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5 Psicologia Da Personalidade Infantil
5 Psicologia Da Personalidade Infantil
INFANTIL
Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2
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NOSSA HISTÓRIA
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1. DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE NOS
PRIMEIROS ANOS DE VIDA
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Observa-se que, para a criança sentir vergonha ou orgulho, é necessário um
conhecimento das normas sociais, uma avaliação da própria conduta em
relação a tais normas e uma atribuição de responsabilidade a si mesma diante
do êxito ou fracasso para se ajustar às situações. O sentimento de culpa, por
sua vez, está ligado ao desenvolvimento sócio moral e tem estrita relação com
o aparecimento de condutas altruístas, já que inibe comportamentos que
possam prejudicar os outros e consiste em um motivador para a reparação de
danos (Saarni, Mumme & Campo, 1998).
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que seus pais lhes ensinam do que de acordo com uma estratégia de
dissimulação bem compreendida. Num segundo momento, a partir dos cinco ou
seis anos, parecem compreender realmente a diferença entre uma emoção real
e uma emoção expressa, sendo conscientes de seus estados mentais e
conseguindo esconder, deliberadamente, seus sentimentos com objetivo de se
ajustar às normas sociais.
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personalidade como pouco integrada e mais complexa. Não há, para esta faixa
etária, um padrão comportamental consistente como há para o adulto.
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Já aquelas que, aos três anos, foram classificadas como inibidas e com
tendência à internalização dos problemas (por exemplo, sentir-se inquieto,
chorar facilmente, andar amuado ou triste), mostraram-se pouco assertivas e
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com maior tendência para depressão e escassez de suporte social, aos vinte e
um anos de idade.
2. TEMPERAMENTO OU PERSONALIDADE?
CONSIDERAÇÕES CONCEITUAIS QUANTO AOS
DOIS CONSTRUTOS
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O construto denominado personalidade consiste em um domínio mais
amplo, envolvendo hábitos, valores, conteúdo da cognição social e padrões de
reação e de sentimentos. Há um número significativo de variáveis que estão no
cerne de sua concepção e desenvolvimento e, por ser um construto com ampla
variabilidade, costuma ser atribuído a crianças mais velhas, adolescentes e
adultos. A forte influência de fatores biológicos divide espaço com mecanismos
ambientais que irão moldar as características gerais do indivíduo (Rothbart &
Bates, 1998; Shiner & Caspi, 2003). Para Colom (1998), a personalidade pode
ser compreendida por meio dos atos cotidianos das pessoas e, para abordá-la
de forma cientifica é preciso empreender uma investigação das diferenças de
conduta numa amostra variada de situações para, então, compreender quais
são as propriedades que governam o comportamento das pessoas.
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Mas também é possível estabelecer, a partir da literatura, algumas
diferenças fundamentais entre os dois construtos:
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partir da observação direta das mesmas. Nove categorias foram analisadas a
partir das informações coletadas: nível de atividade; ritmicidade;
aproximação/afastamento; adaptabilidade; limiar de resposta; intensidade da
reação; qualidade do humor; distração; duração da atenção e persistência.
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fatores como estados motivacionais do indivíduo, estruturas de conhecimento e
as expectativas influenciam igualmente e intervêm no desenvolvimento. A
pesquisadora avalia o temperamento da criança a partir da sua resposta a
estímulos sensoriais e propõe algumas dimensões que podem sofrer alteração
ao longo do tempo. Tais dimensões classificam-se em: a) reatividade negativa:
aversão à aproximação e expressão de sentimentos negativos; b) reatividade
positiva: aproximação e expressão de sentimentos positivos; c) comportamento
inibido diante de estímulos novos e intensos; e c) capacidade de manter a
atenção (Rothbart, 1981, como citado em Rothbart & Bates, 1998).
