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1. Aspectos gerais:
1.1. Conceito de direito Penal:
O conceito de direito penal pode ser visto sob dois aspectos distintos, o aspecto
formal ou material:
a. Aspecto Formal: é o conjunto de normas que qualifica comportamentos domo
infrações penais;
b. Aspecto Material: é um instrumento de controle social que visa assegurar a
disciplina na sociedade.
A manutenção da paz social demanda a existência de normas que estabelecem
diretrizes. Uma vez violadas essas diretrizes, cabe ao estado a imposição de sanções
para que se restaure a ordem.
Tais sanções, que podem ter vários aspectos, como civis, administrativas, tributárias,
mas, é certo que quando a conduta atenta contra bens jurídicos especialmente
tutelados, a reação do Estado deve ser mais enérgica, valendo-se assim do Direito
Penal.
O que diferencia a norma penal das demais é a espécie de conseqüência
jurídica, pois o Direito Penal trabalha com penas privativas de liberdade, ou seja, a
conseqüência jurídica mais grave. Por tanto, o Direito Penal é considerado a ultima
ratio do sistema, a derradeira trincheira no combate dos comportamentos indesejáveis,
por isso é norteado entre outros, pelo princípio da Intervenção Mínima.
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“Art. 5º, XLII a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena
de reclusão, nos termos da lei”
a.2) Doutrinária/Científica: Feita pelos estudiosos do direito, ex. a exposição
do motivos do CP contem vários exemplos.
a.3) Jurisprudencial: Fruto das decisões judiciais pelos tribunais. Ex.
Súmulas vinculantes, que alem de trazer uma interpretação da norma
vinculam o judiciário e a administração pública direta e indireta.
b. Quanto ao modo de interpretação:
b.1) Gramatical: Busca os sentidos das palavras no texto legal;
b.2) Teleológica: Busca a vontade da lei ou do legislador quando da
elaboração do texto legal;
b.3) Histórica: Busca a origem do texto ou do instituto que está contido no
texto legal para se chegar a um sentido mais justo na interpretação da norma;
b.4) Sistemática: Para se chegar ao sentido mais justo, busca-se uma
interpretação do sistema jurídico como um todo, uma vez que ele, embora
dividido em ramos, ainda continua uno.
b.5) Progressiva:
c. Quanto ao resultado da interpretação: é a modalidade mais
importante!
c.1) Declarativa: A letra da lei corresponde exatamente ao que o legislador
quis dizer, nada é adicionado ou retirado.
c.2) Extensiva: Amplia-se o alcance das palavras para corresponder a vontade
do texto legal, aqui, o legislador disse menos do que deveria.
c.3) Restritiva: Reduz-se o alcance do texto legal, o legislador disse menos do
que deveria.
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Conceito de bem jurídico: é um ente material ou imaterial haurido do contexto social de
titularidade individual ou metaindividual, reputado como essencial à coexistência do homem e
seu desenvolvimento em sociedade.
Tem-se admitido a aplicação do princípio nos delitos contra o patrimônio se
praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa, ex. no furto desde que não
qualificado.
Há uma tendência de não se admitir a aplicação quando o bem jurídico for
difuso ou coletivo mas há divergência, sendo que ora os tribunais adotam, ora
ignoram a tese.
Obs.: Bagatela Própria X Bagatela Imprópria:
Própria: Os fatos já nascem irrelevantes para o direito penal onde há a
atipicidade material, não há desvalor na conduta. Ex. furto de um clipe de
papel;
Imprópria: O fato, apesar de ser relevante não desperta o interesse punitivo
do Estado, pois a pena é desnecessária ao caso, o que ocorre é a falta do jus
puniendi. Ex. aplicação do perdão judiciário num homicídio culposo do filho do
autor num acidente de transito.
Obs.: Insignificância X Adequação Social: Embora ambos limitem o direito
penal a insignificância analisa o fato sob a ótica do bem jurídico tutelado, já
a adequação social analisa o fato sob a ótica da aceitação do fato pela sociedade
(leniência).
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Assis Toledo entende que o CP adotou essa corrente, uma vez observado o Art. 59 do CP.
3. Princípios Relacionados com o agente do fato:
3.1. Princípio da Responsabilidade pessoal:
Proíbe-se o castigo pelo fato de outrem, ou seja, não se pune o terceiro pelo fato
praticado por outrem, assim veda-se a responsabilidade coletiva.
O principio tem dois desdobramentos importantes:
a. Obrigatoriedade da individualização da acusação: o MP não pode oferecer
denúncia genérica, vaga ou evasiva, assim, o promotor deve individualizar
os comportamentos de cada agente.4
b. Obrigatoriedade da individualização da pena: O juiz na fixação da punição
deve individualizá-la de acordo com a gravidade do fato e as condições
pessoais do agente.
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Existe uma certa flexibilização desse desdobramento nos caos de crimes societários,
onde,uma vez que é muito difícil saber a exata ação de cada um, vez que tomadas à “portas
fechadas” na empresa, admite-se que a denuncia se restrinja ao fato ocorrido como um todo, e
que durante a instrução criminal sejam provadas as condutas de cada réu.
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São exatamente os elementos da culpabilidade.
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O STF confirmou o entendimento na ADC 19, onde afastou a tese de que o tratamento a mulher
pela Lei 11.340/06 não seria isonômico.
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Convenção Interamericana de Direitos Humanos
O STF prefere a expressão não culpa, uma vez que a CF não presume inocente
em seu Art. 5º, LVII, mas diz “não será culpado”. A expressão “presunção de inocência”
encontra-se no Art. 8º da CIDH8.
Assim, é necessário se apontar três inafastáveis conclusões:
a. Não se admite, como regra, a restrição de liberdade antes da decisão
definitiva de culpa;
Obs.: O Art. 320 do CPP deve ser lido balizando-se a expressão “conveniência
da instrução criminal” por “imprescindibilidade à instrução criminal” pois as
prisões preventivas são sempre imprescindíveis, são a exceção, nunca a regra.
b. A acusação é quem deve demonstrar a responsabilidade do agente, e
não este provar sua inocência;
c. A condenação deve derivar da certeza do julgador.
4. Princípio da Legalidade:
Constitui uma limitação ao poder de o Estado influir nas liberdades pessoais do
cidadão. Encontra-se previsto na Constituição Federal no Art. 5º, II e XXXIV, no Art.
1º do CP, no Estatuto de Roma, na Convenção Interamericana de Direitos Humanos e
até mesmo na Bíblia Sagrada.
Assim afirma-se que a elaboração de normas penais é função exclusiva da lei
(reserva legal), que deve definir anteriormente e precisamente a conduta
proibida.
A doutrina aponta três fundamentos básicos para o princípio da legalidade:
i. Político: Impede o poder punitivo Estatal com base no livre arbítrio;
ii. Democrático: Respeita a divisão dos poderes estabelecida na Bíblia
Política, sendo função precípua do legislador a elaboração de leis.
iii. Jurídico: Uma lei prévia e clara tem importante efeito intimidativo,
garantindo a vigência da norma.
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“(...)Toda pessoa tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove
legalmente as culpa(...)”
4.1.3. Vedação à analogia e aos costumes incriminadores (lege
stricta):
A lei penal deve ser escrita e estrita, ou seja, não pode se usar nem a analogia,
nem o costume para incriminar o acusado, mas é possível a utilização desses dois
institutos em seu favor.
