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Unidade 2
Unidade 2
Revisão Textual:
Prof. Me. Claudio Brites
O Direito na Antiguidade Clássica
• Introdução;
• O Direito Grego Antigo;
• O Direito Romano.
OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Compreender os elementos característicos da organização jurídico-política dos gregos e
dos romanos;
• Apresentar os elementos que de forma mais direta favoreceram para a formação do
direito ocidental contemporâneo.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Assim:
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;
No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;
Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e
de aprendizagem.
UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Introdução
A Idade Antiga [4.000 anos a.C. (invenção da escrita) até 476 d.C. (queda do
Império Romano pelos bárbaros germânicos)], frisa-se, foi o palco privilegiado do
nascimento de sistemas jurídicos que foram decisivos ao progresso do direito e das
ciências jurídicas, são eles os sistemas jurídicos do Egito, da Mesopotâmia, dos
Hebreus, da Grécia e de Roma.
Como consequência dessa nova atitude, segundo Husserl, “irrompe um tipo total-
mente novo de criações espirituais, que rapidamente assumiu as proporções de uma for-
ma cultural bem delimitada. Os gregos chamaram-na filosofia” (HUSSERL, 2008, p. 67).
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Figura 1 – Acropolis, Parthenon, Atenas, Grécia
Fonte: Getty Images
Exemplares no ramo do direito público, os gregos, por outro lado, não sistemati-
zaram as suas instituições de direito privado. Por essa razão, afirma-se que eles não
fundaram uma ciência do direito, deixando a tarefa para os romanos.
Assim, o direito se diferenciava de uma cidade para outra, ou seja, cada cidade tinha
o seu próprio direito. As cidades tinham suas próprias leis. Não há registro de uma lei
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Período Arcaico, do século VIII ao VI a.C., quando tem início as Guerras Pérsicas; Período Clássico, do século V
ao IV a.C.; Período Helenístico, desde Alexandre Magno até a conquista romana do Mediterrâneo Oriental; Perí-
odo Romano, fixado a partir da derrota de Antônio e Cleôpatra por Augusto. Conf. SOUZA, Raquel de. O direito
grego antigo. In: WOLKMER, A. C. Fundamento de história do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2014. p. 76.
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Segundo Raquel de Souza, “para o estudo do direito grego é particularmente interessante o período que se inicia
com o aparecimento da pólis, meados do século VIII a.C., e vai até o seu desaparecimento e surgimento dos reinos
helenísticos no século III a.C. Esse período de cinco séculos [se referem] aos convencionalmente denominados
época arcaica (776 a 480 a.C., datas dos primeiros Jogos Olímpicos e batalha de Salamina, respectivamente) e
período clássico (V e IV a.C.)”. Conf. SOUZA, R. de. O direito grego antigo. In: WOLKMER, A. C. Fundamento
de história do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2014. p. 76.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Leia sobre tempo histórico em: Só História. Virtuous Tecnologia da Informação, 2009-2019.
Explor
Nesse sentido, a evolução dos sistemas jurídicos gregos pode ser pensada a
partir da seguinte divisão: período dos clãs, período da formação das cidades,
período democrático e período de unificação (GILISSEN, 2013, p. 73-74).
definido pela descendência de um ancestral comum. O parentesco baseado em laços pode ser de
natureza meramente simbólica, alguns clãs compartilham um ancestral comum “estipulado”, o
qual é um símbolo da unidade do clã, e quando esse ancestral não é humano, é um totem animal.
Em geral, no clã, o parentesco difere da relação biológica, uma vez que também envolve
adoção, casamento e outros laços genealógicos. Os clãs podem ser descritos mais facilmente
como subgrupos de tribos, todavia não são propriamente tribos. Clã vem da palavra gaélica
que significa “crianças”.
Clã vem da palavra gaélica que significa “crianças”. É uma forma estendida da palavra “clann“
e pode ser traduzida por “família”.
