente. O que pode acontecer é que se não for reconhecida a
responsabilização pontual dos menores, pode haver crime de corrupção de
É um crime comum, pois qualquer pessoa pode ser vítima ou autor do
menores.
constrangimento ilegal. Também é um crime material, porque não basta
simplesmente constranger, é preciso constranger a, e esse constranger a Além disso, o § 1º fala em emprego de arma, portanto pode ser arma
implica, portanto, coação, ação e/ou inação da vítima. Além disso, a vítima própria ou imprópria. Arma própria é aquilo que foi criado para ser uma arma
deve tomar a atitude pretendida pelo autor ao praticar o constrangimento (adaga, revolver, espada, etc). Arma imprópria é aquela cuja função principal
ilegal, do contrário não se reconhece o crime consumado. O crime se não é ser uma arma. Quando falamos em emprego de arma, pouco importa se
consuma com a conduta da vítima constrangida a algo. é uma arma própria ou imprópria. Existe aí alguma discussão na doutrina

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sobre um certo limite. Por exemplo, se eu utilizar um celular para assaltar porque se você tratar como causa de justificação [inaudível] uma exceção à
alguém, esse objeto não é capaz de causar temor à vítima, assim, não pode regra, e isso é um problema.
ser considerado como uma arma, nem mesmo como uma arma imprópria.
Mas como não há uma definição taxativa do que é uma arma própria ou [inaudível]
imprópria, fica à critério do julgador a análise.
Existe um grande debate aqui no inciso primeiro, por conta de
§ 2º - Além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência exceções produzidas por algumas matrizes religiosas, especialmente as
testemunhas de jeová, porque eles não autorizam transfusões sanguíneas
O que a gente tem aqui? Você vai aplicar a pena do crime somada à como prescritivo religioso. Isso cria um problema, porque em regra, quando
pena da violência que existir. um paciente vai ao hospital precisando realizar uma intervenção cirúrgica,
sendo necessária uma transfusão sanguínea, cabe ao médico decidir se faz
Ex: se para constranger a vítima, o agressor dá um soco nela, ele irá ou não. Se for [inaudível] ele vai fazer. Se for um adulto, ele precisa da
responder por constrangimento ilegal e lesão corporal. Será aplicada a pena autorização do sujeito. Se o sujeito é testemunha de jeová e não autoriza a
prevista para o crime de constrangimento ilegal e, em conjunto, as penas transfusão, isso impediria o médico de fazer uma intervenção ou uma
referentes à violência ocorrida, sendo violência apenas os crimes de lesão transfusão sanguínea.
corporal e vias de fato.
Existe um debate bem grande, e posição doutrinária, inclusive
Nota: Ameaça não configura violência quando tratamos de causas de financiada pelas próprias testemunhas de jeová, para justificar que a negativa
aumento de pena no constrangimento ilegal. do paciente em realizar a intervenção cirúrgica caracterizada pela transfusão
sanguínea deve ser respeitada.
O concurso material existe quando com mais de uma ação é produzido
mais de um resultado, assim, somam-se as penas previstas para as duas [inaudível] autores do Direito Penal, do Direito Constitucional e da
ações. O grande problema aqui é que não existe mais de uma ação ou mais
Teoria dos Direitos Humanos. A questão é quando ocorre com crianças. O
de uma conduta, então estão sendo aplicadas as penas previstas em
diferentes tipos a uma conduta única. Mas há um debate de que não seria médico depende de autorização dos representantes legais para fazer a
muito adequado além das penas aplicadas, aplicar a pena da violência, intervenção cirúrgica, mas por razões religiosas, os representantes legais não
porque a violência faz parte do tipo, e aplicar as penas cumulativamente autorizam. Temos um problema. O pai está cometendo crime? Para solucionar
nesses casos seria punir duas vezes pela mesma conduta. essa questão, a saída encontrada, e a que é mais aceita, foi a inexigibilidade
de conduta diversa.
§ 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo:
Pressupor a inexigibilidade de conduta diversa para os pais que negam
I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de
seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida; a transfusão devido à sua crença religiosa parece razoável. Eles têm esse
direito, claro, caso a opção não seja determinante para o resultado, ou seja, se
II - a coação exercida para impedir suicídio. o pai ao negar transfusão para a criança, impede que o médico realize a
intervenção e, consequentemente, leva à morte da criança, nesse caso o pai
Existe a discussão que nestas circunstâncias previstas no § 3º não responde, porque a sua negativa foi determinante no resultado e impediu o
haveria tipicidade de conduta, embora existam autores que falam que médico de agir.
discordam dessa afirmação e falam de justificação. Não parece mais razoável,
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Já o médico pode e deve realizar a intervenção, mesmo que isso seja por coisa alguma, o agente que põe uma arma na minha cabeça responde
contrário à vontade da família da criança. Não é exigido que os pais autorizem pelo crime que eu pratiquei, porque eu sou, na verdade, a vítima dele. Por
a transfusão, a fim de respeitar os princípios religiosos, mas o médico, diante isso, pessoal, embora não contemplado no tipo, não precisa ser contemplado
de sua posição na área da saúde, tem o dever de realizar todos os no tipo, porque quando alguém constrange ilegalmente outra pessoa, na forma
tratamentos possíveis para salvar a vida de um paciente. Ele tanto pode desse tipo legal, à prática de conduta criminosa, ela não pratica o
realizar a intervenção, que no constrangimento ilegal isso está expressamente constrangimento ilegal, ela pratica o próprio crime do objeto da coação.
indicado no tipo, excluindo a tipicidade da conduta nessa situação.
Em caso de coação resistível, a diferença será que o coagido responde
Esse é um debate limítrofe, que trabalha dentro dessa discussão uma também criminalmente, embora com uma pena reduzida, conforme se
teoria que tenta de certa forma introduzir na teoria do delito como melhor lidar encontra lá no artigo 65 do código penal. O crime cometido absorverá o
com circunstâncias tais como a crença, o exercício do direito de fé, e a constrangimento ilegal caso seja mais grave que o constrangimento ilegal, e
solução que tem sido construída é rigorosamente essa: o direito de crença no geral isso acontece, porque o constrangimento ilegal é o meio para a
prevalece em relação à exigibilidade de conduta diversa, desde que não seja prática do crime mais drástico, princípio da conjunção.
determinante no resultado lesivo ao bem jurídico. Quando o pai nega, isso não
impede que o médico faça a intervenção. Para que o sujeito consiga produzir um documento falso com a minha
assinatura, ele precisa apontar uma arma para mim. Claro que ele está
Finalmente, temos aqui o constrangimento para cometimento do crime. fazendo um constrangimento ilegal, mas quando ele responde pela falsidade
Alguém havia perguntado “e se for uma conduta criminosa?”, e foi explicado documental, a falsidade documental é mais grave do que o constrangimento
que o tipo fala em “não fazer o que a lei permite ou fazer o que ela não ilegal, então vai absorver este último.
manda”, não fala em crime.
Tem a classificação doutrinária, que vai variar de autor para autor, mas
Quando o constrangimento é para que alguém pratique um crime, aí a em geral, o constrangimento ilegal é bastante clássico, tem poucas dúvidas
circunstância é outra, porque se o sujeito está constrangido à prática do crime quanto à sua classificação doutrinária. É crime de ação penal pública
por uma violência física ou por uma coação [inaudível], o próprio código penal incondicionada e, se isolado, de competência do juizado especial criminal.
exclui a responsabilidade de quem pratica conduta criminosa por coação 18/10/2022 - Parte I - 40 min.
irresistível.
Ameaça
Quem age por coação irresistível (ameaça possível e grave o suficiente
a ponto de tirar a capacidade do sujeito de fazer escolhas de acordo com o O crime de ameaça, entretanto, é muito mais comum do que o
direito), não comete crime, porque ausente está a exigibilidade de conduta constrangimento ilegal, porque o constrangimento ilegal é bastante comum,
diversa. mas ele em geral é absorvido pelos outros crimes mais graves, pois ele é,
como crime independente, bastante raro.
Ex: um cara aponta uma arma para a minha cabeça e fala “assina esse
documento falso”, é claro que eu posso eventualmente dizer que sim, o direito Mas o crime de ameaça é aquele que está no dia a dia do advogado
não exige que eu seja a tal ponto corajoso, correndo o risco de levar um tiro criminalista; tudo é ameaça. Briga de vizinhos, briga de família, mensagem no
para obedecer ao direito. Diante de uma coação irresistível, eu não respondo whatsapp, tudo termina em ameaça. Ameaça é um crime muito comum, e é
tão comum porque quando analisamos a estrutura típica dele, ele depende
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muito do papel do intérprete. É um crime cuja hermenêutica é essencial, ser um mal, mas é justo. Todos têm direito de ação, você pode processar
porque é um verbo inapreensível do ponto de vista prático, que é o verbo quem você quiser. Não é mal injusto, pode ser grave, mas é certamente justo.
ameaçar. O que é ameaçar?
[inaudível]
Nota: brincadeiras só não são ameaças por conta do animus jocandi,
ameaça depende da forma como a pessoa ameaçada a recebe, se em forma Talvez uma das questões mais delicadas, ou certamente, vinculadas à
de brincadeira ou de modo a lhe causar medo. ameaça, é o que a gente chama de risco de progressão criminosa, que é o
desenvolvimento, a mudança de dolo no meio da conduta criminosa, que
A ameaça depende substancialmente de uma transmissão muda a qualificação típica daquele quadro criminoso.
comunicativa que envolve não só quem prolata a própria frase que pode ser
caracterizada como ameaça, mas também quem a recebe. Ex: você está dando uma surra na sua vítima, batendo e batendo por
conta de tanta raiva, e continua batendo até ela morrer. Veja, eu comecei com
Percebam a dificuldade da comunicação nesse aspecto: quando eu uma lesão corporal, mas no meio do processo eu mudei meu elemento
falo “você está me ameaçando”, percebam que a discussão entra num espaço subjetivo, levando ao fato mais grave, que é o homicídio. Isso é uma
hermenêutico [inaudível], como ameaça deve ser interpretada? Como ela deve progressão criminosa.
ser feita? [inaudível]. O juiz que é o cara que vai dizer se determinada frase é
uma ameaça ou não. Enfim, a casuística é muito comum. A grande pergunta é saber para que você vai responder criminalmente,
porque se mudou o dolo, mudou o tipo.
Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro
meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Se for dentro de um modelo finalista, como é o nosso código penal, a
mudança de dolo tem o condão de mudar o tipo, então se você praticou
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. condutas de lesão corporal com dolo de lesão corporal, o crime é de lesão
corporal, mas no momento em que você muda o dolo, você passa a praticar
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação. condutas de homicídio, tanto é que você tem dois crimes. Essa é a
problemática da progressão criminosa e isso não é muito claramente
É um crime que é tratado pela lei penal com uma gravidade resolvido, porque seria necessário presumir que o agente consiga entender a
substancial, por ser um crime de ação penal pública condicionada à mudança de dolo no meio do processo, e que seja possível provar essa
representação. Mas ação penal pública não é um crime qualquer, não é um mudança de dolo.
crime que fica na esfera privada. É um crime que é tratado com uma certa
seriedade, por se tratar de uma ação penal pública, embora tenha uma pena Ex: um torturador que está torturando sua vítima porque ele quer
baixa. extrair uma informação e, se ele está torturando pra extrair uma informação e
ele não quer matar, ou seja, é um dolo de tortura. Mas, no meio da tortura o
Pergunta: Professor, falar que vai processar alguém não é uma ameaça? R.: torturado grita “você tem chulé” e o torturador responde “aaah, chulé eu não
Não tenho, então eu vou te matar” e tortura mais até morrer, isso muda o dolo.
Agora é dolo de homicídio com tortura. São duas condutas completamente
Pergunta: E se eu falar “vou te processar. Eu conheço advogados ou pessoas
diferentes.
no meio jurídico”? R.: Não é ameaça, porque não é um mal injusto. Pode até

