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Teoria da Comunicação

Texto verbal: análise e estrutura

IT0349 - (Enem) e não aceita o teatro de revista


arte moderna pra você não vale nada
Assentamento
Zanza daqui e até vedete você diz não ser artista
Zanza pra acolá
Fim de feira, periferia afora Você se julga um tanto bom e até perfeito
A cidade não mora mais em mim Por qualquer coisa deita logo falação
Francisco, Serafim Mas eu conheço bem o seu defeito
Vamos embora e não vou fazer segredo não

Ver o capim Você é visto toda sexta no Joá


Ver o baobá e não é só no Carnaval que vai pros bailes se acabar
Vamos ver a campina quando flora Fim de semana você deixa a companheira
A piracema, rios contravim e no bar com os amigos bebe bem a noite inteira
Binho, Bel, Bia, Quim
Vamos embora Segunda-feira chega na repartição
pede dispensa para ir ao oculista
Quando eu morrer e vai curar sua ressaca simplesmente
Cansado de guerra Você não passa de um falso moralista
Morro de bem NELSON SARGENTO. Sonho de um sambista. São Paulo:
Com a minha terra: Eldorado, 1979.
Cana, caqui
Inhame, abóbora As letras de samba normalmente se caracterizam por
Onde só vento se semeava outrora apresentarem marcas informais do uso da língua. Nessa
Amplidão, nação, sertão sem fim letra de Nelson Sargento, são exemplos dessas marcas
Ó Manuel, Miguilim
a) “falação” e “pros bailes”.
Vamos embora
BUARQUE, C. As cidades. Rio de Janeiro: RCA, 1998 b) “você” e “teatro de revista”.
(fragmento). c) “perfeito” e “Carnaval”.
d) “bebe bem” e “oculista”.
Nesse texto, predomina a função poética da linguagem. e) “curar” e “falso moralista”.
Entretanto, a função emotiva pode ser identificada no
verso:

a) “Zanza pra acolá”. IT0299 - (Fuvest)


A escrita faz de tal modo parte de nossa civilização que
b) “Fim de feira, periferia afora”.
poderia servir de definição dela própria. A história da
c) “A cidade não mora mais em mim”.
humanidade se divide em duas imensas eras: antes e a
d) “Onde só vento se semeava outrora”. partir da escrita. Talvez venha o dia de uma terceira era
e) “Ó Manuel, Miguilim”. — depois da escrita. Vivemos os séculos da civilização
escrita. Todas as nossas sociedades baseiam-se no

IT0008 -
escrito. A lei escrita substitui a lei oral, o contrato escrito
(Enem) substitui a convenção verbal, a religião escrita se seguiu à
Falso moralista tradição lendária. E sobretudo não existe história que não
se funde sobre textos.
Você condena o que a moçada anda fazendo Charles Higounet. A história da escrita. Adaptado.

@professorferretto @prof_ferretto 1
A escrita poderia servir de definição da nossa civilização,
uma vez que
IT0009 -
(Enem)
Comportamento geral
a) a terceira era está prestes a acontecer.
Você deve estampar sempre um ar de alegria
b) o escrito respalda as atividades humanas.
E dizer: tudo tem melhorado
c) as convenções verbais substituíram o escrito. Você deve rezar pelo bem do patrão
d) a oralidade deixou de ser usada em períodos remotos. E esquecer que está desempregado
e) os textos pararam de se modificar a partir da escrita.
Você merece
Você merece
IT0005 -(Enem) Tudo vai bem, tudo legal
Cerveja, samba, e amanhã, seu Zé
Reaprender a ler notícias
Se acabarem com teu carnaval
Não dá mais para ler um jornal, revista ou assistir a um
telejornal da mesma forma que fazíamos até o Você deve aprender a baixar a cabeça
surgimento da rede mundial de computadores. O E dizer sempre: muito obrigado
Observatório da Imprensa antecipou isso lá nos idos de São palavras que ainda te deixam dizer
1996 quando cunhou o slogan “Você nunca mais vai ler Por ser homem bem disciplinado
jornal do mesmo jeito”. De fato, hoje já não basta mais
ler o que está escrito ou falado para estar bem Deve pois só fazer pelo bem da nação
informado. É preciso conhecer as entrelinhas e saber que Tudo aquilo que for ordenado
não há objetividade e nem isenção absolutas, porque Pra ganhar um fuscão no juízo final
cada ser humano vê o mundo de uma forma diferente. E diploma de bem-comportado
Ter um pé atrás passou a ser a regra básica número um GONZAGUINHA. Luiz Gonzaga Jr. Rio de Janeiro: Odeon.
de quem passa os olhos por uma primeira página, capa 1973 (fragmento).
de revista ou chamadas de um noticiário na TV.
Há uma diferença importante entre desconfiar de tudo e Pela análise do tema e dos procedimentos
procurar ver o maior número possível de lados de um argumentativos utilizados na letra da canção composta
mesmo fato, dado ou evento. Apenas desconfiar não por Gonzaguinha na década de 1970, infere-se o objetivo
resolve porque se trata de uma atitude passiva. É claro, de
tudo começa com a dúvida, mas a partir dela é a) ironizar a incorporação de ideias e atitudes
necessário ser proativo, ou seja, investigar, estudar, conformistas.
procurar os elementos ocultos que sempre existem numa
b) convencer o público sobre a importância dos deveres
notícia. No começo é um esforço solitário que pode se
cívicos.
tornar coletivo à medida que mais pessoas descobrem
c) relacionar o discurso religioso à resolução de
sua vulnerabilidade informativa.
Disponível em: www.observatoriodaimprensa.com.br. problemas sociais.
Acesso em 30 set. 2015 (adaptado). d) questionar o valor atribuído pela população às festas
populares.
No texto, os argumentos apresentados permitem inferir e) defender uma postura coletiva indiferente aos valores
que o objetivo do autor é convencer os leitores a dominantes.

a) buscarem fontes de informação comprometidas com a


verdade.
b) privilegiarem notícias veiculadas em jornais de grande
IT0313 - (Fuvest)

circulação.
c) adotarem uma postura crítica em relação às
informações recebidas.
d) questionarem a prática jornalística anterior ao
surgimento da internet.
e) valorizarem reportagens redigidas com imparcialidade
diante dos fatos.

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magno, turbantibus aequora ventis/ E terra magnum
alterius spectare laborem. (“É agradável, enquanto no
mar revoltoso os ventos levantam as águas, observar da
terra os grandes esforços de um outro.”).

II.
Tão certo é que a paisagem depende do ponto de vista, e
que o melhor modo de apreciar o chicote é ter-lhe o cabo
na mão.
Machado de Assis. Quincas Borba, cap. XVIII.

III.
Sofia soltou um grito de horror e acordou. Tinha ao pé do
leito o marido:
– Que foi? perguntou ele.
– Ah! respirou Sofia. Gritei, não gritei?
(...)
– Sonhei que estavam matando você.
O efeito de humor presente nas falas das personagens Palha ficou enternecido. Havê-la feito padecer por ele,
decorre ainda que em sonhos, encheu-o de piedade, mas de uma
piedade gostosa, um sentimento particular, íntimo,
a) da quebra de expectativa gerada pela polissemia.
profundo, – que o faria desejar outros pesadelos, para
b) da ambiguidade causada pela antonímia. que o assassinassem aos olhos dela, e para que ela
c) do contraste provocado pela fonética. gritasse angustiada, convulsa, cheia de dor e de pavor.
d) do contraste introduzido pela neologia. Machado de Assis. Quincas Borba, cap. CLXI.
e) do estranhamento devido à morfologia.
No texto III, ao analisar a interioridade de Palha, o
narrador descobre, no pensamento oculto do negociante,
IT0295 - (Fuvest) a) a ternura que lhe inspira a mulher, capaz de toda
Leia os seguintes textos de Machado de Assis: abnegação.
b) a piedade que lhe causa a mulher, a quem só guarda
I.
desprezo.
Suave mari magno*
c) a vaidade que beira o sadismo, ao ver a mulher sofrer
por ele.
Lembra-me que, em certo dia,
Na rua, ao sol de verão, d) o gozo vingativo, visto que a mulher o trai com Carlos
Envenenado morria Maria.
Um pobre cão. e) o remorso do infiel, pois ele trai a mulher com Maria
Benedita.
Arfava, espumava e ria,

IT0001 -
De um riso espúrio e bufão,
Ventre e pernas sacudia (Enem)
Na convulsão. A volta do marido pródigo

Nenhum, nenhum curioso – Bom dia, seu Marrinha! Como passou de ontem?
Passava, sem se deter, – Bem. Já sabe, não é? Só ganha meio dia. [...]
Silencioso, Lá além, Generoso cotuca Tercino:
– [...] Vai em festa, dorme que-horas, e, quando chega,
Junto ao cão que ia morrer, ainda é todo enfeitado e salamistrão!...
Como se lhe desse gozo – Que é que hei de fazer, seu Marrinha... Amanheci com
Ver padecer. uma nevralgia... Fiquei com cisma de apanhar friagem...
Machado de Assis. Ocidentais. – Hum...
– Mas o senhor vai ver como eu toco o meu serviço e
* Expressão latina, retirada de Lucrécio (Da natureza das ainda faço este povo trabalhar...
coisas), a qual aparece no seguinte trecho: Suave, mari [...]

@professorferretto @prof_ferretto 3
Pintão suou para desprender um pedrouço, e teve de a) a escolha de “você” ou de “tu” está condicionada à
pular para trás, para que a laje lhe não esmagasse um pé. idade da pessoa que usa o pronome.
Pragueja: b) a possibilidade de se usar tanto “tu” quanto “você”
– Quem não tem brio engorda! caracteriza a diversidade da língua.
– É... Esse sujeito só é isso, e mais isso... – opina Sidu.
c) o pronome “tu” tem sido empregado em situações
– Também, tudo p’ra ele sai bom, e no fim dá certo...
informais por todo o país.
– diz Correia, suspirando e retomando o enxadão. – “P’ra
uns, as vacas morrem ... p’ra outros até boi pega a d) a ocorrência simultânea de “tu” e de “você” evidencia
parir...”. a inexistência da distinção entre níveis de
Seu Marra já concordou: formalidade.
– Está bem, seu Laio, por hoje, como foi por doença, eu e) o emprego de “você” em documentos escritos
aponto o dia todo. Que é a última vez!... E agora, deixa de demonstra que a língua tende a se manter
conversa fiada e vai pegando a ferramenta! inalterada.
ROSA, J. G. Sagarana. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967.

Esse texto tem importância singular como patrimônio


linguístico para a preservação da cultura nacional devido
IT0327 - (Fuvest)
O feminismo negro não é uma luta meramente
identitária, até porque branquitude e masculinidade
a) à menção a enfermidades que indicam falta de
também são identidades. Pensar feminismos negros é
cuidado pessoal.
pensar projetos democráticos. Hoje afirmo isso com
b) à referência a profissões já extintas que caracterizam a muita tranquilidade, mas minha experiência de vida foi
vida no campo.
marcada pelo incômodo de uma 1incompreensão
c) aos nomes de personagens que acentuam aspectos de
fundamental. 2Não que eu buscasse respostas para tudo.
sua personalidade.
Na maior parte da minha infância e adolescência, 3não
d) ao emprego de ditados populares que resgatam
memórias e saberes coletivos. tinha consciência de mim. Não sabia por que 4sentia
vergonha de levantar a mão quando a professora fazia
e) às descrições de costumes regionais que desmistificam
uma pergunta já supondo que eu não saberia a resposta.
crenças e superstições.
5Por que eu ficava isolada na hora do recreio. Por que os
meninos diziam na minha cara que não queriam formar
IT0006 - (Enem)
par com a “neguinha” na festa junina. Eu me sentia
estranha e inadequada, e, na maioria das vezes, fazia as
Os linguistas têm notado a expansão do tratamento
informal. “Tenho 78 anos e devia ser tratado por senhor, coisas no automático, 6me esforçando para não ser
mas meus alunos mais jovens me tratam por você”, diz o notada.
professor Ataliba Castilho, aparentemente sem se Djamila Ribeiro, Quem tem medo do feminismo negro?.
incomodar com a informalidade, inconcebível em seus
tempos de estudante. O você, porém, não reinará O trecho que melhor define a “incompreensão
sozinho. O tu predomina em Porto Alegre e convive com fundamental” (ref. 1) referida pela autora é:
o você no Rio de Janeiro e em Recife, enquanto você é o a) “não que eu buscasse respostas para tudo” (ref. 2).
tratamento predominante em São Paulo, Curitiba, Belo
b) “não tinha consciência de mim” (ref. 3).
Horizonte e Salvador. O tu já era mais próximo e menos
formal que você nas quase 500 cartas do acervo on-line c) “Por que eu ficava isolada na hora do recreio” (ref. 5).
de uma instituição universitária, quase todas de poetas, d) “me esforçando para não ser notada” (ref. 6).
políticos e outras personalidades do final do século XIX e e) “sentia vergonha de levantar a mão” (ref. 4).
início do XX.