Fonte: http://bit.ly/2IVcTrU
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Período democrático
O período democrático delimita a época, entre os séculos VIII e VII a.C., mar-
cada pelo surgimento da democracia. A democracia ateniense se tornou a mais
conhecida. Em Atenas, a democracia se desenvolveu e o direito se tornou mais forte
tanto no aspecto material quanto no aspecto processual.
As leis de Sólon (de 594-593 a.C.) levam “a uma reforma institucional, social e
econômica” (WOLKMER, 2014, p. 80) importante para os atenienses. A reforma
institucional manteve os Arcontes, o Areópago e a Assembleia, com pequenas
alterações. A administração da cidade é de responsabilidade do conselho (Bulé).
O conselho (Bulé) funciona de forma paralela ao Areópago, é composto de 500
cidadãos tirados à sorte em cada ano, e pelos magistrados, quer sejam eleitos ou
tirados à sorte. A constituição de Atenas é, no entanto, pouco democrática se com-
parada às democracias modernas, pois os escravos não têm nenhum direito, nem
político, nem civil; os metecos (estrangeiros instalados na cidade) têm muito menos
direitos que os cidadãos. Na cidade de Atenas havia cerca de 40.000 cidadãos (ou-
tros dizem 6.000), porém, centenas de milhares de metecos e escravos.
Arconte: na antiga Grécia, os arcontes eram magistrados. Arconte era o cargo ao qual apenas
Explor
tinha acesso os cidadãos, filhos de naturais da pólis. O colégio dos arcontes constava de nove
elementos (divididos em arconte-rei, polemarca e tesmotetas) mais um secretário, eleitos por
sorteio e sujeitos a um exame ou doquimasia antes de assumirem funções.
Areópago: Areópago. Antigo tribunal de Atenas onde se reunia o conselho dos anciãos.
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O primeiro legislador de que se tem conhecimento é Zaleuco de Locros (por volta de 650 a.C.), a quem é atribuído
o primeiro código escrito de leis [...]; têm-se a seguir Carondas, legislador de Catânia (cerca de 630 a.C.), e Licurgo,
em Esparta. São de particular interesse dois legisladores atenienses: Drácon e Sólon. Conf. SOUZA, R. de. O direito
grego antigo. In: WOLKMER, A. C. Fundamento de história do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2014. p. 79-80.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
A reforma social de Sólon obriga os pais a ensinarem um ofício aos filhos (os filhos
não seriam obrigados a alimentarem seus pais na velhice se não tivessem aprendido
com os pais um ofício); instaura a igualdade civil; limita o poder paternal; estabelece
o testamento e a adoção; suprime a propriedade coletiva dos clãs e a servidão por
dívidas; elimina a hipoteca por dívidas; divide a sociedade em classes societárias; per-
mite a entrada de artífices estrangeiros com a promessa de concessão de cidadania.
Período unificação
No período de unificação, no fim do século IV a.C., Alexandre unifica a Grécia,
a Ásia Anterior e o Egito sob sua autoridade. O império de Alexandre não conseguiu,
todavia, manter-se por muito tempo. Aos poucos, a partir do século III, o império
se fragmenta para dar lugar a múltiplas monarquias, governadas por reis absolutos.
As suas vontades são a expressão de “a lei viva”, fórmula que será retomada pelos
imperadores romanos e depois, mais tarde, pelos monarcas da Europa Ocidental.
Após o estudo dos estágios de evolução dos sistemas jurídicos da Grécia Antiga,
passa-se agora ao estudo das fontes históricas do direito grego daquela época.
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Explor
Epigrafia: Ciência ou estudo das inscrições antigas, em pedra, madeira etc.
Fonte: http://bit.ly/3ddGBXd
As principais fontes que permitem o estudo do direito grego são (i) epopeias de Ho-
mero (período arcaico); (ii) discursos de Demóstenes e de Iseu (fim da época clássica do
direito ateniense); (iii) documentos literários e filosóficos, sobretudo os escritos de Platão,
Aristóteles e Plutarco; (iv) inscrições jurídicas; (v) lei de Gortina4 e lei de Dura.5
Dentre as fontes, os documentos literários e filosóficos são a melhor contribuição
para a compreensão da cultura jurídica grega, sobretudo os escritos sobre a demo-
cracia e o governo ideal da cidade-Estado.
