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FAUZI CHOUKR - Cautelares - Atualizado Lei 13964 de 2019
FAUZI CHOUKR - Cautelares - Atualizado Lei 13964 de 2019
Aula 8:
Prisão e Liberdade
Professor:
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Prisão e Liberdade
Professor:
2
FUNDAMENTOS PARA O PROCESSO PENAL CAUTELAR NO ESTADO DE DIREITO
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1. Medidas cautelares e presunção de inocência
Já tivemos a oportunidade de apontar que, no processo penal aderente aos primados constitucionais,
a prisão tem de ser encarada como uma exceção, e a liberdade como uma regra e, por isso, as
privações de liberdade anteriores à sentença condenatória definitiva devem ter, sempre e
necessariamente, fundamentação e finalidade cautelares.
1.1. Gradação das medidas cautelares: a prisão cautelar como ultima ratio
1
Presunção de Inocência e Prisão Cautelar, p. 37
4
Tal sugestão acompanhava aquela já preconizada no
BRASIL. Senado.
“Projeto Frederico Marques” (este também presente na
Anteprojeto de reforma do
comissão dos trabalhos do mencionado PL 1655) de Código de Processo Penal.
Brasília: Senado Federal,
forma a conferir ao Magistrado o “c) poder de aplicação,
2009. Disponível em:
pelo juiz, de medidas alternativas à prisão provisória, de <http://legis.senado.gov.
br/mate-pdf/58503.pdf>.
acordo com as recomendações da Organização das
Nações Unidas em Congresso realizado em 1980 em
Caracas, Venezuela, sobre Prevenção do Crime e
Tratamento do Delinqüente”. Tal projeto, como já anotado
foi retirado do Congresso Nacional em 1989 quando se
encontrava no Senado (PLC 175/1984).
Com efeito, no projeto “Frederico Marques” (PL 633/1975) havia previsão no então artigo 472
que abria o título “das providências cautelares” (titulo IV, capítulo I) com vistas à “assegurar a
atuação da justiça penal” de que pessoa acusada ou suspeita pudesse vir a ser submetida a um
regime de prisão e, alternativamente, liberdade provisória com ou sem fiança.
b) inabilitações provisórias;
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Por outro lado, no plano internacional, às
normas que inspiraram as ideias dos anos 1970 Tais regras interpretam o
conteúdo do artigo 9º, nº 3, do
seguiram-se as denominadas “Regras Mínimas Pacto Internacional sobre os
das Nações Unidas para a elaboração de Direitos Civis e Políticos ao
estabelecer que «a detenção pr
Medidas não Privativas de Liberdade (Regras isiona l de pe ssoa s
aguardando julgamento não
de Tóquio) adotadas pela Assembleia Geral
deve ser regra geral, mas a sua
das Nações Unidas na sua resolução 45/110, libertação pode ser subordinada
a garantir que assegurem a
de 14 de Dezembro de 1990 que, em seu item
presença do interessado no
2.1, determinam: “As disposições pertinentes julgamento”.
das presentes Regras aplicam-se a todas as
pessoas que são objeto de procedimento de
julgamento ou de execução de sentença, em
todas as fases da administração da justiça
penal.
Para os fins das presentes Regras, estas pessoas são denominadas “delinquentes” - quer se
trate de suspeitos, de acusados ou de condenados”. Na sequência, tratando especificamente
sobre a prisão de natureza cautelar define que (item 6) “A prisão preventiva como medida
de último recurso” e (6.1).
A prisão preventiva deve ser uma medida de último recurso nos procedimentos penais,
tendo devidamente em conta o inquérito sobre a presumível infracção e a proteção da
sociedade e da vítima.”
Por fim, (6.2) “As medidas substitutivas da prisão preventiva são utilizadas sempre que possível. A
prisão preventiva não deve durar mais do que o necessário para atingir os objetivos enunciados na
regra 6.1. e deve ser administrada com humanidade e respeitando a dignidade da pessoa” e (6.3) “O
delinquente tem o direito de recorrer, em caso de prisão preventiva, para uma autoridade judiciária
ou para qualquer outra autoridade independente.”