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Mas como se resolve isso? É exatamente essa a discussão que vem à crimes. E por que não há uma progressão criminosa? Porque não há uma
tona quando falamos em progressão criminosa. Não tem sentido reconhecer mudança de dolo no meio, os dolos são absolutamente independentes. Eu
dois crimes diferentes, porque embora tenha havido uma mudança de dolo, a não preciso do dolo de tráfico para fazer a lavagem, ela não se constrói no
conduta criminosa é consequencial, e o dolo surge no processo do primeiro processo, tanto que eu posso apenas traficar e depois transferir o trabalho de
fato. Eu não começo o fato com a vontade de matar, mas ela só surge no lavagem para a minha colega que lava dinheiro para mim. Então a progressão
processo da lesão corporal e se transforma no dolo de matar. criminosa é problemática, e isso vale para qualquer crime. Tem algum debate,
inclusive jurisprudencial, sobre reconhecimento dos efeitos da progressão
Como existe um processo de construção da finalidade no modelo criminosa. Mas no caso de ameaça, em geral, ela (a ameaça) é absorvida pelo
finalista a gente pode reconhecer que o crime a ser imputado é o último crime. crime mais grave.
Isso é importante no crime de ameaça, porque se um sujeito ameaça e
executa a conduta em seguida existiria aí uma progressão criminosa. É um tipo claramente aberto, como eu disse para vocês. Tipo aberto é
aquele que contém elementos que precisam de uma interpretação.
O que tem sido entendido é que, embora exista risco de progressão
criminosa, em geral, o crime praticado no fim das contas, que é o objeto Ex: traficar drogas, como eu sei o que são drogas? Recorrendo à
original da ameaça, é absorvido pela ameaça. portaria da anvisa que lista o que são drogas. Isso é uma lei penal em branco,
que precisa de uma complementação por outra norma. A complementação,
Ex: “vou te dar uma surra” e aí de fato dá uma surra, você vai nesse caso, não cria risco para a legalidade.
responder por lesões corporais e não pela ameaça e por lesões corporais. É
um processo de progressão criminosa. O tipo penal aberto, diferentemente, depende de complementação,
mas não por outra norma. Depende de complementação pelo intérprete. A
Tem crimes onde as progressões são evidentes, por exemplo eu trafico ameaça só vai ser definida como ameaça quando o juiz disser “é uma
drogas e daí lavo o dinheiro das drogas, existem modelos processuais, se eu ameaça”. Portanto, o intérprete precisa dizer o conteúdo do tipo. Aqui há risco
não me engano, a Alemanha, que não criminalizam a autolavagem por conta para a legalidade, porque eu não sei o que é uma ameaça, eu não sei o que
disso, porque se eu trafico drogas, cometo o crime, ganho 100 mil reais e faço eu posso dizer para vocês que o juiz vai entender como ameaça ou não, só
o processo de lavagem desse dinheiro pra poder aferir o lucro desses 100 mil vou saber quando o juiz definir. É justamente isso que a legalidade indica. A
reais obtidos com o tráfico de drogas que eu mesmo pratiquei, isso seria legalidade nos dá previsibilidade.
autolavagem; lavando o dinheiro que eu mesmo produzi. E essa autolavagem
não seria (ou poderia ser) entendida como progressão criminosa, por isso eu Não tem como descrever o crime de ameaçar de outra forma, então é
não respondo por um dos crimes. uma concessão político-criminal que a gente tem que fazer a uma
interpretação da própria legalidade.
Claro, como o crime de tráfico de drogas é mais grave do que o crime
de lavagem de dinheiro, eu responderia por tráfico de drogas, é esse o Evidentemente que nós presumimos que o juiz vai fazer uma
raciocínio. Embora exista uma progressão criminosa. interpretação apoiado nos critérios constitucionais, utilizando princípios como
intervenção mínima, adequação social da conduta e tudo o mais para fazer
Já no modelo brasileiro admite-se a criminalização da autolavagem, uma interpretação.
então se eu trafico drogas e depois faço uma operação de lavagem de
dinheiro com esse dinheiro que veio do tráfico, eu vou responder pelos dois
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Ex: uma expressão que a sociedade entende que não é ameaçadora, O direito não pode trabalhar com esse tipo de circunstância. O direito
que é aceita socialmente, pelo princípio da adequação social da conduta, se vai trabalhar com causa e efeito, e nenhuma morte foi comprovadamente
exclui a tipicidade, não configurando uma ameaça. causada por vela acesa. No plano do funcionamento do tipo para o cidadão
médio o fato tem que ser verossimilhante, e mera superstição não pode
Ameaça pode ser por palavra, por escrito, por gesto ou por outro meio justificar essa ocorrência.
simbólico, o tipo fala em formas da ameaça. Claro que um gesto precisa ser
contextualizado. [inaudível]

Uma ameaça pode ser direta, indireta, explicita, implícita ou Existe uma dúvida que é se o mal ameaçado precisa ser futuro ou não,
condicional. se ele também poderia ser imediato. Eu posso dizer “eu vou te dar uma surra
amanhã”, esse tipo de ameaça indica um fato futuro, e certamente uma
Ex: “se você fizer isso, eu mato você”, “se não fizer eu te mato”, pode ameaça. Mas se esse mal for imediato, por exemplo, dizer “vou te dar um
ser uma ameaça condicional explícita. soco” enquanto avança para dar o soco, isso é uma ameaça? Parte da
doutrina indica que não, parte da doutrina indica que sim.
O tipo não faz restrições, ele admite qualquer tipo de ameaça. Porém,
o mal ameaçado deve ser injusto, ou seja, contrário ao direito. Não existe A maior parte da doutrina entende que o mal só pode ser futuro, porque
ameaça ao dizer que você vai abrir um processo contra alguém, pois esse é o mal imediato faz parte do outro tipo que é praticado, por exemplo o
um direito seu. Claro que isso pode ser aterrorizante, mas nunca vai se constrangimento ilegal ou lesão corporal. Não tem sentido, portanto, falar em
caracterizar como um crime de ameaça, porque não é injusto. mal imediato, pois em caso de mal imediato, a ameaça normalmente é
absorvida, por ser inerente ao tipo mais grave.
Pergunta: Professor, no caso que você falou sobre o direito de outro
processar, se uma pessoa ameaça se demitir, seria uma ameaça? R.: Não, Por essa razão, a maior parte dos autores, especialmente os mais
porque não é um mal injusto. recentes, têm entendido que só é uma ameaça quando o mal ameaçado é
futuro. Claro, o futuro não tem um prazo pré-estabelecido, o futuro pode ser
Deve ser grave, ou seja, capaz de causar medo. Se eu falo para um daqui 15 minutos, ou daqui 15 dias, mas o mal teria que ser futuro para a
lutador profissional que vou dar uma surra nele, isso não causa medo no maior parte da doutrina.
lutador, porque não é uma ameaça possível, embora ainda seja um mal grave
(agredir alguém). O mal é grave, mas circunstancialmente não é uma ameaça. Na doutrina mais antiga, não. Para eles, não existe nenhuma exceção
É preciso analisar circunstancialmente se a ameaça produzida é de mal na lei para dizer que tem que ser um mal futuro. Se a lei quisesse, teria dito
efetivamente grave e verossimilhante dentro do possível. “mal injusto, grave e futuro”, como não disse, existe a possibilidade de ser um
mal imediato.
Ameaçar alguém utilizando fundamentos não reconhecidos pelo direito,
não é considerado como uma ameaça. Cuidado!!! crime de ameaça não é aquela ameaça inerente aos tipos
que falam de ameaça. Vários tipos falam de ameaça. Quando se fala em
Ex: “vou acender uma vela de determinado jeito e por conta disso você violência ou grave ameaça como elementar de outro tipo, não é ao crime de
vai morrer”, você pode até acreditar nisso, mas o direito não acredita, logo, ameaça que está se referindo.
não se caracteriza como crime de ameaça.
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O crime de ameaça tem vida própria, independente da palavra ordem. Mas na condição de funcionário comum, a mudança de tipificação
“ameaça”, que pode ser usada pela lei penal em vários contextos. ocorre somente quando se usa do cargo para o constrangimento da liberdade
do outro.
Os elementos mais clássicos, as dúvidas mais importantes sobre o
crime de ameaça são certamente essas. Pergunta: No caso de policial que não esteja no exercício da função, mas se
valha do cargo para ameaçar, como se enquadra?
O bem jurídico protegido é a liberdade pessoal, não é apenas um risco R: Tem alguma discussão, mas poderia ser abuso de autoridade, se
à segurança jurídica. Deve ser uma ameaça que agregue um risco à liberdade houvesse, por exemplo, a “carteirada”. Pois, nesse caso utiliza do cargo que
do sujeito. Segurança jurídica não se confunde com liberdade. A falta de ocupa para restringir a liberdade de outrem, ainda que não esteja no exercício
liberdade te impede de fazer escolhas que você poderia fazer. A ameaça tem da função, mas ainda assim se vale dela para lesar a liberdade individual do
que ser grave ao ponto de criar algum constrangimento nas suas escolhas outro.
pessoais, um constrangimento que interfira no seu psicológico, não é
simplesmente a segurança jurídica de não ser incomodado. Pergunta: Se um particular ameaça um funcionário público, se enquadra
como ameaça do 147 ou desacato?
O objeto material é a vítima, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa e
R: Depende da circunstância, o crime de desacato possui o bem jurídico de
o sujeito passivo também pode ser qualquer pessoa, desde que, claro, seja
uma natureza mais ampla, assim como injúria e calúnia. O desacato é
capaz de entender a ameaça.
criminalizado em razão da lesão ao bem jurídico que seria a administração
No caso de ameaça cometida por funcionário público, temos o crime de pública e não a liberdade individual. Portanto, depende de que forma foi dito.
abuso de autoridade. Nesse caso o crime de ameaça cai pelo abuso de
autoridade, pois há uma série de circunstâncias muito peculiares, que tornam Pergunta: Há uma discussão sobre se seria ameaça ou não se o suposto
o crime de ameaça muito mais grave devido à perspectiva da pessoa pública. ameaçador não possuir os meios para praticar o que foi prometido. Por
exemplo, uma ameaça vinda de um colecionador de armas, provavelmente,
. terá mais peso.
18/10/2022 - Parte II - 49 min. - Caio e Carol R: Na verdade assim, a interpretação é circunstancial, certamente a prática vai
depender também da possibilidade física da produção, mas não se trata
Pergunta: No caso de ameaça feita por funcionário público, não estando no somente de uma relação de causa e efeito científica, mas é preciso analisar a
exercício da função, ou em razão dela, se enquadra no crime de ameaça do causa e efeito de um aspecto social. Se a pessoa, por exemplo, falar “se você
art. 147, do Código Penal? fizer isso eu vou fazer o papa te excomungar”, veja, não há como fazer o papa
R: Se não houver vínculo com a função pública, daí é o crime de ameaça do te excomungar. Diferente seria se fosse “Vou falar para o diretor fazer um ato
art. 147, por exemplo, um desembargador que pratica o crime de ameaça administrativo contra voce”, aí a coisa muda de figura. Então, demanda uma
dentro de um restaurante, responderá normalmente pelo art. 147. No entanto, análise circunstancial, da possibilidade da conduta.
se o crime for praticado durante audiência, será enquadrado como abuso de
autoridade, portanto, mais grave, visto que carregado pelo peso da função É desnecessária a intimidação, o que significa dizer que a vítima ameaçada
pública. A menos que seja notório, como por exemplo, presidente da não precisa sequer se sentir intimidada, basta que tenha ameaça, quando eu
república, nesse caso não dá para separar, por isso se espera um decoro, pois digo para você “vou te dar uma surra”, o crime de ameaça está evidenciado,
o cargo que ele carrega implica na condição de que seu pedido será sempre mesmo que não haja medo por parte da pessoa ameaçada. Pois, depende da
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lesão ao bem jurídico, a ameaça cria a lesão ao bem jurídico, por isso, não produzir um estado de medo” se ele dissesse que "produzir estado de medo”
significa intimidar-se, porque as pessoas são mais ou menos corajosas. seria uma modificação específica do tipo. Por isso que é um crime formal, o
tipo não exige a produção de um estado específico, basta a conduta
Pergunta: Qual seria a definição do “causar medo”? evidenciada.
R: Entendam medo no sentido de um confronto com a tua liberdade, uma
restrição das tuas escolhas, não precisa ser medo pavor, medo terror. É mais Obs: Pode ser considerado como crime de mera conduta.
no sentido de “Não posso fazer aquilo que quero”, talvez a palavra mais
correta seja um constrangimento à tua liberdade. Lembre-se, não dá para Pergunta: [inaudível]
pensar no tipo fora do contexto do seu bem jurídico,e o bem jurídico é a R: Normalmente um crime formal é um crime de mera conduta. [inaudível].
liberdade individual. Então você só vai reconhecer a ameaça desde que haja
uma lesão a liberdade individual essa lesão não precisa impedir o sujeito de Tem gente que discute a possibilidade, sobre admitir a tentativa ou não,
fazer alguma coisa, intimidar, mas ela precisa pelo menos criar algum exatamente por se tratar de um crime de mera conduta. A maior parte da
constrangimento à liberdade individual. doutrina vai admitir que não existe tentativa no crime de ameaça, não é
possível você iniciar a execução e impedir a consumação do resultado por
Por isso digo a vocês, não é um tipo simples, é um tipo que tem uma circunstâncias alheias à sua vontade. Tem parte da doutrina, como o GRECO,
amplitude hermenêutica do juiz imensa. Embora, seja comum no sentido de por exemplo, que vai dizer que é possível quando se faz por escrito. Ex: Eu
que é uma casuística muito ampla. escrevo a ameaça em um bilhete e quando vou entregar para a vítima, ela
percebe. Mas se começarmos a pensar assim, é uma extrapolação, porque
É crime formal, ou seja, independe da intimidação da vítima, isso de fato não assim você se utiliza de uma possibilidade específica, um caso fora da curva,
interessa, há lesão, então evidencia-se a conduta, independente da produção para justificar uma possibilidade nula, em uma análise estritamente
do resultado normativo específico. Porque o que é crime formal? É aquele circunstancial. Em geral, a doutrina é muito coesa quanto a não
crime cujo tipo não requer nenhum resultado especial. Cuidado, todo tipo admissibilidade da tentativa. [inaudível]. Cuidado com a doutrina que vocês
requer resultado, alguns tipos requerem resultado específico, tipos materiais, utilizam, propondo algumas soluções imprevisíveis, quando tratamos de crime
outros independem do resultado, tipos formais. formal, nos limitamos a pela coerência dos compilados doutrinários.