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centrar o estudo do temperamento no período da infância devido à ideia de que
nessa fase a relação entre temperamento e ambiente é menos complexa; d) o
temperamento se refere a diferenças individuais mais do que a características
gerais de uma espécie. Mas há também divergências fundamentais entre as
principais teorias, que instigam o desenvolvimento de novas pesquisas: a) os
teóricos postulam distintos critérios para definir o temperamento, como por
exemplo: estilos de comportamento, reações emocionais ou estabilidade da
conduta; b) os teóricos também divergem no momento de definir as dimensões
que são consideradas como temperamento. Há um consenso para as
dimensões nível de atividade e a emocionalidade, mas nem todas as
dimensões propostas são aceitas por todos os teóricos; c) a maioria dos
investigadores do temperamento está de acordo que este é um componente da
personalidade, mas divergem ao estabelecer os limites entre estes dois
conceitos.
d) timidez social;
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Os pesquisadores trabalham com modelos diferentes, o que leva ao
segundo obstáculo: a pouca convergência entre as tantas medidas existentes
para se avaliar o temperamento infantil (Caspi et al., 2005).
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As teorias fatoriais desenvolveram-se através do estudo psicolexical e
fatorial de dados. O primeiro sustenta que as diferenças individuais mais
salientes e socialmente relevantes vêm codificadas nas várias línguas. Assim,
a linguagem cotidiana seria a fonte que permitiria identificar os termos que
melhor descrevem a personalidade.
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reúnem características opostas e definem o sujeito como
introvertido.
2 Neuroticismo: sujeitos com altos escores neste fator são
definidos como ansiosos, deprimidos, tensos, irracionais, tímidos,
melancólicos, emotivos, com tendência a sentir culpa e baixa
autoestima. Baixos escores neste fator caracterizam o sujeito
como emocionalmente estável.
3 Psicoticismo: descrito, quando há altas pontuações, por adjetivos
como agressivo, frio, egocêntrico, impessoal, impulsivo,
antissocial, não-empático, criativo e obstinado. Sujeitos com
escores baixos neste fator apresentam características contrárias e
são definidos pelo controle de impulsos.
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O modelo causal de Eysenck relaciona as diferenças entre introvertidos
e extrovertidos em termos de níveis de excitação, localizando as estruturas no
sistema nervoso central em que ocorrem tais diferenças. Uma explicação
neurológica é também oferecida para diferenciar neuróticos de pessoas
emocionalmente estáveis. As diferenças entre Introversão e Extroversão são
em termos de níveis de atividade no sistema ativador reticular ascendente
(SARA) – a atividade desse sistema serve para estimular o córtex cerebral,
levando à maior excitação cortical. Os introvertidos caracterizam-se por uma
maior atividade no SARA, o que gera níveis mais altos de excitação cortical.
São, portanto, mais excitados e mais excitáveis do que os extrovertidos. Por
ficarem superestimados mais facilmente, procuram ambientes mais tranquilos e
com menos estimulação. O contrário ocorre com sujeitos extrovertidos,
caracterizados por uma menor atividade no SARA e, portanto, buscam ativação
no ambiente. Em relação ao Neuroticismo, as diferenças dependem de níveis
de atividade do sistema nervoso autônomo (SNA). Indivíduos neuróticos
caracterizam-se por níveis mais elevados de ativação e por limiares mais
baixos no SNA. Há poucos dados referentes aos mecanismos biológicos do
fator Psicoticismo, mas sabe-se que o mesmo associa-se ao sistema de
ataque-fuga pertencente à malha cortiço-amigdalar, ou circuito do medo. Dessa
forma, sujeitos com alto Psicoticismo apresentam baixa atividade no córtex pré-
frontal, o que gera agressividade e impulsividade, bem como apresentam uma
dificuldade de experimentar o medo, o que está vinculado à falta de empatia
(Campbell et al., 2000; Eysenck, 1992; Juan-Espinosa, 2006).
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versão para adolescentes (EPQ- Junior), estando esta última em processo de
adaptação para o contexto brasileiro.
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criança, e por isso, o uso de tais relatos tem sido extensivo, tanto na pesquisa
clínica quanto na desenvolvimental (Rothbart, Ahadi & Evans, 2000).
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do relato: 1) a avaliação de várias crianças ao mesmo tempo, e 2) a falta de
motivação dos professores para tal tarefa.
