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Conceito

Segundo Barros (2008), Heresia (do latim haerĕsis, por sua vez do grego αἵρεσις,
"escolha" ou "opção") é a doutrina ou linha de pensamento contrária ou diferente de um
credo ou sistema de um ou mais credos religiosos que pressuponha(m) um sistema
doutrinal organizado ou ortodoxo. A palavra pode referir-se também a qualquer
"deturpação" de sistemas filosóficos instituídos, ideologias políticas, paradigmas
científicos, movimentos artísticos, ou outros. A quem funda uma heresia dá-se o nome
de heresiarca.

Heresia enquanto compreensão falsa da verdadeira fé

De acordo com McGrath (2009), a heresia, no contexto religioso, refere-se à adesão ou


propagação de crenças ou doutrinas que são consideradas como desvios significativos
ou falsificações da fé verdadeira de uma determinada religião ou sistema de crenças. A
heresia implica uma rejeição ou interpretação incorreta de princípios centrais e
fundamentais dessa fé, o que pode levar a divisões, conflitos e debates teológicos dentro
da comunidade religiosa.

A compreensão da heresia muitas vezes envolve uma perspectiva relativa à ortodoxia,


que é a crença ou doutrina aceita como padrão dentro de uma tradição religiosa. Quando
alguém se afasta dessas crenças estabelecidas, a comunidade religiosa pode considerar
essa pessoa ou grupo como herético (Ribeiro, 2009).

McGrath (2009), refere que é importante observar que a noção de heresia pode variar
entre diferentes grupos religiosos e tradições, e o que é considerado herético em um
contexto pode não ser considerado da mesma forma em outro. Ao longo da história,
várias religiões experimentaram disputas teológicas e cismas em relação a doutrinas
específicas, levando a acusações de heresia.

É fundamental notar que a heresia não é apenas uma questão de diferenças de opinião,
mas sim uma divergência que envolve conceitos cruciais da fé. A heresia pode ser vista
como uma ameaça à coesão interna de uma comunidade religiosa e, em alguns casos,
pode ter implicações legais ou políticas (Ribeiro, 2009).

Em muitos casos, as comunidades religiosas estabelecem mecanismos para lidar com a


heresia, como conselhos eclesiásticos, debates teológicos ou expulsão de indivíduos
considerados heréticos. No entanto, ao longo da história, as consequências da heresia
variaram de rejeição social a perseguição e violência.
Heresias religiosas
Heresia no cristianismo
Desde Jesus Cristo (Jo 17,21) passando por todos os apóstolos, especialmente São
Paulo, existiu um esforço para manter unidade no cristianismo. A primeira forma de
demonstração desse impulso foi a manutenção da unidade em torno de Pedro. Se há um
só Deus, que se revelou em Jesus Cristo, que fundou Sua única Igreja (Mt 16,18) e se
Jesus Cristo mesmo diz que Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida, argumenta-se que
não poderiam existir outras verdades verdadeiras. Tal asserção, contudo, foi contestada
ao longo da história. Pois se o cristianismo conheceu o impulso e desejo de unificação e
centralização ao longo dos séculos, que praticamente se confunde com a história das
sociedades ocidentais, a religião cristã também conheceu numerosos desdobramentos,
cisões, rejeições da autoridade única, e desde cedo proliferaram as mais diversas formas
de religiosidade relacionadas com o cristianismo (Ribeiro, 2009).

As Heresias, de fato, constituem formas de religiosidade cristã ou concepções do


cristianismo destoantes daquela perpetuada pelo grupo sucessor dos apóstolos e/ou
dos mártires e primeiros cristãos em geral, cujas acepções eram afins com o grupo que
despontava desde o século primeiro como "oficial", no qual se incluíam, no século
primeiro, o próprio apóstolo João em idade avançada, bem como Clemente Romano, e,
nos seguintes, Orígenes, Inácio de Antioquia, Pápias de Hierápolis, Policarpo de
Esmirna, Irineu de Lyon, Antão, entre outros vários. Esse grupo rejeitou firmemente
qualquer desvio da doutrina que proclamavam, não sem gerar estigmatização e
perseguição aos grupos hereges. A designação de determinada prática religiosa como
heresia é construída, evidentemente, a partir de um ponto de vista que se propõe
ortodoxo (Barros, 2008, p. 125).

