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TRADUÇÃO

1-175 Juno envia Íris para junto de Turno a fim de o impelir a marchar em direcção ao
acampamento dos Troianos, uma vez que Eneias se encontra ausente. Turno tenta incendiar os
navios troianos, mas dá-se a metamorfose dos navios em ninfas marinhas. Ao anoitecer, Turno
discursa perante os soldados, e os Troianos montam acampamento à volta da fortaleza troiana.
Os exércitos preparam-se.

Guardava uma das portas Niso, de grande ímpeto na guerra,


o filho de Hírtaco, que a caçadora Ida enviara a Eneias
como companheiro, hábil com dardos e setas velozes.
Junto dele acompanhava-o Euríalo, que nenhum dos Enéades
igualava em beleza, nem quando usava armas troianas, 180
um rapaz cuja juventude mostrava os primeiros sinais de uma barba a crescer.
Possuíam um amor único um pelo outro e ambos corriam para o combate.
Assim vigiavam juntos, num posto que partilhavam, uma das portas.

184-223 Niso revela a Euríalo o seu plano de ir avisar Eneias do ataque dos Rútulos. Decididos,
dirigem-se à presença dos chefes troianos para se voluntariarem.

Por toda a terra os restantes seres vivos, com o sono,


descansavam das preocupações e as almas esqueciam as fadigas. 225

Os principais chefes dos Teucros, fina flor dos guerreiros,


reuniam-se em consílio por causa da salvação do reino:
o que haviam de fazer e quem agora havia de avisar Eneias.
De pé, apoiam-se em compridas lanças e seguram os escudos
no meio dos acampamentos e da parada. Então Niso e Euríalo, 230

cheios de ardor, de imediato pedem para ser ouvidos:


que era um assunto importante e esse tempo valia a pena. Iulo
recebe-os primeiro, pressurosos, e ordena a Niso que comece a falar.
Assim fala o filho de Hírtarco: «Ouvi-nos, ó Enéades de espírito
favorável, e não julgueis o que vos dizemos tendo em conta 235

a nossa idade. Os Rútulos, que jazem devido ao sono e ao vinho,


emudeceram. Nós próprios encontrámos um local para a emboscada,
que se situa no cruzamento da porta próxima do mar.
Num intervalo de uma linha de fogueiras, um negro fumo
sobe até às estrelas. Se nos permitirdes a oportunidade 340

para ir ao encontro de Eneias e das muralhas de Palanteu,


logo aqui o vereis em pessoa depois de realizada, com espólios,
a enorme chacina. Nós conhecemos bem o caminho.
Sob os sombrios vales, já vimos a entrada da cidade porque lá
caçávamos com frequência e conhecemos todo o curso do rio». 345

246-366 Aletes e Ascânio, chefes troianos, aplaudem a coragem dos dois jovens e prometem-
lhes grandes recompensas. Euríalo pede a Ascânio que cuide da sua mãe, o que provoca o choro
nos Troianos. Entretanto, Niso e Euríalo, armados, saem durante a noite. Ao entrar no campo
inimigo, chacinam os Latinos, que estavam entorpecidos pelo sono e pelo vinho. Finda a chacina,
Euríalo recolhe o elmo de Messapo como espólio. Procuram, de seguida, lugar seguro.

Entretanto, enviados adiante cavaleiros da cidade Latina,


enquanto o restante exército, em formação, se detinha nos campos,
partiam e levavam as respostas ao rei Turno
trezentos homens, todos armados de escudo e chefiados por Volcente.
E já se aproximavam do acampamento e avançavam até aos muros
quando os vêem ao longe a seguirem pela esquerda,
mas o elmo, no bruxuleante escuro da noite, desvelou Euríalo,
esquecido dele, que ficou exposto com raios luminosos.
Não foi sem motivo que os viram. Grita, de entre o exército, Volcente:
«Parai, homens! Porque caminhais aqui? Quem sois para terem armas?
Para onde vos dirigis?» Nada eles lhe respondem,
antes partem em fuga para os bosques e confiam-se à noite.
Avançam os cavaleiros pelos caminhos que lhes são conhecidos,
e dum lado e doutro rodeiam com guardas todas as saídas.

381-419 Niso e Euríalo perdem-se na floresta. Euríalo é capturado. Niso, vendo o companheiro
a ser capturado, faz uma prece à filha de Latona para que o ajude a causar o caos no
acampamento dos Latinos. A lança de Niso, voando pelos ares, mata Sulmão e Tago.
Enfurecido, o atroz Volcente não consegue perceber quem
arremessou a lança nem para onde se pode agora lançar em fúria.
«Tu, entretanto, hás-de pagar o castigo de ambos com o teu
sangue ainda quente», afirma, ao mesmo tempo que, de espada na mão,
avança contra Euríalo. Mas agora, apavorado e em desvaire,
começa Niso a gritar e por entre as trevas já não pode
mais esconder-se e suportar uma tão grande dor:
«Fui eu, eu aqui, que fiz o que vêdes! Voltai esse ferro para mim,
ó Rútulos! Eu cometi todo este crime, e ele nada ousou nem
pôde ter feito. Sou disso testemunha debaixo deste céu e das aliadas estrelas.
A única coisa que ele fez foi amar em demasia um amigo sem sorte».
Proferia tais coisas, mas, desferido pela força da espada,
trespassou-lhe as costas e fez romper o seu peito jovem.
Cai Euríalo morto. Ao longo do seu belo corpo
o sangue escorre e sobre os seus ombros a cabeça colapsa.
Tal como quando uma purpúrea flor, cortada pelo arado,
murcha ao morrer, ou quando as papoilas de haste caída
deixam cair a cabeça ao sofrerem, por acaso, o peso da chuva.
Precipita-se Niso para o meio deles e apenas procura
entre todos Volcente, apenas em Volcente se detém.
À sua volta reúnem-se os inimigos, dali e daqui se batendo
com ele corpo a corpo. Não com menos fúria o persegue e brande
a espada fulminante, até que, perante o Rútulo que gritava,
lha enterra na boca. Morrendo, colhe a alma ao inimigo.
Assim sobre o cadáver do seu amigo ele se lança
trespassado, ali por fim repousando na serenidade da morte.

446-502 Os Latinos levam o corpo de Volcente para o acampamento. Cravam as cabeças de Niso
e Euríalo em estacas, à vista dos Troianos. A Fama faz chegar aos ouvidos da mãe de Euríalo a
morte do filho. Desvairada, corre adentro das linhas da frente. Lamentando o filho, pede aos
Latinos e a Júpiter que a matem. O combate, perante tal imagem, fica quebrado. A mãe de Euríalo
é levada em braços para casa.

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