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Para avaliação de crianças na faixa etária pré-escolar, entende-se que
os questionários de hetero-relato são mais adequados, considerando as
limitações da criança nesta idade para refletir sobre seu comportamento nas
diversas situações, compará-lo com o de outras crianças e responder a
perguntas sobre si. No Brasil, contudo, ainda não dispomos de questionários
de avaliação no formato hetero-relato para a faixa etária pré-escolar.
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Robinson e Behbehani (1996) investigaram a relação entre a inteligência e o
nível de estimulação cerebral e concluíram que este último exerce influência
sobre os recursos de atenção e memória de trabalho.
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uma considerável variabilidade de resultados quanto à natureza das
associações. Por exemplo, Matheny (1989) reportou correlações negativas
entre nível de atividade e o desenvolvimento mental de 1 a 12 anos de idade.
Lemelin et al (2006) também observaram uma associação negativa entre nível
de energia e medidas cognitivas aos trinta e seis meses de idade. Já em
estudo envolvendo pares de gêmeos, DiLalla et al. (1990) reportaram
correlações positivas entre o nível de atividade acessado aos nove meses de
idade e medidas cognitivas de 1 a 3 anos de idade. Miklewska et al. (2006)
encontraram, para pré-escolares, correlações negativas entre a inteligência
fluida e a emocionalidade negativa, enquanto a inteligência cristalizada foi
positivamente relacionada ao nível de atividade. Os mesmos autores
reportaram correlação negativa entre força de excitação (tolerância a
estimulações longas e duráveis) e a inteligência fluida para crianças de 8 e 9
anos.
Tal divergência nos achados foi explicada por Lemelin et al. (2006), que
sugeriram que o nível elevado de atividade no início da infância (aos nove
meses) pode servir para organizar a estimulação, eliciar a interação adulto-
criança e permitir que as crianças fiquem alertas às diferentes dimensões do
ambiente. Porém, se o nível elevado se mantiver (a partir dos quinze meses)
pode acabar obstruindo estes processos.
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Dentre as variáveis moderadoras na relação temperamento/cognição,
a qualidade da interação materna é uma das mais estudadas. Maziade et al.
(1987) sugeriram que uma alta irritabilidade pode eliciar uma interação mãe-
filho mais frequente do que uma baixa irritabilidade da criança. Considerando
que: a) o comportamento materno eliciado num ambiente de alto risco pode ser
menos apropriado para um desenvolvimento cognitivo saudável; e b) o
comportamento eliciado em ambientes de baixo risco pode auxiliar o
desenvolvimento cognitivo, espera-se que a qualidade da interação
mãe/criança na predição do desenvolvimento cognitivo seja mediada pela
vulnerabilidade social do ambiente.
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controladas. De acordo com estes autores, as habilidades numérica e
linguística estão positivamente associadas com atenção; negativamente com a
emocionalidade negativa; e não apresentam correlação significativa para
soothability (capacidade de se acalmar) e sociabilidade. As habilidades
emergentes no aprendizado da leitura e escrita, além das habilidades
aritméticas foram relacionadas também com a educação parental e extensão
do vocabulário das crianças. Os resultados revelaram que temperamento –
principalmente a emocionalidade e o nível de atividade – prediz habilidades
linguísticas e numéricas. Estas duas características temperamentais foram
consideradas, pelos autores, como as que apresentam a mais forte ligação
com o sucesso escolar. Conclusão similar foi reportada por Matheny (1989), ao
observar que o nível de energia e a emocionalidade podem contribuir para as
diferenças individuais na forma como a criança absorve o material ensinado no
contexto escolar.
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No Brasil, não foram encontrados estudos que verificassem a
associação entre temperamento, inteligência e rendimento escolar nos anos
pré-escolares. Este é um campo que merece atenção dos pesquisadores,
tendo em vista a importância da personalidade e da inteligência na predição do
sucesso do indivíduo em diversas esferas da vida.
6. DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE DA
CRIANÇA: O PAPEL DA EDUCAÇÃO INFANTIL
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O nascimento de cada criança representa um grande desafio para todos
aqueles que se responsabilizam pelo seu cuidado e pela sua educação.