IT0296 -
Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br. Acesso
em: 21 abr. 2015 (adaptado). (Fuvest)
A taxação de livros tem um efeito cascata que acaba
No texto, constata-se que os usos de pronomes variaram custando caro não apenas ao leitor, como também ao
ao longo do tempo e que atualmente têm empregos mercado editorial – que há anos não anda bem das
diversos pelas regiões do Brasil. Esse processo revela que pernas – e, em última instância, ao desenvolvimento
econômico do país. A gente explica. Taxar um produto
significa, quase sempre, um aumento no valor do
produto final. Isso porque ao menos uma parte desse
imposto será repassada ao consumidor, especialmente se

@professorferretto @prof_ferretto 4
considerarmos que as editoras e livrarias enfrentam há a) Ainda que a prática cardiovascular seja infinitamente
anos uma crise que agora está intensificada pela mais significativa e determinante para a nossa saúde
pandemia e não poderiam retirar o valor desse imposto orgânica como um todo, essa ordem deveria ser
de seu já apertado lucro. Livros mais caros também revista, podendo ser considerada o “coração” de um
resultam em queda de vendas, que, por sua vez, treinamento consciente e saudável.
enfraquece ainda mais editoras e as impede de investir b) Para evitar que a prática cardiovascular se torne
em novas publicações – especialmente aquelas de menor infinitamente mais significativa e determinante para a
apelo comercial, mas igualmente importantes para a nossa saúde orgânica como um todo, podendo ser
pluralidade de ideias. Já deu para perceber a confusão, considerada o “coração” de um treinamento
não é? Mas, além disso, qual seria o custo de uma consciente e saudável, essa ordem deveria ser
sociedade com menos leitores e menos livros? revista.
Taís Ilhéu. “Por que taxar os livros pode gerar retrocesso
c) Quando a prática cardiovascular for infinitamente mais
social e econômico no país”. Guia do Estudante.
significativa e determinante para a nossa saúde
Setembro/2020. Adaptado
orgânica como um todo, essa ordem deveria ser
revista, podendo ser considerada o “coração” de um
De acordo com o texto, os eventos sequenciais aos quais
treinamento consciente e saudável.
alude a expressão “efeito cascata” são:
d) Quanto mais a prática cardiovascular é infinitamente
a) livros mais caros, decréscimo de vendas, estímulo às mais significativa e determinante para a nossa saúde
editoras, supressão de investimento em novas orgânica como um todo, podendo ser considerada o
publicações. “coração” de um treinamento consciente e saudável,
b) aumento do valor do produto final, queda de vendas, essa ordem deveria ser revista.
encolhimento das editoras, aumento do investimento e) Essa ordem deveria ser revista: a prática
em novas obras. cardiovascular é infinitamente mais significativa e
c) livros mais caros, instabilidade nas vendas, determinante para a nossa saúde orgânica como um
enfraquecimento das editoras, expansão das todo, podendo ser considerada o “coração” de um
publicações. treinamento consciente e saudável.
d) aumento do valor do produto final, contração nas
vendas, esgotamento das editoras, falta de
investimento em novas publicações. IT0007 - (Enem)
e) livros mais caros, equilíbrio nas vendas, diminuição Sinhá
das editoras, carência de investimento em novas
publicações. Se a dona se banhou
Eu não estava lá
Por Deus Nosso Senhor
IT0291 - (Fuvest)
Eu não olhei Sinhá
Estava lá na roça
No modelo hegemônico, quase todo o treinamento é
Sou de olhar ninguém
reservado para o desenvolvimento muscular, sobrando
Não tenho mais cobiça
muito pouco tempo para a mobilidade, a flexibilidade, o
Nem enxergo bem
treino restaurativo, o relaxamento e o treinamento
cardiovascular. Na teoria, seria algo em torno de 70%
Para que me pôr no tronco
para o fortalecimento, 20% para o cárdio e 10% para a
Para que me aleijar
flexibilidade e outros. Na prática, muitos alunos
Eu juro a vosmecê
direcionam 100% do tempo para o fortalecimento.
Que nunca vi Sinhá
Como a prática cardiovascular é infinitamente mais
[…]
significativa e determinante para a nossa saúde orgânica
Por que talhar meu corpo
como um todo, podendo ser considerada o “coração” de
Eu não olhei Sinhá
um treinamento consciente e saudável, essa ordem
Para que que vosmincê
deveria ser revista.
Meus olhos vai furar
Nuno Cobra Jr. “Fitness não é saúde”. Uol. 06/05/2021.
Eu choro em iorubá
Adaptado.
Mas oro por Jesus
Para que que vassuncê
Sem alteração de sentido, o segundo parágrafo do texto
Me tira a luz.
poderia ser reescrito da seguinte maneira:
CHICO BUAROUE; JOÃO BOSCO. Chico. Rio de Janeiro:
Biscoito Fino, 2011 (fragmento).

@professorferretto @prof_ferretto 5
paternalismo ingênuo, comecei a lhe explicar o que era
No fragmento da letra da canção, o vocabulário um romance. Eu tentava convencê-lo de que não havia
empregado e a situação retratada são relevantes para o motivo para preocupação. Tudo o que eu queria saber já
patrimônio linguístico e identitário do país, na medida era conhecido. E ele me perguntava: “Então, porque você
em que quer saber, se já sabe?” Tentei lhe explicar que pretendia
escrever um livro e mais uma vez o que era um romance,
a) remetem à violência física e simbólica contra os povos
o que era um livro de ficção (e mostrava o que tinha nas
escravizados.
mãos), que seria tudo historinha, sem nenhuma
b) valorizam as influências da cultura africana sobre a consequência na realidade. Ele seguia incrédulo. Fazia-se
música nacional. de desentendido, mas na verdade só queria me intimidar.
c) relativizam o sincretismo constitutivo das práticas As minhas explicações sobre o romance eram inúteis. Eu
religiosas brasileiras. tentava dizer que, para os brancos que não acreditam em
d) narram os infortúnios da relação amorosa entre deuses, a ficção servia de mitologia, era o equivalente
membros de classes sociais diferentes. dos mitos dos índios, e antes mesmo de terminar a frase,
e) problematizam as diferentes visões de mundo na já não sabia se o idiota era ele ou eu. Ele não dizia nada a
sociedade durante o período colonial. não ser: “O que você quer com o passado?”. Repetia. E,
diante da sua insistência bovina, tive de me render à
evidência de que eu não sabia responder à sua pergunta.
IT0358 - (Enem)
Bernardo Carvalho, Nove Noites. Adaptado.
Projeto na Câmara de BH quer a vacinação gratuita de
Sem prejuízo de sentido e fazendo as adaptações
cães contra a leishmaniose
necessárias, é possível substituir as expressões em
A doença é grave e vem causando preocupação na região
destaque no texto, respectivamente, por
metropolitana da capital mineira
Ela é uma doença grave, transmitida pela picada do a) incompreensão; armação; inofensivo; irredutível.
mosquito-palha, e afeta tanto os seres humanos quanto b) altivez; brincadeira; ofendido; mansa.
os cachorros: a leishmaniose. Por ser um problema de
c) ignorância; mentira; prejudicado; alienada.
saúde pública, a doença pode ganhar uma ação
d) complacência; invenção; bobo; cega.
preventiva importante, caso um projeto de lei seja
aprovado na Câmara Municipal de Belo Horizonte e) arrogância; entretenimento; incapaz; animalesca.
(CMBH). Diante do alto número de casos da doença na

IT0361 -
Grande BH, a Comissão de Saúde e Saneamento da
CMBH aprovou a proposta de realização de campanhas (Enem)
públicas de vacinação gratuita de cães contra a O bebê de tarlatana rosa
leishmaniose, tema do PL 404/17, apreciado pelo – [...] Na terça desliguei-me do grupo e caí no mar alto da
colegiado em reunião ordinária, no dia 6 de dezembro. depravação, só, com uma roupa leve por cima da pele e
Disponível em: https://revistaencontro.com.br. Acesso todos os maus instintos fustigados. De resto a cidade
em: 11 dez. 2017. inteira estava assim. É o momento em que por trás das
máscaras as meninas confessam paixões aos rapazes, é o
Essa notícia, além de cumprir sua função informativa, instante em que as ligações mais secretas transparecem,
assume o papel de em que a virgindade é dúbia e todos nós a achamos
inútil, a honra uma caceteação, o bom senso uma fadiga.
a) fiscalizar as ações de saúde e saneamento da cidade.
Nesse momento tudo é possível, os maiores absurdos, os
b) defender os serviços gratuitos de atendimento à maiores crimes; nesse momento há um riso que galvaniza
população. os sentidos e o beijo se desata naturalmente.
c) conscientizar a população sobre grave problema de Eu estava trepidante, com uma ânsia de acanalhar-me,
saúde pública. quase mórbida. Nada de raparigas do galarim
d) propor campanhas para a ampliação de acesso aos perfumadas e por demais conhecidas, nada do contato
serviços públicos. familiar, mas o deboche anônimo, o deboche ritual de
e) responsabilizar os agentes públicos pela demora na chegar, pegar, acabar, continuar. Era ignóbil. Felizmente
tomada de decisões. muita gente sofre do mesmo mal no carnaval.
RIO, J. Dentro da noite. São Paulo: Antíqua, 2002.

IT0308 - (Fuvest)
No texto, o personagem vincula ao carnaval atitudes e
reações coletivas diante das quais expressa
Leusipo perguntou o que eu tinha ido fazer na aldeia.
Preferi achar que o tom era amistoso e, no meu

@professorferretto @prof_ferretto 6
a) consagração da alegria do povo.
b) atração e asco perante atitudes libertinas. Lembra-me que, em certo dia,
Na rua, ao sol de verão,
c) espanto com a quantidade de foliões nas ruas.
Envenenado morria
d) intenção de confraternizar com desconhecidos. Um pobre cão.
e) reconhecimento da festa como manifestação cultural.
Arfava, espumava e ria,
De um riso espúrio e bufão,

IT0017 -
Ventre e pernas sacudia
(Enem) Na convulsão.
TEXTO I
Terezinha de Jesus Nenhum, nenhum curioso
De uma queda foi ao chão Passava, sem se deter,
Acudiu três cavalheiros Silencioso,
Todos os três de chapéu na mão
O primeiro foi seu pai Junto ao cão que ia morrer,
O segundo, seu irmão Como se lhe desse gozo
O terceiro foi aquele Ver padecer.
A quem Tereza deu a mão Machado de Assis. Ocidentais.
BATISTA, M. F. B. M.; SANTOS, I. M. F. (Org.). Cancioneiro
da Paraíba. João Pessoa: Grafset, 1993 (adaptado). * Expressão latina, retirada de Lucrécio (Da natureza das
coisas), a qual aparece no seguinte trecho: Suave, mari
TEXTO II magno, turbantibus aequora ventis/ E terra magnum
alterius spectare laborem. (“É agradável, enquanto no
Outra interpretação é feita e partir das condições sociais mar revoltoso os ventos levantam as águas, observar da
daquele tempo. Para a ama e para a criança para quem terra os grandes esforços de um outro.”).
cantava a cantiga, e música falava do casamento como
um destino natural na vida da mulher, na sociedade II.
brasileira do século XIX, marcada pelo patriarcalismo. A Tão certo é que a paisagem depende do ponto de vista, e
música prepara a moça para o seu destino não apenas que o melhor modo de apreciar o chicote é ter-lhe o cabo
inexorável, mas desejável; o casamento, estabelecendo na mão.
uma hierarquia de obediência (pai, irmão mais velho, Machado de Assis. Quincas Borba, cap. XVIII.
marido), de acordo com a época e circunstâncias de sua
vida. III.
Disponível em: http://provsjose.blogspot.com.br. Acesso Sofia soltou um grito de horror e acordou. Tinha ao pé do
em: 5 dez. 2012. leito o marido:
– Que foi? perguntou ele.
O comentário do Texto II sobre o Texto I evoca a – Ah! respirou Sofia. Gritei, não gritei?
mobilização da língua oral que, em determinados (...)
contextos, – Sonhei que estavam matando você.
Palha ficou enternecido. Havê-la feito padecer por ele,
a) assegura existência de pensamentos contrários à ainda que em sonhos, encheu-o de piedade, mas de uma
ordem vigente. piedade gostosa, um sentimento particular, íntimo,
b) mantém a heterogeneidade das formas de relações profundo, – que o faria desejar outros pesadelos, para
sociais. que o assassinassem aos olhos dela, e para que ela
c) conserva a influência sobre certas culturas. gritasse angustiada, convulsa, cheia de dor e de pavor.
d) preserva a diversidade cultural e comportamental. Machado de Assis. Quincas Borba, cap. CLXI.
e) reforça comportamentos e padrões culturais.
A analogia consiste em um recurso de expressão
comumente utilizado para ilustrar um raciocínio por meio
IT0294 - (Fuvest)
da semelhança que se observa entre dois fatos ou ideias.
No texto II, a analogia construída a partir da imagem do
Leia os seguintes textos de Machado de Assis:
chicote pretende sugerir que
I.
Suave mari magno*

@professorferretto @prof_ferretto 7
a) o instrumento do castigo nem sempre cai em mãos – Para que se deu em sacrifício, o Homem Deus, que ali
justas. exalou seu derradeiro alento? Ah! Então não era verdade
b) o apreço aos objetos independe do uso que se faz que seu sangue era o resgate do homem! É então uma
deles. mentira abominável ter esse sangue comprado a
liberdade!? E depois, olhai a sociedade... Não vedes o
c) o cabo é metáfora de mérito, e a ponta, metáfora de
abutre que a corrói constantemente!... Não sentis a
culpa.
desmoralização que a enerva, o cancro que a destrói?
d) o mais fraco, por ser compassivo, é incapaz de Por qualquer modo que encaremos a escravidão, ela é, e
desfrutar do poder. sempre será um grande mal. Dela a decadência do
e) o prazer verdadeiro se experimenta no lado dos comércio; porque o comércio e a lavoura caminham de
dominantes. mãos dadas, e o escravo não pode fazer florescer a
lavoura; porque o seu trabalho é forçado.