6
Encerrada a tramitação dos projetos reformistas das décadas de 1970 e 1980, no transcurso
das reformas pontuais nos anos 1990, nos trabalhos da Comissão presidida pelo então
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira instituída pelo Poder Executivo houve, entre as
inúmeras propostas, a de reformar a disciplina da prisão cautelar para contemplar “a
ampliação das hipóteses de prisão preventiva e a possibilidade de sua substituição por
medidas restritivas de liberdade que dispensam o recolhimento à prisão, contribuindo para a
melhoria do sistema carcerário”
Naquela sugestão:
Com efeito, em primeiro lugar deve a decisão encontrar aquilo que se poderia denominar de
“necessidade cautelar” diante da somatória dos arts. 312, 313 e 282, I e II, todos do CPP. O
resultado positivo da análise racional a todos esses fundamentos e critérios implica que o processo
depende de algum asseguramento a ser prestado pela pessoa acusada para que a tutela de
conhecimento possa seguir sem intercorrências.
Além disso há um escalonamento que tem as medidas diversas da prisão contidas no art. 319 do
CPP como prioritárias para, após verificar a (in)suficiência dessas possibilidades chegar-se, como
“ultima ratio” à prisão cautelar.
O art. 321 embaralha por completo esse caminho e induz a compreensões distintas da finalidade do
modelo alternativo. Por isso há de ser saudado com ênfase relevante acórdão do STJ, da lavra do
Min. Rogério Schietti Machado Cruz – Relator (6.ª Turma HC 282.509 j. 19. 11. 2013 - public.22.
11. 2013) que trabalhou o tema de forma lapidar:
"" Com efeito, as medidas alternativas à prisão preventiva não pressupõem, ou não
deveriam pressupor, a inexistência de requisitos ou do cabimento da prisão preventiva,
8
mas sim a existência de uma providência igualmente eficaz (idônea, adequada) para o
fim colimado com a medida cautelar extrema, porém com menor grau de lesividade à
esfera de liberdade do indivíduo. É essa, precisamente, a ideia da subsidiariedade
processual penal, que permeia o princípio da proporcionalidade, em sua máxima parcial
(ou subprincípio) da necessidade (proibição de excesso): o juiz somente poderá
decretar a medida mais radical - a prisão preventiva - quando não existirem outras
medidas menos gravosas ao direito de liberdade do indiciado ou acusado por meio
das quais seja possível, com igual eficácia, os mesmos fins colimados pela prisão
cautelar. Trata-se de uma escolha comparativa, entre duas ou mais medidas
disponíveis - in casu, a prisão preventiva e alguma(s) das outras arroladas no artigo
319 do CPP - igualmente adequadas e suficientes para atingir o objetivo a que se
propõe a providência cautelar. Desse modo, é plenamente possível que estejam
presentes os motivos ou requisitos que justificariam e tornariam cabível a prisão
preventiva, mas, sob a influência do princípio da proporcionalidade e a luz das
novas opções fornecidas pelo legislador, deverá valer-se o juiz de uma ou mais das
medidas indicadas no artigo 319 do CPP, desde que considere sua opção suficiente e
adequada para obter o mesmo resultado - a proteção do bem sob ameaça - de forma
menos gravosa. ... Isso equivale a dizer que os motivos justificadores da prisão
preventiva são os mesmos que legitimam a determinação do recolhimento noturno ou
qualquer outra das medidas cautelares a que alude o artigo 319 do CPP, sendo
equivocado condicionar a escolha de uma dessas últimas ao não cabimento da prisão
preventiva. Na verdade, a prisão preventiva é, em princípio, cabível, mas a sua
decretação não é necessária, porque, em avaliação judicial concreta e razoável,
devidamente motivada, considera-se suficiente para produzir o mesmo resultado a
adoção de medida cautelar menos gravosa. Logo, a dicção normativa do artigo 321,
ao condicionar, se for o caso, a imposição das medidas cautelares - observados os
critérios constantes do artigo 282 do Código - a que estejam “ausentes os requisitos
que autorizam a decretação da prisão preventiva”, suscita a seguinte indagação: com
base em quê será autorizada a providência cautelar menos gravosa, dentre as previstas
no artigo 319?