John Gilissen atribui aos gregos “a invenção da ciência política, a ciência do go-
verno da pólis”. Os pensadores “Hesíodo, Heródoto, Platão, Aristóteles, analisaram
as instituições das cidades gregas para fazerem a sua crítica e contraporem-lhe for-
mas ideais de governo” (GILISSEN, 2013. p. 75). A pluralidade de ideias fez deles
a principal fonte para o estudo da política na Grécia antiga.
Vale destacar aqui a noção de nomos (diversos pensadores), as ideias pla-
tônicas de uma cidade ideal (críticas à democracia), a análise aristotélica das
constituições das cidades-Estado gregas e também as suas concepções teóri-
cas acerca da forma de governo; a saber:
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Longa inscrição descoberta em Creta em 1884, difícil de datar, porque contêm disposições que parecem dever re-
montar a épocas diferentes; século VI ou V, talvez. Conf. GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2013. p. 75.
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Descoberta em 1922 no Eufrates, seria uma cópia tardia (século I) duma lei do século IV a.C. relativa às sucessões.
Conf. GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2013. p. 75.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
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Dessa forma, a cidade se torna um grande regime aristocrático, sendo governa-
da pelos melhores, os aristoi. Platão, contudo, não afasta o fato de que os regimes
políticos tendem na maior parte das vezes para a injustiça. O regime tende a aviltar-
-se em uma timocracia (time, é igual à honra) se os guardiões e os filósofos se que-
dam à procura de honras; se acumulam riquezas, conservarão o poder nas mãos
de um pequeno número de pessoas, resultando em uma uma oligarquia (oligos, é
igual a pequeno).
As leis são uma obra menos utópica, mais próxima da realidade ateniense, dife-
rentemente de A República e Política, que apresentam utopias. Em As leis, Platão
reduz as formas de governo a duas: a monarquia, nela o poder vem de cima; e a
democracia, em que ele vem de baixo. O regime ideal seria uma mistura dos dois;
uma cidade governada por um colégio de sábios, guardiões das leis.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Finalizando o presente capítulo, vale ressaltar, ainda, que o direito privado grego
não deixou legados importantes no direito moderno. Os poucos traços vieram por in-
termédio do direito Romano. No entanto, a terminologia jurídica moderna tem como
legado do direito grego algumas expressões, a saber: sinalagmático, no sentido de
recíproco (vem de trocar + com); quirografário (vem de escrever à mão); anticrese;
enfiteuse; hipoteca etc.
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Estudo Comparativo entre o Direito Privado Grego e o Romano
Ainda na seara do direito privado, importa fazer um breve estudo comparativo
entre o direito de Atenas dos séculos V e IV a.C. e o direito romano que viria a
seguir, a saber:
• No ambiente familiar, o poder paternal é limitado, enquanto em Roma se
torna mais abrangente. O filho se desvincula da autoridade do pai pela maiori-
dade, o que nunca existiu no direito romano; as filhas nunca saem da autorida-
de do pai ou do marido, se casadas, enquanto no direito romano a mulher se
encontra em situação mais favorável;
• No direito grego, a transferência da propriedade se realiza apenas por meio
de contrato, todavia de efeito limitado; em relação a terceiros interessados, a
publicidade é a forma própria de se dar conhecimento dos atos. A proteção de
terceiros é mais efetiva na Grécia do que em Roma, onde não havia a previsão
legal de se dar publicidade ao aos atos jurídicos, sobretudo dos contratos;
• Em que pese a publicidade dos atos, no direito grego, as suas convenções
em matéria de contratos formavam-se apenas por vontade das partes, sem
formalismos, ao passo que no direito romano mantém-se certo grau de forma-
lismo, sem o qual o contrato não seria válido.
Até aqui, foram feitos os estudos do sistema jurídico da Grécia. Resta agora, para
finalizar os estudos sobre os sistemas jurídicos da Antiguidade, o direito Romano.