Simultaneamente, representa a renovação das esperanças de homens e
mulheres, pois nasce com ela uma nova oportunidade de alcançar a plena
humanização do sujeito, com a consolidação de capacidades práticas,
intelectuais e artísticas (Zaporóshetz, 1987) e de afetos constituídas na sua
integração à vida social, as quais se expressam na sua forma singular de ser,
de sentir e de agir. Como a escola da infância pode contribuir no processo de
desenvolvimento da personalidade de cada criança? Qual a função da
Educação Infantil na formação integral dos pequenos e pequenas, propalada
pelos textos acadêmicos e legais, mas nem sempre concretizada nas práticas
educativas em creches e pré-escolas (Brasil, 2009a, 2009b)? É a essas
questões que nossas reflexões se dedicam. Sabemos, não obstante, que, dada
a sua complexidade, não temos condições de esgotá-las em um artigo.
Buscaremos, assim, apresentar alguns princípios que consideramos
fundamentais para a compreensão do desenvolvimento da personalidade das
crianças pequenas, a partir dos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural.
Entendemos que o diálogo que aqui travamos com os autores que nos ajudam
a refletir sobre o tema sob essa perspectiva pode ampliar-se em/para outros
espaços, contribuindo para que professores e professoras tomem ciência de
quanto - ainda que muitas vezes de maneira pouco intencional - interferem na
formação da personalidade infantil e sobre como o entendimento desse
processo pode tornar mais desenvolvente (Davídov, 1988) a sua atuação junto
às crianças.
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Educação Infantil (Carvalho, 2011; Brasil 2009a), o que lhes possibilita
contribuir para ampliar e qualificar positivamente o modo pelo qual meninos e
meninas se relacionam com o mundo a seu redor, com as pessoas, e nesse
processo, como constroem progressivamente a compreensão de si mesmos.
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simultânea e conjuntamente com o processo de maturação orgânica e que seu
portador é o mutante organismo infantil em vias de crescimento e maturação.
(p. 36, tradução nossa).
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sua atividade, mais exatamente pelo conjunto de suas diversas atividades”
(Leontiev, 1978, p. 143, itálicos do autor).
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importância fundamental: a ampliação do capital cultural, efetivada na escola,
sofistica as formas de compreensão dos sujeitos sobre a sociedade e sobre si
mesmos, possibilitando a transformação qualitativa da sua consciência e, com
ela, de suas formas de atuação e da personalidade.
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singular diante do mundo: ela forma uma consciência cada vez mais complexa
sobre os objetos e seu conhecimento, sobre as relações humanas e,
sobretudo, sobre si mesma (a autoconsciência). Esse processo é mediado
pelas situações que a criança vivencia, por isso podemos afirmar que a
personalidade de cada um resulta de sua biografia: das suas condições de vida
e educação, das atividades que desenvolve, das aprendizagens que
empreende e do desenvolvimento do seu psiquismo, como destacam Vigotski
(1929/2000) e Sève (1979).
Por isso, quanto mais ricas forem as vivências da criança com o adulto -
que se torna o mediador dos primeiros contatos sensoriais do bebê com o
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mundo à sua volta-mais positivo será o desenvolvimento físico e emocional
nesse primeiro período de vida.
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alegria de alcançá-los ou o prazer do contato físico com o adulto, criando a
necessidade de novas impressões.