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Cuando los tribunales recurren a la detención preventiva sin considerar la
aplicación de otras medidas cautelares menos gravosas, en atención a la
naturaleza de los hechos que se investigan, la prisión preventiva deviene en
desproporcionada2
2
CrEDH, Case of Ladent v. Poland (Application No. 11036/03), Sentencia del 18 de marzo de 2008, Sección Cuarta de
la Corte, párrs. 55 y 56.
10
Neste ponto, nunca é demais recordar da lição correta de BARROS ao
afirmar, que “A possibilidade jurídica na ação cautelar consiste em se
verificar prima facie, se a medida cautelar pleiteada é admissível no
estatuto processual ou em qualquer lei dessa natureza. Existe uma
tipicidade processual não diferente da tipicidade de direito substancial.
Portanto, importa verificar se o pedido do autor pode subsumir-se num dos
modelos descritos nos preceitos normativos do direito vigorante. Inexistindo
no ordenamento jurídico a medida cautelar pleiteada, não há possibilidade
jurídica para o pedido do autor” (BARROS, 1982).
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3. O conceito de “necessidade cautelar”
É o resultado da constatação judicial sobre a adoção de uma ou mais medidas invasivas da liberdade
estritamente previstas no ordenamento para que o processo penal possa se desenvolver de forma
regular e consiga alcançar uma solução de mérito.
Este conceito substituiu o binômio periculum in mora + fumus bonii iuris cuja matriz teórica é
distante do processo do marco constitucional-convencional posto que, seu primeiro aspecto (“perigo
na demora”) nada mais é que a antecipação da cognição de mérito, inviável na cautelaridade
processual penal posto que desvirtua os fins típicos das cautelares como, aliás, ficou assentado na
reforma trazida com a Lei 13964/2019.
Assim, toda medida incidente na liberdade pessoal anterior ao trânsito em julgado possui
natureza cautelar.
12
3.2. Os fundamentos da necessidade cautelar na estrutura constitucional-convencional
A questão central para adequar-se uma estrutura cautelar ao Estado de Direito é: quais os
fundamentos legítimos para postular a ocorrência da necessidade cautelar.
O regramento cautelar com as reformas em 2011 e 2019 provocou alterações na estrutura originária
do CPP mas sem que pudesse alcançar um padrão mínimo condizente com os estandares
internacionais e comparado, dadas as seguintes circunstâncias:
De forma esquemática o cenário do art. 282, as chamadas “bases gerais” se apresenta da seguinte
forma:
Por outro lado, ao analisar-se o conteúdo do artigo 312 do CPP, a desconformidade constitucional-
convencional persiste apesar das modificações de 2011 e 2019.
Quando analisamos em obra publicada em 2001 os inúmeros projetos de reforma que dariam
vazão a mais uma rodada de alterações pontuais do CPP, dentre eles o das medidas cautelares,
apontamos em relação ao anteprojeto que:
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envolve, em linhas gerais, as seguintes circunstâncias principais: a)
necessidade de resguardar a integridade física ou psíquica do paciente ou
de terceiros; b) objetivo de impedir a reiteração das práticas criminosas,
desde que lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente
no decreto de custódia cautelar; e c) necessidade de assegurar a
credibilidade das instituições públicas, em especial o Poder Judiciário, no
sentido da adoção tempestiva de medidas adequadas, eficazes e
fundamentadas quanto à visibilidade e transparência da implementação de
políticas públicas de persecução criminal (HC 91386/BA, rel. Min. Gilmar
Mendes, 19.2.2008).
É imperioso refletir nas consequências de um poder jurisdicional cautelar que venha a atender a
“implementação de políticas públicas de persecução criminal”, quando intervenientes do processo
judicial, notadamente o Juiz, passe a conceber sua função, no processo, como integrante de um
mecanismo de efetivação de políticas públicas criminais, o que pode perigosamente aproximá- lo
de uma função que não lhe é própria. Isso é muito diferente do controle jurisdicional de políticas
públicas por meio, sobretudo, da verificação de sua compatibilidade constitucional mediante
ações próprias.
