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1. CAPITAL INTELECTUAL

A nova visão empresarial, voltada para a era do conhecimento, requer uma


mudança na forma como se devem perceber as organizações. O paradigma anterior, de um
modelo contábil puramente mecanicista, com atenção centrada no valor patrimonial, tende a ser
substituído por outro de valor mais real, baseado no Capital Intelectual, dando transparência às
empresas, ao seu pessoal, investidores e analistas, além de constituir um modelo que tende a ser
padrão para todas as organizações, inclusive para aquelas sem fins lucrativos.

Mesmo tendo ciência dessa necessária evolução no modo de perceber a empresa, a


contabilidade tradicional enfrenta dificuldades para avaliar as organizações. Segundo Maria
Thereza Pompa Antunes (2000)1, o que ocorre é uma lacuna refletida na diferença entre o valor
patrimonial e o valor de mercado, visível no valor das ações em Bolsa. Todavia, dois outros
aspectos são apontados por ela para o preenchimento dessa lacuna deixada pela contabilidade: o
comportamento inesperado das ações de certas companhias, e a mudança na composição dos
custos dos produtos e serviços, dado que os custos tangíveis estão perdendo espaço para o recurso
do conhecimento.

Para chegar a um valor de uma empresa, a análise deve ir além do acervo


patrimonial e recursos financeiros, deve alcançar o conhecimento e informação gerados e, por ela
gerenciados. São os recursos intangíveis que constroem o Capital Intelectual (CI) da empresa,
mensurá-los têm se tornado a atividade estratégica diferencial com manutenção competitiva. Para
a construção do CI, é necessário o desenvolvimento de uma cultura de mensuração e
acompanhamento das iniciativas, para um adequado gerenciamento dos ativos intangíveis da
organização, o que por sua vez da uma continuidade na divulgação de informações mais
próximas da realidade para os interessados. [grifo nosso]

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ANTUNES, Maria Thereza Pompa. Capital Intelectual: sociedade baseada no conhecimento, organizações na
sociedade do conhecimento, contabilidade na sociedade do conhecimento, Goodwill e capital intelectual, mensuração
do capital intelectual: modelo de Skandia. São Paulo: Atlas, 2000.
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1.1. ATIVO

Ainda dentro de uma explicação contábil, os ativos de uma empresa para a


contabilidade tradicional, compreende os bens e direitos da empresa, que por sua vez, são
classificados em ativos tangíveis e ativos intangíveis. Numa diferenciação simplista, os
primeiros são aqueles que possuem existência física e os segundos são os que não a possuem.
[grifo nosso]

Elucidando a questão, Paton (1962, APUD: ANTUNES, 2000), afirma que as


características físicas do ativo, não são inerentemente tangíveis ou físicas. Um ativo representa
uma quantia econômica. Pode, ou não, estar relacionado ou ser representado por um objeto
físico. [grifo nosso]

Antunes citando Eliseu Martins (1972, APUD: ANTUNES, 2000), lembra que
ativo intangível, “é o futuro resultado econômico que se espera obter de um agente”.

Sérgio Iudícibus (1994, APUD: ANTUNES, 2000) contribui afirmando que:

Todo ativo representa, mediata ou imediatamente, direta ou indiretamente, uma


promessa futura de caixa. Quando falamos indiretamente, queremos referir-nos aos
ativos que não são vendidos como tais para realizarmos dinheiro, mas que contribuem
para o esforço de geração de produtos que mais se transformam em disponível. [grifo
nosso]

Para melhor entender o ativo intangível, formador do Capital Intelectual, Martins


(1972, APUD: ANTUNES, 2000) sintetiza a principal diferença em duas visões o conceito de
ativo: a primeira qualifica o agente como sendo o ativo (visão tradicional/Contabilidade
Financeira), e a segunda, qualifica o resultado trazido pelo agente (visão econômica).

Antunes (2000) aponta que considerar o resultado - no presente e/ou futuro -, em


vez de o agente, na identificação de um ativo, é fator primordial para o entendimento do Capital
Intelectual, pois este emprega o conceito econômico de ativo em contraposição ao conceito
conservador que considera o agente como ativo.
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1.2. ATIVO INTANGÍVEL

A emergência para entendimento do ativo intangível se dá em função do espaço


que este vem abrangendo na economia competitiva e globalizada.

Martins (1972, APUD: ANTUNES, 2000) considera que os Princípios do Custo


como Base do Valor e o da Confrontação das Despesas com as Receitas mais as Convenções da
Objetividade e do Conservadorismo2 têm restringido a aceitação de vários itens e impedindo a
Contabilidade de evidenciar os fatos da maneira mais próxima do real, cujos efeitos se fazem
sentir nos ativos intangíveis, dando origem ao Goodwill.