IT0355 -
REIS, M. F. Úrsula outras obras. Brasília: Câmara dos
(Enem) Deputados, 2018.
Notas
Soluços, lágrimas, casa armada, veludo preto nos portais, Inscrito na estética romântica da literatura brasileira, o
um homem que veio vestir o cadáver, outro que tomou a conto descortina aspectos da realidade nacional no
medida do caixão, caixão, essa, tocheiros, convites, século XIX ao
convidados que entravam, lentamente, a passo surdo, e
a) revelar a imposição de crenças religiosas a pessoas
apertavam a mão à família, alguns tristes, todos sérios e
escravizadas.
calados, padre e sacristão, rezas, aspersões d’água benta,
o fechar do caixão, a prego e martelo, seis pessoas que o b) apontar a hipocrisia do discurso conservador na
tomam da essa, e o levantam, e o descem a custo pela defesa da escravidão.
escada, não obstante os gritos, soluços e novas lágrimas c) sugerir práticas de violência física e moral em nome do
da família, e vão até o coche fúnebre, e o colocam em progresso material.
cima e traspassam e apertam as correias, o rodar do d) relacionar o declínio da produção agrícola e comercial
coche, o rodar dos carros, um a um... Isto que parece um a questões raciais.
simples inventário eram notas que eu havia tomado para e) ironizar o comportamento dos proprietários de terra
um capítulo triste e vulgar que não escrevo. na exploração do trabalho.
ASSIS, M. Memórias póstumas de Brás Cubas.
www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 25 jul. 2022.

O recurso linguístico que permite a Machado de Assis


IT0302 - (Fuvest)

considerar um capítulo de Memórias póstumas de Brás Uma última gargalhada estrondosa. 1E depois, o silêncio.
Cubas como inventário é a O palhaço jazia 2imóvel no chão. 3Mas seu rosto continua
sorrindo, para sempre. Porque a carreira original do
a) enumeração de objetos e fatos. Coringa era para durar apenas 30 páginas. O tempo de
b) predominância de linguagem objetiva. envenenar Gotham, sequestrar 4Robin, enfiar um par de
c) ocorrência de período longo no trecho. sopapos na Homem-Morcego e disparar o primeiro “vou
d) combinação de verbos no presente e no pretérito. te matar” da sua relação. Na briga final do Batman nº. 1,
e) presença de léxico do campo semântico de funerais. o “horripilante bufão” sofria um final digno de sua
desumana ironia: 5ao tropeçar, cravava sua própria adaga

IT0344 -
no peito. Assim decidiram e desenharam 6seus pais, os
(Enem) artistas Bill Finger, Bob Kane e Jerry Robinson. Entretanto,
A escrava o criminoso mostrou, já em sua primeira aventura, um
– Admira-me –, disse uma senhora de sentimentos enorme talento para 7se rebelar contra a ordem
sinceramente abolicionistas —; faz-me até pasmar como estabelecida. 8Seu carisma seduziu a editora DC Comics,
se possa sentir, e expressar sentimentos escravocratas,
que impôs o acréscimo de um quadrinho. Já dentro da
no presente século, no século dezenove! A moral ambulância, vinha à tona “um dado desconcertante”. E
religiosa e a moral cívica aí se erguem, e falam bem alto
então um médico sentenciava: “Continua 9vivo. E vai
esmagando a hidra que envenena a família no mais
sobreviver!”.
sagrado santuário seu, e desmoraliza, e avilta a nação
inteira! Levantai os olhos ao Gólgota, ou percorrei-os em Tommaso Koch. “O Coringa completa 80 anos e na
Espanha ganha duas HQs, que inspiram debates
torno da sociedade, e dizei-me:
filosóficos sobre a liberdade”,
EI País. Junho/2020.

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As vírgulas em “E depois, o silêncio.” (ref. 1) e em “Mas
seu rosto continua sorrindo, para sempre.” (ref. 3) são
IT0340 - (Enem)
PALAVRA – As gramáticas classificam as palavras em
usadas, respectivamente, com a mesma finalidade que as substantivo, adjetivo, verbo, advérbio, conjunção, prono -
vírgulas em me, numeral, artigo e preposição. Os poetas classificam
as palavras pela alma porque gostam de brincar com elas,
a) “Após a queda, tomaram mais cuidado.” e “Quanto
e para brincar com elas é preciso ter intimidade primeiro.
mais espaço, mais liberdade.”.
É a alma da palavra que define, explica, ofende ou elogia,
b) “Aos estrangeiros, ofereceram iguarias.” e “Limpavam se coloca entre o significante e o significado para dizer o
a casa, e preparávamos as refeições.”.
que quer, dar sentimento às coisas, fazer sentido. A
c) “Colheram trigo e nós, algodão.” e “Eles se palavra nuvem chove. A palavra triste chora. A palavra
encontraram nas férias, mas não viajaram.”. sono dorme. A palavra tempo passa. A palavra fogo
d) “Para meus amigos, o melhor.” e “Organizava tudo, queima. A palavra faca corta. A palavra carro corre. A
cautelosamente.”. palavra “palavra” diz. O que quer. E nunca desdiz depois.
e) “Viu o espetáculo, considerado o maior fenômeno de As palavras têm corpo e alma, mas são diferentes das
bilheteria.” e “‘Conheço muito bem’, afirmou o rapaz.”. pessoas em vários pontos. As palavras dizem o que
querem, está dito, e pronto.
FALCÃO, A. Pequeno dicionário de palavras ao vento. São
IT0015 - (Enem) Paulo: Salamandra, 2013 (adaptado).
O Instituto de Arte de Chicago disponibilizou para
visualização on-line, compartilhamento ou download Esse texto, que simula um verbete para a palavra
(sob licença Creative Commons), 44 mil imagens de obras “palavra”, constitui-se como um poema porque
de arte em altíssima resolução, além de livros, estudos e a) tematiza o fazer poético, como em “Os poetas
pesquisas sobre a história da arte. classificam as palavras pela alma”.
Para o historiador da arte, Bendor Grosvenor, o sucesso
b) utiliza o recurso expressivo da metáfora, como em “As
das coleções on-line de acesso aberto, além de
palavras têm corpo e alma”.
democratizar a arte, vem ajudando a formar um novo
c) valoriza a gramática da língua, como em “substantivo,
público museológico. Grosvenor acredita que quanto
adjetivo, verbo, advérbio, conjunção”.
mais pessoas forem expostas à arte on-line, mais visitas
pessoais acontecerão aos museus. d) estabelece comparações, como em “As palavras têm
A coleção está disponível em seis categorias: paisagens corpo e alma, mas são diferentes das pessoas”.
urbanas, impressionismo, essenciais, arte africana, moda e) apresenta informações pertinentes acerca do conceito
e animais. Também é possível pesquisar pelo nome da de “palavras”, como em “As gramáticas classificam as
obra, estilo, autor ou período. Para navegar pela imagem palavras”.
em alta definição, basta clicar sobre ela e utilizar a

IT0329 -
ferramenta de zoom. Para fazer o download, disponível
para obras de domínio público, é preciso utilizar a seta (Fuvest)
localizada do lado inferior direito da imagem. E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon: Et
Disponível em: www.revistabula.com. Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a
Acesso em: 5 dez. 2018 (adaptado). mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, –
coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame,
A função da linguagem que predomina nesse texto se quando quer amar. Se esta última reflexão é o motivo
caracteriza por secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois
muito indiscreta, e que eu não me quero senão com
a) evidenciar a subjetividade da reportagem com base na
dissimulados.
fala do historiador de arte.
Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim
b) convencer o leitor a fazer o acesso on-line, levando-o
da comissão das Alagoas, com elogios da imprensa; a
a conhecer as obras de arte.
Atalaia chamou‐lhe “o anjo da consolação”. 1E não se
c) informar sobre o acesso às imagens por meio da
pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse;
descrição do modo como acessá-las.
ao contrário, resumindo em Sofia toda a ação da
d) estabelecer interlocução com o leitor, orientando-o a caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer‐lhe
fazer o download das obras de arte. perder em um dia o trabalho de longos meses. Assim se
e) enaltecer a arte, buscando popularizá-la por meio da explica o artigo que a mesma folha trouxe no número
possibilidade de visualização on-line. seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as
outras comissárias – “estrelas de primeira grandeza”.

@professorferretto @prof_ferretto 9
Machado de Assis, Quincas Borba. –– O que o quê?
–– O que você disse.
Considerando o contexto, o trecho “E não se pense que –– Outrossim?
este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse” (ref. 1) –– É.
pode ser reescrito, sem prejuízo de sentido, da seguinte –– O que é que tem?
maneira: E não se pense que este nome a alegrou, –– Nada. Só achei engraçado.
–– Não vejo a graça.
a) apesar de lisonjeá‐la.
–– Você vai concordar que não é uma palavra de todos os
b) antes a lisonjeou. dias.
c) porque a lisonjeava. –– Ah, não é. Aliás, eu só uso domingo.
d) a fim de lisonjeá‐la. –– Se bem que parece mais uma palavra de segunda-
e) tanto quanto a lisonjeava. feira.
–– Não. Palavra de segunda-feira é “óbice”.
–– “Ônus”.
IT0297 - (Fuvest)
–– “Ônus” também. “Desiderato”. “Resquício”.
–– “Resquício” é de domingo.
A taxação de livros tem um efeito cascata que acaba
–– Não, não. Segunda. No máximo terça.
custando caro não apenas ao leitor, como também ao
–– Mas “outrossim”, francamente...
mercado editorial – que há anos não anda bem das
–– Qual o problema?
pernas – e, em última instância, ao desenvolvimento
–– Retira o “outrossim”.
econômico do país. A gente explica. Taxar um produto
–– Não retiro. É uma ótima palavra. Aliás é uma palavra
significa, quase sempre, um aumento no valor do
difícil de usar. Não é qualquer um que usa “outrossim”.
produto final. Isso porque ao menos uma parte desse
VERISSIMO, L. F. Comédias da vida privada.
imposto será repassada ao consumidor, especialmente se
Porto Alegre: L&PM, 1996 (fragmento).
considerarmos que as editoras e livrarias enfrentam há
anos uma crise que agora está intensificada pela
No texto, há uma discussão sobre o uso de algumas
pandemia e não poderiam retirar o valor desse imposto
palavras da língua portuguesa. Esse uso promove o(a)
de seu já apertado lucro. Livros mais caros também
resultam em queda de vendas, que, por sua vez, a) marcação temporal, evidenciada pela presença de
enfraquece ainda mais editoras e as impede de investir palavras indicativas dos dias da semana.
em novas publicações – especialmente aquelas de menor b) tom humorístico, ocasionado pela ocorrência de
apelo comercial, mas igualmente importantes para a palavras empregadas em contextos formais.
pluralidade de ideias. Já deu para perceber a confusão,
c) caracterização da identidade linguística dos
não é? Mas, além disso, qual seria o custo de uma
interlocutores, percebida pela recorrência de palavras
sociedade com menos leitores e menos livros?
regionais.
Taís Ilhéu. “Por que taxar os livros pode gerar retrocesso
d) distanciamento entre os interlocutores, provocado
social e econômico no país”. Guia do Estudante.
pelo emprego de palavras com significados pouco
Setembro/2020. Adaptado
conhecidos.
No texto, os pronomes em negrito referem-se, e) inadequação vocabular, demonstrada pela seleção de
respectivamente, a: palavras desconhecidas por parte de um dos
interlocutores do diálogo.
a) taxação de livros, mercado editorial, crise, queda de
vendas.
b) taxação de livros, leitor, crise, queda de vendas.
c) efeito cascata, mercado editorial, crise, queda de
IT0013 -(Enem)
Seu delegado
vendas.
d) efeito cascata, mercado editorial, livrarias, livros. Eu sou viúvo e tenho um filho homem
e) efeito cascata, leitor, crise, livros. Arrumei uma viúva e fui me casar
A minha sogra era muito teimosa
Com o meu filho foi se matrimoniar
IT0018 -
(Enem)
Desse matrimônio nasceu um garoto
Desde esse dia que eu ando é louco
De domingo
Esse garoto é filho do meu filho
E o filho da minha sogra é irmão da minha mulher
–– Outrossim...
Ele é meu neto e eu sou cunhado dele
–– O quê?