Ademais, na visão contemporânea do assunto pelo STF acentua-se a ordem pública como
instrumento preventivo ao se afirmar que:
" A garantia da ordem pública, por sua vez, visa, entre outras coisas, evitar a
reiteração delitiva, assim resguardando a sociedade de maiores danos’
(HC 84.658/PE, rel. min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJ de 3-6-
2005). Nessa linha, deve-se considerar também o ‘perigo que o agente
representa para a sociedade como fundamento apto à manutenção da
segregação’ (HC 90.398/SP, rel. min. Ricardo Lewandowski, Primeira
Turma, DJE de 17-5-2007) (HC 106.788, rel. min. Ellen Gracie, julgamento
em 31-5-2011, Segunda Turma, DJE de 4-8-2011).
Quando não, vai-se a uma retórica circular, sem um ponto de apoio efetivamente concreto quando
se decide que
16
"
O conceito jurídico de ordem pública não se confunde com incolumidade
das pessoas e do patrimônio (art. 144 da CF/1988). Sem embargo, ordem
pública se constitui em bem jurídico que pode resultar mais ou menos
fragilizado pelo modo personalizado com que se dá a concreta violação da
integridade das pessoas ou do patrimônio de terceiros, tanto quanto da
saúde pública (nas hipóteses de tráfico de entorpecentes e drogas afins).
Daí sua categorização jurídico-positiva, não como descrição do delito nem
da cominação de pena, porém como pressuposto de prisão cautelar; ou
seja, como imperiosa necessidade de acautelar o meio social contra
fatores de perturbação que já se localizam na gravidade incomum da
execução de certos crimes. Não da incomum gravidade abstrata desse ou
daquele crime, mas da incomum gravidade na perpetração em si do crime,
levando à consistente ilação de que, solto, o agente reincidirá no delito.
Donde o vínculo operacional entre necessidade de preservação da
ordem pública e acautelamento do meio social. Logo, conceito de ordem
pública que se desvincula do conceito de incolumidade das pessoas e do
patrimônio alheio (assim como da violação à saúde pública), mas que se
enlaça umbilicalmente à noção de acautelamento do meio social. É certo
que, para condenar penalmente alguém, o órgão julgador tem de olhar
para trás e ver em que medida os fatos delituosos e suas coordenadas dão
conta da culpabilidade do acusado. Já no que toca à decretação da prisão
preventiva, se também é certo que o juiz valora esses mesmos fatos e vetores,
ele o faz na perspectiva da aferição da periculosidade do agente. Não
propriamente da culpabilidade. Pelo que o quantum da pena está para a
culpabilidade do agente assim como o decreto de prisão preventiva está
para a periculosidade, pois é tal periculosidade que pode colocar em risco
o meio social quanto à possibilidade de reiteração delitiva (cuidando-se,
claro, de prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem
pública)” (HC 96.212, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 16-6-2010,
Primeira Turma, DJE de 6-8-2010). No mesmo sentido: HC 114.524, rel.
min. Rosa Weber, decisão monocrática, julgamento em 13- 8-2012, DJE
de 22-8-2012; HC 102.043, rel. min. Dias Toffoli, julgamento em 24-8-
2010, Primeira Turma, DJE de 22-11-2010.
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Não é exagero afirmar, diante da ausência de elementos Lenart, André. “O STF e a
substanciais concretos para sua definição, que esse fundamentação do decreto de
prisão preventiva.” Revista da
fundamento, de incidência cada vez mais rara no direito SJRJ 15 . 22
comparado, acentua o caráter efetivamente incerto e, para (2010): 61-80.
E, numa percepção genérica, pode-se opor a manutenção desse fundamento como contraponto à
estrutura processual penal aderente ao Estado de Direito que prima pela presunção de inocência.
É, assim, a “ordem pública” um dos principais alicerces de refutação de um ordenamento
condizente com a Constituição que, para muitos, é visto pejorativamente como “garantista” e em
excesso.
Aqui é necessário acrescer breve comentário sobre os
profundos equívocos que repousam sob o rótulo de FERRAJOLI, Luigi.