Obs.: A doutrina admite a possibilidade do costume interepretativo, aquele
que ajuda a aclarar a letra da lei, o “secundum legem”. Ex. Art. 155, § 1º CP a expressão
“repouso noturno” depende inevitavelmente dos costumes do lugar.
Obs.: O costume abolicionista: A doutrina diverge a cerca da sua possibilidade,
são três correntes: i) Admite o costume revogador, quando a infração não contraria
mais o interesse social; ii) Não admite a utilização de costume para abolir crime, mas
se o fato já não contraria mais o interesse social, a lei não deveria ser aplicada pelo
magistrado; iii) Não existe costume abolicionista, pois, somente a lei pode revogar
outra lei, essa corrente prevalece nos tribunais e na doutrina.
4.1.5. Necessidade:
A lei penal deve ser o mecanismo necessário para coibir a ofensa ao bem jurídico
tutelado.
Aqui tem-se um claro desdobramento do princípio da intervenção mínima.
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Exemplo: o artigo 312 do Código Penal trata do crime de peculato, conduta praticada por
funcionário público. O conceito de funcionário público, para fins penais, está positivado em
outro artigo, mais precisamente o 327, também do Código Penal.
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Exemplo: o artigo 236 do Código Penal95 depende de complemento encontrado no Código
Civil, instância legislativa diversa. Note-se que o conceito de "impedimento" é encontrado em
diploma legal distinto (Código Civil).
Aplicação da Lei Penal:
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Art. 4º: "considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja
o momento do resultado”
Obs.: Abolitio criminis X Continuidade normativo típica: São figuras diferentes, a
primeira, o legislador não quer mais considerar a conduta como sendo ofensiva ao
comportamento social, e por isso, típica, já na segunda, a conduta continua sendo
tipificada pelo ordenamento jurídico, mas altera-se seu tipo penal, ocorre uma
migração de um tipo para outro. Ex. A figura típica do atentado violento ao pudor que
saiu do tipo do Art. 214 do CP e foi para o Art. 213, cuja conduta agora configura
estupro.
"A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. "
Depreende-se que caso a lei de qualquer modo favoreça o agente, ela deverá ser
aplicada, não havendo respeito se quer à coisa julgada.
Assim, antes da prolação da sentença, cabe ao juiz competente para o processo a
aplicação da lei nova mais benéfica, bem como que após a sentença condenatória
(recorrível), cabe à instância recursal esta função.
Questiona-se em relação ao juiz natural para a aplicação da Lex mitior, nos casos
em que haja coisa julgada, sobre o tema a Súmula nº 611 do STF estabelece que:
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"É cabível a aplicação retroativa d a Lei n. 11.343/2006, desde q u e o resultado da incidência das suas
disposições, na integra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei nº 6.368/76,
sendo vedado a combinação de leis".
“parte” de outra para favorecer o agente. Essa posição é extremamente garantista e
atualmente minoritária.
sua vigência"
A lei Temporária é aquela que traz em seu texto o tempo de sua vigência,
também chamada de lei temporária em sentido estrito.
A lei Excepcional, é a que atende necessidades estatais transitórias, ou seja,
perdura até que a excepcionalidade se encerre. Também é chamada de lei temporária
em sentido amplo.
É possível afirmar que ambas as leis são ultrativas, pois de acordo com o CP
aplicam-se a fatos ocorridos em sua vigência, ainda que decorrido o prazo, ou
cessada a situação excepcional.
As leis temporária e excepcional têm duas características essenciais:
a. Autorrevogabilidade:
As leis temporária e excepcional são autorrevogáveis, daí porque chamadas
também de leis intermitentes . Esta característica significa dizer que as leis temporária
e excepcional se consideram revogadas assim que encerrado o prazo fixado (lei
temporária) ou cessada a situação de anormalidade (lei excepcional) .
b. Ultra-atividade:
Por serem ultra-ativas, alcançam os fatos praticados durante a sua vigência129,
ainda que as circunstâncias de prazo (lei temporária) e de emergência (lei excepcional)
tenham se esvaído, uma vez que essas condições são elementos temporais do próprio
fato típico. Observe-se que, por serem (em regra) de curta duração, se não tivessem a
característica da ultra-atividade, perderiam sua força intimidativa. Em outras palavras,
podemos afirmar que as leis temporárias e excepcionais não se sujeitam aos
efeitos da abolitio criminis (salvo se houver lei expressa com esse fim).
A doutrina discute acerca se o Art. 3º do CP foi recepcionado pela Ordem
Constitucional de 88, sendo duas as posições: i) Para Rogério Greco e Zaffaroni, a
norma não foi recepcionada, pois a CF não faz qualquer menção à retroatividade
maléfica; ii) Para LFG não se trata de retroatividade da norma penal, ou seja não há
conflito de leis penais no tempo, pois ambas tratam de fatos distintos, assim, não se
pode analisar ou não a recepção da norma.
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Cf. STF – Primeira Turma – HC 73.168, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 15/03/1995 e STF –
Segunda Turma HC 68.904, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 03/-4/1992.
regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. (...)
A territorialidade adotada foi a temperada (ou limitada), e não a absoluta, pois o
Brasil admite aplicar a lei de outros países à crimes cometidos em seu
território, o que se verifica por conta da expressão: “sem prejuízo de convenções,
tratados e regras de direito internacional”. Assim, conforme determina o art. 5º do CP:
i) ocorrido o crime no Brasil e aplicada a leibrasileira:princípio da
territorialidade;
ii) ocorrido o crime fora do Brasil e aplicada a brasileira: princípio da
extraterritorialidade (art. 7º, CP):
a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves
Art. 5º (...) § 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de
2.2. Territorialidade:
2.2.1. Teoria adotada pelo Brasil: Quando o crime se considera
praticado no território brasileiro?
São três as teorias sobre o tema:
i. Pela teoria da atividade, considera-se lugar do crime aquele onde o agente
desenvolveu a conduta.
ii. De acordo com a teoria do resultado, considera-se o lugar do crime
aquele onde ocorreu o evento (resultado).
iii. Pela teoria mista (ou da ubiquidade), considera-se lugar do crime
aquele onde ocorreu a conduta ou o resultado.
O Brasil adotou a teoria mista ou da ubiquidade (art. 6º, CP):
produzir-se o resultado.
Obs.:Se no território brasileiro ocorre unicamente o planejamento ou
preparação do crime, o fato não interessa ao direito brasileiro.Salvo quando
a preparação, por si só, caracterizar crime autônomo, ex. associação criminosa.
Dessa forma, observando o inter criminis (Cogitação Preparação
ExecuçãoResultado/Consumação), apenas interessa à lei brasileira os atos de
execução e o resultado/consumação, salvo se a lei brasileira punir
autonomamente os atos de preparação, a cogitação nunca será objeto de
interesse do direito penal (direito à perversão).
§ 1º A passagem será considerada inocente desde que não seja prejudicial à paz, à
sejam impostos por motivos de força ou por dificuldade grave, ou tenham por fim
consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o
competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o
§ 2º Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será
incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas
I - os crimes:
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que
II - os crimes:
Art. 7º (...) § 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a
extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar
Art. 77. Não se concederá a extradição quando: (Renumerado pela Lei nº 6.964, de
09/12/81) (...)
IV - a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a 1 (um) ano;
iv) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena:
Perceba a diferença para os crimes de extraterritorialidade incondicionada, nos
quais pouco importa a condenação ou a absolvição no estrangeiro.
v) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou extinta a punibilidade, de
acordo com a lei mais favorável.