1.3. CONCEITO DE CAPITAL INTELECTUAL

Antunes aponta três autores para a conceituação de Capital Intelectual:

Annie Brooking (1996, APUD: ANTUNES, 2000) define Capital Intelectual


como uma combinação de ativos intangíveis, frutos das mudanças nas áreas da tecnologia da
informação, mídia e comunicação, que trazem benefícios intangíveis para as empresas e que
capacitam seu funcionamento.

E Edvinson e Malone (1998, APUD: ANTUNES, 2000) que empregam uma


linguagem metafórica na simbologia de uma árvore. A parte visível da árvore são as
demonstrações contábeis, e a parte invisível, as raízes, é o Capital Intelectual. Essa parte
invisível, segundo os autores, é dividida em duas outras partes, a saber:

 Capital humano: conhecimento, expertise, inovação, habilidades, valores,


cultura, e a filosofia da empresa;

 Capital estrutural: equipamentos de informática, softwares, banco de


dados, patentes, marcas registradas, relacionamento com os clientes e a
capacidade organizacional.

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Princípios Fundamentais da Contabilidade nos quais se baseia a elaboração das Demonstrações Financeiras.
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Uma última conceituação é aqui colocada por Antunes (2000): “Capital Intelectual
é o conjunto de valores (ou ativo, ou recursos, ou capital) ocultos que agregam valor às empresas
e permitem sua continuidade”.

A diferença entre uma perspectiva sociológica e a econômica leva a duas


abordagens bastante distintas quanto à definição e gestão do capital intelectual nas empresas. A
primeira abordagem baseia-se na premissa que o simples aumento do estoque de conhecimento
dentro da firma pode alavancar a sua capacidade de gerar lucros no longo prazo. A perspectiva
econômica considera o Capital Intelectual (CI) um ativo que pode ser gerido por meio de
métodos econômicos e financeiros. O foco dessa abordagem está na estratégia competitiva, no
acesso ao valor econômico e no processo de extração do valor criado pelo Capital Intelectual.

1.3.1. Desenvolvimento Histórico do Conceito de Capital Intelectual

Antunes aponta Peter Drucker como o primeiro estudioso do conhecimento como


recurso para a sociedade. Nesta mesma direção histórica, Antunes diz que a primeira matéria
publicada sobre o assunto foi na Fortune em 1994 por Thomas Stewart. Stewart abre as portas
para futuros artigos acadêmicos, dentre eles, destaca-se Skandia AFS3.

Kwasnichka (1981, APUD: ANTUNES, 2000), em pesquisa sobre o impacto da


contabilização dos recursos humanos, faz uma retrospectiva histórica sobre a evolução do
entendimento do ser humano como capital. Segundo a autora, a base dos estudos do tema
encontra-se em William Farr (1853), Ernest Engel (1883) e Theodor Wiltstein (1867), que
desenvolveram métodos para avaliar os recursos humanos, tendo Wiltstein definido o ser humano
como bem de capital.

Entre os economistas clássicos, Tinoco (1996, APUD: ANTUNES, 2000) aponta


Adam Smith e Marx Weber como aqueles que investiram esforços para encontrar uma forma de
atribuir valor monetário ao ser humano. Entretanto, o autor afirma que somente no final do século
que terminou, foi que o conceito de recursos humanos como capital tomou vulto, por meio dos

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Primeira organização a publicar um relatório suplementar às Demonstrações Contábeis divulgando o Capital
Intelectual, cujo principal executivo para esse assunto era Leif Edvinsson.
5

trabalhos dos economistas T.W. Schultz e Gary Becker; e na área da Contabilidade, por Eric
Flamholtz, Roges Hermanson, e Lee Brumet.

Antunes (2000) coloca que na visão dos economistas, o ser humano é considerado
capital por possuir capacidade de gerar bens e serviços, por meio da força de trabalho e do
conhecimento, sendo estes a fonte de acumulação e de crescimento econômico.

Para Schultz (1967, APUD: ANTUNES, 2000) o conceito de capital restrito a


estruturas, equipamentos de produção e patrimônio é extremamente limitado para estudar tanto o
crescimento econômico computável, sendo melhor compreendido, quando levado em
consideração a instrução e o progresso no conhecimento (lato e stricto).