Constitucionalismo pri nci
“garantismo”. Sem pretender adentrar na extensão pi al i sta y c o n st itu c io
conceitual desse assunto, destaca-se que o garantismo, n a lis m o gar antista.
DOXA, Cuadernos de
sobretudo na obra de seu autor mais reconhecido no Filosofía del Derecho, 34
Brasil, Luigi Ferrrajoli (e distorcidamente tido como o (2011)
ISSN: 0214-8676 pp.
“pai” dessa construção) , preconiza um modelo de 15-53.
estrita subsunção legal, a dizer, de normatividade estrita
e com apelo aos direitos fundamentais como sustentação
de um modelo político que se reflete no jurídico.
"
A distinção entre direito e moral envolve, ainda, uma limitação à figura dos
juízes, repelindo arbitrariedades derivadas de juízos morais. Equivale,
18
ainda, a uma limitação às atividades do Poder Legislativo, repelindo que
este se imiscua na vida moral dos cidadãos.
O resultado concreto é que um sistema que se apregoou como tendente à minimização resistiu e se
manteve vivo em sua essência.
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3.3. Aplicação em concreto: Impossibilidade de necessidade cautelar ex lege
20
Na Ação Direta De Inconstitucionalidade 3.112- 1 que teve como relator o Min. Ricardo
Lewandowski. No corpo do acórdão tem-se que: “A prisão obrigatória, de resto, fere os princípios
constitucionais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV), que abrigam um conjunto de
direitos e faculdades, os quais podem ser exercidos em todas as instâncias jurisdicionais, até a sua
exaustão.”
No mais, o próprio STF reiterou esse entendimento em acórdãos diversos e, dentre eles, o com a
seguinte ementa: vedação legal absoluta em caráter apriorístico, da concessão de liberdade
provisória. lei de drogas (art. 44). Inconstitucionalidade. ofensa aos postulados constitucionais da
presunção de inocência, do “due process of law”, da dignidade da pessoa humana e da
proporcionalidade. O significado do princípio da proporcionalidade, visto sob a perspectiva
“proibição do excesso”: fator de contenção e conformação da própria atividade normativa do
estado. Precedente do supremo tribunal federal: adi 3.112/df (estatuto do desarmamento, art. 21).
Caráter extraordinário da privação cautelar da liberdade individual. Não se decreta prisão cautelar,
sem que haja real necessidade de sua efetivação, sob pena de ofensa ao “status libertatis” daquele
que a sofre. Irrelevância, para efeito de controle da legalidade do decreto de prisão cautelar, de
eventual reforço de argumentação acrescido por tribunais de jurisdição superior. Precedentes.
Medida cautelar deferida) STF
- med. Caut. Em habeas corpus 97.976-9 Minas Gerais – relator: min. Celso de Mello – Data do
Julgamento: 09 de março de 2009 (grifos no original).
A estrutura do CPP com a redação dada pela Lei 13964/2019 impôs modificações explicítas na
norma infraconstitucional que, rigorosamente falando, já eram extraíveis desde a base
constitucional-convencional 1988/1992. Mas, num ambiente cultural em que o normativismo –
plano distinto e inferior ao positivismo – é a bússola de funcionamento prático do direito vivo, as
modificações são positivas uma vez que:
Da cultura do sistema internacional referente ao devido processo legal tem-se, no tema específico
da metodologia para apuração da necessidade cautelar que
7
ONU, Grupo de Trabajo sobre Detenciones Arbitrarias, Informe sobre Misión a Argentina, E/CN.4/2004/3/Add.3,
publicado el 23 de diciembre
22
E, ainda,
La celebración de una audiencia previa sobre la procedencia de la prisión
preventiva, además de garantizar el principio de inmediación, permite, entre
otras cosas, que la persona imputada y su defensa conozcan con antelación
los argumentos a partir de los cuales se infiere el riesgo de fuga o de
interferencia con las investigaciones. Además, ofrece un mejor escenario,
tanto para la defensa, como para la parte acusadora, en el que presentar sus
argumentos a favor o en contra de la procedencia de la prisión preventiva, o
en su caso de otras medidas menos restrictivas. En definitiva, la oralidad
garantiza la posibilidad de discutir todas las cuestiones vinculadas con la
aplicación de la medida cautelar8
Por sua vez, a Lei 13964/2019 nada alterou nesse cenário. As modificações trazidas dizem respeito
à fundamentação das decisões e não o método de sua produção.