Caso prático: um brasileiro, nos EUA, mata um italiano. Logo depois do crime,
foge para o Brasil. Aplica-se a lei brasileira, desde que presentes todas as condições
acima estudadas.A competência para a aplicação da lei brasileiraserá, em regra, da
justiça estadual. Será da Justiça federal se presente alguma das condições do art. 109 da
CR. O território competente (comarca) será o da capital onde houver por último
residido o acusado. Seele nunca tiver residido no Brasil, será competente o juízo da
capital da República (art. 88 do CPP):
Art. 88. No processo por crimes praticados fora do território brasileiro, será
competente o juízo da Capital do Estado onde houver por último residido o acusado.
República.
Como visto, na extraterritorialidade incondicionada aplica-se a lei brasileira,
pouco importando se o agente tenha sido absolvido ou condenado no exterior. Isso
significa que pode haver um processo no estrangeiro e um processo no Brasil, bem
como que o agente pode ser condenado no estrangeiro e no Brasil. Assim, ele pode ter
de cumprir pena no estrangeiro e no Brasil.
Isso não configura um bis in idem? Como estudado, a vedação do bis in idem tem
significado processual, penal e execucional, buscando evitar duplicidade em todas essas
hipóteses. A doutrina enxerga, no caso, uma exceção à vedação do bis in idem,
justificada por razões de soberania nacional.
Francisco de Assis Toledo ensina que o art. 8º evita um bis in idem. Na verdade, o
dispositivo não evita a existência do bis in idem(dois processos e de duas
condenações), mas apenas atenua a duplicidade de penas:
3.1. Introdução
A lei penal se aplica a todos, por igual, não existindo privilégios
pessoais (art. 5º da CR).
Há, no entanto, pessoas que, em virtude das suas funções, desfrutam de
imunidades.
Longe de uma garantia pessoal, trata-se de uma prerrogativa funcional, de
uma proteção ao cargo. Não se trata de um privilégio, mas de uma prerrogativa.
Privilégio Prerrogativa
Exceção à lei comum deduzida da situação Conjunto de precauções que rodeiam a
de superioridade das pessoas que a desfrutam. função e servem para o exercício desta.
Parte da noção de que umas pessoas seriam
superiores às outras.
É subjetivo e anterior à lei. É objetiva e deriva da lei.
Tem essência pessoal. É anexa à qualidade do órgão.
É poder frente à lei. É conduto para que a lei se cumpra.
Próprio das aristocracias sociais. Própria das aristocracias das instituições
governamentais.
Não se trata, portanto, de foro “privilegiado”, como se diz, mas de foro por
“prerrogativa” de função.
3.3.1.3. Limites:
14
A punibilidade do partícipe depende de que o fato praticado pelo autor seja típico E ilícito,
pela teoria da acessoriedade limitada.
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Súmula 245 - a imunidade parlamentar não se estende ao corréu sem essa prerrogativa.
Segundo o voto emblemático do Min. Marco Aurélio, no Inquérito nº 13 16, o
instituto da imunidade parlamentar absoluta não permite ações estranhas ao
mandato, como ofensas pessoais, sem que haja consequências.
A não se entender assim, estarão eles acima do bem e do mal, blindados, como se
o mandato fosse um escudo polivalente.
Obs.: Tem se entendido que em hipótese de utilização de meios eletrônicos
(facebook, Twitter, e-mail, etc) para divulgar mensagens ofensivas à honra de alguém
deve haver vinculação com o exercício da atividade parlamentar, ainda que a
mensagem tenha sido gerada dentro do gabinete. Entendimento diverso daria margem
ao exercício abusivo dessa prerrogativa, que é da instituição e não do parlamentar.
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“2. Os atos praticados em local distinto escapam à proteção absoluta da imunidade, que
abarca apenas manifestações que guardem pertinência, por um nexo de causalidade, com o
desempenho das funções do mandato parlamentar” (STF – Tribunal Pleno – Inq. 2.813 – Rel.
Min. Marco Aurélio – DJe 24/05/2011)
Todavia, em se tratando de uma prerrogativa, finalizado o mandato, o juízo natural de
1º grau retoma sua competência.
A Súmula 394 do STF17foi cancelada, justamente porque previa um privilégio
pessoal. Não são admitidos privilégios no Brasil. Somente prerrogativas são
fomentadas.
De acordo com o STF encerrada a instrução ou autos pautados para o
julgamento, a renuncia do parlamentar não retira da corte o poder de julgá-lo 18.
Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva
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Súmula 394 - cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial
por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a
cessação daquele exercício (cancelada).
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Obs.: AP 396, percebendo que estava na iminência do julgamento pelo STF e que se avizinhava
a prescrição, o parlamentar renunciou ao mandato, com o objetivo de obter a prescrição (por
conta do longo caminho que haveria do envio dos autos do STF ao juízo de 1º grau). No entanto,
restou decidido pelo STF que a renúncia na véspera do julgamento pelo Pleno configura fraude
processual inaceitável, pois objetiva, em primeiro lugar, fugir à punição, buscando a prescrição.
Diante desse quadro, o STF permaneceu competente para o processo e julgamento da demanda.
Observou o Min. Marco Aurélio, discordando da maioria, que a renúncia do parlamentar é um
direito potestativo e, como tal, deve ser analisado dentro do direito de ampla defesa do réu.
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Incluir um texto desse inquérito.
Além disso, cabe prisão em flagrante quando o crime é inafiançável.
Nesse caso excepcional em que cabe prisão provisória (flagrante) do parlamentar,
os autos serão encaminhados à Casa respectiva (para a Câmara, se for Deputado, e para
o Senado, se for Senador) para que resolva sobre a manutenção ou não da prisão. Vale
observar que o juízo realizado pela Casa é político, pois se averigua a conveniência e
oportunidade da manutenção da prisão.
Portanto, dentro de 24 horas, os autos serão encaminhados ao STF e à Casa
respectiva. O STF fará uma análise jurídica da prisão, ao passo que a Casa fará uma
análise política da manutenção da prisão em flagrante. Note que são duas análises
distintas. O STF vai analisar a formalidade do flagrante. A casa respectiva vai analisar a
conveniência e oportunidade da manutenção da prisão.
Obs.: Caso do Senador Delcídio em 2015: O STF, no entanto, de forma
excepcional, no final de 2015, decretou prisão preventiva de Senador (Delcídio do
Amaral), a exemplo do que, num passado recente, fez em relação a um deputado
estadual, igualmente imune. Em resumo, o Senador, buscando embaraçar investigação
em curso na Operação Lava Jato, evitando futura delação, propõe a um filho de preso
um verdadeiro plano de fuga para seu pai, bem como anuncia exercer indevida
influência em Ministros da Corte Suprema, o que garantiria a tão almejada
liberdade do condenado. Oferece, ainda, uma ajuda de custo (R$ 50.000,00) para o
condenado manter-se no país de destino. O afastamento da aplicação de regras válidas
ante as circunstâncias específicas do caso concreto é conhecido como
derrotabilidade (ou superabilidade). Em tais hipóteses, o intérprete confere ao
princípio da justiça e aos princípios que justificam o afastamento da regra um peso
maior do que ao princípio da segurança jurídica e àqueles subjacentes à regra 20. A
ponderação, portanto, não é feita entre a regra e o princípio, mas entre princípios que
fornecem razões favoráveis e contrárias à aplicação da regra naquele caso específico.