1.3.2. Considerações sobre Ativo/Capital Humano

O Capital Intelectual é relativo ao intelecto, que só os seres humanos possuem. O


conhecimento lato e stricto materializam-se no Capital Estrutural, para Edvinsson e Malone, e
nos Ativos de Mercado, de Propriedade Intelectual e de Infra-Estrutura, para Brooking. Mas
resumindo o que Antunes deseja explicitar: Quanto melhor o capital humano/ativo humano de
uma organização, melhores resultados ela alcançará no Capital Intelectual.

Hoje as organizações não levam somente em conta o Quociente de Inteligência


(QI)4, mas também a Inteligência Emocional (QE) 5. A Inteligência Emocional abrange aspectos
como motivação e persistência diante de frustrações, autocontrole, habilidade de não permitir que
a aflição impeça a capacidade de pensar e, principalmente, o relacionamento em grupo e a
empatia. A diferença entre QI e QE, é que os últimos são mais capazes de motivar-se e de
transformar suas redes informais em equipes improvisadas. Em outras palavras, segundo Antunes
(2000), é que a Inteligência Emocional envolve a habilidade de resolver problemas e enfrentar
situações adversas, de expor idéias com clareza e rapidez, de ser criativo e saber materializar a
imaginação.

4
Teste de QI: metodologia utilizada pelos psicólogos para medir a proporção entre a inteligência de um indivíduo,
determinada de acordo com alguma média mental, e a inteligência normal (FERREIRA, 1986, APUD: ANTUNES,
2000).
5
Teoria desenvolvida por Goleman (1996, APUD: ANTUNES, 2000).
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1.4. CONCEITO DE GOODWILL

O conceito aqui colocado de Goodwill é para uma comparação com o conceito do


Capital Intelectual.

Segundo Monobe (1986: APUD: ANTUNES, 2000) a primeira aparição de


Goodwill foi vinculada a terra (1571); gradativamente foi sendo relacionada ao comércio, ou
ainda, à geração de lucro, a atividade industrial, a fidelidade da clientela, a localização
privilegiada, a personalidade dos proprietários, a processos industriais, a conexões financeiras e a
staffs eficientes. Lembra-se que esses atributos não são reconhecidos pela Contabilidade, a não
ser quando contabiliza o Goodwill na compra e venda de uma empresa.

O valor do Goodwill corresponde à diferença entre o valor atual de toda a empresa,


ou seja, sua capacidade de geração de lucros futuros, e o valor econômico de seus ativos,
apresentando, portanto, uma característica residual. (MONOBE, 1986, APUD: ANTUNES, 2000)

Goodwill é definido como a diferença entre o valor de um negócio em sua


totalidade e a soma dos ativos individuais avaliados por seu valor justo.6

1.4.1. Classificação do Goodwill

Para Coyngton (1923, APUD: ANTUNES, 2000) goodwill divide-se em:

 Goodwill comercial – criado em função da empresa;

 Goodwill pessoal – decorre de uma ou várias pessoas que integram a


empresa;

 Goodwill profissional – desenvolvido por uma classe profissional que cria


uma imagem, que propicia condições de alta remuneração; exemplos:
médicos, advogados, etc.;

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The Chartered Institute of Management Accountants, 1986. Apud: ANTUNES, 2000.
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 Goodwill evanescente – característico de certos produtos que a moda cria e,


portanto, possuem curta duração;

 Goodwill de nome ou marca comercial – ocasionado pela imagem do nome


da empresa que produz o produto ou da marca sob o qual é comercializado.
Distingue-se do anterior pela durabilidade.

Para Paton e Paton (1952, APUD: ANTUNES, 2000) goodwill divide-se em:

 Goodwill comercial – decorrente de serviços colaterais e qualidade do


produto, além da propaganda e localização da empresa;

 Goodwill industrial – decorrente de altos salários, baixo turnover de


empregados, oportunidades internas satisfatórias que contribuam para a
boa imagem da empresa e redução do custo unitário de produção;

 Goodwill financeiro – derivado da atitude de investidores e de fontes de


financiamento e de crédito em virtude da sólida situação que a empresa
apresenta;

 Goodwill político – em decorrência de boas relações com o Governo.