Pergunta: Mas professor, se é um crime formal, porque você falou que é Nota: Em geral, a doutrina é muito coesa limitando-se à abertura que o tipo
necessário que a pessoa entenda a ameaça, porque em tese se um alemão te impõe, ou seja, não se admite tentativa.
ameaçar, mas você não entender alemão então não configura lesão.
R: [Inaudível] Quando eu falo no crime de ameaça eu falo da lesão ao bem Pergunta: Professor, a pessoa precisa entender a ameaça. Por exemplo, a
jurídico, que é a liberdade individual, que por sua vez possui seus limites pessoa diz: “Vou te dar um coió (bater, dar uma surra)”, e a pessoa ameaçada
verificados num contexto social, então quando eu falo na exigência da lesão não entende o que é. Ainda assim a ameaça é verificada?
ao bem jurídico, significa um constrangimento a aquilo que você e as pessoas R: Tanto é necessário, que trata-se de crime de ação penal pública
entendem tem por liberdade dentro de um contexto social. Como, por condicionada, ou seja, tem que ter a representação penal da vítima. Claro, a
exemplo, a questão do papa excomungar, nós sabemos que no nosso questão é processual penal, pois se a vítima não representar perante ao MP,
contexto social isso não é possível, logo não há lesão. Agora, isso não quer não haverá processo. Há a possibilidade de se sentir ameaçado depois,
dizer que o tipo exige um resultado específico, o tipo não diz assim “ameaçar, quando entender a palavra dita. Mas é preciso se atentar ao tempo entre a
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conduta e o entendimento. A dimensão do risco à liberdade tem que ter uma jurisprudencial e doutrinário. A maior parte de doutrina e jurisprudência vai
dimensão pessoal, caso contrário nem faria sentido ser uma ação penal dizer que não exclui.
pública condicionada.
E daí, claro, competência é do juizado especial criminal, sendo um crime de
ação penal pública condicionada.
Elemento subjetivo: dolo, claro, direto e eventual. Posso ter uma ameaça com Pergunta: Se alguém ameaça que vai fazer alguma coisa, mas vai lá e faz
dolo eventual? Posso. Se ele vai se sentir ameaçado ou não, que se dane, eu outra. Por exemplo, se alguém ameaça que vai te prejudicar no trabalho, mas
falo mesmo. Exclui-se o animus jocandi, vontade de brincar. “Vou te dar uma vai lá e te bate. Eu tenho dois crimes?
surra”. Turma, a gente fala isso o tempo todo para os colegas, na intenção de
brincar. Animus jocandi. Não se pode reconhecer isso, porque o Resposta: Certamente. O que você poderia dizer, eventualmente, é que o
direcionamento da vontade claramente não é um direcionamento que te crime posterior absorve o primeiro. Mas aqui as condutas são absolutamente
aproxime da pretensão de violar o direito. separadas. Tem dois crimes. Eu ameaço uma coisa e faço outra. Se eu
ameaço dar uma surra e vou lá e mato o cara, são dois crimes: ameaça e
O crime independe da real vontade de realizar o mal prometido. Ex: eu falo homicídio. Agora tem uma questão processual envolvida aí. Quando tem um
que vou te dar uma surra, mas eu não tenho coragem de te dar uma surra. crime com pena grave, normalmente o processo demora. Como o crime de
Não importa, a ameaça está feita, está lançada. ameaça tem uma pena muito pequena, na hora de o juiz calcular, a chance de
prescrição é enorme. É difícil ter uma condenação que envolva essas duas
Pergunta: professor, a outra pessoa tem que entender a ameaça? Tem uma
condutas. Mas a regra seria um concurso material. Duas condutas, duas
palavra que é assim: coió. Eu vou te dar um coió. A pessoa não entende o que
penas.
é, mas outras pessoas entendem que é uma agressão.
Pergunta do aluno intercambista, não consegui entender.
Resposta: Tanto é necessário [que a pessoa entenda], que se trata de ação
penal pública condicionada. Tem que ter a representação da vítima. Claro que Outra pergunta inaudível.
a solução aqui é muito mais processual, porque se a vítima não representar, o
ministério público não pode processar. Claro, eu posso me sentir ameaçado Resposta: Na conjunção, a gente fala que tem uma conduta necessária para
depois. Não preciso me sentir ameaçado circunstancialmente na mesma hora. outra.
Se o cara fala em alemão que vai me matar e eu não entendo, mas depois
uma pessoa que entende me fala: Rui, ele tá querendo te matar. Agora, Então o dolo é sempre o mesmo?
confirmou a circunstância. Agora eu compreendi a ameaça. Tem uma
dimensão temporal. É a mesma coisa que se eu escrevesse um bilhete com Resposta: Isso, então, por exemplo, para matar eu preciso causar lesões
uma ameaça e colocasse no teu caderno, mas você só encontra ele amanhã. corporais. Não tem como eu matar alguém sem causar lesão corporal. O
homicídio absorve as lesões corporais por uma relação causal de
Tem que ter uma dimensão individual, evidentemente. Caso contrário, não necessidade.
faria sentido se ter uma ação penal condicionada. Se não fosse assim, o MP
reconheceria socialmente, e você poderia ter uma ameaça contra uma criança Agora, eu vou só mostrar esse tipo para vocês e na próxima aula a gente
de 6 meses. Vocês perceberam como tem uma dimensão pessoal nesse limite explora mais.
à liberdade?
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio,
Discussão: estado de ira, cólera, excluiria a ameaça? Não. Porque a gente ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a
tem regras do código penal de emoção, de paixão que tratam disso. Você capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando
pode até diminuir um pouco a pena. Mas lembrem-se que emoção e paixão sua esfera de liberdade ou privacidade. (Incluído pela Lei nº 14.132, de
não excluem a imputabilidade penal no nosso modelo. Há debate 2021)
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Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Quando o crime de estupro passa a ser de ação pública incondicionada, qual
Lei nº 14.132, de 2021) é a grande questão? Se eu for estuprado, eu não decido mais nada. O MP vai
denunciar. Mas eu não quero que denuncie, porque aí todo mundo vai saber
§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido: (Incluído pela que eu fui estuprado, isso vai me constranger. A ação penal é incondicionada.
Lei nº 14.132, de 2021) O MP é dono da minha liberdade sexual, de eu não iniciar o processo criminal.
I – contra criança, adolescente ou idoso; (Incluído pela Lei nº 14.132, de Se você for estuprado e não quiser o processo, não conta pra ninguém. Se
2021) contar pro MP, já era. Você vai ter que ir no processo, porque vai ser arrolado
como testemunha. E vão perguntar para você sobre sua vida sexual. E você
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § vai ter que responder. A liberdade sexual, no que diz respeito ao início da ação
2º-A do art. 121 deste Código; (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021) criminal, tornou-se pública.
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de A razão disso é óbvia, porque muitos estupros não eram investigados porque
arma. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021) a mulher não dava autorização ao MP, para seguir adiante, e o MP ficava de
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à mãos atadas, e a mulher continuava sofrendo a violência. A pergunta é: é um
violência. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021) preço a se pagar?

§ 3º Somente se procede mediante representação. Por que estou falando disso? Eu sou contra isso. Porque para proteger a
liberdade sexual da mulher, você quebra uma barreira muito delicada. Você
Eu coloquei esse colorido para mostrar a complexidade desses dois tipos publiciza um bem jurídico que deveria ser tratado na esfera privada. Tem que
[perseguição e violência contra a mulher]. ter outra saída para isso. Eu não gosto de usar o direito penal para resolver
problemas de direitos humanos.
Porque eu estou mencionando esses tipos em específico? Porque se ameaça
já era complicada por ter vários elementos, imagina esses dois. Essa é uma O que eu quero mostrar é que essa liberdade sexual passou a ser interpretada
nova técnica legislativa, muito recente no modelo brasileiro, nos últimos 10 a partir de uma perspectiva pública, e não privada. Não é uma liberdade mais
anos e olhe lá. Construção de tipos muito complexos, que pretendem absorver apenas em uma perspectiva liberal. É uma perspectiva claramente social.
uma casuística muito ampla. E por que fazer isso? Porque representam não
tanto uma lesão a um bem jurídico bastante evidente, mas muito mais a um Estamos lidando com o problema de violência contra a mulher para além da
bem jurídico segundo interpretado socialmente. Quando eu estou falando em perspectiva individual. Não é “a mulher”. É o gênero. Estamos protegendo
perseguição e em violência psicológica contra a mulher, estou falando em algo todas as mulheres. E aí temos que pensar em uma perspectiva muito mais
muito mais amplo que simplesmente a liberdade da mulher. Eu não tô falando ampla que a liberdade individual.
de liberdade da mulher. Estou falando da liberdade da mulher como Por isso que o tipo é muito complexo.
socialmente a interpretamos. Vocês conseguem entender essa diferença?
Art. 147-B. Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu
Como tratamos o crime de estupro hoje? É uma ação pública penal pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações,
incondicionada. Mas o crime de ação pública penal incondicionada diz respeito comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
a um crime contra a liberdade sexual. Mas liberdade sexual de quem? É humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação
minha! Nenhum de vocês pode dizer algo sobre minha liberdade sexual, a do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde
menos que eu autorize. Minha esposa pode dizer algo sobre minha liberdade psicológica e autodeterminação: (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021)
sexual, porque ela é minha esposa, eu autorizo.
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não
constitui crime mais grave
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Causar dano emocional. O que é causar dano emocional à mulher? É mulher mais grave, desenhada como um crime contra a humanidade e em certa
só do sexo feminino, ou a interpretação é mais ampla? Certamente a medida até como uma variação do genocídio, em que um determinado grupo
jurisprudência vai interpretar com uma perspectiva muito mais ampla, como já persegue outro.
faz em outros tipos.
Não é neste contexto que o crime de perseguição entra no direito penal
O que é perturbar o pleno desenvolvimento? brasileiro, tal crime (contra a humanidade) não está tipificado pelo sistema
brasileiro.
É muito “ou”. Olha a complexidade disso.
O que temos no Brasil é o crime que se convencionou chamar de
Parece o tipo de tráfico de drogas. Basicamente, cabe qualquer coisa aqui. stalking:
Por que tem essa complexidade toda? Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio,
ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a
Eu resolvi pintar ali para vocês poderem ver os grandes blocos de elementos capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando
normativos do tipo. sua esfera de liberdade ou privacidade. (Incluído pela Lei nº 14.132, de 2021)
Por que temos a conduta dessa forma e por que isso escapa do Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
constrangimento ilegal? O que isso é diferente do constrangimetno ilegal. Não
é nada diferente. É uma releitura social do constrangimento ilegal. Uma Essa tipificação surge com a proposta de realizar especialmente a proteção da
releitura que não tem mais como bem jurídico a liberdade individual, como nós mulher, porque a mulher tradicionalmente é vítima desse tipo de crime com
trabalhamos no direito penal liberal, mas uma liberdade individual como maior frequência. Todavia, o artigo apresentado aplica-se a todos os
interpretada num contexto político cultural que pretende realizar funções indivíduos, apenas ressalto que, de modo geral, a maioria das vítimas do
constitucionais, em substituição à políticas públicas de garantia do direito. stalking são mulheres.
Se você tivesse uma política pública para garantia do direito da mulher, esse É importante observar que o stalking não é qualquer perseguição, trata-se de
tipo poderia estar incluso no constrangimento ilegal. uma perseguição reiterada. Ainda há dúvidas sobre o que a lei compreende
como “reiterada”. Por isso temos que interpretar de forma sistêmica, desta
O crime de stalking, por causa da casuística de rede social ele se tornou mais forma compreende-se que reiterada é aquela frequência capaz de impactar,
importante. A gente vai falar mais deles, mas é difícil falar desses tipos, alterar, a rotina do sujeito.
porque eles têm 1 ano. A gente vai começar a processar eles agora. A
doutrina fala, mas ainda não tem chancela jurisprudencial. Portanto, pesquisar o facebook de uma pessoa, por exemplo, não é um crime.
É necessário que haja algum constrangimento à liberdade da outra pessoa
24/10/2022 - Prt. ún. - 41 min. - OK para se caracterizar como crime, ou seja, é preciso que seja identificado um
Vamos dar continuidade a aula passada, onde começamos a tratar dos crimes dano.
contra a liberdade individual e eu cheguei a apresentar para vocês dois tipos Todavia é evidente que esse tipo de crime veio à tona com o avanço das redes
bem recentes, os quais não vou me aprofundar muito porque estamos ainda sociais, afinal a tecnologia facilita a prática do stalking. Apesar disso, o tipo
em uma zona muito escura no que se trata dessas duas espécies de tipo. penal não foi desenhado pensando apenas na perseguição digital, o artigo
CRIME DE PERSEGUIÇÃO abrange também as perseguições realizadas fora do espaço digital.