Não há nisso, qualquer desobediência ao direito, pois a decisão é pautada
por normas estabelecidas pelo próprio ordenamento jurídico.
Cabe prisão civil do parlamentar federal? O STF entende que o parlamentar não
pode sequer sofrer prisão civil por dívidas.
20
É um absurdo manter o senador solto neste caso, quando o sentimento de justiça dita
exatamente o contrário, assim, ponderando entre a regra da imunidade à prisão e o princípio da
justiça, o STF entendeu prevalecer o princípio em relação à regra, daí a legitimidade da prisão.
21
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: (...) § 3o Se a injúria
consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição
de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena - reclusão de um a três anos e multa.
em razão de sua raça, isso caracterizaria uma segregação e, portanto, crime de racismo,
passível de flagrante, por ser crime inafiançável.
respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da
ação.
Diretora.
Diz o art. 53, §3º que, recebida a inicial contra o parlamentar, o STF dará
ciência do recebimento à Casa respectiva (apenas e tão somente isso).
Obs.: Antes da EC 35/2001, o STF sequer poderia processar o
parlamentar, pois precisava de autorização da Casa respectiva. Hoje, o STF apenas
dará ciência, não sendo necessária a autorização para processar o parlamentar.
pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações. (Redação dada pela
e juízes dos Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem
estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos
3.3.3.3.
Os deputados estaduais têm as mesmas imunidades dos deputados
federais:
Nos termos do art. 27, §1º, da CR, os deputados estaduais têm as mesmas
imunidades dos deputados federais:
Art. 27. (...) § 1º - Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais,
22
A 1ª Turma concedeu habeas corpus para cassar decreto de prisão expedido por juiz de direito
contra deputado estadual. Entendeu-se que, ante a prerrogativa de foro, a vara criminal
seria incompetente para determinar a constrição do paciente, ainda que afastado
do exercício parlamentar”. (STF – Info nº 628 – HC 9548 – Rel. Min. Marco Aurélio – DJe
24/05/2011)
STF, mas o TJ (nos crimes da competência da justiça estadual), o TRF (nos crimes
da competência da justiça federal) e o TRE (nos crimes da competência da
justiça eleitoral).
A imunidade do deputado estadual não se limita ao território de seu Estado,
desde que ele esteja no exercício de sua função. Basta imaginar a situação de uma
Comissão Parlamentar de Inquérito que tenha de viajar para outros estados para
realizar investigação. Cabe notar que a Súmula nº 3 do STF23, que trazia
entendimento diverso, foi superada. Ela limitava a imunidade às fronteiras do
Estado, mas isso não mais se aplica hoje.
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Súmula 3- A imunidade concedida a deputados estaduais é restrita à justiça do estado.
(SUPERADA)
24
“A imunidade material concedida aos vereadores por suas opiniões, palavras e votos
não é absoluta. A barca as manifestações que tenham pertinência com o cargo e o interesse
municipal, ainda que ocorram fora do recinto da Câmara, desde que dentro da
circunscrição municipal” (STF – Primeira Turma, AI 698921 Agr – Rel. Min. Ricardo
Lewandowski - DJe 14/08/2009)
Obs.: cuidado: Segundo o STF a Constituição Estadual pode prever foro
especial (TJ, TRF e TRE). Há dois exemplos de estados que inseriram em suas
constituições essa previsão: Rio de Janeiro e Piauí.
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Súmula 721- A competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o foro por
prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela constituição estadual. Súmula
Vinculante nº 45 “A competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o foro
por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela constituição estadual”.
Evidentemente que não se trata de conflito efetivo de normas, sob pena de o
direito penal deixar de constituir um sistema ordenado e harmônico, onde suas normas
apresentam entre si uma relação de dependência e hierarquia, permitindo a aplicação
de uma só lei ao caso concreto, excluindo ou absorvendo as demais.
Assim, dá-se o Conflito Aparente de Normas quando um fato único subsume-se
em dois ou mais tipos legais, aplicando-se porém apenas um deles.
Na análise do problema verifica-se qual das normas deve se aplicar ao autor do
crime. Os princípios reitores da matéria impedem o bis in idem, isto é, a aplicação
conjunta de duas ou mais normas a um único fato.
Segundo a doutrina, a configuração do Conflito Aparente de Normas depende
necessariamente de três requisitos:
i. Unidade de Fato, que pode ser simples ou complexa;
ii. Pluralidade de Normas nas quais se enquadram esse fato delituoso;
iii. Vigência contemporânea das normas no momento em que o fato é
praticado.
Faltando um desses requisitos, não conflito aparente de normas.
Muito embora não haja consenso sobre o assunto (salvo no tocante ao princípio
da especialidade), admitem-se comumente os princípios mencionados.
26
Hungria, em seu anteprojeto de reforma do Código Penal, pretendia tratar da matéria
na Parte Geral do Código, dispondo da seguinte maneira: “Quando a um mesmo fato podem ser
aplicadas duas ou mais normas penais, atende-se ao seguinte, a fim de que uma só pena seja
imposta: (a) a norma especial exclui a norma geral; (b) a norma relativa a crime que passa a ser
elemento constitutivo ou qualificativo de outro é excluída pela norma atinente a este; (c) a
norma incriminadora de um fato que é meio necessário ou normal fase de preparação ou
execução de outro crime é excluída pela norma a este relativa. Parágrafo único. A norma penal
que prevê vários fatos, alternativamente, como modalidades de um mesmo crime, só é aplicável
uma vez, ainda quando os ditos fatos são praticados, pelo mesmo agente, sucessivamente”.
conteúdo.Nestes casos, a comparação entre as normas virtualmente aplicáveis se faz no
plano abstrato, é dizer, confrontando-se o teor dos dispositivos para, então, determinar,
ora o especial (que prevalecerá sobre o geral), ora o principal (que predominará em
relação ao subsidiário).
Percebe-se, então, que toda ação que realiza o tipo do infanticídio realiza o do
homicídio, mas nem toda ação que se subsume ao homicídio tem enquadramento no
tipo do infanticídio.
Haverá, portanto, uma norma mais ampla, porque descreverá um grau maior de
violação ao bem; será a norma primária ou principal. Existirá, ainda, outra menos
ampla, pois descreverá um grau inferior de violação a esse mesmo bem; será a norma
subsidiária ou famulativa.
Assim, por exemplo, o crime de roubo será agravado quando o agente utilizar,
como meio executório, arma de fogo (CP, art. 157, § 2º, I). Caso se apure que o ofendido
não portava absolutamente nenhum bem consigo, será aplicada a figura do art. 17 do
CP (crime impossível), afastando-se o delito patrimonial. O juiz, todavia, não deverá
simplesmente absolver o réu, mas, sim, condená-lo por porte ilegal de arma de fogo
(Lei n. 10.823/2006, art. 14), o qual atuará como “soldado de reserva”.
27
Exemplo: art. 132 do CP, que define como crime o ato de expor a vida ou a saúde de
outrem a perigo direto e iminente, punindo-o com detenção, de três meses a um ano, se o fato
não constitui crime mais grave. Se o agente, v.g., efetua disparos de arma de fogo em direção à
vítima, para matá-la, embora ela não seja atingida, responde por tentativa de homicídio (norma
primária), deixando de aplicar-se o delito mencionado anteriormente (norma subsidiária).
circunstância legal de outro crime28. Assim, o crime de dano é subsidiário
do furto com destruição ou rompimento de obstáculo; a violação de
domicílio do crime de furto ou roubo, com entrada em casa alheia; o
constrangimento ilegal dos crimes em que há emprego de violência ou
grave ameaça.