@professorferretto @prof_ferretto 10
IT0360 -
A minha nora é minha sogra
Meu filho meu sogro é (Enem)
Nessa confusão já nem sei quem sou Firmo, o vaqueiro
Acaba esse garoto sendo meu avô. No dia seguinte, à hora em que saía o gado, estava eu
TRIO FORROZÃO. Agitando a rapaziada. Rio de Janeiro: debruçado à varanda quando vi o cafuzo que preparava o
Natasha Records, 2009. animal viajeiro:
– Raimundinho, como vai ele?...
Nessa letra da canção, a suposição do último verso De longe apontou a palhoça.
sinaliza a intenção do autor de – Sim.
O braço caiu-lhe, olhou-me algum tempo comovido;
a) ironizar as relações familiares modernas.
depois, saltando para o animal, levou o polegar à boca
b) reforçar o humor da situação representada.
fazendo estalar a unha nos dentes: “Às quatro da
c) expressar perplexidade em relação ao parente. manhã... Atirei um verso e disse, para bulir com ele: Pega,
d) atribuir à criança a causa da dúvida existencial. velho! Não respondeu. Tio Firmo, mesmo velho e doente,
e) questionar os lugares predeterminados da família. não era homem para deixar um verso no chão... Fui ver,
coitado!... estava morto. E deu de esporas para que eu
não lhe visse as lágrimas.
IT0003 - (Enem) NETTO, C. In: MARCHEZAN, L. G. (Org.). O conto
regionalista. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
A draga

A gente não sabia se aquela draga tinha nascido ali, no A passagem registra um momento em que a
Porto, como um pé de árvore ou uma duna. expressividade lírica é reforçada pela
– E que fosse uma casa de peixes? a) plasticidade da imagem do rebanho reunido.
Meia dúzia de loucos e bêbados moravam dentro dela,
b) sugestão da firmeza do sertanejo ao arrear o cavalo.
enraizados em suas ferragens.
c) situação de pobreza encontrada nos sertões
Dos viventes da draga era um o meu amigo Mário-pega-
brasileiros.
sapo.
[...] d) afetividade demonstrada ao noticiar a morte do
Quando Mário morreu, um literato oficial, em necrológio cantador.
caprichado, chamou-o de Mário-Captura-Sapo! Ai que e) preocupação do vaqueiro em demostrar sua virilidade.
dor!
Ao literato cujo fazia-lhe nojo a forma coloquial.

IT0317 -
Queria capturaem vez de pega para não macular (sic) a
língua nacional lá dele... (Fuvest)
Da velha draga Os textos literários são obras de discurso, a que falta a
Abrigo de vagabundos e de bêbados, restaram as imediata referencialidade da linguagem corrente;
expressões: estar na draga, viver na draga por estar sem poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante,
dinheiro, viver na miséria cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que
Que ora ofereço ao filólogo Aurélio Buarque de Hollanda os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a
Para que as registre em seus léxicos que devem o poder de apelo estético que nos enleia;
Pois que o povo já as registrou. seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...).
BARROS, M. Gramática expositiva do chão: poesia quase No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando
toda. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 1990 retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e
(fragmento). renovada pela experiência da obra, à luz do que nos
revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐
Ao criticar o preciosismo linguístico do literato e ao o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o
sugerir a dicionarização de expressões locais, o poeta fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele,
expressa uma concepção de língua que transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós
provocou.
a) contrapõe características da escrita e da fala.
Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.
b) ironiza a comunicação fora da norma-padrão.
c) substitui regionalismos por registros formais. O que eu precisava era ler um romance fantástico, um
d) valoriza o uso de variedades populares. romance besta, em que os homens e as mulheres fossem
e) defende novas regras gramaticais. criações absurdas, não andassem magoando-se, traindo-

@professorferretto @prof_ferretto 11
se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente
essas leituras já não me comovem. Os últimos quatro versos do poema rompem com a série
Graciliano Ramos, Angústia. de contrapontos entre a usina e o banguê, pois

a) negam haver diferença química entre o açúcar cristal e


Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado
o açúcar mascavo.
de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma
concessão ao gosto público. Solilóquio doido, enervante. b) esclarecem que a aparência do açúcar varia com a
Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a espécie de cana cultivada.
respeito de seu livro Angústia. c) revelam que na base de toda empresa açucareira está
o trabalhador rural.
O argumento de Benedito Nunes, em torno da natureza d) denunciam a exploração do trabalho infantil nos
artística da literatura, leva a considerar que a obra só canaviais nordestinos.
assume função transformadora se e) explicam que a estação do ano define em qualquer
a) estabelece um contraponto entre a fantasia e o processo o tipo de açúcar.
mundo.
b) utiliza a linguagem para informar sobre o mundo.
c) instiga no leitor uma atitude reflexiva diante do
IT0298 - (Fuvest)
Chega um momento em que a tensão eu/mundo se
mundo.
exprime mediante uma perspectiva crítica, imanente à
d) oferece ao leitor uma compensação anestesiante do
escrita, o que torna o romance não mais uma variante
mundo.
literária da rotina social, mas o seu avesso; logo, o oposto
e) conduz o leitor a ignorar o mundo real. do discurso ideológico do homem médio. O romancista
“imitaria” a vida, sim, mas qual vida? Aquela cujo sentido

IT0314 -
dramático escapa a homens e mulheres entorpecidos ou
(Fuvest) automatizados por seus hábitos cotidianos. A vida como
Psicanálise do açúcar objeto de busca e construção, e não a vida como
encadeamento de tempos vazios e inertes. Caso essa
O açúcar cristal, ou açúcar de usina, pobre vida-morte deva ser tematizada, ela aparecerá
mostra a mais instável das brancuras: como tal, degradada, sem a aura positiva com que as
quem do Recife sabe direito o quanto, palavras “realismo” e “realidade” são usadas nos
e o pouco desse quanto, que ela dura. discursos que fazem a apologia conformista da “vida
Sabe o mínimo do pouco que o cristal como ela é”...
se estabiliza cristal sobre o açúcar, A escrita da resistência, a narrativa atravessada pela
por cima do fundo antigo, de mascavo, tensão crítica, mostra, sem retórica nem alarde
do mascavo barrento que se incuba; ideológico, que essa “vida como ela é” é, quase sempre,
e sabe que tudo pode romper o mínimo o ramerrão [repetição] de um mecanismo alienante,
em que o cristal é capaz de censura: precisamente o contrário da vida plena e digna de ser
pois o tal fundo mascavo logo aflora vivida.
quer inverno ou verão mele o açúcar. É nesse sentido que se pode dizer que a narrativa
descobre a vida verdadeira, e que esta abraça e
Só os banguês que-ainda purgam ainda transcende a vida real. A literatura, com ser ficção, resiste
o açúcar bruto com barro, de mistura; à mentira. É nesse horizonte que o espaço da literatura,
a usina já não o purga: da infância, considerado em geral como lugar da fantasia, pode ser o
não de depois de adulto, ela o educa; lugar da verdade mais exigente.
em enfermarias, com vácuos e turbinas, Alfredo Bosi. “Narrativa e resistência”. Adaptado.
em mãos de metal de gente indústria,
a usina o leva a sublimar em cristal O conceito de resistência, expresso pela tensão do
o pardo do xarope: não o purga, cura. indivíduo perante o mundo, adquire perspectiva crítica
Mas como a cana se cria ainda hoje, na escrita do romance quando o autor
em mãos de barro de gente agricultura,
o barrento da pré-infância logo aflora
quer inverno ou verão mele o açúcar.
João Cabral de Melo Neto, A Educação pela Pedra.
* banguê: engenho de açúcar primitivo movido a força
animal.

@professorferretto @prof_ferretto 12
a) rompe a superfície enganosa da realidade. um movimento de recuperação da língua patxôhã. Os
b) forja um realismo rente à vida mesquinha. filhos de Sameary Pataxó já são fluentes – e ela, que se
mudou quando já era adulta para a aldeia, tenta
c) é neutro ao figurar a vacuidade do presente.
aprender um pouco com eles. “É a nossa identidade.
d) conserva o discurso positivo da ordem. Você diz quem você é por meio da sua língua”, afirma a
e) consegue sobrepor a fantasia à verdade. professora de ensino fundamental sobre a importância
de restaurar a língua dos pataxós. O patxôhã está entre as

IT0362 -
línguas indígenas faladas no Brasil: o IBGE estimou 274
(Enem) línguas no último censo. A publicação Povos indígenas no
Vanda vinha do interior de Minas Gerais e de dentro de Brasil 2011/2016, do Instituto Socioambiental, calcula
um livro de Charles Dickens. Sem dinheiro para criá-la, 160. Antes da chegada dos portugueses, elas totalizavam
sua mãe a dera, com seus sete anos, a uma conhecida. mais de mil.
Ao recebê-la, a mulher perguntou o que a garotinha Disponível em: https://brasil.elpais.com. Acesso em: 11
gostava de comer. Anotou tudo num papel. Mal a mãe jun. 2019 (adaptado).
virou as costas, no entanto, a fulana amassou a lista e,
como uma vilã de folhetim, decretou: “A partir de hoje, O movimento de recuperação da língua patxôhã assume
você não vai mais nem sentir o cheiro dessas comidas!”. um caráter identitário peculiar na medida em que
Vanda trabalhou lá até os quinze anos, quando recebeu a
a) denuncia o processo de perseguição histórica sofrida
carta de uma prima com uma nota de cem cruzeiros, saiu
pelos povos indígenas.
de casa com a roupa do corpo e fugiu num ônibus para
São Paulo. b) conjuga o ato de resistência étnica à preservação da
Todas as vezes que eu e minha irmã a importunávamos memória cultural.
com nossas demandas de criança mimada, ela nos c) associa a preservação linguística ao campo da pesquisa
contava histórias da infância de gata-borralheira, fazia- acadêmica.
nos apertar seu nariz quebrado por uma das filhas da d) estimula o retorno de povos indígenas a suas terras de
“patroa” com um rolo de amassar pão e nos expulsava da origem.
cozinha: “Sai pra lá, peste, e me deixa acabar essa janta” e) aumenta o número de línguas indígenas faladas no
PRATA, A. Nu de botas. São Paulo: Cia. das Letras, 2013 Brasil.
(adaptado).