O Direito Romano
O direito romano é o conjunto de normas que regeram a sociedade roma-
na desde as origens (segundo a tradição, Roma foi fundada em 753 a.C.)
até o ano 565 d.C., quando ocorreu a morte do imperador Justiniano.
(ALVES, 2002, p. 1)
A evolução do direito romano no império bizantino, até o século XV, não é ob-
jeto do presente estudo, isso porque o Código de Justiniano marca o final de uma
época. Segundo Thomas Marky, “a codificação justinianéia foi conclusiva: foram
recolhidos os resultados das experiências anteriores e [a obra foi] considerada [...]
definitiva e imutável” (MARKY, 1992, p. 5).
John Gilissen alonga a história do direito romano até o final do império bizantino:
A história do direito romano é uma história de 22 séculos, do século VII
a.C. até ao século VI d.C., no tempo de Justiniano, depois prolongada
até ao século XV d.C. no império bizantino. No Ocidente, a ciência ju-
rídica romana conheceu um renascimento a partir do século XII; a sua
influência permaneceu considerável sobre todos os sistemas romanistas
de direito, mesmo nos nossos dias. (GILISSEN, 2013, p. 80)
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Nesse período de 12 (doze) séculos (de 753 a.C. até 565 d.C.), o povo romano
experimentou diferentes regimes políticos e diferentes fases do direito. As transfor-
mações políticas nem sempre são coincidentes com as jurídicas, razão pela qual o
estudo é feito de forma separada. Segundo Monier:
Uma divisão em períodos, apresenta algo de arbitrário, e é preciso re-
conhecer que não existe sincronismo rigoroso entre os acontecimen-
tos políticos, a evolução dos costumes e as transformações do direito.
(MONIER, 2002, p. 9)
3ª Período do Principado (27 a.C. até 284 d.C. com o início do domi-
nato (monarquia absoluta) de Diocleciano;
4ª Período do Dominato (de 284 até 585 d.C., data em que morre Jus-
tiniano). (WOLKMER, 2014. p. 140; ALVES, 2002, p. 1)
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A historiografia jurídica divide as transformações do direito romano segun-
do 3 (três) fases. Essa divisão é a que permite o acesso à história interna do
direito romano:
1. A do direito antigo ou pré-clássico (das origens de Roma à Lei Aebutia, de
data incerta, compreendida aproximadamente entre 149 a 126 a.C.).
2. A do direito clássico (daí ao término do reinado de Deocleciano, em 305
d.C.); e
3. A do direito pós-clássico (dessa data até à morte de Justiniano, em 565
d.C.) (ALVES, 2002, p. 2).
O Período da Realeza
A Realeza é o período histórico em que Roma foi governada pelos Reis. As ori-
gens de Roma são lendárias. A sua fundação teria ocorrido em 753 a.C. Após
a fundação, o governo foi exercido por uma sequência de 7 (sete) reis: Rômulo;
Numa Pompílio; Tulo Hostílio; Anco Márcio; Tarquínio, o Prisco; Sérvio Túlio; e
Tarquínio, o Soberbo. É fato que a historiografia não confirma aos 7 (sete) reis a
condição de personagens históricas.
O rei reunia em si tanto o poder temporal quanto o religioso. O rei era ao mesmo
tempo o chefe de Estado, o juiz e o sacerdote. Na condição de chefe de Estado, tinha
o comando supremo do exército; declarava guerra e celebrava a paz. A sua função de
magistrado era suprema, vitalícia e irresponsável, ou seja, não respondia pelos seus
atos e decisões. A sucessão do rei não se fazia pelo princípio da hereditariedade ou
da eleição; o sucessor, quando não indicado pelo rei, viria por designação do Senado;
o senador escolhido governava, na vacância, pelo prazo de 5 (cinco) dias; vencido o
prazo, passaria o poder para outro senador, e assim sucessivamente, até que fosse
escolhido outro rei. A sua função de sacerdote tornava intocável não somente a sua
pessoa como também os seus atos, todos eles praticados sob o manto da religiosidade.