É o que ocorre entre os atos preparatórios puníveis, seguidos dos atos executórios
e, por fim, da consumação (todos inseridos no mesmo iter criminis). Por exemplo: o
indivíduo que porta consigo uma faca (porte de arma branca — ato preparatório
punível), brande o instrumento (ato executório) e golpeia a vítima, ferindo-a
(consumação), responde somente pelo crime-fim, ou seja, pela lesão corporal.
Segundo André Estefam e Vitor Eduardo Rios Gonçalves, ocorre o ante factum
impunível quando o agente realiza uma conduta criminosa visando praticar outra, em
que a primeira esgotará toda a sua potencialidade lesiva. A ação ou omissão anterior
não possui razão de ser, senão para viabilizar a prática da seguinte, em que produzirá
todo seu malefício.
Teoria do crime
1. Aspectos introdutórios
A teoria do crime preocupa-se com o estudo de elementos que possibilitam a
compreensão do necessários para a configuração do crime (Teoria geral do
delito), bem como com os pressupostos necessários à imposição da pena
(Teoria Geral da Pena).
Segundo Zaffaroni, a teoria do delito é uma construção dogmática, que nos
proporciona o caminho lógico para averiguar se há delito em cada caso concreto.
A par disso, pode-se afirmar ser o crime, o delito, a infração penal a pedra de
toque da teoria abaixo estudada.
Para tanto necessário discernir dos vocábulos usados para identificar o objeto de
estudo.
Pois bem, de inicio observa-se que o conceito de infração penal pode variar
conforme o enfoque.
Sob o enfoque formal, infração penal é aquilo que assim está rotulado em
uma norma penal incriminadora, sob ameaça de pena.
Num conceito material, infração penal é comportamento humano causador de
relevante e intolerável lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado, passível de
sanção penal.
O conceito analítico leva em consideração os elementos estruturais que compõem
infração penal, prevalecendo fato típico, ilícito e culpável.
No Brasil, infração penal é gênero, podendo ser dividida em crime (ou delito)
e contravenção penal (ou crime anão, delito liliputiano ou crime vagabundo), adotou-
se o sistema dualista ou binário.
Entretanto essas espécies, no entanto, não guardam entre si distinções de
natureza ontológica (do ser), mas apenas axiológica (de valor), ou seja qualquer crime
ou contravenção em sua essência são a mesma coisa, entretanto, pelo direito brasileiro,
por uma questão de política criminal, são valorados de forma distinta.
Assim, observa-se que os crimes serão punidos com penas mais severas (reclusão
ou detenção), enquanto as contravenções penais com penas menos severas
(destacando-se a prisão simples, art. 6° da LCP, que não segue os rigores penitenciários
daquelas).
Art. 109: “Aos juízes federais compete processar e julgar: IV - os crimes políticos e as
2. Conceito de crime
2.1. Conceito formal
Sob o enfoque formal, crime é aquilo que está estabelecido em uma norma penal
incriminadora, sob ameaça de sanção penal.
3. Sujeitos do crime
3.1. Sujeito ativo
3.1.1. quem pode figurar como sujeito ativo de uma ação penal?
Sujeito ativo é o autor da infração penal.
Pode figurar como sujeito ativo de uma infração penal a pessoa física, com idade
igual ou superior a dezoito anos e capaz.
Há três correntes acerca da possibilidade de a pessoa jurídica figurar como sujeito
ativo de crime:
1ª corrente: a pessoa jurídica não pratica crimes nem pode ser responsabilizada
criminalmente. A responsabilidade penal da pessoa jurídica ofende:i) o princípio da
responsabilidade subjetiva (trata-se de responsabilidade sem dolo e sem culpa); ii) o
princípio da culpabilidade;iii) o princípio da responsabilidade pessoal (configurando
responsabilidade coletiva); e iv) o princípio da personalidade da pena (a pena passa da
pessoa do delinquente).
2ª corrente: a pessoa jurídica pode ser autora de crimes ambientais, sendo por
eles responsabilizada penalmente (Lei 9.605/1998). Isso porque:i) trata-se de
responsabilidade objetiva (sem dolo e sem culpa) autorizada pela própria CR;ii) a
pessoa jurídica deve responder por seus atos, adaptando-se o juízo da culpabilidade às
suas características; e iii) a responsabilização penal não viola o princípio da
personalidade da pena, transmitindo-se, eventualmente, os efeitos da condenação.
3ª corrente:apesar de a pessoa jurídica ser um ente autônomo e distinto de seus
membros, dotado de vontade própria, não pratica crimes, mas pode ser
responsabilizada penalmente (art. 3º da Lei 9.605/1998). Trata-se de responsabilidade
penal social:
penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida
Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas
4. Objeto material
Objeto material é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta criminosa.
Ele não pode ser confundido com o sujeito passivo. Ex.: se “A” furta a carteira de
“B”, o sujeito ativo é “A”, o sujeito passivo é “B” e o objeto material é a carteira. Há
crimes, como o homicídio, em que os dois institutos se confundem.
Em regra, não existe crime sem objeto material. Há, todavia, exceções
doutrinárias: ato obsceno e falso testemunho.
5. Objeto jurídico
Objeto jurídico é o bem ou interesse tutelado pela norma.
Delitos pluriofensivos são os que lesam ou expõem a perigo mais de um bem
jurídico. Ex.: o latrocínio tem como bens jurídicos a vida e o patrimônio.
Não se admite delito sem objeto jurídico. Para que haja crime, é imprescindível
um direito ou bem tutelado pela norma. Crime sem proteger nenhum interesse é um
uso ilegítimo do direito penal.
29
Bettiol é o autor que chama fato típico, antijurídico e culpável de “substratos” do crime.
7. Teorias do crime/da tipicidade/da conduta
(Sistemas Penais)
Sistema Neoclássico Finalista Funcionalista
Clássico Corresponde ao anterior, Hans Welzel Se divide em: funcionalismo
Liszt, Beling, acrescido da teoria de Reinhard sistêmico ou radical (Jakobs) e
Radbruch Frank e de Edmund Mezger teleológico ou moderado
(Roxin), dentro dos quais se
desenvolveu a (moderna)
teoria da imputação objetiva.
O crime é O crime é dividido em: O crime é dividido em: O crime é dividido em:
dividido em • Injusto: composto de Injusto: Injusto:
Critério Fato típico + composto de Fato composto de Fato
objetivo: antijuridicidade típico + típico +
Fato típico + antijuridicidade antijuridicidade +
antijurídico imputação objetiva
•Culpabilidade: possui
três elementos:
o Imputabi Culpabilidade: Responsabilidad
lidade possui 3 elementos: e: que é formada pela:
Critério
o Dolo ou o Imputabi o Culpabilidade
subjetivo:
culpa lidade o Satisfação de
Culpabilidade,
dividido em dolo o Exigibilid o Potencial necessidades
ou culpa ade de conduta consciência da preventivas
diversa ilicitude
Obs. Dolo e culpa o Exigibilid Culpabilidade
são espécies de ade de conduta expandida. A
culpabilidade. A culpabilidade passa a responsabilidade é a
diversa.
ser considerada um juízo soma da ImpoEx +
de reprovação sobre o satisfação de
ato, mas ainda contém Obs. culpabilidade=
necessidades
dolo e culpa. ImPoEx
preventivas. Se o juiz
Obs. No finalismo o dolo
entender que a aplicação
e culpa migram para o
da pena não tem o
fato típico (agora
condão de prevenir a
composto por dolo e
pratica de crimes
culpa).