Pela ótica do narrador, a trajetória da empregada de sua


casa assume um efeito expressivo decorrente da
IT0300 - (Fuvest)
A escrita faz de tal modo parte de nossa civilização que
a) citação a referências literárias tradicionais. poderia servir de definição dela própria. A história da
b) alusão à inocência das crianças da época. humanidade se divide em duas imensas eras: antes e a
partir da escrita. Talvez venha o dia de uma terceira era
c) estratégia de questionar a bondade humana.
— depois da escrita. Vivemos os séculos da civilização
d) descrição detalhada das pessoas do interior. escrita. Todas as nossas sociedades baseiam-se no
e) representação anedótica de atos de violência. escrito. A lei escrita substitui a lei oral, o contrato escrito
substitui a convenção verbal, a religião escrita se seguiu à

IT0351 -
tradição lendária. E sobretudo não existe história que não
(Enem) se funde sobre textos.
As línguas silenciadas do Brasil Charles Higounet. A história da escrita. Adaptado.
Para aprender a língua de seu povo, o professor Txaywa
Pataxó, de 29 anos, precisou estudar os fatores que, por A locução conjuntiva “de tal modo…que” e o advérbio
diversas vezes, quase provocaram a extinção da língua “sobretudo”, respectivamente, expressam noção de:
patxôhã. Mergulhou na história do Brasil e descobriu
a) conformidade e dúvida.
fatos violentos que dispersaram os pataxós, forçados a
abandonar a própria língua para escapar da perseguição. b) consequência e realce.
“Os pataxós se espalharam, principalmente, depois do c) condição e negação.
Fogo de 1951. Queimaram tudo e expulsaram a gente das d) consequência e negação.
nossas terras. Isso constrange o nosso povo até hoje”, e) condição e realce.
conta Txaywa, estudante da Universidade Federal de
Minas Gerais e professor na aldeia Barra Velha, região de
Porto Seguro (BA). Mais de quatro décadas depois,
membros da etnia retornaram ao antigo local e iniciaram
IT0303 - (Fuvest)
– Posso furar os olhos do povo?

@professorferretto @prof_ferretto 13
Esta frase besta foi repetida muitas vezes e, em falta de a) caracterização da personagem com mestiça.
coisa melhor, aceitei-a. Sem dúvida. As mulheres hoje b) construção do enredo de conquistas da família.
não vivem como antigamente, escondidas, evitando os
c) relação conflituosa das mulheres e seus maridos.
homens. Tudo é descoberto, cara a cara. Uma pessoa
topa outra. Se gostou, gostou; se não gostou, até logo. E d) nostalgia do desejo de viver como os antepassados.
eu de fato não tinha visto nada. As aparências mentem. A e) marca de antigos sofrimentos no fluxo de consciência.
terra não é redonda? Esta prova da inocência de Marina
me pareceu considerável. Tantos indivíduos condenados

IT0312 -
injustamente neste mundo ruim! O retirante que fora
encontrado violando a filha de quatro anos – estava aí (Fuvest)
um exemplo. As vizinhas tinham visto o homem Remissão
afastando as pernas da menina, todo o mundo pensava
que ele era um monstro. Engano. Quem pode lá jurar que Tua memória, pasto de poesia,
isto é assim ou assado? Procurei mesmo capacitar-me de tua poesia, pasto dos vulgares,
que Julião Tavares não existia. Julião Tavares era uma vão se engastando numa coisa fria
sensação. Uma sensação desagradável, que eu pretendia a que tu chamas: vida, e seus pesares.
afastar de minha casa quando me juntasse àquela
sensação agradável que ali estava a choramingar. Mas, pesares de quê? perguntaria,
Graciliano Ramos, Angústia. se esse travo de angústia nos cantares,
se o que dorme na base da elegia
Em termos críticos, esse fragmento permite observar vai correndo e secando pelos ares,
que, no plano maior do romance Angústia, o ponto de
vista e nada resta, mesmo, do que escreves
e te forçou ao exílio das palavras,
a) se acomoda nos limites da vulgaridade.
senão contentamento de escrever,
b) tenta imitar a retórica dos dominantes.
c) reproduz a lógica do determinismo social. enquanto o tempo, e suas formas breves
d) atinge a neutralidade do espírito maduro. ou longas, que sutil interpretavas,
e) revira os lados contrários da opinião. se evapora no fundo do teu ser?
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.

IT0346 - (Enem)
Claro enigma apresenta, por meio do lirismo reflexivo, o
posicionamento do escritor perante a sua condição no
Mas seu olhar verde, inconfundível, impressionante,
mundo. Considerando-o como representativo desse seu
iluminava com sua luz misteriosa as sombrias arcadas
aspecto, o poema “Remissão”
superciliares, que pareciam queimadas por ela, dizia logo
a sua origem cruzada e decantada através das misérias e a) traduz a melancolia e o recolhimento do eu lírico em
dos orgulhos de homens de aventura, contadores de face da sensação de incomunicabilidade com uma
histórias fantásticas, e de mulheres caladas e sofredoras, realidade indiferente à sua poesia.
que acompanhavam os maridos e amantes através das b) revela uma perspectiva inconformada, mesclando-a,
matas intermináveis, expostas às febres, às feras, às livre da indulgência dos anos anteriores, a um novo
cobras do sertão indecifrável, ameaçador e sem fim, que formalismo estético.
elas percorriam com a ambição única de um “pouso”
c) propõe, como reação do poeta à vulgaridade do
onde pudessem viver, por alguns dias, a vida ilusória de
mundo, uma poética capaz de interferir na realidade
família e de lar, sempre no encalço dos homens,
pelo viés nostálgico.
enfebrados pela procura do ouro e do diamante.
PENNA, C. Fronteira. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s/d. d) reflete a visão idealizada do trabalho do poeta e a
consciência da perenidade da poesia, resistente à
Ao descrever os olhos de Maria Santa, o narrador passagem do tempo.
estabelece correlações que refletem a e) realiza a transição do lirismo social para o lirismo
metafísico, caracterizado pela adesão ao conforto
espiritual e ao escapismo imaginativo.

IT0326 - (Fuvest)

@professorferretto @prof_ferretto 14
Agora, o Manuel Fulô, este, sim! Um sujeito pingadinho, como Avanhandava (lugar onde o índio corre),
quase menino – “pepino que encorujou desde pequeno” Pindamonhangaba (lugar de fazer anzol) e Itu (cachoeira).
– cara de bobo de fazenda, do segundo tipo –; porque E acabou inventando uma nova língua.
toda fazenda tem o seu bobo, que é, ou um velhote
baixote, de barba rara no queixo, ou um eterno rapazola, “Os escravos dos bandeirantes vinham de mais de 100
meio surdo, gago, glabro* e alvar**. Mas gostava de tribos diferentes”, conta o historiador e antropólogo John
fechar a cara e roncar voz, todo enfarruscado, para Monteiro, da Universidade Estadual de Campinas. “Isso
mostrar brabeza, e só por descuido sorria, um sorriso mudou o tupi paulista, que, além da influência do
manhoso de dono de hotel. E, em suas feições de português, ainda recebia palavras de outros idiomas.” O
caburé*** insalubre, amigavam‐se as marcas do sangue resultado da mistura ficou conhecido como língua geral
aimoré e do gálico herdado: cabelo preto, corrido, que do sul, uma espécie de tupi facilitado.
boi lambeu; dentes de fio em meia‐lua; malares ANGELO. C. Disponível em: http://super.abril.com.br.
pontudos; lobo da orelha aderente; testa curta, fugidia; Acesso em: 8 ago. 2012 (adaptado).
olhinhos de viés e nariz peba, mongol.
Guimarães Rosa, “Corpo fechado”, de Sagarana. O texto trata de aspectos sócio-históricos da formação
linguística nacional. Quanto ao papel do tupi na formação
*sem pelos, sem barba **tolo ***mestiço do português brasileiro, depreende-se que essa língua
indígena
O retrato de Manuel Fulô, tal como aparece no
a) contribuiu efetivamente para o léxico, com nomes
fragmento, permite afirmar que
relativos aos traços característicos dos lugares
a) há clara antipatia do narrador para com a personagem, designados.
que por isso é caracterizada como “bobo de fazenda”. b) originou o português falado em São Paulo no século
b) estão presentes traços de diferentes etnias, de modo a XVII, em cuja base gramatical também está a fala de
refletir a mescla de culturas própria ao estilo do livro. variadas etnias indígenas.
c) a expressão “caburé insalubre” denota o determinismo c) desenvolveu-se sob influência dos trabalhos de
biológico que norteia o livro. catequese dos padres portugueses vindos de Lisboa.
d) é irônico o trecho “para mostrar brabeza”, pois ao fim d) misturou-se aos falares africanos, em razão das
da narrativa Manuel Fulô sofre derrota na luta física. interações entre portugueses e negros nas investidas
e) se apontam em sua fisionomia os “olhinhos de viés” contra o Quilombo dos Palmares.
para caracterizar a personagem como ingênua. e) expandiu-se paralelamente ao português falado pelo
colonizador, e juntos originaram a língua dos

IT0016 -
bandeirantes paulistas.
(Enem)

IT0307 -
A língua tupi no Brasil
(Fuvest)
Há 300 anos, morar na vila de São Paulo de Piratininga Alferes, Ouro Preto em sombras
(peixe seco, em tupi) era quase sinônimo de falar língua Espera pelo batizado,
de índio. Em cada cinco habitantes da cidade, só dois Ainda que tarde sobre a morte do sonhador
conheciam o português. Por isso, em 1698, o governador Ainda que tarde sobre as bocas do traidor.
da província, Artur de Sá e Meneses, implorou a Portugal Raios de sol brilharão nos sinos:
que só mandasse padres que soubessem “a língua geral Dez vias dar.
dos índios”, pois “aquela gente não se explica em outro
idioma”. Ai Marília, as liras e o amar
Não posso mais sufocar
Derivado do dialeto de São Vicente, o tupi de São Paulo E a minha voz irá
se desenvolveu e se espalhou no século XVII, graças ao Pra muito além do desterro e do sal,
isolamento geográfico da cidade e à atividade pouco Maior que a voz do rei.
cristã dos mamelucos paulistas: as bandeiras, expedições Aldir Blanc e João Bosco, trecho da canção “Alferes”, de
ao sertão em busca de escravos índios. Muitos 1973.
bandeirantes nem sequer falavam o português ou se
expressavam mal. Domingos Jorge Velho, o paulista que A imagem de Tiradentes – a quem Cecília Meireles
destruiu o Quilombo dos Palmares em 1694, foi descrito qualificou “o Alferes imortal, radiosa expressão dos mais
pelo bispo de Pernambuco como “um bárbaro que nem altos sonhos desta cidade, do Brasil e do próprio mundo”,
falar sabe”. Em suas andanças, essa gente batizou lugares em palestra feita em Ouro Preto – torna a aparecer como

@professorferretto @prof_ferretto 15
IT0316 -
símbolo da luta pela liberdade em vários momentos da
cultura nacional. Os versos do letrista Aldir Blanc evocam, (Fuvest)
em novo contexto, o mártir sonhador para resistir ao Cantiga de enganar
discurso (...)
O mundo não tem sentido.
a) da doutrina revolucionária de ligas politicamente
O mundo e suas canções
engajadas.
de timbre mais comovido
b) da historiografia, que minimizou a importância de
estão calados, e a fala
Tiradentes.
que de uma para outra sala
c) de autoritarismo e opressão, próprio da ditadura ouvimos em certo instante
militar. é silêncio que faz eco
d) dos poetas árcades, que se dedicavam às suas liras e que volta a ser silêncio
amorosas. no negrume circundante.
e) da tirania portuguesa sobre os mineradores no ciclo Silêncio: que quer dizer?
do ouro. Que diz a boca do mundo?
Meu bem, o mundo é fechado,
se não for antes vazio.
IT0352 - (Enem) O mundo é talvez: e é só.
Esaú e Jacó
Bárbara entrou, enquanto o pai pegou da viola e passou Talvez nem seja talvez.
ao patamar de pedra, à porta da esquerda. Era uma O mundo não vale a pena,
criaturinha leve e breve, saia bordada, chinelinha no pé. mas a pena não existe.
Não se lhe podia negar um corpo airoso. Os cabelos, Meu bem, façamos de conta.
apanhados no alto da cabeça por um pedaço de fita De sofrer e de olvidar,
enxovalhada, faziam-lhe um solidéu natural, cuja borla de lembrar e de fruir,
era suprida por um raminho de arruda. Já vai nisto um de escolher nossas lembranças
pouco de sacerdotisa. O mistério estava nos olhos. Estes e revertê‐las, acaso
eram opacos, não sempre nem tanto que não fossem se lembrem demais em nós.
também lúcidos e agudos, e neste último estado eram Façamos, meu bem, de conta
igualmente compridos; tão compridos e tão agudos que – mas a conta não existe –
entravam pela gente abaixo, revolviam o coração e que é tudo como se fosse,
tornavam cá fora, prontos para nova entrada e outro ou que, se fora, não era.
revolvimento. Não te minto dizendo que as duas (...)
sentiram tal ou qual fascinação. Bárbara interrogou-as; Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.
Natividade disse ao que vinha e entregou-lhe os retratos
dos filhos e os cabelos cortados, por lhe haverem dito Em Claro Enigma, a ideia de engano surge sob a
que bastava. perspectiva do sujeito maduro, já afastado das ilusões,
– Basta, confirmou Bárbara. Os meninos são seus filhos? como se lê no verso‐síntese “Tu não me enganas, mundo,
– São. e não te engano a ti.” (“Legado”). O excerto de “Cantiga
ASSIS, M. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, de enganar” apresenta a relação do eu com o mundo
1994. mediada

a) pela música, que ressoa em canções líricas.


