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KITARO NISHIDA, Ensaio sobre o Bem, p.23 (trad. Joaquim Antonio Bernardes Carneiro
Monteiro)
KANCHI SOSAN, Shin Jin Mei, 23 -24 (tradução a partir da tradução de Taisen
Deshimaru)
:
O filósofo japonês Kitaro Nishida (1870 - 1945), no primeiro capítulo de sua obra Zen no
kenkyū (Ensaio sobre o Bem), examina o conceito central de sua filosofia, a experiência
pura. Esta significa o conhecimento das coisas tais como elas são sem quaisquer
elaborações, juízos e discriminações de nossa parte. É o momento anterior à distinção de
sujeito e de objeto, como o momento em que ouvimos um som e ainda não o
distinguimos como vindo de um objeto externo ou identificamos a natureza desse som.
Nishida afirma que todos os fenômenos espirituais aparecem dessa forma: sensação,
percepção, memória ou abstração. A experiência pura é sempre simples no momento de
sua ocorrência, mas pode ser considerada complexa porque pode ser analisada
posteriormente em seus elementos constituintes. Como quando a consciência presente é
analisada e, por essa razão, não é mais a mesma experiência de antes. A análise é uma
diferenciação no interior da experiência pura e, por isso mesmo, já não é essa unidade
originária.
Nishida não cita o caso das artes marciais, mas creio que, nesse ponto, seja possível
fazer um paralelo com as lições de Yagyu Munenori (1571- 1646), fundador da escola de
esgrima Yagyu Shinkage-Ryu. Munenori afirma em seus escritos que se o samurai
armado com uma espada está consciente de portar uma espada, seus golpes serão
instáveis. Da mesma forma, o flautista e o escritor, se cônscios de suas atividades, eles
não as realizarão bem. Isto é, a interferência do pensamento consciente que pensa cada
movimento constitui-se em um obstáculo à boa execução de uma atividade.
Somente quando não se tem nada no coração ( ⼼ ), diz Munenori, que se está no
Caminho (道). O espelho reflete perfeitamente as coisas justamente porque é amorfo e o
coração daqueles que estão no Caminho é como um espelho, vazio e claro, inconsciente
e sem desejos. A mente de um artista marcial treinado não está concentrada
especificamente em nenhum dos pontos dos movimentos exigidos pelo kata, mas está,
por assim dizer, por toda a sua extensão, em unidade. Se a mente estiver atenta a cada
movimento, haverá erro na execução do kata. Quando os efeitos do treino contínuo são
absorvidos, executam-se os movimentos espontaneamente e livre de pensamentos
:
conscientes.
Nishida considera que a experiência pura seja uma intuição dos fatos tais como eles são
e que, portanto, seja desprovida de significado. Sendo caótica e indistinta, os significados
e os juízos que surgem de ela são diferenciações que nada acrescentam ao conteúdo da
experiência. Assim, os juízos e os significados constituem-se em uma parte que foi
abstraída da experiência originária. Em certo sentido, há um empobrecimento da
experiência.
Quando identificamos uma percepção auditiva com o som de um sino, relacionamos essa
percepção presente a uma percepção passada. Nascem assim o juízo e o significado
graças ao rompimento da unidade da experiência. Todavia, diz Nishida, o juízo, quando
sua unidade é rigorosa, pode assumir a forma de uma experiência pura. Tal é o caso do
aprendizado de uma arte que, a princípio, é consciente em todos os seus momentos e
que depois torna-se como que inconsciente. Como visto acima acerca das lições de
Yagyu Munenori.
A experiência pura e o significado ou o juízo são, para Nishida, dois aspectos da mesma
consciência ou duas formas de ver a mesma coisa, pois há na consciência sempre
unidade e diferenciação. Não obstante, no terceiro capítulo da segunda seção, Nishida
afirma que na experiência pura não há a divisão entre sujeito e objeto, mas um fato
independente e completo em si mesmo. Quando ouvimos, arrebatados, uma bela
melodia, esquecemos de nós mesmos e das coisas, tudo é uma unidade absoluta. Nesse
momento, apresenta-se a realidade verdadeira. Quando o "eu" aparece, surge o
pensamento e a reflexão e esquecemos a verdadeira realidade.
...
Leia também:
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http://oleniski.blogspot.com/2019/02/eihei-dogen-taisen-deshimaru-e-o.html
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3 comentários:
Eu acabei de traduzir do russo e publicar aqui em Lisboa esta obra de Berdiaev. Se tiver
interesse em melhor conhecê-la (ao menos em português), eu lhe ofereço um exemplar de
bom grado. Escrevi também uma introdução à vida e obra do filósofo russo, além de
traduzir o importante poema "O Profeta" de Pushkin, que tão bem retrata a filosofia
religiosa russa.
Responder
Não havia ainda pensado nesse paralelo da mística de Berdiev com o budismo Mahayana.
Muito interessante.
Abraços!
Responder
No séc. II Orígenes afirmava que até o demônio deverá ser reintegrado no paraíso divino
(apocatástase). Isto lembra o voto do Buda Amida antes de alcançar a iluminação, de que
todos renasceriam na Terra Pura (Shin Budismo).
Mande por favor seu endereço postal para o meu email, que eu remeto o livro de Lisboa.
Esta é a 1a edição da minha tradução, e a minha idéia é editar uma 2a edição
incorporando uma outra obra do Berdiaev que ja comecei a traduzir, intitulada 'Dialética
existencial do divino e do humano'. Essas duas obras compõem o livro da edição russa
que estou utilizando, e elas em conjunto fazem bastante sentido. Mas isto é só para o final
do ano que vem, ou depois. Até lá, senti que precisava publicar o que já fiz.
:
Abraços
Joao Mendonca
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