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O estudo da justiça fiscal ganha especial relevância nos ditos Estados tributários.
Isso porque, diferentemente do Estado-mínimo (em que grande parte da despesa serve para
financiar a tão somente a própria administração), o Estado tributário depende do pagamento
de tributos não só para sobreviver, mas também para cumprir a sua função social de prestar
serviços e de produzir bens públicos, garantindo também a sobrevivência da sociedade que
depende desses serviços.
Nesse passo, a justiça fiscal envolveria dois momentos que, apesar de ocorrer em
momentos distintos, constituem, na verdade, “o verso e o anverso da mesma moeda”,1 nos
termos utilizados pelo autor.
Em um primeiro momento, a justiça fiscal está ligada à redistribuição da riqueza.
Isso porque aquele que paga o tributo, o paga para toda coletividade usufruir de um bem ou
serviço público gratuitamente, inclusive por aqueles que não pagam. Em um segundo
momento, a justiça fiscal está atrelada à realização da despesa, isto é, como e em que medida
o Estado vai gastar os recursos que arrecadou.2
No que diz respeito ao primeiro momento (= de arrecadação), diz o texto que,
historicamente, despontaram dois critérios de repartição dos encargos tributários: um que
vinculava o pagamento àquilo que cada um ia receber do Estado (teoria da equivalência) e
outro que o pagamento se daria de acordo com o que cada um pode pagar (ability to pay -
expressão cunhada por Adam Smith).
Na prática, tais critérios são diametralmente opostos. Explica-se: de acordo com o
critério da equivalência, os pobres deveriam pagar mais impostos que os ricos porque
usufruem mais das prestações do Estado do que os ricos. Lado outro, na esteira do critério da
capacidade contributiva, os ricos deveriam pagar mais impostos que os pobres, em razão do
seu elevado patrimônio.
Disso resulta que, justamente por serem critérios inconciliáveis, os dois não podem
ser, ao mesmo tempo, meios hábeis a promover a justiça fiscal. É dizer, caso um dos critérios
realize justiça fiscal a adoção do outro conduziria, automática e necessariamente, à uma
situação de injustiça fiscal.
1
SALDANHA SANCHES, J. L. Justiça fiscal. Lisboa: FFMS, 2010, p. 16.
2
No que diz respeito ao segundo momento (= de realização da despesa), este não será objeto de análise deste
fichamento por se tratar de matéria afeta ao direito financeiro.
Adianta-se, nesse ponto, que prevaleceu historicamente o critério da capacidade
contributiva como modo de alcançar a justiça fiscal. E isso se dá por uma razão sobretudo
lógica: se os hipossuficientes fossem obrigados a pagar mais impostos, o seu patrimônio
diminuiria cada vez mais, e chegaria um momento que nem ele teria mais condições de arcar
com os encargos tributários, e, por força disso, o Estado pararia de arrecadar.
Trata-se, mutatis mutandis, de um dos motivos que levaram às revoltas populares
revolução francesa, já que naquele contexto “as desigualdades tributárias agravam-se ao
mesmo tempo que aumentam as necessidades da coroa aumentam”,3 agravando ainda mais a
insatisfação da população.
Nesse delinear, surgiu a necessidade de constitucionalizar a matéria tributária, seja
(i) limitar a invasão do estado no patrimônio pessoal dos contribuintes - que antes se dava de
forma arbitrária; ou para (ii) estabelecer critérios gerais de como o Estado arrecada tributos.
Aqui, embora ambas as finalidades estejam vinculadas à realização da justiça fiscal,
é justamente no segundo ponto onde se vê o princípio da capacidade contributiva. Não é outra
a lição de ROQUE ANTONIO CARRAZZA:
Insistimos que o princípio da capacidade contributiva, intimamente ligado ao
princípio da igualdade, é um dos mecanismos mais eficazes para que se alcance, em
matéria de impostos, a tão almejada Justiça Fiscal. Em resumo, é ele que
concretiza, no âmbito dos impostos, a igualdade tributária e a Justiça Fiscal.4
III. CONCLUSÃO.
Por todo o exposto, conclui-se que o Estado de direito deve se revestir não só de
regras formais definidoras de competência tributária, mas também de normas materiais -
como aquelas inscritas no princípio da capacidade contributiva e da progressividade das
alíquotas - como forma de prestigiar o princípio da dignidade da pessoa humana e da
igualdade, corolários da justiça fiscal.
3
SALDANHA SANCHES, J. L. Justiça fiscal. Lisboa: FFMS, 2010, p. 26.
4
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015,
p. 104.