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Os comícios por cúrias eram uma assembleia convocada pelo rei. Reuniam-se, geralmente, no comitium, ao pé do
Capitólio. Não se sabe ao certo como a vontade do povo era apurada nesses comícios. [...] Esses comícios não deli-
beravam: aprovavam ou rejeitavam a proposta de quem lhes presidia. Conf. ALVES, José Carlos Moreira. Direito
romano. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 11.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
A Gens: A família romana, durante séculos, apresenta organização patriarcal. Significa isso
Explor
A clientela era formada por uma classe social de pessoas ou famílias que eram
obrigadas, ou se sujeitavam espontaneamente, à dependência de uma gens, a fim de
receber proteção.7 A forma de submissão se assemelha à vassalagem do regime feudal
da Idade Média. Os clientes se colocavam na condição de súditos; deviam obediência
aos gentiles. Todavia, tinham o direito de exigir proteção e assistência, e, caso fossem
negadas ou negligenciadas, o patrono poderia ser morto por qualquer do povo.
Os plebeus se apresentavam como uma classe social separada e inferior à dos
patrícios. A sua posição na organização social é bastante indefinida: não fazem
parte das gentes, não são clientes dos patrícios e não fazem parte da organização
política, embora estejam sob a proteção do rei.
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É provável que a composição social da clientela estivesse assim distribuída: (i) os estrangeiros vencidos na guerra; (ii)
os estrangeiros emigrados que se submetiam, voluntariamente, à proteção de uma gens; e (iii) os escravos libertados
que ficavam vinculados à gens do seu antigo dono. Conf. ALVES, José Carlos Moreira. Direito romano. v. 1. Rio
de Janeiro: Forense, 2002. p. 10.
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Na historiografia jurídica não existe o consenso de que as leis régias são fontes
do direito na Realeza. A tradição informa que teriam existido na época de Rômu-
lo, Numa Pompílio e Tulo Hostílio. As leis deveriam ser votadas pelos comícios e
por cúrias para serem aprovadas. Atribui-se a Sexto Papírio a compilação de leis
régias, nos fins da Realeza ou no início da República.
Por fim, a jurisprudência também pode ser considerada fonte do direito na
Realeza. Nessa época, a jurisprudência (ciência do direito) romana era monopoli-
zada pelos religiosos. A eles pertenciam o conhecimento exclusivo de fórmula para
julgar; de rituais; de prazos; e dos dias de julgamento.
O Período Republicano
A tradição (lendária) aponta o fim da Realeza, em 510 a.C., com a morte do úl-
timo rei (Tarquínio, o Soberbo), por meio de uma revolução, chefiada por patrícios
e militares (CRETELLA JÚNIOR, 2002, p. 30).
A Magistratura na República
A partir de 510 a.C., o poder consular sucede ao rei. Os cônsules são os detento-
res da magistratura suprema, “são os magistrados únicos, com atribuições militares,
administrativas e judiciárias”. A magistratura era prerrogativa dos patrícios (ALVES,
2002, p. 13).
A plebe não tinha acesso à magistratura. Em Roma, no ano de 494 a.C., a ple-
be se revolta contra o arbítrio dos magistrados patrícios. Em massa, deixa Roma e
se aloja no Monte Sagrado. A intenção da plebe era fundar uma nova cidade nas
cercanias de Roma. Sem a participação da parte mais numerosa e trabalhadora,
Roma ficou paralisada. Em face disso, os patrícios cederam à criação de duas ma-
gistraturas plebeias: o tribunato e a edilidade da plebe. A primeira, a princípio,
era composta por dois tribunos; mais tarde, passaram a quatro, cinco e dez. A se-
gunda, composta por dois edis plebeus, que executava as ordens dos tribunos.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Em que pese à conquista das magistraturas, a falta de leis escritas levava os ple-
beus à insegurança jurídica. O movimento de luta por direitos resultou na Lei das
XII Tábuas, elaborada em 450 e 449 a.C.
A partir de 445 a.C., os plebeus intensificaram a luta por mais espaço na ma-
gistratura. A reação patrícia veio com a criação do tribunato consular, a fim de
manter a prerrogativa do consulado. Quase um século depois, em 367 a.C., a plebe
conseguiria o seu maior feito: por meio da Lei Licinia de magistratibus, o plebeu
poderia ser cônsul.