O crime de perseguição é um crime histórico, especialmente no direito penal Novamente ressalto que é necessário que a prática de perseguição ocorra de
internacional. Mas neste caso temos uma figura diferente, uma figura muito forma reiterada, a reiteração precisa estar evidenciada.

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Pergunta: Quando investigadores privados são contratados para investigar E como consequência, houve a extinção da figura da perturbação da
casos de infidelidade, por exemplo, configura-se como uma figura típica? R.: tranquilidade, antiga contravenção penal. Essa figura era mais ampla do que é
Eu imagino que sim, confesso que não sei exatamente como isso será a figura específica. Então, aparentemente seria possível manter as duas,
classificado pela jurisprudência, mas eu imagino que seja perfeitamente porque molestar alguém não envolve violência nem uma restrição exagerada
possível pois, se você olhar o artigo ele não exclui a possibilidade de que você da liberdade. De qualquer forma, o que se tem entendido é a tese de
cometa o crime através de terceira pessoa → contrate alguém para perseguir revogação da perturbação da tranquilidade. Fica só a forma mais grave agora,
outra pessoa. do stalking. Mas precisaremos ver como a jurisprudência vai lidar com isso.

Pergunta: Ainda sobre os profissionais investigadores, para a conduta ser Essa figura é explicável, tem razão de existência. Embora a gente pudesse
típica é necessário que a pessoa seja comunicada ou caso ela não saiba que reconhecer do ponto de vista prático no dia a dia como um sujeito persegue a
está sendo investigada não há tipicidade? R.: Presume-se que ela tem que vítima do ponto de vista físico, isso se tornou muito mais comum do ponto de
saber que está sendo perseguida, pois o tipo indica a necessidade de uma eletrônico. Eu não vou descartar a possibilidade de isso acabar acontecendo
restrição EVIDENTE da liberdade. Todavia é necessário esperarmos para ver no metaverso. Então dentro desse mundo cibernético, tem sentido você
como a jurisprudência vai tratar destas questões. Mas o tipo parece indicar a imaginar a criação desse tipo específico.
necessidade de que a pessoa sinta-se incomodada com a perseguição.
Agora mais difícil é o tipo da violência psicológica contra a mulher, porque é
Então essa posição aqui provavelmente indica a clara evidência da um tipo de uma amplitude gigantesca, que é na verdade uma variação do
necessidade de uma abstenção da liberdade. Veja, a abstenção não precisa constrangimento ilegal voltada especificamente para a proteção da mulher,
ser física no sentido de segurar alguém, como num constrangimento ilegal em dado ao fato de que as mulheres não sofrem só de violência física.
sua forma física. Mas ela implica num constrangimento de ir e vir. Eu não me
sinto à vontade de ir lá, não me sinto à vontade de sair da sala de aula porque Art. 147-B. Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu
o cara tá me esperando lá. pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
Novamente, precisamos esperar para ver como a jurisprudência vai lidar com humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação
isso. Mas o tipo parece indicar a necessidade de alguma restrição, algum do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde
incômodo, como me parece evidente isso em todos os crimes contra a psicológica e autodeterminação: (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021)
liberdade individual: eles demandam essa condição de liberdade (inaudível)
pessoal, não uma liberdade só espiritualizada. Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não
constitui crime mais grave.
É um crime bicomum, então qualquer um pode praticar e qualquer um pode
ser vítima, inclusive praticado por terceiro. Então pode ter coautoria: quando Esse tipo entrou em vigor em julho de 2021 e ele é absolutamente uma
eu contrato alguém para investigar a minha vítima, tem coautoria. incógnita. Eu não sei como é que o juiz vai aplicar isso.

A ideia é ter uma ameaça à integridade física ou psicológica da vítima, não um Qualquer coisa pode se enquadrar nesse tipo, especialmente pelo fato de que
mero incômodo. Algo que constrange, impede a pessoa de viver a própria vida o dano é muito difícil de ser quantificado. Em tese o dano psicológico deveria
em sua integralidade. ser atestado, mas até mesmo com a análise de um psiquiatra ou psicólogo é
uma coisa inescapável. É um tipo que muito provavelmente, por se tratar de
O que é essa ameaça à integridade física e ou qual é o nível da ameaça à um tipo penal bem aberto, vai ficar a cargo do juiz definir. Diferente de lesão
integridade física eu confesso a vocês que eu não sei dizer. É a casuística que corporal, que você pode definir de forma mais precisa, esse conceito de dano
vai nos dizer quando a ameaça estará evidente. Pessoalmente, eu acho que o emocional é talvez algo que a gente precise de uma definição mais técnica
tipo na forma da integridade física ou psicológica é bem evidente, tem que
evidenciar uma restrição psicológica ou física.
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Pergunta: Isso pode ser objeto de regulação por regulação, pela via necessária e conveniente, mas a construção do tipo [“dano emocional”, art.
administrativa, enfim…? R.: A gente não tem precisão nenhuma. Porque é 147-B, CP] é mais para você dar uma resposta à sociedade do que para se
difícil precisar esse dano. Então é difícil ter um critério muito claro. Pensar tornar eficiente.
numa regulamentação normativa disso até poderia, mas o problema é que
você não consegue definir exatamente qual é o nível ou o grau de dano que Saibam desses elementos, saibam dessa construção complexa e saibam que,
cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação. E aí a gente já estando o tipo no Capítulo dos Crimes contra a Liberdade Individual, alguma
transita entre a lesão corporal, por exemplo, mais a restrição de liberdade. restrição à liberdade individual o tipo deve ter. E não é o dano psicológico,
Então, quando você começa a falar em dano, você precisa dar um passo para porque não posso criminalizá-lo aqui, porque a gente não está falando do
trás: o crime [“dano emocional”, art. 147-B, CP] está no capítulo contra a crime de Lesão Corporal, a gente não tá nos crimes Contra a Honra, a gente
Liberdade e não no capítulo da Lesão Corporal, então você não pode exigir está nos crimes contra a Liberdade e a liberdade individual da mulher deve ser
um dano, uma lesão propriamente dita, porque o tipo se refere à Liberdade. O protegida. Embora, conforme o critério que eu disse na aula passada, a
tipo parece um pouco estranho, está num lugar [no CP] porque parece que liberdade da mulher, aqui, está publicizada. Essa liberdade não é a da
não tinha outro lugar para ele. Por isso que a jurisprudência vai nos salvar, mulher A, mas da coletividade das mulheres. É uma liberdade que ficou tão
esperamos. ampla que a gente parece proteger outros fins que não a liberdade individual,
mas ela tomada no contexto de todas as mulheres.
Pergunta: E o senhor não acha que poderia ser declarada a
inconstitucionalidade dessa lei …? R.: Acho que sim. Acho que, além da O raciocínio segue a linha do exemplo que eu dei sobre a Liberdade Sexual no
técnica legislativa [redação da lei, do tipo penal em si] ser muito ruim, o tipo é caso da mudança da Ação Penal no Estupro. A vítima [de estupro] não tem
tecnicamente ruim. O tipo penal é muito longo, muito amplo. E o tipo penal não mais a autonomia de escolher se quer ou não que o estupro cometido contra
parece atender à ideia de fechamento necessário do tipo. Para que o tipo ela seja processado. Se a pessoa foi estuprada e o Ministério Público
penal serve? Serve para dar previsibilidade ao cidadão, que é saber como o descobriu isso, não tem saída: vai adiante a ação penal sem perguntar para a
Estado vai atuar criminalmente e quando a minha conduta pode ser alcançada vítima. E isso é problemático porque a liberdade sexual individual da vítima é
tipicamente. De forma que, quando eu olho para o artigo 121, eu sei atingida em nome da necessidade da proteção da liberdade sexual de todos.
exatamente o que é “matar alguém”, qual é o resultado da minha conduta que Essa publicização de um bem jurídico que é naturalmente privado é
não é admissível. Aqui [“dano emocional”, art. 147-B, CP], eu não sei problemática na minha opinião e, nesse aspecto, eu sou bem liberal. Ou seja,
exatamente o que não é admissível. Então, talvez a gente pudesse o Direito Penal deve se preocupar com outras coisas que não as
reconhecer. Por exemplo, “...mediante constrangimento…”, uma demissão “espiritualizações do bem jurídico” para atender o impossível. Mas outros tipos
poderia causar constrangimento? Imagine a mãe de uma criança pequena? O são necessários e para isso deve-se desenvolver políticas públicas e não
chefe espera terminar os 06 meses [licença-maternidade] e manda embora. criminalização, políticas públicas para mulheres.
Isso não causa constrangimento? Não causa um prejuízo à saúde psicológica
e autodeterminação? Então, não sei até onde pode ir isso. Essa abertura Sequestro e Cárcere Privado é crime contra a liberdade.
exagerada do tipo pode ser algo que leve à declaração de Vejam: Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere
inconstitucionalidade. Eu, pessoalmente, acho que sim. E o problema disso é privado. Percebam a diferença desse tipo, que é clássico, com os mais
que você perde uma enorme oportunidade de criar uma tipificação importante recentes: o clássico é uma frase, três ou quatro elementos, uma fórmula de
para a proteção da mulher porque cria um tipo que quer pegar tudo. A cometimento. Um tipo muito mais refinado. Aí, você vai ter reclusão de um a
construção de um tipo que fosse mais lógica, mais eficiente, teria sido muito três anos. Muito mais grave porque você tá levando o constrangimento ilegal a
mais interessante para as mulheres do que a construção aberta adotada, que outro nível. Não é simplesmente impedir a pessoa de ir para lá é para cá, é
beira a inconstitucionalidade. Talvez fosse melhor não ter esse tipo e usar o você cercear a liberdade, tolher a liberdade de forma evidente, privando o
tipo do Constrangimento Ilegal, que é capaz de causar dano emocional. Eu, sujeito da sua liberdade. Aí, com uma pena bem maior, de dois a cinco anos,
pessoalmente, não gostei desse tipo. E, entendam, não é porque eu não outros casos bastante importantes.
pense na proteção específica da mulher, pelo contrário. A proteção é
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Seqüestro e cárcere privado Mas, do ponto de vista prático, não faz diferença. TALVEZ, somente no cálculo
de pena, já que deixar a vítima em um espaço aberto seria melhor do que a
Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere manter em um quarto isolado. Essa seria a discussão fundamental. Se eu saio
privado: (Vide Lei nº 10.446, de 2002) daqui e tranco vocês na sala de aula, de sacanagem, isso é um sequestro,
talvez um cárcere privado, MAS o importante é que eu estou restringindo a
Pena - reclusão, de um a três anos. liberdade de vocês! Mas e durante a prova, quando o professor não deixa o
§ 1º - A pena é de reclusão, de dois a cinco anos: aluno ir ao banheiro? Aí, o professor está no exercício regular do direito dele,
já que a lei o permite, de modo que ele está colocando restrições que são
I – se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente aceitas no sistema normativo.
ou maior de 60 (sessenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de
O bem jurídico é a Liberdade, mas, nessa espécie [Sequestro e Cárcere
2005)
Privado] fica muito mais evidente. Porque, como o crime é grave, está de fato
impedindo o sujeito de se deslocar.
II - se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou
hospital; O objeto material é a vítima privada de liberdade.
III - se a privação da liberdade dura mais de quinze dias. O sujeito ativo é qualquer pessoa.
IV – se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; (Incluído Cuidado: se o sujeito ativo é Funcionário Público, é Abuso de Autoridade e
pela Lei nº 11.106, de 2005) ainda cabe HC. Eu tranco o sujeito na cadeia sem autorização, de forma
ilegal, estou cometendo sequestro e cárcere privado, sanável por Habeas
V – se o crime é praticado com fins libidinosos. (Incluído pela Lei nº Corpus. Quando é contra Menor, é apreensão ou retenção abusiva e está lá
11.106, de 2005) no ECA. Apreensão é “prisão” de menor de idade.
§ 2º - Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à
detenção, grave sofrimento físico ou moral: sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem
Pena - reclusão, de dois a oito anos. escrita da autoridade judiciária competente:

Então, a primeira pergunta: Sequestro e Cárcere Privado, qual a diferença? Pena - detenção de seis meses a dois anos.
A resposta é que não tem diferença do ponto de vista prático.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem
Cuidado: não confunda com Extorsão Mediante Sequestro, que é um crime observância das formalidades legais.
muito mais grave, no qual você restringe a liberdade de alguém e pede o
resgate. Isso é um crime contra o Patrimônio e veremos adiante. Vejam que é algo bem específico por causa do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Eu estou falando, portanto, do Sequestro e do Cárcere Privado. A diferença
entre as duas figuras, para quem diz que tem diferença, Sequestro é um O sujeito passivo é qualquer pessoa, inclusive bebês e doentes mentais que
espaço um pouco mais amplo, enquanto que o Cárcere Privado é um não tenham a noção de sua liberdade. Ainda que a liberdade tenha uma
espaço mais restrito. dimensão individual, segundo a doutrina, estamos falando da possibilidade do
auxílio de terceiros. Então, quando impeço a liberdade de um bebê, estou
Por exemplo: se você tranca a pessoa em um quarto, seria Cárcere Privado; tolhendo a liberdade das demais pessoas, a sua família, de terem acesso ao
se tranca em uma casa, em uma chácara, é Sequestro. bebê. Esse impedimento é encarado como uma violação da ampla liberdade