24
4.1.1. A “audiência de custódia” e controle da necessidade cautelar
O tema começou a ser tratado legislativamente pelo PLS 544 de 2011, apresentado
pelo Senador Antônio Carlos Valadares, que preconizou a seguinte nova redação para
o art. 306 do CPP:
“§ 1º No prazo máximo de vinte e quatro horas depois da prisão, o preso deverá ser
conduzido à presença do juiz competente, ocasião em que deverá ser apresentado o
auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas e, caso o
autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria
Pública”.
Contudo, a reforma pretendida ganhou rumos diferentes porquanto a lei das cautelares
de 2011 não conseguiu alterar o grave cenário da população carcerária de presos
preventivos e, tampouco, influiu na diminuição das noticiadas torturas no ambiente
policial.
A combinação dos artigos 287 e 310 do CPP, com a redação dada pela Lei
13964/2019 acabou por regular definitivamente essa audiência fazendo-o de forma
muito similiar à Resolução 213 do CNJ. Essa regulação revela a opção brasileira em
restringir essa audiência ao controle estrito da necessidade cautelar, sem propiciar
espaço para outros desdobramentos processuais como, por exemplo, o acordo de não
persecução penal (ANPP).
Mais uma vez o que se buscou foi condensar no texto de lei aspectos dominantes da
jurisprudência – muito mais que da doutrina – visando confinar a atividade do julgador
à obediência da caso concreto e, ainda, forçar a obediência a precedentes de caráter
vinculante. Assim, o cenário normativo passou a ser o seguinte:
“Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre
motivada e fundamentada.
§ 1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o
juiz deverá indicar concretamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que
justifiquem a aplicação da medida adotada.
§ 2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória,
sentença ou acórdão, que:
I - limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar
sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de
sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese,
infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus
fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta
àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela
parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação
do entendimento.” (NR)
26
da própria pena – nesse caso afigura-se como pena antecipada. 9
Não por outra razão, em todas as análises sobre o tema que partem da estrutura
internacional de proteção aos direitos fundamentais afirma-se que “Así, en atención al
derecho a la presunción de inocencia y al carácter excepcional de la prisión preventiva
surge el deber del Estado de revisar periódicamente la vigencia de las circunstancias
que motivaron su aplicación inicial” posto que “Este ejercicio de valoración posterior
se caracteriza por el hecho de que, salvo evidencia en contrario, el riesgo procesal
tiende a disminuir con el paso del tiempo”.10
Ademais, se observada a estrutura dos ritos em vigor desde 2008, não há qualquer
diferença obrigatória entre as situações processuais estando a pessoa submetida à
persecução presa ou solta. Assim, temos a seguinte disciplina legal.
9
Neste sentido: Pena antecipada - Corte IDH. Caso López Álvarez Vs. Honduras. Sentencia de 1 de
febrero de 2006. Serie C Nº 141, párr. 69; Corte IDH. Caso Acosta Calderón Vs. Ecuador. Sentencia de
24 de junio de 2005. Serie C Nº 129, párr. 111; Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Sentencia de 7 de
septiembre de 2004. Serie C Nº 114, párr. 180; Corte IDH. Caso “Instituto de Reeducación del Menor”
Vs. Paraguay. Sentencia de 2 de septiembre de 2004. Serie C Nº 112, párr. 229; Corte IDH. Caso
Suárez Rosero Vs. Ecuador. Sentencia de 12 de noviembre de 1997. Serie C Nº 35, párr. 77.
Igualmente, CIDH. Informe Nº 86/09, Caso 12.553, Fondo, José, Jorge y Dante Peirano Basso,
Uruguay, 6 de agosto de 2009, párr. 133; CIDH. Informe Nº 2/97, Caso 11.205, Fondo, Jorge Luis
Bronstein y otros, Argentina, 11 de marzo de 1997, párr. 12; CIDH. Tercer Informe sobre la Situación
de los Derechos Humanos em Paraguay, Cap. IV, párr. 34.