A luta por direitos não terminaria com a Lei Licinia. A plebe almejava a total
equiparação política com os patrícios. Ao longo do tempo, teve acesso às demais
magistraturas: em 364 a.C., aproximadamente, a edilidade curul (a ser preenchida
por um patrício ou por um plebeu); em 356, a ditadura; em 351 a.C., a censura;
e, finalmente, em 337 a.C., a pretura. A plebe teve acesso também a quase todas
as dignidades sacerdotais. Em 300 a.C., a Lei Ogulnia permitiu o acesso dos ple-
beus aos colégios dos Pontífices e dos Áugures.
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A potestas é comum a todos os magistrados, mas nem todos têm o poder
de imperium. As magistraturas se classificam em cum imperio e sine imperio.
O consulado, a pretura, a ditadura, o tribunato militar são magistraturas cum
imperio. As demais são classificadas na condição de sine império.
O Senado na República
Na República, o Senado, órgão permanente, se torna a principal referência do
poder do Estado romano. No início da República, “o senado era formado por
300 senadores; Sila elevou esse número para 600; César e o segundo triunvirato
(Otaviano, Marco Antônio e Lépido) o aumentaram. Otaviano, para 900; Marco
Antônio e Lépido, para 1000” (ALVES, 2002, p. 17).
Os senadores, até a Lei Quinia, de 312 a.C., eram nomeados pelos cônsules.
Tempos depois, atribuiu-se aos censores o poder de escolha dos senadores, dentre
os que tinham ocupado magistraturas, sem distinção entre patrícios e plebeus.
Senatus populusque Romanus (SPQR), o senado é a comunidade dos
cidadãos romanos, esta expressão adquire um sentido jurídico e político.
A res publica, a coisa pública, não é nem a república, nem o Estado no
sentido moderno; designa a organização política e jurídica do populus,
na qual o cidadão subordina o seu próprio interesse (res privata) ao da
comunidade. (GILISSEN, 2013, p. 83)
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Figura 7
Fonte: Getty Images
Os senadores tinham o poder de veto sobre as leis aprovadas nos comícios (assem-
bleias). Eventual o veto poderia se dar em razão do não cumprimento do processo
legislativo (formalidades legais); pelo fato de serem contrárias aos costumes. A partir da
Lei Publilia (339 a.C.), a auctoritas patrum (ratificação de toda a decisão dos comícios
ou assembleias) se transforma em autorização prévia. Os senadores analisavam os pro-
jetos de lei, podendo aprová-los ou recusá-los, antes de a lei ser votada pelos comícios.
Os Comícios na República
Além do senado, outros órgãos colegiados se reuniam em assembleias para de-
liberar sobre leis, são eles:
• Comícios por cúrias (comitia curiata ou curiata comitia): Os comícios por
cúrias já existiam na Realeza. Na República, tiveram pouca expressão em ra-
zão do aparecimento dos comícios por centúrias e por tribos;
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• Comícios por centúrias (comitia centuriata ou centuriata comitia): Os
comícios por centúrias tinham as seguintes atribuições: a) eleitorais, elegiam os
magistrados maiores (pretores e cônsules); b) legislativas, discussão e votação
de leis em geral; relativas à declaração de guerra, ao restabelecimento da paz
e à conclusão de tratados; c) judiciárias, apreciavam recursos interpostos pelos
cidadãos, da sentença de condenação à morte;
• Comícios por tribos (comitia tribuna ou tribuna comitia): Os comícios
por tribos tinham as seguintes atribuições: a) eleitorais, elegiam os magistra-
dos menores (edis curis e questores); legislativas, votação de leis em geral;
judiciárias, apreciar recursos acerca de multa (valor expressivo) imposta ao
cidadão romano;
• Comícios da Plebe (concilia plebis): Os comícios da Plebe são assembleias
que têm somente a competência para votar leis destinadas à própria classe so-
cial; votam os plebiscitos (deliberação da plebe) que, com a Lei Hortensia, de
286 a.C., são equiparados às leis; apreciar recursos acerca de multas impostas
pelos magistrados da plebe; elegem apenas o tribunos e edis da plebe.