1.4.2. Goodwill versus Capital Intelectual

Os fatores comuns entre Goodwill e Capital Intelectual são: administração


superior; organização de vendas proeminentes; fraqueza na administração do competidor;
propaganda eficaz; processos secretos de fabricação; boas relações e treinamento com os
empregados; crédito proeminente como resultado de uma sólida reputação; respeito perante a
comunidade; associações favoráveis com outra empresa; localização estratégica; descoberta de
talentos ou recursos; condições favoráveis com relação aos impostos, e demais legislações;
funcionário tratado como um ativo raro; pessoa certa na função certa; oportunidade de
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desenvolvimento profissional e pessoal; avaliação do retorno sobre o investimento realizado em


Pesquisa & Desenvolvimento – P&D; identificação dos clientes recorrentes; mensuração da
marca; avaliação do retorno sobre o investimento realizado em canais de distribuição; sinergia
entre os programas de treinamento e os objetivos corporativos; boa infra-estrutura; valorização
das opiniões dos funcionários para objetivos traçados; incentivo para inovar; valorização da
cultura organizacional.

Para Brooking (1996, APUD: ANTUNES, 2000) o Capital Intelectual nasceu com
o primeiro vendedor ao estabelecer um bom relacionamento com o cliente, o que se denominou
Goodwill; Edvinsson e Malone (1997, APUD: ANTUNES, 2000), apontam que o Capital
Intelectual nasceu como uma nova teoria, mas que sempre esteve presente na forma de bom-
senso.

Enfim, as pesquisas mostram que os ativos qualitativos podem materializarem-se


em itens do Balanço Patrimonial e que o reconhecimento da realidade empresarial atual está
forçando a emergência de um novo equilíbrio, em que o passado é computado levando-se em
conta o futuro, e os aspectos financeiros são influenciados pelos não financeiros: o Capital
Intelectual. A partir desta conscientização, a organização do futuro terá uma relação mais
próxima com seu pessoal e com a valorização de ativos intelectuais. Uma nova atitude permitirá
uma nova postura que avalie melhor as organizações diante do seu real.

2. A MENSURAÇÃO DO CAPITAL INTELECTUAL

Relata-se aqui, as vantagens do entendimento do Capital Intelectual para as


organizações, bem como suas limitações.

A mensuração do Capital Intelectual serve tanto para gestores e usuários externos,


quanto e especialmente para acionistas, pois esta permite inclusive a empresa se conhecer melhor,
e buscar por aprimoramento.
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Brooking (1996) enfatiza que o conhecimento do Capital Intelectual é uma fonte


rica de informações sobre a organização e instrumento valioso para os aspectos a seguir
relacionados:

 Confirmar a habilidade da organização para atingir objetivos;

 Planificar a Pesquisa e Desenvolvimento;

 Fornecer informações básicas aos programas de reengenharia;

 Fornecer um foco para programas de educação organizacional e


treinamento;

 Analisar o valor da empresa;

 Ampliar a memória organizacional.

A mensuração do Capital Intelectual permite ainda: identificar os recursos


necessários em ativos intangíveis para que o Planejamento Estratégico possa não ser prejudicado;
criação de patentes, desenvolvimento de designs, desenvolvimento de novos produtos,
compreender as vantagens competitivas; o não corte de pessoas com capacidade e know-how;
decisão de treinamento de recursos humanos; contribui para decisão de investimento em
tecnologia da informação; e avaliação sobre os clientes.

Por último, o constante gerenciamento dos indicadores do Capital Intelectual,


permite ter uma visão necessária para proceder às modificações impostas pelas mudanças na
sociedade.

Do ponto de vista externo da organização, pode-se identificar as seguintes


vantagens:

 Relatórios com indicadores do CI são subsídios para analistas e


financiadores;

 Os relatórios são importantes para os acionistas, pois mostram os valores


ocultos da empresa; ou seja, têm as tendências da empresa;
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 A divulgação do CI pode explicar a diferença entre o valor contábil, e o de


mercado.

2.1. LIMITAÇÕES À MENSURAÇÃO DO CAPITAL INTELECTUAL

Empresas como IASC – International Accounting Standards Committee, FASB –


Financial Accounting Standards Board, e SEC – Securities Exchange Comission, buscam
promover um relatório modelo universal ou por setor em função das particularidades de cada
setor na economia.

Outra limitação diz respeito ao grande número de indicadores, tornando necessária


a existência de um Sistema de Informações eficiente, para identificar os dados específicos.
Investimento em Sistema de Informação também pode ser considerado uma limitação; somam-se
as estas limitações à falta de unidade-padrão de mensuração.
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REFERÊNCIA

ANTUNES, Maria Thereza Pompa. Capital Intelectual: sociedade baseada no conhecimento,


organizações na sociedade do conhecimento, contabilidade na sociedade do conhecimento,
Goodwill e capital intelectual, mensuração do capital intelectual: modelo de Skandia. São Paulo:
Atlas, 2000.

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