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de acesso da criança a outras pessoas, evidenciando o crime. Ainda que a mudar a pena de privação de liberdade, impondo somente a pena de multa,
pessoa não se dê conta dessa condição, o crime existe. seria possível chamar isso de crime privilegiado. Esta posição, no entanto, é
minoria, pois a maior parte da doutrina vai dizer que trata-se de crime
A consumação do crime se dá com o impedimento de movimento. Então, não
preciso nem mover ninguém, é só impedir que a pessoa não possa se minorado.
movimentar. O crime já existe nessas condições.
Quando se fala que o juiz “pode substituir”, isso significa que o juiz deve
Clássico crime permanente, ou seja, aquele em que a conduta se prolonga no substituir - desde que os requisitos estejam presentes. Trata-se de um direito
tempo. A conduta mantém-se enquanto a liberdade segue restringida.
subjetivo do réu. A dúvida aqui mora na quantificação de valor. Cada
Existe uma dúvida fundamental sobre se é possível tentativa. Dá para tentar doutrinador tinha costume de criar seu critério. Antigamente tinha-se como
cometer cárcere privado? A dúvida é: por quanto tempo eu preciso restringir a base o “homem médio”, o que é um problema, pois este não existe - todas as
liberdade do sujeito para que o crime esteja consumado? Para a primeira pessoas são individualizadas. Por conta disso, a doutrina teve que
posição, não tem saída: (1) restringiu a liberdade, o crime está consumado; se estabelecer critérios mais estáveis. O Bittencourt, por exemplo, vai falar em
segurou a vítima, abraçou, crime consumado. A posição dois diz que por salário mínimo. O Prado vai falar em dependência das circunstâncias, que irá
pouco tempo, haveria (2) tentativa de cárcere privado. Mas ninguém sabe
quanto é “pouco tempo”, a doutrina não diz. E é circunstancial. A terceira variar de acordo com caso concreto (se for um furto de 500 reais em um cofre
posição diz que, se é por pouco tempo, por dois minutos, por exemplo, a (3) cheio de ouro, provavelmente será um pequeno valor, se for um furto de 500
restrição é insignificante, não há tipicidade, o crime [de sequestro e cárcere reais de alguém que ganhe 500 reais por mês, não. Esta análise circunstancial
privado] não é evidenciado. Mas poderia ser constrangimento ilegal. A será, inclusive, a posição majoritária da jurisprudência.
posição mais aceita é a 03.
Cuidado → pequeno valor é uma coisa e insignificância é outra. 200 reais
31/10/2022 - Parte ún. Eduarda
pode ser um pequeno valor, mas talvez não seja insignificante (insignificância
é algo irrisório, não chegando a lesionar o patrimônio de forma evidente,
[a gravação começa com a aula rolando] enquanto pequeno valor é algo um pouco maior).

FURTO PRIVILEGIADO Assim, não há uma definição exata.

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Além disso, também não se confunde com furto famélico, produzido pela
fome, que estaria justificado pelo estado de necessidade → pois, nesse caso,
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. não se falaria em pequeno valor (ainda que o sujeito pegue uma comida de
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa alto valor para se alimentar, isto estaria justificado). Vale lembrar que o furto
furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, famélico não se trata só de furto de comida, visto que seria possível enquadrar
diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. o roubo de um medicamento necessário para sobrevivência, por exemplo.

Apesar de levar esse nome, de furto privilegiado não tem nada. O que se tem Dito isso, o §2º ainda fala em criminoso “primário”. Este conceito por incrível
é uma forma de pena diminuída → trata-se de causa de diminuição de pena. que pareça não está claro, pois a lei não traz uma definição, não indica em
Há doutrina que critica esta ideia, dizendo que, havendo a possibilidade de se quais condições o criminoso seria primário. Sabe-se que o é o réu reincidente,
pois o Código Penal traz essa definição.
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01/11/2022 - Partes I e II. - 1 h 30 min. - Crislayne
O que se entende é que a primariedade não afasta quem tem maus
Furto qualificado.
antecedentes. Portanto, na interpretação que se tem dado para este
dispositivo, primário é o não-reincidente. Consequentemente, não é O professor iniciou a aula tratando sobre o uso de arma, arma de fogo, arma
reincidente, será beneficiado pelas circunstâncias, mesmo que já tenha tido branca, arma (...) roubo especialmente. O professor informou que há uma
alguma condenação anterior (o que caracteriza maus antecedentes). dificuldade em trazer um significado para o uso de arma para o uso restrito,
devido que nos últimos anos houveram 40 novos atos normativos trazendo o
que arma de uso restrito, uso permitido quando uma passa pra cá e passa pra
Aqui, vale lembrar que o STF mudou sua posição recentemente sobre isso.
lá, sendo complicado da gente trabalhar com isso. Ele acredita que agora
Em 2020, ele decidiu que quem tem alguma condenação e não seja chegou em uma racionalidade um pouco mais positiva devido que o estatuto
reincidente (pois teve uma condenação que não se encaixa na condição de de desarmamento trouxe uma medida importantíssima, trazendo uma das
reincidente), permanece com maus antecedentes. A dúvida existia pois existia primeiras políticas criminais lúcidas, eficientes e lógicas para o nosso Direito
um debate do tribunal - dependendo de onde o processo caia, existia uma Penal (...). O estatuto do desarmamento 2002/2003, trouxe a lógica de “arma
solução. Havia aqueles que entendiam que o sujeito não poderia ficar está na mão de funcionário público de segurança pública”, e se está na mão
carregando uma condenação de 30 anos atrás produzindo efeitos pelo resto do cidadão, tem uma série de requisitos para ter e tem que estar na casa dele,
não podendo ficar andando com a arma de lá pra cá. Essa lógica se manteve
de sua vida → não sendo, possível, assim, reconhecer os maus antecedentes
substancialmente bastante viável por pelo menos 15 anos, e agora que foi
e utilizar deles para estabelecer uma pena-base acima do mínimo. Isso liberada para o pessoal usar, se tornando uma situação bem preocupante. O
destruía a ideia de maus antecedentes, e, para o professor, tinha que destruir Professor comentou que conversa bastante com pessoas da segurança
mesmo - seria por isso que existiria o critério de reincidência. A questão é que pública (policiais em geral), e a pior coisa foi afastar o estatuto do
agora os Tribunais Superiores passaram a entender que condenações desarmamento, pois antes se o cara estivesse armado podia prender, agora
anteriores que não sirvam para caracterizar reincidência, a ser aplicada na quando encontra alguém armado às 03h00 da manhã há várias desculpas do
segunda fase do cálculo da pena como agravante, podem ser usadas para motivo de estar com uma arma do carro.
estabelecer um aumento da pena-base. Neste ponto, o professor retomou o conteúdo do furto. Na aula anterior, o
professor começou a apresentar os parágrafos do furto em que tem as causas
Este §2º está na mesma posição topográfica do §1º. O professor tinha de aumento e outras circunstâncias.
mencionado que o §1º se aplicava apenas o caput, pois seguia o caput,
Sobre o furto de energia, § 3º art.155:
especificando o caput e não a forma qualificada. Entretanto, o §2º, da forma
privilegiada, também está na mesma posição topográfica do parágrafo § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que
primeiro, todavia, a jurisprudência e a doutrina entendem que ele se aplica ao tenha valor econômico.
§4º (das formas qualificadas), pois é mais benéfica ao réu. Aplicar o §1º nas
Com o furto de energia a gente está lidando com coisa de imóvel, e coisa de
formas do §4º seria mais gravoso para o réu, ao passo que o §2º deve ser imóvel parece uma coisa muito mais substancial do que (...), o problema é que
estendido às formas do §4º haja vista que isso é mais benéfico para o réu. energia não parece ter essa mesma característica, embora ela seja móvel, ela
certamente não é algo (...) coisa, por causa de uma certa substancialidade, e
Assim, o §2º vai incidir também para as formas qualificadas. Na doutrina, seria é por isso que o parágrafo § 3° foi incluído no art. 155.
possível, inclusive, cometer um furto privilegiado (§2º) durante o repouso
A gente está falando aqui da energia, do gerador. Cuidado, nem sempre será
noturno (§1º). furto, pois dependendo do método que se usa para furtar energia pode ser um

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estelionato. A energia que chega na nossa casa, chega por um relógio, pela O fato é que não há uma posição, pois o STF diz uma coisa, o STJ outra, há
rede pública, e a energia que passa pelo relógio é nossa, é o que é cobrado algumas decisões isoladas, como no TJ do Rio Grande do Sul dizendo que é
da gente. O trâmite conhecido como “gato”, é aquela ligação feita antes do estelionato. Ficando sem solução o caso.
relógio, justamente para que ela não seja computada no meu gasto, essa
ligação é ligada no posto de luz, sendo o furto de energia. Se eu faço uma A doutrina também quer dizer que é crime cibernético, havendo uma
alteração no medidor para desconfigurar, ou para alterá-lo de alguma maneira, divergência.
não estou praticando furto, estou praticando estelionato. A mesma coisa pode
acontecer com água. Na opinião do professor não dá para encaixar no § 3° do art. 155, pois
precisamos fazer uma interpretação estrita da lei penal, e se não conseguimos
Ex.: As pessoas colocavam dentro do cavalete um arame, travando a encaixar perfeitamente na lei, não podemos estender o tipo de forma
ventoinha que faz a contagem do medidor, isso é um estelionato. imprevista.

O estelionato é o raciocínio de enganar a empresa, usando uma difícil (...). Furto qualificado:
Diante de um crime permanente, você furta a energia enquanto ela está
passando. Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Há a possibilidade de furto de energia solar, nuclear e outras que existem. Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Também é possível o furto de energia genética, como o furto de sêmen a qual § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o
se fala da carga genética daquele sêmen e não de um produto. repouso noturno.
Ex.: Furto do sêmen do boi premiado. § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz
Furto de sinal de tv a cabo, estamos diante de um furto de energia? Esse pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois
assunto gera enormes debates, pois não é propriamente energia, pois energia terços, ou aplicar somente a pena de multa.
é o que alimenta o sinal, é um sinal eletromagnético, criando um problema na § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que
jurisprudência sem solução até hoje. tenha valor econômico.
Em 2011 o STF disse que sinal de tv a cabo não é energia, não podendo ser Furto qualificado
objeto material de delito do art. 155 §3°, mas o STJ em 2013 disse que sinal
de tv a cabo pode ser equiparado com energia. § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é
cometido:
O debate não mudou, continua o mesmo. O STF dizia que há uma
regulamentação da tv a cabo que dizia o seguinte: "constitui ilícito penal, a I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
interceptação ou a redução não autorizada dos sinais de tv a cabo”, só disse
isso, não tem pena. É um ilícito penal, mas não tem pena. II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

Pergunta: O art. 35 poderia falar aos moldes do art. 155, ficaria adequado? III - com emprego de chave falsa;

Resposta: Poderia, ele poderia fazer uma (...), não é incomum, inclusive IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
existe uma súmula no Código Penal que faz isso, estabelece o tipo e a pena, a
mesma do tipo tal. Então não estabeleceu crime, e se estabeleceu crime, é do § 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver
tipo incompleto. A gente chama de tipo incompleto aquele que não define a emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
sanção, ou que faz (...) a outra, o que não é o caso aqui, ele não tem sanção. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018)
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§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto Resposta: Ele fala em rompimento ou destruição, precisa romper/quebrar de
mediante fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, fato.
conectado ou não à rede de computadores, com ou sem a violação de
mecanismo de segurança ou a utilização de programa malicioso, ou por Pergunta: Se abriu a porta (...)
qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei nº 14.155, de
2021) Resposta: Daí você tem outro dispositivo, o emprego de chave falsa.