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Nesse período, a percepção da criança torna-se cada vez mais
semântica, isto é, ela já é capaz de compreender o mundo à sua volta de modo
mais integrado. A criança pequenininha passa a perceber-se como sujeito das
ações que realiza, e esse é um progresso central para o desenvolvimento de
sua personalidade. Desse modo, ainda que o adulto continue sendo o
motivador central do comportamento da criança, nesse momento ele passa a
uma nova posição: a de companheiro nas ações empreendidas sobre os
objetos sociais. A criança manipula-os, apropriando-se de suas características
físicas e, simultaneamente, percebendo as suas próprias possibilidades como
sujeito que realiza ações com esses objetos. Por isso é tão comum ela repetir
inúmeras vezes as mesmas ações: abrir e fechar a porta; jogar e recuperar um
objeto do chão; empurrar e puxar... Ela está envolvida em um complexo
processo de percepção das coisas e de autopercepção, mediado pela
presença do adulto – primeiro como colaborador, depois, como modelo de
ações. É importante considerar que nesse momento a criança imita as ações
do adulto em si mesmas. Acontece então o que Vigotski (1932/2013b)
denomina de um “quase jogo” (p. 359). Se aparentemente a atividade que
realiza é um faz-de-conta, na realidade a criança não cria uma situação fictícia,
que é pressuposto do jogo de papéis. Ela ainda não é capaz de representar
simbolicamente um papel. Por isso ela nina sua boneca, mas não deixa de
considerá-la como boneca, enquanto para uma criança maior, envolvida no faz-
de-conta, a boneca seria, dentro de uma situação imaginária, a filha, e ela, a
mãe. Podemos dizer que a criança imita externamente as ações do adulto, sem
se colocar no lugar dele.
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adultos e crianças compartilham as palavras, o que permite aos pequenos a
assimilação de um vocabulário cada vez mais rico e um pensamento
progressivamente menos situacional, embora os significados dessas mesmas
palavras estejam passando por um processo evolutivo e guardem
características próprias (Vygotsky, 1934/2001).
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completamente nova. Assim, o desenvolvimento do pensamento verbal assume
importância fundamental na formação da personalidade. O autor afirma que
nossas memórias mais antigas em relação à primeira infância têm origem a
partir do momento em que linguagem e pensamento deixam de ser processos
independentes e passam a constituir um único processo, mediado pelos
significados das palavras – que passam a ser o substrato tanto da forma como
pensamos o mundo quanto da forma como expressamos nossa compreensão
dele (Vygotsky, 1931/2013a).
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comer sozinha; indispõe-se com o adulto que pretenda controlar suas ações. A
consciência dos pais e dos professores sobre a importância desse momento
crítico, que representa uma virada no desenvolvimento da criança, é
fundamental para evitar as crises (Vygotsky, 1932/2013b), que acontecem
quando há uma profunda diferença entre aquilo que a criança já é capaz de
fazer e o que efetivamente lhe é permitido pelos adultos. Neste contexto, se
não é possível deixar que a criança resolva tudo por si mesma, o adulto pode
apresentar opções para que ela faça escolhas. O importante é que ela assuma
uma nova posição nas relações, que não seja mais tratada como um bebê e
que exercite, na medida do possível, a sua autonomia. Assim, se as condições
de vida e de educação incentivaram a sua condição de sujeito em
desenvolvimento, com voz e vez, esta autonomia resulta das vivências
anteriores da criança, nas quais ela foi desenvolvendo a fala, o andar, a
memória, as percepções em geral e a percepção de si mesma. Cabe recordar
que sua relação com o entorno mudou proporcionalmente ao desenvolvimento
de suas capacidades. Ela é capaz de compreender os fatos e a si mesma de
maneira inteiramente nova, e nessas condições, o adulto tem o papel essencial
de evitar crises, permitindo que a criança assuma novos papéis nas relações
com as pessoas (Leontiev, 2010).
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representa simbolicamente as atividades realizadas por eles, desenvolvendo,
progressivamente, suas formas de compreender o mundo, as pessoas e a si
mesma.
Por outro lado, algo precisa ser lembrado: embora tenham importância
essencial, os jogos de papéis não são os únicos responsáveis pelo
desenvolvimento de todas as aprendizagens importantes da criança na
Educação Infantil. O seu envolvimento em outras atividades, que desenvolvam
a sua capacidade expressiva e o seu conhecimento do mundo, das pessoas e
dos objetos sociais tem um papel fundamental. O desenho, a oralidade, o
movimento que promove a consciência corporal, a pintura, a modelagem, os
conhecimentos matemáticos, a música, a escrita e a leitura também assumem
grande importância na formação das capacidades intelectuais, práticas e
artísticas e no desenvolvimento da personalidade. Disso decorre a necessidade
de que a criança esteja envolvida em atividades diversificadas e significativas,
que instiguem a sua curiosidade e a afetem positivamente e, nesse sentido,
mobilizem-na para se apropriar dos objetos culturais, desenvolvendo suas
funções psíquicas superiores. Neste contexto, o trabalho do professor
enquanto pessoa que, ao propor situações que possibilitem a ampliação das
necessidades de conhecer e de se expressar das crianças, diversifiquem e
enriqueçam as suas atividades, torna-se essencial para o desenvolvimento da
personalidade infantil (Zaporóshetz, 1987).