A culpabilidade torna-se futuros, não aplica a
exclusivamente normativa; dolo pena.
e culpa passam a integrar o fato A ação perde relevância como
típico elemento central da teoria do
crime, dando lugar à
imputação; a culpabilidade é
expandida para uma noção
mais abrangente (a de
responsabilidade
30
A vontade segundo o causalismo é composta de um aspecto externo, o movimento
corporal do agente, e de um aspecto interno, vontade de fazer ou não fazer (conteúdo final da
ação). A ação seria, portanto, composta de vontade, movimento corporal e resultado, porém a
vontade não está relacionada à finalidade do agente, elemento analisado somente na
culpabilidade.
31
A finalidade especial do agente é o que característica a teoria finalista.
32
Art 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
33
Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou
nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de
prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante: Pena
- reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos,
e multa, se o documento é particular.
2. Não há como negar a presença de elementos normativos e subjetivos do tipo.
3. Ao fazer a análise do dolo e da culpa somente no momento da culpabilidade,
não há como distinguir, apenas pelos sentidos, a lesão corporal da tentativa
de homicídio, por exemplo.
4. É inadmissível imaginar a ação humana como um ato de vontade sem
finalidade.
34
Que acreditava que todas as ciências deveriam ser analisadas através de uma mesma forma de
observação (a forma causal).
35
Valores metafísicos, valoração dos fenômenos (método axiológico).
Mas como se determinar a reprovabilidade de um comportamento?
Para que houvesse uniformização e, consequentemente, segurança jurídica, era
necessário trazer um conceito para a reprovabilidade.
O critério escolhido foi a possibilidade de o indivíduo agir ou não de forma diversa
(exigibilidade de conduta diversa), assim era necessário analisar se a pessoa podia ou
não agir de maneira diversa, evitando o delito.
Ora, as pessoas são livres para escolher seu caminho, devendo ser recompensadas
pelas boas escolhas, e sofrer as conseqüências pelas más escolhas. Para que alguém
possa, de fato, sofrer a conseqüência negativa da má escolha, é necessário que na
situação concreta tenha havido real condição de optar.
Se o agente não podia agir de outro modo, se os fatores externos à conduta não
davam ao agente condição de escolher, não poderá haver punição (não houve má
escolha, mas sim falta de escolha).
Este pensamento resulta no fato de a culpabilidade depender do exame da
possibilidade de exigir outra conduta do agente – é a exigibilidade de conduta
diversa.
A culpabilidade passa a conter elementos (e não as espécies dolo e culpa, como no
Sistema Clássico). São eles:
i) Imputabilidade
ii) Dolo ou culpa
iii) Exigibilidade de conduta diversa
Assim, a culpabilidade deixa de ter aspectos apenas subjetivos, passando a ter juízo
de valor (= elemento normativo). Passa a ter natureza normativa.
36
Como elementos subjetivos retratam uma finalidade especial do agente, como se pode
analisar um fim especial do agente, se nem ao menos se analisa no tipo o fim especial, ou seja, o
dolo e a culpa, que ainda estão na culpabilidade.
7.3. Teoria finalista
7.3.1. Noções gerais
Foi criada pelo alemão Hans Welzel em meados do século XX.
O Finalismo pesquisa a essência do homem, e através de dados e informações da
realidade, procura construir verdades absolutas, leis imutáveis. Trata-se de um
método empírico em busca da estrutura do crime.
Percebe-se que cada conduta humana leva a um resultado (premissa
fundamental). O homem, em todas as suas ações, sempre está em busca de alguma
finalidade. Por ter conhecimento da conseqüência dos atos que deseja praticar, o
homem os dirige para a obtenção de uma meta.
Segundo Welzel, a finalidade é a espinha dorsal da conduta humana.
Nos sistemas anteriores, ou seja, no Causalismo, a ação era definida de forma
incompleta, pois não se preocupava com a intenção que move toda e qualquer
conduta humana.
Assim, surge um novo conceito de conduta: é o comportamento humano
voluntário, psiquicamente dirigido à um fim.
O conceito de conduta para o finalismo nasceu diferente: falava-se em
“psiquicamente dirigido a um fim ilícito”. Mas a teoria logo se corrigiu, tendo o “ilícito”
sido retirado do conceito, pois ele excluía o crime culposo.
O grande marco do finalismo foi a saída do dolo e da culpa da
culpabilidade, os quais migraram para a conduta (ou seja, para o fato típico). Aqui,
que nasce a famosa expressão: “o causalismo é cego; o finalismo, vidente”.
Zaffaroni é adepto da teoria finalista e afirma que o dolo está livre de toda
reprovação, porque a reprovabilidade (culpabilidade) é um passo posterior à
averiguação do injusto (conduta típica e antijurídica), pois o dolo integra o injusto
como uma característica da tipicidade dolosa. Nesse sentido, o autor sustenta um
conceito de dolo valorado (quanto à reprovação), enquanto os partidários da teoria
causalista (dolo na culpabilidade) em geral defendem um conceito de dolo desvalorado
(o dolo só pode ser dolo culpável).
A culpabilidade, para o Finalismo, é formada por três elementos:
i) Imputabilidade (capacidade mental de entender o caráter ilícito do fato
e de exercitar o autocontrole)
ii) Potencial consciência da ilicitude (possibilidade de entender o caráter
ilícito do fato)
iii) Exigibilidade de conduta diversa (destacou-se no finalismo, embora
tenha surgido no sistema neoclássico)
A culpabilidade torna-se, exclusivamente, juízo de valor (aspecto puramente
normativo – não há mais previsão de dolo e culpa, que são elementos subjetivos e
fazem parte do fato típico) – Teoria normativa pura da culpabilidade.
37
Ex. o que vem a ser a conduta.
Os penalistas, observando os sistemas anteriores, perceberam que havia uma
grande preocupação com a estrutura do crime, com a elaboração de um sistema
harmônico, com teorias logicamente compatíveis, deixando para segundo plano a
análise sobre as soluções dadas a esse sistema (não se analisava a justiça das decisões).
Segundo o sistema funcionalista, houve uma perda de foco.
Assim, deve-se colocar em primeiro plano um sistema que proporcione soluções
justas, para somente depois elaborar o sistema, em consonância com tais decisões.
Importante mencionar que, desde o Sistema Clássico, começou a se desenvolver a
idéia de que Dogmática (Teoria) e Política Criminal deveriam ser analisadas de forma
separada. A dogmática seria responsabilidade do jurista, enquanto que a política
criminal (redução da criminalidade, enfrentamento do crime) era deixada a cargo do
legislador.
O Funcionalista discorda dessa premissa, pois, além de se preocupar com a
Teoria, entende importante que o jurista se preocupe com a política criminal, que se
preocupe com a Justiça. As Teorias elaboradas pelo jurista devem ser aptas a propiciar
o cumprimento da função do direito penal.
A teoria é chamada de funcionalista, na medida em que considera que a análise
da teoria do crime deve ser feita à luz da “função ou “missão” do direito penal”.
Esse ponto de vista é comum para Roxin e Jakobs.
Entretanto, observa-se que o conceito de conduta está diretamente ligado ao que
se admite por “missão” do direito penal, sendo que os dois grandes expoentes dentro
dessa teoria, Roxin e Jakobs, divergem quanto à missão do Direito Penal.