§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do Nota: Para ser furto qualificado é necessário o rompimento externo, caso
resultado gravoso: (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) contrário será simples, sendo necessário romper o obstáculo para furtar a
coisa.
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado
mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional; Ex.: Arrombar a garagem para furtar o carro.
(Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) Pergunta: (...)
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra Resposta: Ele é do carro, ele faz parte do carro, essa é ideia. Você está
idoso ou vulnerável. (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) furtando o carro, quebrou o vidro para furtar o carro, o vidro é parte do carro e
§ 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo não um obstáculo ao carro. Agora, quebrar o vidro para furtar a bolsa é
automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. diferente, você está quebrando o obstáculo para alcançar o bem.
(Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996) Pergunta.: (...)
§ 6o A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de Tem um debate na doutrina sobre se precisa arrombar o obstáculo antes ou
semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em depois, pois posso precisar arrombar o cadeado para sair. E aí caracteriza ou
partes no local da subtração. (Incluído pela Lei nº 13.330, de 2016) não a qualificadora? Há um debate na doutrina sobre isso, o professor não
§ 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a achou a posição da jurisprudência instável.
subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou Ex.: Entrei por uma janela aberta, mas não consigo sair por ela, vou ter que
isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. arrombar o cadeado para sair.
(Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018)
O professor acha que parte da doutrina entende que sim, qualifica, pois se fala
Aqui estamos falando de qualificado porque temos uma nova pena, uma pena em rompimento para a subtração da coisa e não para o acesso à coisa.
maior. Pena: reclusão de 2 a 8 anos, ou seja, dobrou a pena.
Segunda qualificadora: com abuso de confiança, ou mediante fraude,
Inciso I fala em violência contra coisa, obstáculo ou subtração da coisa. escalada ou destreza. Abuso de confiança é (...) de uma relação, ainda que
Rompimento de obstáculo significa abrir uma brecha, arrombar, descolocar, rápida entre as pessoas envolvidas. Se cria confiança da vítima, do
empurrar a porta para entrar, forçar um cadeado até que ele abra, isso é a proprietário, do detentor da coisa, e a partir disso, se abusa dessa confiança,
ideia de um rompimento de obstáculo. Pode ser interno ou externo, sendo engana a vítima.
como o arrombamento de uma gaveta interno, ou externo, como o
arrombamento da porta para entrar no lugar com um pé de cabra, alicate, ou Ex.: A colega está de olho no celular e não deixa eu furtar o celular dela, mas
qualquer coisa que faça romper ou destruir o obstáculo. eu peço pra ela pegar a chave no meu armarinho lá na secretaria, ela levanta
e eu furto o celular. Eu abusei da confiança dela.
Pergunta: Necessariamente precisa ter uma violação desse obstáculo ou
pode (...)?
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Ainda que a confiança seja estabelecida de forma rápida, ainda sim há o Resposta: Sim, seria um furto, você pega a mais do que deveria, podendo ser
abuso de confiança. qualificado. Ficando com o resto, caracterizando apropriação indébita.

Nota: Cuidado, não é apropriação indébita, pois na apropriação indébita a No furto eu me aproprio contra a vontade do detentor, na apropriação indébita
vítima entrega o patrimônio para o autor usar. eu me aproprio me aproveitando da seção da transferência da posse daquele
bem.
Pergunta: No shopping tinha um moço que pediu para uma pessoa cuidar do
celular dele, se essa pessoa se apropriar do celular dele, seria apropriação Pergunta: (...).
indébita?
Resposta: Apropriação indébita, ela tinha a coisa de forma lícita, no momento
Resposta: O professor acha que seria um furto, porque na apropriação em que ela foi chamada a devolver e ela não devolve, caracteriza apropriação
indébita a transferência do patrimônio se dá de forma lícita e com sentido de indébita (...).
transferência mesmo.
Comentário: Acontece muito no ambiente de trabalho, quando as pessoas
Ex: Eu empresto meu carro pra você usar um dia para ir para algum lugar por estão em home office e pegam computador emprestado da empresa e não
um certo período de tempo mais ou menos definido, numa lógica essa relação devolve, na empresa do Lucas fizeram um processo de descontar de quem
não chega a ser uma relação estável (...). Se você cria uma situação ao ponto não devolve.
de poder ficar com a coisa que eu te entreguei, seria um furto nessa forma. Na
apropriação indébita você tem uma estabilidade na transferência da posse Resposta: A ideia é que se tiver uma apropriação indébita, você tem que
maior e mais estável. No furto você não transfere a coisa. devolver e não devolve, querendo ter a coisa para si, que caracteriza a
apropriação indébita (...).
A pena é maior quando há abuso de confiança porque estou aproveitando da
confiança, sendo mais reprovável que simplesmente furtar (...). Pergunta: (...)

Na apropriação indébita há a transferência voluntária da coisa ao sujeito que Resposta: Tentativa do crime tentado, são dois elementos, a gente precisa do
comete o furto, sendo a transferência lícita. Há uma inversão da posse (...). elemento objetivo e a gente precisa do elemento subjetivo. No teu exemplo, o
elemento subjetivo está bem claro “eu quero ter a coisa pra mim”, o elemento
Pergunta: No meu trabalho houve uma situação que agora fiquei em dúvida, a objetivo curiosamente na apropriação indébita/furto (...).
neta que usa o cartão previdenciário da vó pra fazer compras, ela abusa disso
comprando coisas pra ela, parece uma apropriação indébita? A fraude faz parte da segunda qualificadora, e ela é feita por meios ardilosos
para burlar a confiança da vítima. Aqui o agente usa algum meio para enganar
Resposta: É, mas tem lei especial, é uma apropriação indébita, mas o o sujeito. Quando se fala de meios ardilosos, é necessário ter algum esquema,
estatuto do idoso regula. não é simplesmente falar. O esquema pode ser criar uma imagem, trocar o
objeto, etc.
Pergunta: Se o senhor falar pra ir pegar R$ 100,00 no banco, mas ela vai lá e
pega R$ 1.000,00, parece furto? Ex.: Eu quero ficar com o celular dela, pego uma caixinha de celular e jogo
fora e quando a vítima está desatenta pego a caixinha e coloco no lugar,
Resposta: O professor não se lembra, mas acha que no estatuto do idoso sendo que a vítima olha e acha que o celular está lá, mas na verdade eu já
absorve as duas formas, tanto seria essa que seria mais um furto do que peguei o celular.
naquela forma do abuso de confiança na apropriação indébita.
A caixinha é o meio estratagema para fraudar a vítima.
Pergunta: Se fosse uma pessoa normal?

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Nota: Cuidado, no estelionato eu engano a vítima para me entregar de livre Pergunta: (...) Vale só para o acesso à coisa? Porque parece que a maior
espontânea vontade, enquanto que no furto qualificado eu engano e pego a dificuldade é sempre depois que já está com a coisa, pois tem o peso da
coisa de forma que confunde a vítima, mas sem a livre espontânea vontade coisa, tem que tirar do ambiente em que ela se encontra.
dela.
Resposta: Não, aplica-se a qualificadora inclusive para sair com a coisa.
Fraude e abuso de confiança podem ser muito próximos? Há casos em que as
duas irão acontecer juntas, mas o legislador nomeia e diferencia as duas para Terceira qualificadora: chave falsa, a qual é outra chave diferente da
não ter o risco de não conseguir pegar quando for só um. verdadeira, que tenha ou não forma de chave. Pode pegar uma chave, a qual
é a chave “mestra” e usar. Pode usar “gazua”, que não é chave, a lixa
Ainda na segunda qualificadora, há a escalada, a ideia é usar algum meio que também se usa e não é chave, mas ela se adapta.
envolve algum esforço maior do que o normal para furtar a coisa. Pode ser
pular o muro para furtar uma bicicleta, mas não precisa ser isso, a ideia é Quarta qualificadora: concurso de pessoas, consiste em uma ajuda a outra a
acessar um lugar com maior dificuldade. A ideia aqui é uma conduta de maior subir o muro e etc. Sempre tem que ter duas pessoas ou mais. Concurso com
reprovabilidade, reflete portanto no sujeito que tem mais audácia para prática menores e imputáveis também contam.
do crime.
Alteração recente 2018: § 4° a pena de reclusão de 4 a 10 anos, se houver
Ex.: O cara cava um túnel para chegar no cofre que ele quer furtar. emprego de explosivo ou de (...) que causam perigo comum. Aqui está sendo
criminalizado de forma específica o furto de caixa eletrônico. O pessoal pega
Se fala em escala porque é o que normalmente o pessoal faz, como pular um o dinamite, explode o caixa para ter acesso ao dinheiro que tem lá dentro.
muro, subir no telhado, etc. A doutrina diz que se não houver um esforço Hoje é crime hediondo. Cuidado, se o explosivo é o meio para o furto, só há o
maior não é escalada. crime de furto.

Ex.: O dono da casa estava arrumando o telhado e deixou um buraco lá e uma Outra alteração recente é de maio de 2021, a pena de reclusão do furto
escada encostada e o indivíduo se aproveita da facilidade para furtar a casa. “cibernético”( o professor chamou assim) é de 4 a 8 anos e multa. O furto é
mediante fraude, e é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou
Nesse caso não é escalada, pois não há um maior esforço. Tem que envolver informático, conectado ou não a redes de computadores com ou sem a
maior esforço porque o nosso tipo quer (...) quem é esse de maior reprovação, violação de mecanismo de segurança com a utilização de programa malicioso
porque sua pena é maior. E quem merece uma pena maior é quem se esforça ou por qualquer outro meio (...). Aumenta um terço ou dois terços se o crime é
mais para cometer o crime. praticado mediante utilização de servidor fora do território nacional ou se o
crime é praticado contra idoso ou vulnerável. A gente ainda não tem
Destreza é uma extrema habilidade de dissimulação para conseguir enganar. jurisprudência, pois é um tipo bem específico, mas se tornou bem comum nos
Pergunta: (...) últimos tempos. A ideia é qualquer jeito que consiga acessar a senha de
terceiro assim ter acesso a conta e furtar seu dinheiro.
Resposta: Sim, pode ser, se for uma destreza (...).
Pergunta: (...)
Nota: Cuidado, se não der certo, não se aplica a qualificadora, pois não há
destreza. Se o cara tentou fazer a coisa e não deu certo é porque ele não tem Resposta: A ideia é o seguinte, deixando claro que a vulnerabilidade
a destreza necessária pra fazer a coisa. A jurisprudência entende que não cibernética não faz diferença, com ou sem violação de segurança, ninguém
basta tentar, tem que conseguir. tem o direito de enganar para pegar as senhas.

Pergunta: São dois casos, um hacker que invade o Instagram, o Facebook


rouba a senha ou daqueles casos do cartão com tecnologia de aproximação, o
Giocondo viu que estava tendo um alerta para as pessoas tomarem cuidado
23
em relação a essas coisa, qual dois se encaixam mais com o crime “furto de uso” – ou seja, subtração da coisa para uso (inaudível), quando eu
cibernético? não tenho a intenção de retê-la para mim para outrem.
Resposta: Professor falou que sabia que haviam pessoas com maquininha de
Ex: se eu pego o celular de alguém para fazer uma ligação pretendendo
cartão que estavam encostando na bolsa para o cartão passar, nesse caso o
professor ficou em dúvida. Ele disse que a gente vai precisar de um apoio da devolver, eu não o estou furtando, porque, embora eu esteja me apropriando
jurisprudência para resolver esses casos. Mas na opinião dele, é fraude. de coisa alheia móvel, eu não a direciono para mim ou para outrem –
consequentemente, eu estou diante de um “quase-furto”, ou o que a nossa
Furto de veículo enviado para outro estado ou exterior, por exemplo levar para doutrina vai chamar de um “furto de uso”.
o Paraguai, pois er comum porque lá era fácil de emplacar carro. Cuidado, tem
que ser veículo automotor, e tem que ser para outro estado ou exterior. Para Alguns (inaudível) o espanhol, o da Alemanha, mencionam expressamente o
outro município não qualifica.
furto de uso – e é possível criminalizá-lo expressamente. Esse não é o nosso
Pergunta: (...) modelo: seja por omissão ou por opção político-criminal, esse tipo não é
contemplado pela legislação brasileira. Se você pegar um carro para dar uma
Resposta: Prendiam os carros na divisa, na fronteira, aí a jurisprudência volta pretendendo devolvê-lo ao dono do carro, você não estará cometendo
colocava em cheque, há uns 5 anos a jurisprudência estabilizou no STJ no
crime de furto.
sentido de que se as circunstâncias deixaram a entender que o veículo seria
levado para o exterior ou outro estado, é qualificado.
Pergunta: roubaram o carro do meu cunhado mas devolveram no dia
Se o bem for semovente domesticado, como boi, ovelha e etc, ainda que seguinte, mas ele estava armado
abatido e dividido em partes no local a pena será de 2 a 5 anos.
R: Então é roubo; se houver caracterização do crime de roubo, se afasta o
Pena de 4 a 10 anos se a subtração for de substância corrosiva ou acessória.
furto de uso – se atentem aos art. 155 e 157.
Aqui é o furto de explosivos.