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O momento dos jogos e atividades lúdicas cria as bases para um novo
período do desenvolvimento da personalidade: o momento da escolarização.
Ao imitar os papéis sociais dos adultos, a criança, progressivamente, vai
percebendo que ainda não domina os conhecimentos daqueles, os quais se
tornam tão interessantes para ela. Adultos (e crianças maiores) sabem muitas
coisas que a criança deseja conhecer. Na nossa sociedade, o local privilegiado
para a aprendizagem desses conhecimentos é a escola, e desde cedo meninos
e meninas sabem disso. Eles desejam ocupar novos espaços nas relações
sociais, uma nova situação de desenvolvimento, em que não se sintam mais
tão distantes do adulto, mas sejam valorizados por ele. Novas transformações
da personalidade hão de vir: formas de pensamento cada vez mais abstrato e a
formação de conceitos que disso decorre; uma maior capacidade
argumentativa; uma autoconsciência cada vez mais profunda acerca das
próprias possibilidades e vontades; a possibilidade de agir tendo objetivos
previamente formulados. Todas essas novas capacidades e traços de
personalidade tornarão mais complexa a consciência da criança no momento
da escolarização (Bozhovich, 1981, 1987; Elkonin, 1987).
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Para isso, o trabalho pedagógico efetivamente promotor do
desenvolvimento fundamenta-se no profundo conhecimento teórico acerca do
desenvolvimento humano. Cabe ao professor compreender que a cultura, por
diferentes formas de mediação, pode ser apropriada pela criança, contribuindo
para a sua formação como pessoa completa. Cabe-lhe, ainda, selecionar
objetos materiais e não materiais do capital cultural acumulado pela
humanidade e, conhecendo as especificidades dos momentos do
desenvolvimento da personalidade infantil, organizar tempos, espaços,
relações e experiências formativas que permitam a apropriação efetiva de
conhecimentos que vão além daqueles já presentes no cotidiano das crianças
e são assimilados mesmo sem a participação do trabalho sistematizado da
escola. A escola da infância deve ser um espaço que faça diferença na vida da
criança: um espaço de atuação sobre as capacidades em formação, um
espaço de atividades que possibilitem à criança compreender e compreender-
se, perceber e perceber-se, conhecer, fruir (Brasil, 2009a, 2009b). A escola
deve ser um espaço de criação de novas necessidades que impulsionem a
criança a aprender e a desenvolver-se.
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zona de desenvolvimento próximo da criança (Vygotski, 1932/2013b), e assim
seu trabalho impulsiona o desenvolvimento das capacidades intelectuais,
afetivas, práticas e artísticas da personalidade infantil.
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Neste processo, conhecer a si mesma e conhecer as suas próprias
possibilidades. Neste sentido o professor exerce um trabalho fundamental: o de
atuar com a criança, de forma que ela perceba os usos dos objetos culturais e
amplie seus conhecimentos acerca dos saberes e fazeres humanos; o de
organizar situações para que as crianças, em interação, ajam de forma a
interferir nas aprendizagens umas das outras a partir de conhecimentos
prévios, tendo em vista a elaboração de novas e mais complexas formas de
compreensão, que advêm das relações com a cultura historicamente
acumulada nos objetos e nos saberes e fazeres humanos.
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atividades da criança e, nesse processo, possibilitar o desenvolvimento de
novas formas de compreensão e de ação sobre os objetos e de novas relações
com as pessoas, enfim, espaços-tempo de desenvolvimento da personalidade.
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