10
COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS INFORME SOBRE EL USO DE
LA PRISIÓN PREVENTIVA EN LAS AMÉRICAS - 30 diciembre 2013
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privado de libertad” 11.
Contudo, o mínimo que existe de limitação temporal e que, como visto, não se aplica
exclusivamente às medidas cautelares, sofre mitigações de várias ordens tal como
compreendido na jurisprudência dos tribunais.
O resultado prático dessa deformação pode ser sentido nas seguintes estatísticas
disponibilizadas pelo CNJ:
11
Caso Barreto Leiva Vs. Venezuela. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 17 de noviembre de
2009. Serie C No. 206; párr. 120; Corte IDH. Caso Bayarri Vs. Argentina. Excepción Preliminar,
Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 30 de octubre de 2008. Serie C No. 187, párr. 70
28
Ainda:
Porém, com a nova redação do art. 316, parágrafo único do CPP, com a redação dada
pela Lei 13964/2019, passa a existir um necessário controle periódico ao menos da
prisão preventiva de modo a aproximar minimamente o direito brasileiro aos cânones
comparados e contemporâneos da matéria.
Certo, é uma evolução a ser saudada, nada obstante alguns pontos pudessem, desde
sempre, possuir melhor técnica legislativa e aderência ao marco constitucional
convencional, a saber:
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da tradição procedimental inquisitiva e que, desde uma visão retrospectiva de
funcionamento da mecânica processual penal, será assim atuada na revisão periódica;
c) Protagonismo do responsável pela acusação na sustentação da permanência da
necessidade cautelar e não o tratamento de uma mera revisão “de ofício” como
mencionado na norma reformada.
6. A prisão temporária
30
processo legislativo empregado (questionamento formal), a partir de Medida Provisória
e sem o requisito de urgência constitucionalmente necessário, seja pela sua
incompatibilidade com o texto constitucional diante de modificações que ampliaram
a possibilidade de emprego desse mecanismo.
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S e g u n d o s e t o r e s da d o u t r i n a tr CINTRA JÚNIOR, Dyrceu Aguiar Dias. Prisão
a t o u - s e da formalização de uma temporária, o arbítrio tolerado. Boletim IBCCRIM, São
prática reconhecidamente existente Paulo, n. 15, p. 01., abr. 1994.
no plano das atividades de polícia
judiciária e que já fora contemplada no Trata-se do projeto de lei (PL) 1655/1983 derivado do
anteprojeto de Código de Processo denominado “Projeto Frederico Marques” este, por
Penal de 1983, como demonstrado por sua vez, oriundo do Decreto nº 61.239, de 25 de
PITOMBO: agosto de 1967 e retirado do Congresso pelo próprio
Poder Executivo em 17 de novembro de 1989 pela
Mensagem nº 797/89.
12
PITOMBO, Sérgio Moraes. 1986 :pgs. 296-300. Para complementação da crítica a esse
projeto ver Malan, Diogo. Prisão Temporária. In http://www.malanleaoadvs.com.
br/artigos/prisao_temporaria.pdf. Acessado em 15.01.2014
32
É de ser destacado, contudo, que no curso do estado de exceção vivido entre 1964 a 1988 (tomada
esta data como marco da reforma constitucional), no âmbito de uma legislação adjetivada como
“emergencial” existia, ao amparo da Lei de Segurança Nacional - Lei nº 6.620/78, uma forma de
prisão aproximada à prisão temporária, cabível apenas nos casos de apuração de crimes contra a
segurança nacional de acordo o art. 53 da mencionada Lei. A mesma disciplina, com modificação
do tempo de duração da prisão foi mantida pela Lei de nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 (atual
lei de segurança nacional), então com previsão no seu artigo 33.
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Nas primeiras interpretações doutrinárias houve alguma hesitação quanto à definição jurídica dessa
modalidade de prisão, em um momento em que a literatura nacional estava por demais apegada
aos cânones anteriores à reconstitucionalização de 1988 e distante do próprio texto da Convenção
Americana de Direitos do Homem que viria e entrar no cenário jurídico brasileiro em 1992.