A lei vai aos poucos se tornando parte da tradição jurídica dos romanos. São
duas as modalidades de lei: (i) Lex rogata, proposta por um magistrado e aprovada
pelos comícios; (ii) Lex data, proposta por um magistrado em razão dos poderes
concedidos pelos comícios.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
O Período do Principado
O Principado (27 a.C. até 284 d.C.) é o período histórico que se inicia com o
reinado de Otaviano (o Senado outorgou a Otaviano o título de Augustus), e tem
o seu final quando se iniciou o dominato (monarquia absoluta) pró-Deocleciano.
Tribunicia potestas (poder tribuniciano): refere-se aos direitos concedidos aos tribuni plebis
Explor
Fonte: http://bit.ly/2QsJI3I
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• Pretura: foi mantida durante o principado. Os magistrados pretores urba-
no e pelegrino exercem a jurisdição civil em Roma e também no território
italiano. Embora a função de pretor pelegrino tenha desaparecido com o
tempo, a urbana permaneceu. Institui-se a função de praetor tutelaris, en-
tre outras específicas;
• Censura: foi reduzida já no início do período. As suas funções se restringem à
redação de listas dos cidadãos de Roma, e de coordenação dos recenseamen-
tos realizados por magistrados municipais;
• Questura perdeu autonomia. Tornou-se subalterna ao príncipe, servindo-o na
condição de secretários;
• Edilidade curul e da plebe: Em face da edilidade curul e da plebe, os edis,
em número de seis, a partir de César, se dividem, dois a dois, em três cate-
gorias: edis curuis, plebeus e ceriales. Os edis ceriales são encarregados do
aprovisionamento de Roma. A edilidade deixa de existir no século III d.C., e
suas funções passam a ser exercidas por funcionários administrativos;
• Tribunato da plebe: permaneceu durante todo o período. Todavia, as suas
funções foram transferidas para o imperador. Atribuiu-se novas funções aos
magistrados plebeus, entre elas a de vigilância das sepulturas.
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
lei comicial que se conhece foi no tempo de Nerva. Os comícios não tiveram fim
por ordem imperial, todavia desapareceram pela absoluta falta de demanda.
A edição de Editos foi limitada à revisão de editos anteriores. A autonomia dos
pretores para criar atos processuais passou a depender de autorização do impera-
dor ou do Senado. No governo de Adriano, o imperador ordenou a Sálvio Juliano
(jurisconsulto romano) a fixação definitiva do conjunto de editos existentes à época,
dando origem ao que se denominou de Edictum Perpetuum (Edito Perpétuo).
No início do principado, os senatus consultos passaram a ser fonte de direito.
O enfraquecimento dos comícios e também a intenção do príncipe de aliar-se ao
senado fortaleceram a instituição. Aos poucos, as deliberações do príncipe (oratio,
significa proposta do príncipe) passaram a ter mais valor do que as deliberações do
Senado. O Senado perdeu sua força, e passou a se manifestar sempre pela aprova-
ção das medidas do príncipe.
As constituições imperiais decorrem do poder de legislar evocado pelo príncipe
em decorrência do seu poder de império que aos poucos vai se tornando absoluto.
O príncipe não tinha o poder de legislar, o seu poder foi se fortalecendo na medida
em que absorveu magistraturas republicanas. Os atos formais do príncipe de conte-
údo jurídico resultaram nas constitutiones (constituições imperiais).
Os jurisconsultos romanos não ocupavam cargos no governo. Na qualidade de
particulares, respondiam às consultas feitas pelas partes litigantes, pelos magistrados
ou pelos juízes. O príncipe outorgou a alguns juristas o direito de responder às consultas,
introduzindo o ius respondendi ex auctoritate principis ou ius respondendi pelo
qual os seus pareceres tinham maior autoridade em relação aos demais pareceres de
juristas, sem a outorga. A partir de Adriano, as respostas dos jurisconsultos (responsa
prudentium), além dos casos práticos, passaram a incidir sobre obras doutrinárias.
