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No início do capítulo XVI da Sabedoria dos Princípios, Mário Ferreira dos Santos realiza
a demonstração da impossibilidade do Nada absoluto e da eternidade do Ser. Se o Nada
é a absoluta ausência de todo e qualquer ser, então seria impossível o Ser nascer do
Nada, pois o Ser teria que ser uma possibilidade dentro do Nada, o que é absurdo. A
possibilidade de algo não é um nada, e o Nada nega toda e qualquer forma de Ser, ainda
que somente possível.
Então, o mero fato de que há Ser exclui a possibilidade de haver o Nada, pois se há Ser,
o Ser é possível e se o Nada nega toda possibilidade, o Ser não se daria. Sempre há
Ser, sempre há seres, quaisquer que eles sejam, pois o Nada é impossível. E a
impossibilidade do Nada é absoluta, o que significa que jamais houve o Nada. O
:
argumento pode ser sumarizado da seguinte forma: o Ser é, então é possível. O Nada
nega toda possibilidade. Logo, o Nada não pode ter sido.
Concluir-se-á do que vai acima que o Ser é necessário, não apenas possível. O possível
pode ou não se concretizar, o necessário é aquilo que não pode deixar de ser. Dado que
há Ser, sabemos que o Ser é possível, pois só se concretiza o que antes é possível. Se o
Ser, por sua mera existência, já mostra que é possível, então o Nada, a negação
absoluta de todo modo de ser, inclusive da possibilidade, não pode haver existido. À
impossibilidade do Nada corresponde à necessidade do Ser.
Se algo é real, o Ser era possível. Uma vez que o Nada é impossível, sabemos que o Ser
é necessário. Essa é uma intuição apofântica, segundo Mário Ferreira. O mero fato de
haver algum ser revela indiretamente que sempre houve algum ser. A necessidade do
Ser é apontada como vestígio que está contido no mero fato de que há algum ser que,
portanto, era possível.
Significa, então, que a cadeira necessariamente tinha que existir? Não, ela era
meramente possível, e alguém a trouxe à realidade a fabricando. Poderia muito bem
jamais ter existido essa cadeira. Mas o fato de que ela existe, aponta indiretamente para
a necessidade do Ser. Sempre há ser, não importando quais seres se realizam ou não. O
que é necessário é haver seres, não é necessário haver estes seres que há. Algo há,
e se há, era possível. O possível nega o Nada absoluto. Logo, o Ser é necessário. O
haver Ser é absoluto, os seres que há são contingentes.
O capítulo XVII inicia com a distinção básica entre o Ser e os seres. O conceito de Ser é
confuso, pois fusiona em si todas as possibilidades de ser. Tudo o que é ser, qualquer
tipo de ser, está incluído no conceito de Ser, que, por isso, é indeterminado quanto a seu
conteúdo. Aquilo que é determinado possui determinações, limites, que encerram a
natureza da coisa. Assim, uma cadeira é determinada porque possui um conjunto
essencial de características que pode ser formulado em um conceito.
O que Mário Ferreira quer expressar nesse ponto é que o intelecto humano só concebe
conceitualmente aquilo que possui limites e que, por conseguinte, pode ser formulado em
um conceito. Cada coisa possui uma quididade (quid? "o quê?"), uma oqueidade, uma
talidade, uma natureza própria. Tal coisa tem tais e tais características essenciais que a
tornam o que ela é. Como visto anteriormente, uma coisa se distingue de outra
justamente pelo fato de possuir algo que uma outra não possui e vice-versa. Cada ser
tem uma natureza determinada, mas o Ser em geral não possui nenhuma determinação,
:
pois engloba em si mesmo todas as determinações possíveis.
Cada ser é um ser na medida em que tem positividade, que é uma entitas, um ente.
Aquilo que é ente não pode ser Nada. Ônticamente, cada coisa é um ente singular. Esta
cadeira é esta cadeira, que é diferente daquela outra cadeira. O ôntico trata da
singularidade das coisas, trata desta cadeira e não da cadeira em geral. Já o ontológico
refere-se ao logos da coisa, à generalidade da coisa, o tipo de ser que este ente é (a
cadeiridade da cadeira).
"Ora, o ser é a positividade do que é. Ser é a aptidão para existir, para dar-se. O nada
não tem aptidão para existir. Neste caso, há entre todos os entes que são, entre todas as
entidades, que são, um ser que em todas se univoca: é a presença, a positividade. São
os modos de ser que distinguem uns dos outros, mas, em ser, todos se univocam. (...) A
posição platônica, em face dos universais, é realista. As formas têm uma realidade, mas
formal. E a realidade formal não se singulariza e nem se universaliza. É um modo de ser
formal que pertence ao poder do ser. As formas são possíveis do ser, poderes do Ser,
exemplares formais." (pag. 269, itálico no original)
Mas nas possibilidades é mister distinguir entre aquelas que são intrínsecas e aquelas
que são extrínsecas. A possibilidade intrínseca refere-se à ausência de contradição no
conceito da coisa, e, portanto, é o índice da possibilidade intrínseca da coisa de se
efetivar na realidade. A possibilidade extrínseca refere-se à existência de agentes
capazes de trazer a coisa possível à realidade. A cadeira é possível intrinsecamente, mas
é preciso que haja quem fabrique a cadeira. Estando ausente quem possa fazer a
cadeira, ela não possuirá possibilidade extrínseca de existir na realidade, de singularizar-
se no mundo.
As coisas têm sistência (do latim, sistere), diz Mário Ferreira, na medida em que
possuem positividade. A negatividade, consequentemente, é a ausência de sistência, e o
Nada é a negação de toda e qualquer sistência. Os termos persistência, existência,
consistência, entre outros, derivam de sistência. Os prefixos de sistência indicam modos
de ser da positividade. A coisa persiste se perdura no ser, se permanece afirmando sua
positividade. A coisa existe na medida em que possui a sistência fora (ek) de suas
causas. O ser, portanto, é sistência.
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