38
Isso porque, para Roxin, a missão do direito penal é proteger bens jurídicos
indispensáveis ao homem.
39
Foi o que ocorreu em SP, com os ataques do PCC, em que a sociedade apenas temeu os
ataques, se recolhendo às suas casas, sem confiar na norma penal.
40
E não reprovável como se vê na lição de Roxin.
41
Jakobs exumou o Direito Penal do inimigo e não o inventou, inspirando-se em vários
pensadores, entre eles, Protágoras, São Tomás de Aquino, Kant, Locke, Hobbes.
A teoria considera que àquele que se dedica a determinados crimes não se deve
garantir o status de cidadão, merecendo, ao revés, punição específica e severa 42, uma
vez que o seu comportamento põe em risco, de forma ímpar, a integridade do sistema.
Entretanto, Jakobs fomenta o Direito Penal do inimigo apenas para determinados
tipos de criminosos, não à todos, como ex. o terrorista, traficante de drogas, de armas e
de seres humanos e para os membros de organizações criminosas transnacionais.
O direito penal do inimigo tem características similares às da “tolerância zero”
(teoria norte-americana dos broken windows):
i. Antecipação da punibilidade, com a tipificação de atos preparatórios:
O iter criminis tem quatro fases: cogitação, preparação, execução e resultado. No
direito penal do fato, a punibilidade surge a partir do início da execução. A cogitação e a
preparação deveriam ser impuníveis, mas o direito penal do inimigo antecipa a
punibilidade, tipificando como crimes atos meramente preparatórios, buscando evitar o
início da execução do crime.
ii. Criação de tipos de mera conduta:
Ocorre então a flexibilização do princípio da lesividade. Ex. O Brasil tem
vários crimes de mera conduta: ato obsceno, violação de domicílio. Os crimes omissivos
puros são de mera conduta.
iii. Criação de tipos de perigo abstrato:
O STF tem reduzido muito a aceitação de tipos penais de perigo abstrato.
Todavia, na Lei de Drogas, os crimes são de perigo abstrato, não havendo dúvidas a
esse respeito.
iv. Inobservância dos princípios da ofensividade e da exteriorização do fato:
Na medida em que tipifica atos preparatórios, o direito penal do inimigo
desrespeita o princípio da exteriorização do fato. Ao punir tipos de mera conduta,
desrespeita o princípio da ofensividade.
v. Flexibilização do princípio da legalidade:
A flexibilização do princípio da legalidade é feita pelo direito penal do inimigo
mediante a descrição vaga dos crimes e das penas. Ex.: o art. 20 da Lei
7.170/198343 (Lei dos Crimes contra a Segurança Nacional) fala em atos de terrorismo,
sem explicar no que eles consistem. Quanto mais vaga e ambígua a redação do tipo
penal, maior o número de condutas abrangidas:
Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o
dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.
vi. Preponderância do direito penal do autor, em prejuízo ao direito penal do
fato.
Flexibilização do princípio da exteriorização do fato, ex. admite a punição do
agente pelo simples fato de ele ser terrorista, não necessariamente por efetivamente
praticar atos terroristas.
vii. Surgimento das chamadas “leis de luta ou de combate”:
42
“ O Delinquente, autor de determinados crimes, não é ou não deve ser considerado
cidadão, mas sim um cancro no societário que deve ser extirpado”.
43
Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado,
incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por
inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações
políticas clandestinas ou subversivas. Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.
As leis de luta ou de combate são as leis oportunistas, leis de ocasião surgidas
graças à pressão da mídia. No Brasil, isso se verificou na edição da Lei dos Crimes
Hediondos, do Estatuto do Torcedor etc.
viii. Restrição de garantias penais e processuais:
O direito penal do inimigo é considerado um direito penal de terceira velocidade.
Obs.: Cada velocidade está ligada a um momento histórico vivido pelo direito
penal.No direito penal de 1ª velocidade, predominava a pena privativa de liberdade.
Começou-se a perceber a falência, o caos do sistema prisional. O direito penal de 2ª
velocidade passa a fomentar penas alternativas. O direito penal de 3ª velocidade surge
no contexto de medo do terrorismo e de organizações criminosas. Daí o fato de o direito
penal de 3ª velocidade envolver a redução das garantias penais e processuais penais
(campo fértil para o direito penal do inimigo). Essa divisão é de Silva Sanchez.
45
Reprovabilidade é imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa, potencial consciência da
ilicitude e necessidade da pena.
46
Para Roxin, a missão do direito penal é proteger bens jurídicos indispensáveis ao homem.
47
Para Jakobs, a missão do direito penal é resguardar o sistema (aquele que não respeita o
sistema é seu inimigo: direito penal do inimigo).
Fato Típico (Tipicidade)
1. Aspectos gerais
1.1. Conceito
É um fato humano, indesejado que, norteado pelo princípio da intervenção
mínima, consiste numa conduta causadora de um resultado, com ajuste formal,
material a um tipo penal (tipicidade) 48.
Assim, pelo conceito é possível extrair os requisitos do fato típico: 1. Conduta;
2. Resultado; 3. Nexo Causal e 4. Tipicidade penal.
Obs.: A tipicidade penal não se confunde com o tipo penal, este é apenas o
modelo de conduta proibido pela norma49. Aquela, é o modelo de conduta
proibida pela norma, é requisito do fato típico.
2. Conduta
A conduta, como acabamos de apresentar, é um dos elementos do fato típico, e,
uma vez ausente, não se pode falar em crime (nullum crimen sine conducta), assim não
há crime sem conduta.
Entretanto, há doutrina que nega a responsabilidade da pessoa jurídica pois, o
ente coletivo não tem conduta, mas é conduzido, mas prevalece ser possível
responsabilizar penalmente pessoa jurídica autora de crimes ambientais, pois a própria
Constituição Federal (Art. 225, § 3º50) admite essa possibilidade, cabendo a doutrina
conformar suas lições à esse mandamento.
48
Fato típico, portanto, pode ser conceituado como ação ou omissão humana,
antissocial que, norteada pelo princípio da intervenção mínima, consiste numa conduta
produtora de um resultado que se subsume ao modelo de conduta proibida pelo Direito Penal,
seja crime ou contravenção penal
49
Ex. é a conduta “matar alguém” descrita no Art. 121 do Código Penal,
50
Segundo Rogério Greco, “a ação, ou conduta, compreende qualquer
comportamento humano comissivo (positivo) ou omissivo (negativo), podendo ser
ainda dolosa (quando o agente quer ou assume o risco de produzir o resultado) ou
culposa (quando o agente infringe o seu dever de cuidado, atuando com negligência,
imprudência ou imperícia) .
Culpabilidade
ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o
resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria
51
Alguns entendem que o finalismo adotado é o alemão, entretanto, outros entendem que
o finalismo adotado é o dissidente.
52
Imputabilidade, Potencial consciência da ilicitude e Exigibilidade de conduta diversa
(ImPoEx).
Voluntário significa dominável pela vontade53. Qualquer movimento humano não
dominado pela vontade não será considerado conduta, assim se o comportamento
praticado, ainda que previsto em um tipo penal, não for precedido da vontade do seu
agente, não haverá conduta, e, consequentemente, desfigurado estará o fato típico
(substrato do crime), faltando seu primeiro elemento, ou substrato.
Outra característica da conduta é a sua repercussão no mundo exterior. A
simples cogitação (o pensamento não exteriorizado) é estranha ao Direito Penal.