No relato da visita de duas mulheres ricas a uma vidente
b) pela cor, brilhante na claridade solar.
no Morro do Castelo, a ironia — um dos traços mais
c) pela afirmação de valores sólidos.
representativos da narrativa machadiana — consiste no
d) pela memória, que corre fluida no tempo.
a) modo de vestir dos moradores do morro carioca. e) pelo despropósito de um faz‐de‐conta.
b) senso prático em relação às oportunidades de renda.

IT0310 -
c) mistério que cerca as clientes de práticas de vidência.
d) misto de singeleza e astúcia dos gestos da (Fuvest)
personagem. Leusipo perguntou o que eu tinha ido fazer na aldeia.
e) interesse do narrador pelas figuras femininas Preferi achar que o tom era amistoso e, no meu
ambíguas. paternalismo ingênuo, comecei a lhe explicar o que era
um romance. Eu tentava convencê-lo de que não havia
motivo para preocupação. Tudo o que eu queria saber já

@professorferretto @prof_ferretto 16
era conhecido. E ele me perguntava: “Então, porque você Disponível em: www.migalhas.com.br. Acesso em: 23 set.
quer saber, se já sabe?” Tentei lhe explicar que pretendia 2020 (adaptado).
escrever um livro e mais uma vez o que era um romance,
o que era um livro de ficção (e mostrava o que tinha nas Essa petição de habeas corpus, ao transgredir o rigor da
mãos), que seria tudo historinha, sem nenhuma linguagem jurídica,
consequência na realidade. Ele seguia incrédulo. Fazia-se
a) permite que a narrativa seja objetiva e repleta de
de desentendido, mas na verdade só queria me intimidar.
sentidos denotativos.
As minhas explicações sobre o romance eram inúteis. Eu
tentava dizer que, para os brancos que não acreditam em b) mostra que o cordel explora termos próprios da esfera
deuses, a ficção servia de mitologia, era o equivalente do direito.
dos mitos dos índios, e antes mesmo de terminar a frase, c) demonstra que o jogo de linguagem proposto atenua a
já não sabia se o idiota era ele ou eu. Ele não dizia nada a gravidade do delito.
não ser: “O que você quer com o passado?”. Repetia. E, d) exemplifica como o texto em forma de cordel
diante da sua insistência bovina, tive de me render à compromete a solicitação pretendida.
evidência de que eu não sabia responder à sua pergunta. e) esclarece que os termos “crime” e “processo de
Bernardo Carvalho, Nove Noites. Adaptado. contravenção” são sinônimos.

Na cena apresentada, que explora o desconforto gerado


pela difícil interlocução com o indígena, o narrador
IT0353 - (Enem)
a) abandona a ideia de investigar o passado, ao se ver A senhora manifestava-se por atos, por gestos, e
encurralado por Leusipo. sobretudo por um certo silêncio, que amargava, que
b) explora a sua posição ameaçadora de homem branco, esfolava. Porém desmoralizar escancaradamente o
ao insistir em permanecer na aldeia. marido, não era com ela. [...]
As negras receberam ordem para meter no serviço a
c) age com ousadia, ao procurar subjugar Leusipo a
gente do tal compadre Silveira: as cunhadas, ao fuso; os
contribuir com o seu projeto.
cunhados, ao campo, tratar do gado com os vaqueiros; a
d) identifica-se com a sabedoria de Leusipo, ao preterir
mulher e as irmãs, que se ocupassem da ninhada.
do papel interrogativo e se deixar questionar.
Margarida não tivera filhos, e como os desejasse com a
e) sente-se frustrado com a reação de Leusipo, que não força de suas vontades, tratava sempre bem aos
se deixa levar por sua diplomacia. pequenitos e às mães que os estavam criando. Não era
isso uma sentimentalidade cristã, uma ternura, era o

IT0014 -
egoísta e cru instinto da maternidade, obrando por mera
(Enem) simpatia carnal. Quanto ao pai do lote (referia-se ao
Senhor Juiz Antônio), esse que fosse ajudar ao vaqueiro das bestas.
Ordens dadas, o Quinquim referendava. Cada um
O instrumento do “crime” que se arrola moralizava o outro, para moralizar-se.
Nesse processo de contravenção PAIVA, M. O. Dona Guidinha do Poço. Rio de Janeiro:
Não é faca, revólver ou pistola, Tecnoprint, s/d.
Simplesmente, doutor, é um violão.
No trecho do romance naturalista, a forma como o
Será crime, afinal, será pecado, narrador julga comportamentos e emoções das
Será delito de tão vis horrores, personagens femininas revela influência do pensamento
Perambular na rua um desgraçado
a) capitalista, marcado pela distribuição funcional do
Derramando nas praças suas dores?
trabalho.
Mande, pois, libertá-lo da agonia b) liberal, buscando a igualdade entre pessoas
(a consciência assim nos insinua) escravizadas e livres.
Não sufoque o cantar que vem da rua, c) científico, considerando o ser humano como um
Que vem da noite para saudar o dia. fenômeno biológico.
d) religioso, fundamentado na fé e na aceitação dos
É o apelo que aqui lhe dirigimos, dogmas do cristianismo.
Na certeza do seu acolhimento e) afetivo, manifesto na determinação de acolher
Juntada desta aos autos nós pedimos familiares e no respeito mútuo.
E pedimos, enfim, deferimento

@professorferretto @prof_ferretto 17
IT0002 -
que devem o poder de apelo estético que nos enleia;
(Enem) seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...).
Não que Pelino fosse químico, longe disso; mas era sábio, No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando
era gramático. Ninguém escrevia em Tubiacanga que não retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e
levasse bordoada do Capitão Pelino, e mesmo quando se renovada pela experiência da obra, à luz do que nos
falava em algum homem notável lá no Rio, ele não revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐
deixava de dizer: “Não há dúvida! O homem tem talento, o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o
mas escreve: ‘um outro’, ‘de resto’...” E contraía os lábios fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele,
como se tivesse engolido alguma cousa amarga. transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós
Toda a vila de Tubiacanga acostumou-se a respeitar o provocou.
solene Pelino, que corrigia e emendava as maiores glórias Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.
nacionais. Um sábio...
Ao entardecer, depois de ler um pouco o Sotero, o O que eu precisava era ler um romance fantástico, um
Candido de Figueiredo ou o Castro Lopes, e de ter romance besta, em que os homens e as mulheres fossem
passado mais uma vez a tintura nos cabelos, o velho criações absurdas, não andassem magoando-se, traindo-
mestre-escola saía vagarosamente de casa, muito se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente
abotoado no seu paletó de brim mineiro, e encaminhava- essas leituras já não me comovem.
se para a botica do Bastos a dar dous dedos de prosa. Graciliano Ramos, Angústia.
Conversar é um modo de dizer, porque era Pelino avaro
de palavras, limitando-se tão-somente a ouvir. Quando, Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado
porém, dos lábios de alguém escapava a menor de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma
incorreção de linguagem, intervinha e emendava. “Eu concessão ao gosto público. Solilóquio doido, enervante.
asseguro, dizia o agente do Correio, que…” Por aí, o Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a
mestre-escola intervinha com mansuetude evangélica: respeito de seu livro Angústia.
“Não diga ‘asseguro’, Senhor Bernardes; em português é
garanto”. Para Graciliano Ramos, Angústia não faz concessão ao
E a conversa continuava depois da emenda, para ser de gosto do público na medida em que compõe uma
novo interrompida por uma outra. Por essas e outras, atmosfera
houve muitos palestradores que se afastaram, mas
a) dramática, ao representar as tensões de seu tempo.
Pelino, indiferente, seguro dos seus deveres, continuava
b) grotesca, ao eliminar a expressão individual.
o seu apostolado de vernaculismo.
BARRETO, L. A Nova Califórnia. Disponível em: c) satírica, ao reduzir os eventos ao plano do riso.
www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 24 jul. 2019. d) ingênua, ao simular o equilíbrio entre sujeito e
mundo.
Do ponto de vista linguístico, a defesa da norma-padrão e) alegórica, ao exaltar as imagens de sujeira.
pelo personagem caracteriza-se por

a) contestar o ensino de regras em detrimento do


conteúdo das informações. IT0323 - (Fuvest)
Uma planta é perturbada na sua sesta* pelo exército que
b) resgatar valores patrióticos relacionados às tradições
a pisa.
da língua portuguesa.
Mas mais frágil fica a bota.
c) adotar uma perspectiva complacente em relação aos
Gonçalo M. Tavares, 1: poemas.
desvios gramaticais.
*sesta: repouso após o almoço.
d) invalidar os usos da língua pautados pelos preceitos da
gramática normativa. Considerando que se trata de um texto literário, uma
e) desconsiderar diferentes níveis de formalidade nas interpretação que seja capaz de captar a sua
situações de comunicação. complexidade abordará o poema como

a) uma defesa da natureza.

IT0319 - (Fuvest)
b) um ataque às forças armadas.
c) uma defesa dos direitos humanos.
Os textos literários são obras de discurso, a que falta a
imediata referencialidade da linguagem corrente; d) uma defesa da resistência civil.
poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante, e) um ataque à passividade.
cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que
os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a

@professorferretto @prof_ferretto 18
IT0292 -
a) a contemplação das paisagens naturais, como se lê em
(Fuvest) “ele admirava aquele pedaço de água quieta”.
No modelo hegemônico, quase todo o treinamento é b) a presença de um narrador-personagem, como se lê
reservado para o desenvolvimento muscular, sobrando em “em verdade vos digo que pensava em outra
muito pouco tempo para a mobilidade, a flexibilidade, o coisa”.
treino restaurativo, o relaxamento e o treinamento c) a sobriedade do protagonista ao avaliar o seu
cardiovascular. Na teoria, seria algo em torno de 70% percurso, como se lê em “Cotejava o passado com o
para o fortalecimento, 20% para o cárdio e 10% para a presente”.
flexibilidade e outros. Na prática, muitos alunos
d) o sentido místico e fatalista que rege os destinos,
direcionam 100% do tempo para o fortalecimento.
como se lê em “Deus escreve direito por linhas
Como a prática cardiovascular é infinitamente mais
tortas”.
significativa e determinante para a nossa saúde orgânica
como um todo, podendo ser considerada o “coração” de e) a reversibilidade entre o cômico e o trágico, como se lê
um treinamento consciente e saudável, essa ordem em “de modo que o que parecia uma desgraça...”.
deveria ser revista.
Nuno Cobra Jr. “Fitness não é saúde”. Uol. 06/05/2021.
Adaptado. IT0004 - (Enem)
Estojo escolar
Dentre as expressões destacadas, a que exerce a mesma
função sintática do termo sublinhado em “o treino Rio de Janeiro – Noite dessas, ciscando num desses
restaurativo, o relaxamento e o treinamento canais a cabo, vi uns caras oferecendo maravilhas
cardiovascular” é: eletrônicas, bastava telefonar e eu receberia um
notebook capaz de me ajudar a fabricar um navio, uma
a) um atleta de seleção precisa de treinamento intenso. estação espacial.
b) o amor ao esporte é fundamental para o atleta. [...] Como pretendo viajar esses dias, habilitei-me a
c) a população incorpora radicalmente atitudes comprar aquilo que os caras anunciavam como o top do
saudáveis. top em matéria de computador portátil.
d) muitas pessoas se beneficiam de alimentos verdes. No sábado, recebi um embrulho complicado que
e) todo tipo de atividade física faz bem à saúde mental. necessitava de um manual de instruções para ser aberto.
[...] De repente, como vem acontecendo nos últimos
tempos, houve um corte na memória e vi diante de mim