Ou “subcautelaridade” como
Assim, à época chegou-se a afirmar que a prisão descrito por LOUREIRO, M. F.
Reflexões sobre a prisão
temporária não possuia natureza cautelar ou MÉDICI, Sérgio
temporária de Oliveira.
nos crimes contra a
mesmo que seria uma antecipação da prisão Observações sobre aIn: prisão
ordem econômica. Luiz A n
tôn io CâBoletim
temporária. m a r a . IBCCRIM,
(Or g. ).
preventiva, Crimes Empresariais - Não
São Paulo, n. 20, p. Cautelas
Autoincriminação, 07., set.
1994.Pessoais e Sigilo Processual.
MÉDICI, Sérgio de Oliveira. 1ed.Curitiba: Juruá, 2012, v.
Observações sobre a prisão 1, p. 251-272.
temporária. Boletim IBCCRIM
São Paulo, n. 20, p. 07.,
set.1994
34
alguns estudos postulavam comunhão de identidade e fundamentos com a preventiva
Neste ponto reside uma das mais acesas polêmicas quanto à lei em tela vez que são três os
fundamentos para a decretação dessa modalidade de custódia cautelar, a saber:
I. ser imprescindível para as investigações;
II. o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao
esclarecimento de sua identidade;
III. existir “ fundadas suspeitas” que a conduta apurada se subsuma a uma das
expressamente previstas no rol existente na norma e desde sua entrada em vigor passou-se a discutir
a necessidade da presença dos três fndamentos em conjunto, apenas um deles isoladamente ou, no
mínimo, com a presença de duas das hipóteses legais.
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da nobre autora, o “espírito da lei”. GRINOVER, Ada Pellegrini. Limites
constitucionais à prisão temporária. Revista
Jurídica Brasileira, n. 207, 1995.
Invocado o “espírito da lei”, é necessário conhecê-lo um pouco mais a fundo para concluir porque
apenas a necessidade de duas e não das três causas fundamentadoras da custódia em apreço.
36
A necessidade sempre da presença do do periculum. Não havendo ligação lógica ou
inciso III é do sistema da lei. Desejasse teleológica dessas causas, não há motivo para exigir
o legislador seu cabimento para suas presenças contemporâneas ao lado do sempre
qualquer crime, não haveria a presente inciso III.
necessidade da exposição taxativa de um
rol de tipos penais.
Sendo medida cautelar, há necessidade
da presença do periculum, cujos
fundamentos são dados pelos incisos I e
II. Resta indagar se apenas um deles já
constitui o perigo reclamado pela
medida cautelar ou se apenas presentes
os dois conjuntamente (o que
equivaleria dizer a necessidade dos três
requisitos) haveria a legalidade da
constrição da liberdade. Contudo, de
plano, deve ser evitada a posição
utilitária quanto à diminuição das
hipóteses fáticas caso fosse exigida a
presença de todos os requisitos.
Por outro lado, os fundamentos cautelares
dos incisos I e II são absolutamente
distintos. O primeiro, de
constitucionalidade duvidosa porque
resvala na seara da inquisitividade, ao
transformar o suspeito em objeto da
investigação, nada influi ou deflui da
condição do segundo inciso, que trata
apenas das matérias residência e
identidade. Assim, a cumulatividade não
se faz necessária porque o legislador
vislumbrou a ambas como fundamentos
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6.4 Esgotamento da prisão
temporária e atuação policial na
liberação da pessoa presa
38
Atrelada a uma visão utilitária da prisão temporária para a investigação no inquérito policial, não
são raras as manifestações jurisprudenciais que dão pela possibilidade da Autoridade Policial, por
sua própria iniciativa, soltar a pessoa presa quando entender que a prisão não é mais necessária sem
que isso configure qualquer irregularidade com repercussões administrativas ou penais. Fica
exponenciado, por essa linha de entendimento, o grau de autonomia policial na condução da
investigação e na elaboração do mérito que dela se faz.
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