Eventuais divergências doutrinárias nos tribunais, originadas dos pareceres, eram
decididas pelos juízes.
O Período do Dominato
O período tem início em 284 d.C., com a implantação da monarquia absoluta
por Diocleciano. No período anterior (principado):
O imperador partilhava o poder com o senado (diarquia, governo de
dois), neste período, o traço político dominante é a concentração dos po-
deres nas mãos do soberano que governa sozinho (monarquia, governo
de um só). (CRETELLA JÚNIOR, 2002, p. 46)
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em pars Orientis e pars Occidentis. Em cada pars haveria um augustus e um cae-
sar que o sucederia no trono. O imperador reservou para si a posição de augustus
do governo do Ocidente, tendo nomeado Maximiniano para a posição de caesar.
O novo regime político dividiu o poder entre 4 (quatro) governantes. Nele, governa-
vam dois (dois) augustus e dois caesar.
O Império do Ocidente, assediado por Odoacro, rei dos Hérulos (povo bárbaro
germânico), tem o seu fim no ano de 476 a.C. Por outro lado, o Império Romano
do Oriente se manteve até o ano de 1453 d.C., quando Constantinopla foi tomada
pelos turcos otomanos comandados por Maomé II.
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(atos, rituais, provérbios ou adágios, fórmulas discursivas etc.). O direito privilegia a
forma em detrimento do conteúdo e dos fins da lei.
A partir das normas costumeiras e dos preceitos da Lei da XII Tábuas, a interpre-
tação do direito, por jurisconsultos, resulta em produção jurídica. “Dizia Pompônio
que o ius civile ‘in sola prudentium interpretatione consistit’ ou seja, o ius civile
consiste unicamente na interpretação dos jurisconsultos”. O ius civile tem a sua
origem na atividade criadora da jurisprudência (ALVES, 2002, p. 69).
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UNIDADE O Direito na Antiguidade Clássica
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Leitura
O Problema das Fontes para um Estudo de História do Direito Grego Antigo
O trabalho pretende apresentar como os estudos na área da História do Direito grego
antigo têm sido prejudicados por causa da dificuldade com as fontes históricas. Esse
problema decorre da dificuldade do acesso, da leitura, mas também decorre da tentativa
de aproximação do direito grego antigo com as fontes encontradas na Roma antiga.
SALGADO, G. M.
http://bit.ly/2WomW0L
Importância e Atualidade do Direito Romano
FRANÇA, R. L. Importância e atualidade do direito romano.
http://bit.ly/3acRg2F
A Vida de Justiniano e a sua Contribuição para o Direito Romano
O artigo narra a vida de um dos mais influentes imperadores romanos para a história
do direito. Entender a história do direito romano é entender a origem do próprio direito
brasileiro. PERESTRELO, K.
http://bit.ly/2WonweX
Corpus Juris Civilis: Justiniano e o Direito brasileiro
O artigo tem como objetivo analisar a influência da vida e obra do imperador bizantino
Justiniano I na formação e desenvolvimento do direito brasileiro atual. Assim, a partir
de uma retomada dos principais fatos históricos e de uma análise, principalmente, do
conteúdo do Corpus Iuris Civilis, é realizada uma comparação dos institutos jurídicos
presentes nesta e na atual legislação brasileira, identificando pontos em que são
comuns. MARTINS, J. E. F. de A.
http://bit.ly/3bbggY5
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Referências
ALVES, J. C. M. Direito romano. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
MARKY, T. Curso elementar de direito romano. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1992.
NETO, F. Q. V. Direito romano clássico: seus institutos jurídicos e seu legado. In:
WOLKMER, A. C. Fundamento de história do direito. Belo Horizonte: Del Rey,
2014. p. 140.
SOUZA, R. de. O direito grego antigo. In: WOLKMER, Antônio Carlos. Funda-
mento de história do direito. Belo Horizonte: Del Rey, 2014.
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