IT0311 - (Fuvest)
o meu primeiro estojo escolar. Tinha 5 anos e ia para o
jardim de infância.
Rubião fitava a enseada, – eram oito horas da manhã.
Era uma caixinha comprida, envernizada, com uma
Quem o visse, com os polegares metidos no cordão do
tampa que corria nas bordas do corpo principal. Dentro,
chambre, à janela de uma grande casa de Botafogo,
arrumados em divisões, havia lápis coloridos, um
cuidaria que ele admirava aquele pedaço de água quieta;
apontador, uma lapiseira cromada, uma régua de 20 cm e
mas em verdade vos digo que pensava em outra coisa.
uma borracha para apagar meus erros.
Cotejava o passado com o presente. Que era, há um ano?
[...] Da caixinha vinha um cheiro gostoso, cheiro que
Professor. Que é agora! Capitalista. Olha para si, para as nunca esqueci e que me tonteava de prazer. [...]
chinelas (umas chinelas de Túnis, que lhe deu recente
O notebook que agora abro é negro e, em matéria de
amigo, Cristiano Palha), para a casa, para o jardim, para a
cheiro, é abominável. Cheira vilmente a telefone celular,
enseada, para os morros e para o céu; e tudo, desde as
a cabine de avião, a aparelho de ultrassonografia onde
chinelas até o céu, tudo entra na mesma sensação de
outro dia uma moça veio ver como sou por dentro. Acho
propriedade.
que piorei de estojo e de vida.
– Vejam como Deus escreve direito por linhas tortas,
CONY, C. H. Crônicas para ler na escola. São Paulo:
pensa ele. Se mana Piedade tem casado com Quincas
Objetiva, 2009 (adaptado).
Barba, apenas me dano uma esperança colateral. Não
casou; ambos morreram, e aqui está tudo comigo; de
No texto, há marcas da função da linguagem que nele
modo que o que parecia uma desgraça...
predomina. Essas marcas são responsáveis por colocar
Machado de Assis, Quincas Borba.
em foco o(a)

O primeiro capítulo de Quincas Borba já apresenta ao


leitor um elemento que será fundamental na construção
do romance:

@professorferretto @prof_ferretto 19
a) mensagem, elevando-a à categoria de objeto estético a) fluidez nos ventos do presente e conteúdo fixo no
do mundo das artes. passado.
b) código, transformando a linguagem utilizada no texto b) forma abstrata no espaço e presença concreta na
na própria temática abordada. história.
c) contexto, fazendo das informações presentes no texto c) leveza impalpável na arte e vigor nos documentos
seu aspecto essencial. antigos.
d) enunciador, buscando expressar sua atitude em d) sonoridade ruidosa nos ares e significado estável no
relação ao conteúdo do enunciado. papel.
e) interlocutor, considerando-o responsável pelo e) lirismo irrefletido da poesia e peso justo dos
direcionamento dado à narrativa pelo enunciador. acontecimentos.

IT0306 -
(Fuvest) IT0322 - (Fuvest)
Romance LIII ou Das Palavras Aéreas amora
a palavra amora
Ai, palavras, ai, palavras, seria talvez menos doce
que estranha potência, a vossa! e um pouco menos vermelha
Ai, palavras, ai, palavras, se não trouxesse em seu corpo
sois de vento, ides no vento, (como um velado esplendor)
no vento que não retorna, a memória da palavra amor
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma! a palavra amargo
seria talvez mais doce
Sois de vento, ides no vento, e um pouco menos acerba
e quedais, com sorte nova! (...) se não trouxesse em seu corpo
(como uma sombra a espreitar)
Ai, palavras, ai, palavras, a memória da palavra amar
que estranha potência, a vossa! Marco Catalão, Sob a face neutra.
Perdão podíeis ter sido!
– sois madeira que se corta, Tal como se lê no poema,
– sois vinte degraus de escada,
– sois um pedaço de corda... a) a palavra “amora” é substantivo, e “amargo”, adjetivo.
– sois povo pelas janelas, b) o verbo “amar” ameniza o amargor da palavra
cortejo, bandeiras, tropa... “amargo”.
c) o substantivo “corpo” apresenta sentido denotativo.
Ai, palavras, ai, palavras, d) o substantivo “amor” intensifica o dulçor da palavra
que estranha potência, a vossa! “amora”.
Éreis um sopro na aragem... e) o verbo “amar” e o substantivo “amor” são
– sois um homem que se enforca! intercambiáveis.
Cecília Meireles, Romanceiro da Inconfidência.

A “estranha potência” que a voz lírica ressalta nas


palavras decorre de uma combinação entre
IT0011 - (Enem)
Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário
público, certo de que a língua portuguesa é emprestada
ao Brasil; certo também de que, por esse fato, o falar e o
escrever em geral, sobretudo no campo das letras, se
veem na humilhante contingência de sofrer
continuamente censuras ásperas dos proprietários da
língua; sabendo, além, que, dentro do nosso país, os
autores e os escritores, com especialidade os gramáticos,
não se entendem no tocante à correção gramatical,
vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os
mais profundos estudiosos do nosso idioma – usando do
direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o

@professorferretto @prof_ferretto 20
IT0010 -
Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua
oficial e nacional do povo brasileiro. (Enem)
BARRETO, L. Triste fim de Policarpo Quaresma. Disponível Vou-me embora p’ra Pasárgada foi o poema de mais
em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 26 jun. longa gestação em toda a minha obra. Vi pela primeira
2012 vez esse nome Pasárgada quando tinha os meus
dezesseis anos e foi num autor grego. [...] Esse nome de
Nessa petição da pitoresca personagem do romance de Pasárgada, que significa “campo dos persas” ou “tesouro
Lima Barreto, o uso da norma-padrão justifica-se pela dos persas”, suscitou na minha imaginação uma
paisagem fabulosa, um país de delícias, como o
a) situação social de enunciação representada.
de L’invitation au Voyage, de Baudelaire. Mais de vinte
b) divergência teórica entre gramáticos e literatos.
anos depois, quando eu morava só na minha casa da Rua
c) pouca representatividade das línguas indígenas. do Curvelo, num momento de fundo desânimo, da mais
d) atitude irônica diante da língua dos colonizadores. aguda sensação de tudo o que eu não tinha feito em
e) tentativa de solicitação do documento demandado. minha vida por motivo da doença, saltou-me de súbito
do subconsciente este grito estapafúrdio: “Vou-me
embora p’ra Pasárgada!” Senti na redondilha a primeira
IT0357 - (Enem) célula de um poema, e tentei realizá-lo, mas fracassei.
Alguns anos depois, em idênticas circunstâncias de
Ser cronista
Sei que não sou, mas tenho meditado ligeiramente no desalento e tédio, me ocorreu o mesmo desabafo de
assunto. evasão da “vida besta”. Desta vez o poema saiu sem
Crônica é um relato? É uma conversa? É um resumo de esforço como se já estivesse pronto dentro de mim.
um estado de espírito? Não sei, pois antes de começar a Gosto desse poema porque vejo nele, em escorço, toda a
escrever para o Jornal do Brasil, eu só tinha escrito minha vida; [...] Não sou arquiteto, como meu pai
romances e contos. desejava, não fiz nenhuma casa, mas reconstruí e “não
E também sem perceber, à medida que escrevia para de uma forma imperfeita neste mundo de aparências’,
aqui, ia me tornando pessoal demais, correndo o risco de uma cidade ilustre, que hoje não é mais a Pasárgada de
em breve publicar minha vida passada e presente, o que Ciro, e sim a “minha” Pasárgada.
não pretendo. Outra coisa notei: basta eu saber que BANDEIRA, M. Itinerário da Pasárgada. Rio de Janeiro:
estou escrevendo para jornal, isto é, para algo aberto Nova Fronteira; Brasília: INL, 1984
facilmente por todo o mundo, e não para um livro, que só
é aberto por quem realmente quer, para que, sem Os processos de interação comunicativa preveem a
mesmo sentir, o modo de escrever se transforme. Não é presença ativa de múltiplos elementos da comunicação,
que me desagrade mudar, pelo contrário. Mas queria que entre os quais se destacam as funções da linguagem.
fossem mudanças mais profundas e interiores que não Nesse fragmento, a função da linguagem predominante
viessem a se refletir no escrever. Mas mudar só porque é
isso é uma coluna ou uma crônica? Ser mais leve só a) emotiva, porque o poeta expõe os sentimentos de
porque o leitor assim o quer? Divertir? Fazer passar uns angústia que o levaram à criação poética.
minutos de leitura? E outra coisa: nos meus livros quero
b) referencial, porque o texto informa sobre a origem do
profundamente a comunicação profunda comigo e com o
nome empregado em um famoso poema de
leitor. Aqui no Jornal apenas falo com o leitor e agrada-
Bandeira.
me que ele fique agradado. Vou dizer a verdade: não
c) metalinguística, porque o poeta tece comentários
estou contente.
sobre a gênese e o processo de escrita de um de seus
LISPECTOR, C. In: A descoberta do mundo. Rio de Janeiro:
poemas.
Rocco, 1999.
d) poética, porque o texto aborda os elementos estéticos
No texto, ao refletir sobre a atividade de cronista, a de um dos poemas mais conhecidos de Bandeira.
autora questiona características do gênero crônica, como e) apelativa, porque o poeta tenta convencer os leitores
sobre sua dificuldade de compor um poema.
a) relação distanciada entre os interlocutores.
b) articulação de vários núcleos narrativos.
c) brevidade no tratamento da temática.
d) descrição minuciosa dos personagens.
IT0321 - (Fuvest)
amora
e) público leitor exclusivo. a palavra amora
seria talvez menos doce
e um pouco menos vermelha

@professorferretto @prof_ferretto 21
se não trouxesse em seu corpo a) justaposição de sequências verbais e nominais.
(como um velado esplendor) b) mudança de eventos resultante do jogo temporal.
a memória da palavra amor
c) uso de adjetivos qualificativos na descrição do cenário.
a palavra amargo
seria talvez mais doce d) encadeamento semântico pelo uso de substantivos
e um pouco menos acerba sinônimos.
se não trouxesse em seu corpo e) inter-relação entre orações por elementos linguísticos
(como uma sombra a espreitar) lógicos.
a memória da palavra amar

IT0328 -
Marco Catalão, Sob a face neutra.
(Fuvest)
É correto afirmar que o poema ) E Sofia? interroga impaciente a leitora, tal qual Orgon:
Et Tartufe? Ai, amiga minha, a resposta é naturalmente a
a) aborda o tema da memória, considerada uma
mesma, – também ela comia bem, dormia largo e fofo, –
faculdade que torna o ser humano menos amargo e
coisas que, aliás, não impedem que uma pessoa ame,
sombrio.
quando quer amar. Se esta última reflexão é o motivo
b) enfoca a hesitação do eu lírico diante das palavras, o secreto da vossa pergunta, deixai que vos diga que sois
que vem expresso pela repetição da palavra “talvez”. muito indiscreta, e que eu não me quero senão com
c) apresenta natureza romântica, sendo as palavras dissimulados.
“amora” e “amargo” metáforas do sentimento Repito, comia bem, dormia largo e fofo. Chegara ao fim
amoroso. da comissão das Alagoas, com elogios da imprensa; a
d) possui reiterações sonoras que resultam em uma Atalaia chamou‐lhe “o anjo da consolação”. 1E não se
tensão inusitada entre os termos “amor” e “amar”. pense que este nome a alegrou, posto que a lisonjeasse;
e) ressalta os significados das palavras tal como se ao contrário, resumindo em Sofia toda a ação da
verificam no seu uso mais corrente. caridade, podia mortificar as novas amigas, e fazer‐lhe
perder em um dia o trabalho de longos meses. Assim se

IT0341 -
explica o artigo que a mesma folha trouxe no número
(Enem) seguinte, nomeando, particularizando e glorificando as
Morte lenta ao luso infame que inventou a calçada outras comissárias – “estrelas de primeira grandeza”.
portuguesa. Maldito D. Manuel I e sua corja de tenentes Machado de Assis, Quincas Borba.
Eusébios. Quadrados de pedregulho irregular socados à
mão. À mão! É claro que ia soltar, ninguém reparou que No excerto, o autor recorre à intertextualidade,
ia soltar? Branco, preto, branco, preto, as ondas do mar dialogando com a comédia de Molière, Tartufo (1664),
de Copacabana. De que me servem as ondas do mar de cuja personagem central é um impostor da fé. Tal é a
Copacabana? Me deem chão liso, sem protuberâncias fama da peça que o nome próprio se incorporou ao
calcárias. Mosaico estúpido. Mania de mosaico. Joga vocabulário, inclusive em português, como substantivo
concreto em cima e aplaina. Buraco, cratera, pedra solta, comum, para designar o “indivíduo hipócrita” ou o “falso
bueiro-bomba. Depois dos setenta, a vida se transforma devoto”. No contexto maior do romance, sugere‐se que a
numa interminável corrida de obstáculos. A queda é a tartufice
maior ameaça para o idoso. “Idoso”, palavra odienta. a) se cola à imagem da leitora, indiscreta quanto aos
Pior, só “terceira idade”. A queda separa a velhice da amores alheios.
senilidade extrema. O tombo destrói a cadeia que liga a
b) é ação isolada de Sofia, arrivista social e benemérita
cabeça aos pés. Adeus, corpo. Em casa, vou de corrimão
fingida.
em corri - mão, tateio móveis e paredes, e tomo banho
sentado. Da poltrona para a janela, da janela para a c) diz respeito ao filósofo Quincas Borba, o que explica o
cama, da cama para a poltrona, da poltrona para a janela. título do livro.
Olha aí, outra vez, a pedrinha traiçoeira atrás de me d) se produz na imprensa, apesar de esta se esquivar da
pegar. Um dia eu caio, hoje não. eloquência vazia.
TORRES, F. Fim. São Paulo: Cia. das Letras, 2013. e) se estende à sociedade, na qual o cinismo é o trunfo
dos fortes.
O recurso que caracteriza a organização estrutural desse