No início era pouco evidente uma Igreja organizada como hoje, e desde o século
primeiro, entre os que aderiam ao cristianismo, sempre existiram controvérsias
doutrinárias e disciplinares, a respeito das quais se manifestavam com autoridade o
grupo dos apóstolos, com especial destaque para Pedro, como se vê em At 15, 1-5.

Segundo McGrath (2009), havia grupos em Roma, no Oriente e norte da África, que sob
influência helenística, zoroastrista e de convicções pessoais, que queriam adaptar a
doutrina de Jesus às suas ideias. Tais foram os grupos dissidentes ou heréticos fundados
por Donato Magno, o gnosticismo de Marcião (o "Primogênito de Satanás"
segundo Jerônimo), Montano, Nestório, Paulo de Samósata e Valentim entre outros. Os
escritos de Tertuliano contra os heréticos e o "Contra Heresias" de Ireneu de
Lyon foram respostas às heresias. O Primeiro Concílio de Niceia foi convocado pelo
imperador Constantino I devido a disputas em torno da natureza de Jesus "não criado,
consubstancial ao Pai". Na Santíssima Trindade, as três pessoas têm a mesma natureza,
ou seja, a divina.

A partir de 325, alguns pontos do cristianismo foram estabelecidos como dogma através
de cânones promulgados pelo primeiro concílio de Niceia, dentre outros. O Credo
Niceno esclarecia os erros do arianos que negava a divindade de Jesus. Foi usado
por Cirilo para expulsar Nestório (Barros, 2008).

O sacerdote espanhol Prisciliano foi o primeiro a ser executado por heresia, 60 anos
após o concílio de Niceia (em 385), sob o protesto de Martinho, Bispo de Tours, que
não aceitava o “crime novo de submeter uma causa eclesiástica a um juiz secular”.
Uma das linhas que foi condenada como heresia eram as que divergiam da afirmação de
que Cristo era totalmente divino e totalmente humano, e que as três pessoas da Trindade
são iguais e eternas. À semelhança do que ocorreu em diversos outros momentos da
história, este dogma (Um só Deus em Três Pessoas = Três pessoas e uma só natureza
divina assim como existem bilhões de pessoas e uma só natureza humana) foi
proclamado como tal em definitivo somente depois que Ário o desafiou, embora muito
antes disso ele fosse ensinado pela ortodoxia, (McGrath, 2009).

Heresia na Igreja Católica


Historicamente, houve muitos que discordaram dos dogmas da Igreja. Eram
considerados hereges quando se tornavam uma ameaça à unidade em torno da
autoridade papal e porque propalavam ideias ou práticas contrárias à interpretação da
Igreja Católica sobre a doutrina ensinada por Jesus Cristo e contida nos Escritos
Sagrados (Ribeiro, 2009).

Portanto, a heresia é uma questão complexa e sensível, que reflete os desafios de manter
a coesão e a integridade das crenças dentro de uma comunidade religiosa, ao mesmo
tempo em que respeita a diversidade de interpretações e opiniões.
Referências bibliográficas
Barros, J. (2008). Heresias entre os séculos XI e XV: Uma revisitação das fontes e da
discussão historiográfica – notas de leitura. in Arquipélago. Ponta Delgada (Açores):
Universidade dos Açores.
McGrath, A. E. (2009). Heresy: A History of Defending the Truth. HarperOne.
Ribeiro, J. (2009). Pequena história das heresias. Campinas: Papirus.

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