07/11/2022 - Parte ún. No entanto, podemos pensar na possibilidade de o sujeito dirigir um furto de
uso para outro crime.
O elemento subjetivo do crime de furto demanda uma direção especial da
vontade. Portanto, temos o que alguns autores chamam de “dolo específico” e Ex.: quero praticar um assalto a banco e pego um carro, abro-o, uso-o para o
“dolos especiais”; para outros, entretanto essa especial direção da vontade assalto e deixo ele sem nenhum dano em algum outro lugar, a gente teria um
seria um elemento subjetivo especial do tipo, que não se confunde com o dolo. furto de uso. Claro, é muito difícil você classificar o elemento subjetivo nesse
De qualquer maneira, as duas concepções partem de uma especial direção da caso – o elemento subjetivo exige que não seja para si ou para outrem, mas
vontade, de modo que, para a conduta de furto seja subjetivamente típica, ela não tem como saber se não é para si ou para outrem num caso desses. É
tem que ser envolvida pela apropriação dirigida para si ou para outrem uma questão de prova – não tenho dúvida que o MP envolveria a
–falamos, portanto, de uma forma de dolo especial que participa do responsabilização por furto e roubo, e deixe que a parte comprove que não há
direcionamento especial da vontade. Ausente esse elemento dessa vontade, “eu não queria para mim/outrem, foi uma retenção momentânea unicamente
ausente estará a tipicidade dessa conduta de furto – e o que nós teríamos, para fazer o roubo” – ninguém conseguiria produzir essa prova! Mas, fato é
nesse caso, é o que a doutrina e a jurisprudência passaram a se referir como que, nesse caso, se eu furto um carro, me aproprio do carro para fazer alguma
coisa e devolvê-lo no mesmo lugar, não é crime de furto – não há a destinação
específica da vontade para si ou para outrem.
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Pergunta: e se eu deixar um carro no estacionamento, na retirada o tanque Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem,
está mais vazio do que quando se entregou? mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por
qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
R: Poderia dizer que houve o furto da gasolina, mas teria que analisar se o
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
resultado é insignificante, poderia dimensionar o valor do carro, da gasolina,
etc. Ainda assim, quanto ao automóvel, seria furto de uso. § 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa,
emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a
Vale assinalar que a jurisprudência entende que, se não há devolução ou se o impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.
apropriador do bem for pego no meio do caminho, está caracterizado o furto –
presume-se, na falta de devolução, caracteriza-se a apropriação para si ou § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
para ontem – o professor entende que é equivocado, mas mesmo assim é a (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018)
interpretação que tem sido feita.
I – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018)
Pergunta: O que acontece se a pessoa não se apropriou para si ou para II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;
outrem? Quando a direção da vontade subjetiva do ator não se dirige para a
apropriação? Por exemplo: como uma brincadeira com um amigo) III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente
conhece tal circunstância.
R: Nesse caso é furto de uso e a conduta é atípica. Como o tipo exige
apropriação para si ou para outrem, para que a conduta seja subjetivamente IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado
típica, ela obrigatoriamente tem que ser direcionada para si ou para outrem. para outro Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de
1996)
Não tem saída: precisa da direção da vontade.
V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua
Pergunta: Houve um caso do Rio de Janeiro em que pessoa pegou carro liberdade. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)
estacionado no fórum, levou para casa, passeou, foi fotografado, mas depois
devolveu. VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que,
conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou
R: Poderia configurar crime contra a administração da justiça, mas não um emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018)
furto – se não foi detido antes da devolução, não configura furto.
VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma
branca; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Furto de coisa comum: sujeito que se apropria do patrimônio do qual é titular
juntamente com outrem, que é lesado – sujeito que furta patrimônio do § 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): (Incluído pela
condomínio, por exemplo – detenção de 6 meses a dois anos – uma pena um Lei nº 13.654, de 2018)
pouco menor. É um dos tipos mais raros, não vale muito a pena reter-se nele.
I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo;
(Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018)

Roubo

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II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de uma questão bem complexa - cabem, é claro, críticas a aplicação de um
explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. (Incluído padrão jurídico europeu a uma sociedade como a nossa etc.
pela Lei nº 13.654, de 2018)
Entretanto, com o crime de roubo, não se fala mais somente no patrimônio,
§ 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de
mas na integridade física da vítima – é um crime pluriofensivo, que atinge
arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista
no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) mais de um bem jurídico. Possível uma discussão acerca dos níveis de
violência, mas não é possível desconstituir a necessidade de criminalizar esse
§ 3º Se da violência resulta: (Redação dada pela Lei nº 13.654, tipo de conduta. Não é uma realidade, mesmo entre abolicionistas; o crime
de 2018) atenta contra o patrimônio, o bem-estar, a liberdade, a vida, tornando-o um
“tipo necessário”, como o estupro, o homicídio, a corrupção, etc., dos quais
I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito)
não se pode escapar.
anos, e multa; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018)

II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa. É um tipo criminal bastante estável, pois a configuração dele envolve a
(Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) subtração do patrimônio anexada à violência, levando a uma pena muito maior
– de 4 a 10 anos.

Mas há formas particulares, que nós vamos chamar de roubo circunstanciado


Vamos aonde interessa, a figura do ROUBO: sua casuística é absolutamente ou roubo qualificado.
importante. O número de pessoas encarceradas por roubo chega a
representar 25-30% da população carcerária. Nota: Acerca das alterações legislativas, houveram poucas substanciais até
2018 – mas desde então houve uma alteração bem mais ampla, criando uma
É um tipo que, embora haja uma discussão, como o furto, acerca da verdadeira bagunça normativa, segundo o professor – o que, como o roubo é
apropriação do patrimônio, há uma distinção importante: isto porque, enquanto um crime muito comum no Brasil, a possibilidade de divergência
no furto é discutível uma restituição patrimonial, o roubo já envolve a violência: jurisprudencial é bem grande, que precisa ser resolvida no STJ – e é somente
e realmente o roubo, praticado com ameaça ou violência contra a pessoa, agora que essas divergências jurisprudenciais estão chegando no STJ. Então,
possui uma reprovabilidade imensamente maior, com uma apropriação do a jurisprudência sem dúvida vai mudar nos próximos anos – quem vai fazer o
patrimônio de maneira muito mais “baixa” que a apropriação de furto, levando exame da ordem precisa ficar atento aos novos casos e decisões que
o crime a outra dimensão. Não raro está ligada a carreiras criminosas, ao sobrevierem – não há como explicar muita coisa de forma definitiva, pois ainda
sujeito que se dedica ao roubo como forma de vida, uma forma rápida de se estamos em fase de discussão e desconstrução.
conseguir dinheiro com um risco bastante pequeno, já que, com violência ou
ameaça, a vítima com quase certeza vai entregar seu bem sem hesitação. Exemplo: alteração de 2019:

Estamos falando de uma espécie muito delicada, inclusive do ponto de vista Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave
criminológico: digo isso porque, por um lado, o crime furto é mais fácil de ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio,
analisar criminologicamente por envolver somente patrimônio, abrindo reduzido à impossibilidade de resistência:
caminho para uma crítica bem ampla nessa questão patrimonial, além de uma
expansão para outras questões, como o patrimônio intelectual, cuja proteção é
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§ 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de Pergunta: é necessária uma arma para essa grave ameaça, uma arma
fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput branca...?
deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
R: Não, a ameaça de agressão física é suficiente. “Vou te bater” – mesmo que
O que caracteriza, aqui, “arma de fogo de uso restrito ou proibido”? Não está não haja diferença de porte físico, etc., se isso é suficiente para tirar a
claro – algumas armas são restritas administrativamente, outras no âmbito capacidade de reação do sujeito, configura roubo. Bater/agredir é grave
legal, etc. A jurisprudência não conseguiu adstringir exatamente o significado. ameaça.

Continuando, tudo o que já foi dito acerca do patrimônio de aplica aqui, com a A complexidade do Roubo vem, acima de tudo, da junção de duas figuras
cautela de que há violência, o que a coloca numa posição de certa maneira típicas, sendo necessário separá-las: de um lado, nós temos o crime de
oposta ao furto: no furto a gente tem entendido alguma dimensão relativizante, violência ou ameaça; de outro, o de furto.
a fim de reduzir a pena a ponto do crime se enquadrar na competência do
Juizado Especial Criminal, podendo admitir reparação do dano. Elemento substancial para a caracterização do crime de roubo: subtração –
mesmo do crime de furto – reduzir ou afastar o poder de disposição que o
No roubo, o discurso é contrário – se direciona ao aumento da pena, do vigor, sujeito passivo goza sobre um objeto – violência ou ameaça encontram
a resposta penal contra um sujeito que se utiliza de apropriação violenta do relevância aqui: seu emprego diminui a capacidade do sujeito passivo de
patrimônio, o que não pode ser tolerado – vamos ver os raciocínios impedir a subtração, mas esta última se mantém como elemento substancial
desenvolvidos hoje sobre o crime de roubo – o que é agravado pela grave do tipo.
situação nacional, político-criminalmente, em vista do número altíssimo de
roubos, que precisa de uma resposta adequada. A subtração ocorre sem o consentimento da vítima e de forma livre – isto é,
por meio de qualquer forma de coação violenta ou ameaça.
Resposta inadequada na política criminal brasileira, que é pensada numa
lógica de retribuição – espera-se que o roubo aconteça para dar uma resposta Sobre o objeto: coisa móvel alheia – todo objeto mobilizável mediante ação
legal. Necessário uma lógica preventiva. Como? Incerto; mas a vigilância, física. “Mobilizável” aqui seria qualquer desligado de bem imóvel – uma janela
talvez eletrônica, pode ser uma saída inteligente, segundo o professor – é um bem imóvel enquanto estiver ligado à parede, mas torna-se móvel, por
captura de imagens, policiamento amplo, etc. Há inúmeras propostas, mas a exemplo, quando é retirada durante uma reforma. O objeto deve ser coisa
necessidade de mais eficiência é inegável. alheia, isto é, de titularidade de outra pessoa: exclui-se aqui o res publicum, o
bem comum, sem titular – ex. areia da praia, cuja apropriação não configura
Pergunta: o que seria uma grave ameaça? Existe uma leve ameaça? “Senão crime de furto ou roubo (crimes contra a pessoa), mas pode configurar crimes
você vai ver só” ambientais ou contra o patrimônio público.

R: A ideia é justamente não haver um limite muito baixo. “Me dá teu celular Violência ou grave ameaça: elementos cruciais para diferenciar o roubo do
senão te dou um peteleco no nariz” – é uma “ameaça” leve. Ameaça grave é furto – as duas se confundem e se sobrepõem em grande medida – uma
aquela que tem um condão de diminuir a tua resistência, a sua proteção para ameaça pode configurar uma violência moral.
com o seu patrimônio. É uma ameaça que te tira a capacidade de reação, que
causa sério receio de que o furto possa se tornar roubo.

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Ex.: se uma pessoa de porte físico ameaça te agredir se você não lhe R.: Talvez pudesse ser entendida como grave ameaça, de fato, mas nesse
entregar um certo bem, por mais que seja uma ameaça, o constrangimento da caso nós já temos o tipo específico da extorsão. Entretanto, não é possível
situação pode configurar violência moral. separar claramente a integridade física da mental – a diferença entre roubo e
extorsão não é clara. Alguns dizem que o momento da violência faz a
A violência ou ameaça sempre, obrigatoriamente, se dirigem a uma pessoa, diferença, mas aprofundaremos essa questão quando formos falar de extorsão
podendo ser direta (contra a vítima da subtração) ou indireta (contra terceiros. especificamente.
Ex.: assaltante aponta a arma para o filho do assaltado). Violência indireta
pode ser dirigida, também, a um objeto importante; entretanto, o objetivo deve Pergunta: Então essa grave ameaça à pessoa tem que ser à vítima
ser sempre causar efeito sobre a vítima – isto é, atinge-se o objeto para envolvida? Se o assaltante pede o celular da mãe, mas aponta a arma pro
produzir violência moral ou grave ameaça à vítima. filho, por exemplo.

A violência também pode ser própria (a violência em si) ou imprópria (outro R: É roubo sim – é o caso da violência indireta, como já mencionado. O cerne
meio capaz de reduzir a resistência da vítima – Ex.: uso de drogas ou de da grave ameaça está menos no potencial dano ao sujeito, e mais na
álcool; induzir o indivíduo a embriagar-se; jogar “boa-noite cinderela” em sua diminuição de sua resistência à apropriação de seu patrimônio que a ameaça
bebida – meio não diretamente violento, mas que diminui sua resistência à causa.
subtração).
Relembrando: estamos diante de um crime complexo e pluriofensivo; atenta
Sobre o caso da grave ameaça: envolve infundir terror, isto é, coagir ao patrimônio e mais alguma coisa, como a liberdade individual, a integridade
psicologicamente a vítima a ponto de “tomar” a vontade da vítima e impedi-la física, ou a vida – uma dessas três será atingida pela violência.
de defender seu próprio patrimônio. Também não pode ser uma ameaça
futura, mas imediata ou próxima. Ex. 1: Ao apontar a arma e dizer “passe o teu dinheiro”, eu estou atentando
contra a liberdade individual;
Ex.: ameaçar disparar arma de fogo contra um indivíduo constitui grave
ameaça; ameaçar voltar para casa, pegar uma arma lá, retornar ao local e Ex. 2: ao atirar no pé da vítima para pegar o seu celular, estou lesionando a
atirar contra a vítima não, pois há formas da vítima fugir dessa violência integridade física;
ameaçada.
Ex. 3: quando mato a vítima para roubar seu celular, cometo um latrocínio
Ainda, ameaça deve ser verossímil – Ex.: “eu possuo um pacto com uma (roubo seguido de morte), violando seu direito à vida.
entidade; se eu estalar os dedos, você vai morrer” – é necessário que
constitua ameaça real e credível do ponto de vista material, não em ameaças Como o bem jurídico ofendido é plural, o objeto material é duplo: a coisa
sobrenaturais; a crença da vítima nessas ameaças sobrenaturais pode levar a apropriada + a pessoa submetida à violência.
constituição de fraude, estelionato, etc., mas não em roubo propriamente dito.
Sujeito ativo: qualquer pessoa, mesmo o proprietário do bem, segundo alguns
Pergunta: Para classificar o roubo, precisa se relacionar com a integridade – sobre isso há menos divergência doutrinário do que no caso de furto, já que
física da vítima? Ameaçar alguém a exposição ao ridículo na internet seria, na se o proprietário tenta roubar do possuidor, ainda há a gravidade da violência,
verdade, extorsão? que se sobrepõe a da apropriação; mesmo assim, a controvérsia acerca da
questão se mantém, apesar de minoritariamente.
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Sujeito passivo: qualquer pessoa – ainda menos dúvidas que acerca do sujeito
ativo, embora haja discussão acerca da propriedade do objeto quando Arma própria seria no sentido daquilo que é feito pra violência, ex: arma de
desvinculada da posse pode ser problemática: assim como no caso do furto, o fogo, adaga, espada. Arma imprópria seria aquela que não é feita para o fim
da violência mas pode ser usada para isso, ex: chave de fenda, alicate.
sujeito ativo que rouba o objeto do possuidor não alcança o proprietário
diretamente; ainda assim, a presença de violência ou grave ameaça deixa Fora esses conceitos há em paralelo o conceito de Arma Branca, é arma
menos espaço para desídias doutrinárias própria que não é de fogo, ex: Espada, faca. Ela serve para matar, serve para
ferir. Há na legislação uma questão acerca do porte de arma, a legislação trata
Diante da pluriofensividade do crime de roubo, que atenta tanto contra a coisa de toda e qualquer arma, uma contravenção penal, pois define que sair de cas
quanto contra a pessoa, é plenamente possível que este seja praticado contra apenas sem o registro de arma é contravenção.
proprietário, detentor e possuidor.
“Art 3º (…) XI - arma branca: artefato cortante ou perfurante,
Ex: Alugo meu celular para A, que o empresta para B – se alguém roubar o normalmente constituído por peça em lâmina ou oblonga”.
celular de B, pouco importa o titular do patrimônio: a violência/ameaça atinge o
violentado/ameaçado, reconhecendo-se o crime de roubo. LCP - Decreto Lei nº 3.688 de 03 de Outubro de 1941
Art. 19. Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta,
22/11/2022 - Partes I e II - 30 min. - Hudson
sem licença da autoridade:

Porém há também a de porte de arma de fogo, num artigo específico sobre o


porte de armas, porém ainda há na seara a adição do porte de arma restrita.
O problema do porte de arma em seu conceito geral é que essa arma pode
29/11/2022 - Parte I - 36 min. - Giocondo ser qualquer coisa, desde um estojo até uma tesoura. O legislador nunca
trabalhou bem esses conceitos.
O prof inicia falando sobre o que vai cair na próxima prova, no caso serão 10
questões de múltipla escolha, do tipo concurso e prova da OAB, ainda cairão 2
questões discursivas uma delas um pouco provavelmente mais teórica, sobre Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito,
modelos que trabalhamos com aplicação do direito penal, tipo dolo aplicado a transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar,
uma norma, a segunda um caso mais prático. manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso
Falas do professor sobre o trabalho, correções e aulas nos dias de jogos do permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
Brasil regulamentar:
Fala sobre a matéria que vai cair na prova. Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
O prof indicou algumas leituras, pediu para atentar-se à ampla modificação da O uso de arma de fogo de 2⁄3, de arma branca é de ⅓ . Ainda há muito
questão do uso de arma no roubo, há uma modificação profunda entre 2018 e trabalho jurisprudencial a ser feito. Porém, há uma tipificação quando a arma
2019.Comentários à Lei n. 13.654/2018 de fogo é de uso restrito, a alteração se deu em 2019. O artigo 16 da Lei nº
10.826, de 22 de dezembro de 2003 trata da utilização e porte deste tipo de
Houve uma série de alterações normativas, sobre o uso de armas, para tentar arma.
regular a questão de armas, inicialmente de fogo, depois de arma branca, pois
não haviam indicações normativas claras sobre o conceito de arma. Em 2018
houve alteração do conceito de arma própria para arma imprópria.
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“Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em Há funcionalistas com um entendimento de uma perspectiva específica do
depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, elemento dolo, com uma dimensão específica da vontade, o tipo exigiria nessa
empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou condição específica. O nosso código penal é funcionalista, com um elemento
munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação subjetivo especial, ou dolo especial.
legal ou regulamentar:
A classificação varia entre na doutrina, a maior parte entende por dano, uma
CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO pequena por perigo ao patrimônio.
O prof começa a trabalhar os crimes contra o patrimônio, no caso as
extorsões. Há dois crimes de extorsão, o 158 simples, comum, e o 159 a º O dano a liberdade do sujeito,
extorsão mediante sequestro. A utilização do meio de violência ou grave º O resultado é forma, a jurisprudencial indicou que é formal, não necessita de
ameaça, com o intuito de levar alguém a fazer ou deixar de fazer algo, a fim um resultado específico. Basta que exista o constrangimento a que faça ou
de obter uma vantagem econômica. que não faça, é doloso.
º Objeto material é a pessoa.
Extorsão º O patrimônio é o bem jurídico, apesar de a liberdade também figurar, mas ela
Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e fica em segundo plano
com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, º Sujeito ativo e passivo qualquer um
a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: ° Pode lesionar outrem, numa pluralidade de ofendidos. Ex: Diretor de órgão
público que é dar vantagem a uma empresa
Extorsão mediante seqüestro
Art. 159 - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para A consumação da extorsão gera um briga na doutrina. Com concepções
outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: diversas, a partir de que momento o crime está consumado. Os principais
pontos de divergência são:
A extorsão e roubo são muito parecidas. A extorsão mediante sequestro, 1. Prática da vítima pela conduta exigida, estaria consumado quando a
sequestro relâmpago, segue mais no sentido de extorsão, apesar da vítima pratica ou deixa de prática o exigido. posição majoritária
semelhança com o roubo. Não há ponto pacifico na doutrina, a apropriação 2. O crime se consuma quando o ocorre o constrangimento
mediante constrangimento é roubo, existe apropriação. Já quando a vítima é
levada a entregar algo é constrangimento, isso implica em aspectos A obtenção da vantagem é um terceiro momento, um iter-criminis, que se dá
importantes como o sequestro relâmpago. com exaurimento,quando ocorre a obtenção da vantagem
É um crime formal, independente da vantagem obtida, segundo a súmula 96
EX: Quando leva a vítima a sacar de um caixa eletrônico. do STF. Posição jurisprudencial conclusiva1

De qualquer modo, esse crime é mais amplo do que o roubo, do que uma Pergunta: Se na extorsão com violência admite tentativa?
simples apropriação da coisa, há figuras maiores alcançar, há sempre duas Não admite esse tipo, apenas alguns casos por exemplo de bilhete
pessoas envolvidas.
Pergunta: Por que é formal?
O tipo objetivo é constranger uma pessoa a algo, de que uma pessoa faça
algo ou deixe de fazer, utilizando para isso violência ou grave ameaça,
1
podendo ser coação física, ameaça de agressão psicológica. Súmula 96-STJ: O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção
Por tipo subjetivo é o dolo, é um dolo dirigido orientado para se obter uma da vantagem indevida. Importante. Para fins de consumação não importa se o agente
consegue ou não obter a vantagem indevida. Essa obtenção da vantagem constitui
vantagem específica.
mero exaurimento, que só interessa para a fixação da pena.
Súmula 96
30
Porque é um constrangimento para algo, é um constrangimento para um Pergunta: fazer um empresário ir ao banco e obrigá-lo a passar a grana. Mas
determinado fim não tem nada na conta dele (bens arrestados). O que fazer?
Resposta: não se pune pela situação de erro. Se imagina que vai ter a
possibilidade mas não a tem. Não é possível realizar um crime impossível
29/11/2022 - Parte II - 1h - Lucas Machado e Miguel (matar um cadáver). “Tentar tirar dinheiro precisa ser punido”: sim, mas não
com extorsão.
O professor continua sua explicação sobre a Extorsão: os verbos são iguais,
mas não se consegue interpretar a realidade sem a influência da vontade. Por Posição do Bittencourt: vantagem econômica é elemento subjetivo especial
isso que a conduta se torna central no finalismo - a conduta que importa para que não se confunde com o dolo, é especificação do dolo. Ele diz que “Dolo é
o Direito penal é uma conduta no mero constranger. Há uma diferença entre o elemento praticado com tipo objetivo. Quando tipo objetivo exige um
“constranger sem querer” e “constranger para cometer o crime de extorsão”. A elemento especial subjetivo, este não é o dolo, e com ele não se confunde,
Conduta no Direito Penal é a modificação de um mundo realizada por parte de vem algo além do dolo. Tipo exige dolo, e dolo precisa trazer o direcionamento
um plano. Modifica-se algo para conquistar alguma coisa. Por isso que não se específico da vontade. “O especial fim com o objetivo de agir, embora amplie o
deve interpretar a palavra somente objetivamente, tal interpretação é artificial aspecto subjetivo do tipo não integra o dolo nem se confunde, uma vez que o
(didática), mas é impossível pensar no finalismo sem separar o tipo. dolo esgota-se com a consciência voluntária de realizar a ação com a
finalidade de obter o resultado exitoso.” Elemento Especial do tipo vs Dolo.
TENTATIVA: Para uma boa parte da doutrina, sim, por ser um crime Não pode afastar a tipicidade, por conta de ser impossível o resultado. Basta
fracionável. Posso constranger e a vítima nada faz. que o sujeito tenha o dolo de extorquir para ter uma vantagem indevida. Se a
EX: aponto a arma e quando vou falar, a polícia me prende. Inicio a execução vantagem é possível ou não, há uma variação do dolo.
e não a finalizo por circunstâncias alheias à minha vontade. O Professor não concorda com o Bittencourt porque acha que enrola sobre o
Elemento subjetivo é doloso, não havendo extorsão culposa. Importante o dolo. “Dolo precisa ser direcionado para aquele fim, senão, não se reconhece
elemento subjetivo “indevida vantagem econômica”. Não há problemas com a conduta.” A maior parte da doutrina segue isso. A ideia da impossibilidade
interpretações dúbias, por estar no próprio tipo o especial fim. Dolo não se não parece tão fora da casinha considerando isso. Não se pune por extorsão,
especifica, é o que está no tipo. mas testam-se outros tipos.
Lógica da indevida vantagem econômica: indevida igual a “que não tem direito
sobre tal vantagem”. CONCURSO DE PESSOAS. Absolutamente comum. 10 pessoas podem
“Econômica” é certamente mais ampla que o roubo. Roubo fala em coisa praticar em conjunto. A dúvida é: é possível que a participação do terceiro seja
móvel alheia. posterior? Sujeito faz a extorsão (não é um ato imediato normalmente).
Alguma pessoa que simplesmente se envolva no meio do processo (coletando
E se eu extorquir para conseguir um negócio que não é válido? Um negócio o dinheiro), não fica evidente a prova de vontade expressa, por exemplo.
nulo, por exemplo. Sujeito me passa um bem gravado com cláusula de Prova-se somente a conexão final. Crime já está consumado - falta conquistar
inalienabilidade. A cláusula impede que ele transmita o bem. Este documento a vantagem econômica indevida. Doutrina varia: 1) Sim, se consumada a
não tem validade. conduta, é perfeitamente possível se participar para o exaurimento. 2) Greco
diz que não, por entender que a conduta se dá quando se constrange a vítima
Demanda-se um negócio válido? Esta vantagem econômica precisa ser (conduta já consumada). O Prof não encontrou resposta jurisprudencial para
válida? isso, mas presume o primeiro caminho. Extorsão é um crime grave, e a
Pergunta inaudível. tendência é uma resposta mais rigorosa.
O tipo fala em vantagem econômica indevida. Constrange-se para uma
vantagem econômica indevida, presume-se a vantagem econômica. AUMENTO DE PENA:
Concurso de pessoas: § 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas,
ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade.
31
Todo mundo precisa estar presente no momento do crime? Vejam, pode-se ter
uma conduta complexa em que cada um se envolva diferente e
estrategicamente? Sim, mas uma maior parte da doutrina exige que todos
estejam no mesmo contexto, presentes no processo na sua integralidade, não
fisicamente. Não faz nem sentido, em razão da possibilidade de cometer
crimes pela internet.

Envolver alguém posteriormente, por exemplo, não aumentaria a pena, pois a


pessoa não está contextualizada desde o momento da conduta criminosa.
Participação de inimputável? Sim. Vão computar o concurso de pessoas.

Crime cometido com arma. § 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante


violência o disposto no § 3º do artigo anterior.

Não se alterou a disposição como se mexeu no crime de roubo. Fala-se em


“ARMA”. Como interpretamos isso? Classificação antiga: própria (objeto
projetado para ser uma arma, cujo fim é ser arma - revólver) ou imprópria
(faca de cozinha, caco de vidro) - duas servem para aumentar a pena). Não há
dúvidas, pode ser qualquer uma. A pergunta é: a vítima deve ter conhecimento
da arma para servir como aumento? Exemplo: arma escondida, não serviu
para a extorsão, embora estivesse armado. Não aumentou a reprovabilidade.
O importante não é o risco, mas o constrangimento que fez na vítima. Se
estou armado mas a vítima não sabe, o fato de eu ter uma arma não
constrange mais a vítima (30:17) …

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