Dessa forma, podemos admitir como dois os elementos da conduta:
a. Comportamento voluntário (dirigido a um fim): nos crimes dolosos, o
fim é a lesão ao bem jurídico ou sua exposição a perigo, ao passo que, nos
crimes culposos, a finalidade é a prática de um ato cujo resultado previsível
seja capaz de causar lesão ao bem jurídico;
b. Exteriorização da vontade: é o aspecto mecânico ou neuromuscular,
consistente na prática de uma ação ou omissão capaz de externar o elemento
psíquico.
Nesse sentido, a conduta pode ser considerada ausente nos casos de:
i. Caso fortuito e força maior:
Segundo Maria Helena Diniz, a Força maior é fato da natureza ocasionando o
acontecimento (ex.: raio que provoca incêndio). Já o Caso fortuito é o evento tem
origem em causa desconhecida (ex.: cabo elétrico que sem motivo aparente se rompe
provocando incêndio).
Excluem a conduta uma vez que são fatos imprevisíveis ou inevitáveis.
ii. Involuntariedade:
Há uma ausência na direção da conduta de acordo com a sua finalidade.
a. atos reflexos imprevisíveis:
traduz-se num sintoma de reação automática do organismo a um estimula
externo, é um movimento desprovido de vontade.
Entretanto, para excluir a conduta, o ato reflexo deve ser imprevisível, pois se era
previsível e acaba acontecendo, aquele que o pratica pode responder pelo crime doloso
ou culposo, se o caso. Ex.: o sujeito que limpa uma arma na frente de uma criança
responde pelo crime se ela dispara por conta de um susto sofrido por ele.
Obs.: Segundo Flávio Monteiro de Barros, há uma diferença entre os movimentos
reflexos e as “ações em curto-circuito54”, Nestas existe vontade de praticar o ato, vez que
oriunda de um movimento relâmpago provocado por excitação.
b. estado de inconsciência:
Exemplos de estado de inconsciência são o sonambulismo e a hipnose. Se o
sonâmbulo mata alguém, o fato é atípico pela ausência de conduta.
iii. Coação Física Irresistível:
53
Copiar a nota de rodapé 31 do livro do Rogério Sanches.
54
"Com efeito, nos movimentos reflexos há um impulso completamente fisiológico
provocado pela excitação de um só órgão. Nas ações em curto-circuito (atos impulsivos), ao
revés, há um movimento relâmpago, provocado pela excitação de diversos órgãos, acompanhado
de um elemento psíquico, isto é, de uma vontade obcecada, de modo que o agente não chega a
perder a consciência, podendo, inclusive, evitar o seu agir pelo exercício do autocontrole" Ex.
Torcida de futebol que inflamada pelo “calor do jogo” começa a atirar objetos no campo.
O Coagido é impossibilitado de determinar seu movimentos de acordo com a sua
vontade55.
Crime doloso
2.4.1.2. Conceito
Segundo a doutrina, “dolo é a vontade livre e consciente de realizar ou aceitar
realizar a conduta prevista no tipo penal incriminador”.
Dolo é consciência e vontade.
O equívoco desse conceito, entretanto, está na palavra “livre”. A existência ou não
de liberdade na vontade é matéria a ser analisada na culpabilidade (mais precisamente
na exigibilidade de conduta diversa), e não no dolo56.
Há quem diga que o doente mental não tem dolo, mas não é o que prevalece. Ele
tem consciência e vontade, dentro de seu precário mundo valorativo. Caso contrário,
não haveria como aplicar a medida de segurança, que pressupõe fato típico e ilícito. O
mesmo com relação aos demais inimputáveis.
A noção de dolo não se esgota na realização do resultado, podendo abranger
também o resultado demais circunstâncias da infração penal.
2.4.1.3. Elementos
Do conceito acima, extraem-se os elementos do dolo:
i. Elemento intelectivo: consciência Consciência da conduta e do
resultado.
ii. Elemento volitivo: vontade Vontade de praticar a conduta típica.
A liberdade, como visto, não é elemento do dolo, mas uma circunstência a ser
analisada na culpabilidade.
55
Não se confunde com a coação moral, que interfere na culpabilidade, apenas se for
irresistível, se for resistível interfere na pena,
56
Fosse o caso de ser um dos elementos do dolo, a coação moral irresistível excluiria de
início a tipicidade, e não a culpabilidade como é o caso.
2.4.1.4.2. Teoria da representação
Segundo a teoria da representação, há dolo sempre que o agente tem a previsão
do resultado como possível e, ainda assim, decide continuar a conduta. Essa teoria
amplia o conceito de dolo e acaba por abranger a culpa consciente57.
Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia
constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser
escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre
Crime culposo
negligência ou imperícia.
2.4.2.2. Conceito
O crime culposo consiste numa conduta voluntária que realiza um fato ilícito não
querido ou aceito pelo agente, mas que foi por ele previsto (culpa consciente) ou lhe
era excepcionalmente previsível (culpa inconsciente) e podia ser evitado se o agente
atuasse com a cautela necessária.
Culpa é a quebra do dever objetivo de cuidado.
No art. 33, II, do CPM, há um conceito legal de crime culposo:
Art. 33. Diz-se o crime:
Culpabilidade (...)
ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o
Art. 18 (...) Parágrafo único- Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode
ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica
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Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica
do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração
penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no
prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação
pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente. (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008). (...)
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Segundo Cleber Masson, a previsibilidade subjetiva não é elemento da culpa, mas
será considerada pelo magistrado no juízo da culpabilidade, integrando o elemento da
exigibilidade de conduta diversa.
dolosamente.
Art. 180 (...) § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela
presumir-se obtida por meio criminoso: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)
Na culpa consciente, o agente prevê o resultado, mas espera que ele não
ocorra, supondo poder evitá-lo contando com sua habilidade ou com a sorte. Também
é chamada de culpa com previsão. Mais que previsibilidade o agente tem previsão, mas
o resultado continua involuntário, ainda que previsto pelo agente.
Art. 20 (...) § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas
circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não
há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime
culposo.
Trata-se daquela em que o agente, por erro evitável, fantasia certa situação de
fato, supondo estar agindo acobertado por uma excludente de ilicitude (descriminante
putativa) e, em razão disso, provoca intencionalmente um resultado ilícito. Apesar de a
ação ser dolosa, o agente responde por culpa. A estrutura do crime é dolosa, porém ele
é punido como se culposo fosse.
São sinônimos de culpa imprópria: culpa por extensão, por assimilação ou por
equiparação.
Consciência Vontade
Dolo direto O agente prevê o O agente quer o resultado.
resultado.
Dolo eventual O agente prevê o O agente assume o risco de
resultado. produzir o resultado, aceitando-o.
Culpa consciente O agente prevê o O agente acredita que o resultado
resultado. não vai ocorrer.
Culpa inconsciente O agente não prevê o O agente não tem vontade de
resultado, que era previsível. realizá-lo (obviamente).
A dificuldade em diferenciar dolo eventual eculpa consciente não é teórica, mas
prática. O “racha“, para os Tribunais Superiores, é dolo eventual. Todavia, em prova da
Defensoria, deve-se alegar que se trata de culpa consciente. A embriaguez, sem racha, é
considerada culpa consciente na jurisprudência (posição, inclusive, da PGJ/SP).
Rogério acha que tanto a embriaguez quanto o racha são dolo eventual.