IT0293 -
texto é o(a)
(Fuvest)
Leia os seguintes textos de Machado de Assis:

@professorferretto @prof_ferretto 22
a) volta-se nostálgica para as imagens de uma
I. lembrança.
Suave mari magno* b) centra-se com desprezo na figura do animal
agonizante.
Lembra-me que, em certo dia,
c) apreende displicentemente o movimento dos
Na rua, ao sol de verão,
transeuntes.
Envenenado morria
Um pobre cão. d) ganha distância da cena para captar todos os seus
aspectos.
Arfava, espumava e ria, e) apresenta o espectador da crueldade como um ser
De um riso espúrio e bufão, incomum.
Ventre e pernas sacudia

IT0318 -
Na convulsão.
(Fuvest)
Nenhum, nenhum curioso Os textos literários são obras de discurso, a que falta a
Passava, sem se deter, imediata referencialidade da linguagem corrente;
Silencioso, poéticos, abolem, “destroem” o mundo circundante,
cotidiano, graças à função irrealizante da imaginação que
Junto ao cão que ia morrer, os constrói. E prendem‐nos na teia de sua linguagem, a
Como se lhe desse gozo que devem o poder de apelo estético que nos enleia;
Ver padecer. seduz‐nos o mundo outro, irreal, neles configurado (...).
Machado de Assis. Ocidentais. No entanto, da adesão a esse “mundo de papel”, quando
retornamos ao real, nossa experiência, ampliada e
* Expressão latina, retirada de Lucrécio (Da natureza das renovada pela experiência da obra, à luz do que nos
coisas), a qual aparece no seguinte trecho: Suave, mari revelou, possibilita redescobri‐lo, sentindo‐o e pensando‐
magno, turbantibus aequora ventis/ E terra magnum o de maneira diferente e nova. A ilusão, a mentira, o
alterius spectare laborem. (“É agradável, enquanto no fingimento da ficção, aclara o real ao desligar‐se dele,
mar revoltoso os ventos levantam as águas, observar da transfigurando‐o; e aclara‐o já pelo insight que em nós
terra os grandes esforços de um outro.”). provocou.
Benedito Nunes, “Ética e leitura”, de Crivo de Papel.
II.
Tão certo é que a paisagem depende do ponto de vista, e O que eu precisava era ler um romance fantástico, um
que o melhor modo de apreciar o chicote é ter-lhe o cabo romance besta, em que os homens e as mulheres fossem
na mão. criações absurdas, não andassem magoando-se, traindo-
Machado de Assis. Quincas Borba, cap. XVIII. se. Histórias fáceis, sem almas complicadas. Infelizmente
essas leituras já não me comovem.
III. Graciliano Ramos, Angústia.
Sofia soltou um grito de horror e acordou. Tinha ao pé do
leito o marido: Romance desagradável, abafado, ambiente sujo, povoado
– Que foi? perguntou ele. de ratos, cheio de podridões, de lixo. Nenhuma
– Ah! respirou Sofia. Gritei, não gritei? concessão ao gosto público. Solilóquio doido, enervante.
(...) Graciliano Ramos, Memórias do Cárcere, em nota a
– Sonhei que estavam matando você. respeito de seu livro Angústia.
Palha ficou enternecido. Havê-la feito padecer por ele,
ainda que em sonhos, encheu-o de piedade, mas de uma Se o discurso literário “aclara o real ao desligar-se dele,
piedade gostosa, um sentimento particular, íntimo, transfigurando-o”, pode-se dizer que Luís da Silva, o
profundo, – que o faria desejar outros pesadelos, para narrador-protagonista de Angústia, já não se comove
que o assassinassem aos olhos dela, e para que ela com a leitura de “histórias fáceis, sem almas
gritasse angustiada, convulsa, cheia de dor e de pavor. complicadas” porque
Machado de Assis. Quincas Borba, cap. CLXI.

A visão do eu lírico no texto I

@professorferretto @prof_ferretto 23
a) rejeita, como jornalista, a escrita de ficção. Uma planta é perturbada na sua sesta* pelo exército que
b) prefere alienar-se com narrativas épicas. a pisa.
Mas mais frágil fica a bota.
c) é indiferente às histórias de fundo sentimental.
Gonçalo M. Tavares, 1: poemas.
d) está engajado na militância política. *sesta: repouso após o almoço.
e) se afunda na negatividade própria do fracasso.
O ditado popular que se relaciona melhor com o poema

IT0012 -
é:
(Enem)
a) Para bom entendedor, meia palavra basta.
Relatos de viagem: nas curvas da Nacional 222, em
Portugal b) Água mole em pedra dura tanto bate até que fura.
c) Quem com ferro fere, com ferro será ferido.
Em abril deste ano, fomos a Portugal para uma d) Um dia é da caça, o outro é do caçador.
viagem de um mês que esperávamos há um ano. Pois no e) Uma andorinha só não faz verão.
dia 4 de maio, chegávamos ao Aeroporto Francisco Sá
Carneiro, no Porto. Que linda a “antiga, muy nobre,
sempre leal e invicta” cidade do Porto! “Encantei-me”,
diriam eles... pelas belas paisagens, construções
IT0309 - (Fuvest)
Leusipo perguntou o que eu tinha ido fazer na aldeia.
históricas com lindas fachadas, parques e praças muito
Preferi achar que o tom era amistoso e, no meu
bem cuidados.
paternalismo ingênuo, comecei a lhe explicar o que era
Os tripeiros, sinônimo de portuenses, têm orgulho
um romance. Eu tentava convencê-lo de que não havia
de sua cidade, apelidada de Invicta – nunca foi invadida.
motivo para preocupação. Tudo o que eu queria saber já
E valorizam tudo o que há de bom ali, como “a melhor
era conhecido. E ele me perguntava: “Então, porque você
estrada para se dirigir do mundo”, a Nacional 222.
quer saber, se já sabe?” Tentei lhe explicar que pretendia
Pois na manhã do 25 de abril, dia da Revolução
escrever um livro e mais uma vez o que era um romance,
dos Cravos, resolvemos conhecer a tal maravilha. A cada
o que era um livro de ficção (e mostrava o que tinha nas
10 km tínhamos que encostar: corríamos, dançávamos,
mãos), que seria tudo historinha, sem nenhuma
tomávamos chocolate quente, sopa, tudo que fosse
consequência na realidade. Ele seguia incrédulo. Fazia-se
quentinho. E lá íamos para mais uma etapa. Uma
de desentendido, mas na verdade só queria me intimidar.
aventura deliciosa. Depois de três horas – mais ou menos
As minhas explicações sobre o romance eram inúteis. Eu
o dobro do tempo necessário, não fossem as paradas
tentava dizer que, para os brancos que não acreditam em
para aquecimento –, chegamos a casa! Congelados, mas
deuses, a ficção servia de mitologia, era o equivalente
maravilhados e invictos!
dos mitos dos índios, e antes mesmo de terminar a frase,
Disponível em: https://oglobo.globo.com. Acesso em: 6
já não sabia se o idiota era ele ou eu. Ele não dizia nada a
dez. 2017 (adaptado).
não ser: “O que você quer com o passado?”. Repetia. E,
diante da sua insistência bovina, tive de me render à
Nesse texto, busca-se seduzir o leitor por meio da
evidência de que eu não sabia responder à sua pergunta.
exploração de uma voz externa sobre a identidade
Bernardo Carvalho, Nove Noites. Adaptado.
histórica do povo português. O trecho que evidencia esse
procedimento argumentativo é
As respostas do narrador às perguntas de Leusipo são
a) “Que linda a ‘antiga, muy nobre, sempre leal e invicta’ uma tentativa de disfarçar o caráter
cidade do Porto!”.
a) fabular do romance, inspirado nas lendas e tradições
b) “Encantei-me’, diriam eles... pelas belas paisagens, dos Krahô.
construções históricas com lindas fachadas [...]”.
b) investigativo do romance, embasado em testemunhos
c) “Os tripeiros, sinônimo de portuenses, têm orgulho de dos Krahô.
sua cidade [...]”.
c) político do romance, a respeito das condições de vida
d) “E valorizam tudo o que há de bom ali, como ‘a dos Krahô.
melhor estrada para se dirigir do mundo’ [...]”.
d) etnográfico do romance, através do registro da cultura
e) “Pois na manhã do 25 de abril, dia da Revolução dos dos Krahô.
Cravos, resolvemos conhecer a tal maravilha”.
e) biográfico do romance, relatando sua vivência junto
aos Krahô.

IT0324 - (Fuvest)
IT0339 - (Enem)

@professorferretto @prof_ferretto 24
IT0301 -
Ela era linda. Gostava de dançar, fazia teatro em São
Paulo e sonhava ser atriz em Hollywood. Tinha 13 anos (Fuvest)
quando ganhou uma câmera de vídeo – e uma irmã. As Uma última gargalhada estrondosa. 1E depois, o silêncio.
duas se tornaram suas companheiras de
O palhaço jazia 2imóvel no chão. 3Mas seu rosto continua
experimentações. Adolescente, Elena vivia a criar
sorrindo, para sempre. Porque a carreira original do
filminhos e se empenhava em dirigir a pequena Petra nas
Coringa era para durar apenas 30 páginas. O tempo de
cenas que inventava. Era exigente com a irmã. E
acreditava no potencial da menina para satisfazer seus envenenar Gotham, sequestrar 4Robin, enfiar um par de
arroubos de diretora precoce. Por cinco anos, integrou sopapos na Homem-Morcego e disparar o primeiro “vou
algumas das melhores companhias paulistanas de teatro te matar” da sua relação. Na briga final do Batman nº. 1,
e participou de preleções para filmes e trabalhos na TV. o “horripilante bufão” sofria um final digno de sua
Nunca foi chamada. No início de 1990, Elena tinha 20 desumana ironia: 5ao tropeçar, cravava sua própria adaga
anos quando se mudou para Nova York para cursar artes no peito. Assim decidiram e desenharam 6seus pais, os
cênicas e batalhar uma chance no mercado americano. artistas Bill Finger, Bob Kane e Jerry Robinson. Entretanto,
Deslocada, ansiosa, frustrada após alguns testes de o criminoso mostrou, já em sua primeira aventura, um
elenco malsucedidos, decepcionada com a ausência de enorme talento para 7se rebelar contra a ordem
reconheci mento e vitimada por uma depressão que se
estabelecida. 8Seu carisma seduziu a editora DC Comics,
agravava com a falta de perspectivas, Elena pôs fim à vida
que impôs o acréscimo de um quadrinho. Já dentro da
no segundo semestre. Petra tinha 7 anos. Vinte anos
depois, é ela, a irmã caçula, que volta a Nova York para ambulância, vinha à tona “um dado desconcertante”. E
percorrer os últimos passos da irmã, vasculhar seus então um médico sentenciava: “Continua 9vivo. E vai
arquivos e transformar suas memórias em imagem e sobreviver!”.
poesia. Tommaso Koch. “O Coringa completa 80 anos e na
Elena é um filme sobre a irmã que parte e sobre a irmã Espanha ganha duas HQs, que inspiram debates
que fica. É um filme sobre a busca, a perda, a saudade, filosóficos sobre a liberdade”,
mas também sobre o encontro, o legado, a memória. Um EI País. Junho/2020.
filme sobre a Elena de Petra e sobre a Petra de Elena,
sobre o que ficou de uma na outra e, essencialmente, um No fragmento “ao tropeçar, cravava sua própria adaga no
filme sobre a delicadeza. peito.” (ref. 5), a oração em negrito abrange,
VANUCHI, C. Época, 19 out. 2012 (adaptado). simultaneamente, as noções de

a) proporção e explicação.
O texto é exemplar de um gênero discursivo que cumpre
b) causa e proporção.
a função social de
c) tempo e consequência.
a) narrar, por meio de imagem e poesia, cenas da vida d) explicação e consequência.
das irmãs Petra e Elena.
e) tempo e causa.
b) descrever, por meio das memórias de Petra, a
separação de duas irmãs.
c) sintetizar, por meio das principais cenas do filme, a
história de Elena.
d) lançar, por meio da história de vida do autor, um filme
autobiográfico.
e) avaliar, por meio de análise crítica, o filme em
referência.

@professorferretto @prof_ferretto 25

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