Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Aula 2 - LINDB
DIREITO CIVIL I
1. PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE A LEI DE INTRODUÇÃO
2. A LEI DE INTRODUÇÃO E A LEI COMO FONTE PRIMÁRIA DO DIREITO BRASILEIRO. A
VIGÊNCIA DAS NORMAS JURÍDICAS (ARTS. 1.º E 2.º DA LEI DE INTRODUÇÃO)
3. CARACTERÍSTICAS DA NORMA JURÍDICA E SUA APLICAÇÃO. ANÁLISE DO ART. 3.º DA
LEI DE INTRODUÇÃO
4. AS FORMAS DE INTEGRAÇÃO DA NORMA JURÍDICA. ART. 4.º DA LEI DE INTRODUÇÃO
5. APLICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA NO TEMPO. O ART. 6.º DA LEI DE INTRODUÇÃO
6. APLICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA NO ESPAÇO. OS ARTS. 7.º A 19 DA LEI DE
INTRODUÇÃO E O DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E PRIVADO
7. INCLUSÕES FEITAS NA LEI DE INTRODUÇÃO PELA LEI 13.655/2018. REPERCUSSÕES
PARA O DIREITO PÚBLICO
Prof. Fabiano Mariano
1. PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE A LEI DE
INTRODUÇÃO
Anote-se que a Lei de Introdução não faz parte do Código Civil de 2002,
como também não era componente do Código Civil de 1916. Como se extrai,
entre os clássicos, da obra de Serpa Lopes, ela é uma espécie de lei anexa,
publicada originalmente em conjunto com o Código Civil para facilitar a sua
aplicação.
CF, art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação,
mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre
matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial,
terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração
pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à
sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
CPC - Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e
coerente.
Apesar de a lei ser a fonte primária do Direito, não se pode conceber um Estado Legal
puro, em que a norma jurídica acaba sendo o fim ou o teto para as soluções jurídicas. Na
verdade, a norma jurídica é apenas o começo, o ponto de partida, ou seja, o piso mínimo
para os debates jurídicos e para a solução dos casos concretos.
Esclarecendo, a lei passa por três fases fundamentais para que tenha validade e
eficácia:
• elaboração,
• promulgação e
• publicação.
Depois vem o prazo de vacância, geralmente previsto na própria norma.
• CC - Art. 2.044. Este Código entrará em vigor 1 (um) ano após a sua
publicação.
LINDB, Art. 1º, § 3º. Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer
nova publicação de seu texto, destinada a correção, o prazo deste
artigo e dos parágrafos anteriores começará a correr da nova
publicação.
A norma corretiva é aquela que existe para afastar equívocos importantes cometidos
pelo texto legal, sendo certo que as correções do texto de lei já em vigor devem ser
consideradas como lei nova.
O art. 2.º da Lei de Introdução consagra o princípio da continuidade da lei, pelo qual a
norma, a partir da sua entrada em vigor, tem eficácia contínua, até que outra a modifique
ou revogue. Dessa forma, tem-se a regra do fim da obrigatoriedade da lei, além do caso de
ter a mesma vigência temporária.
Contudo, não se fixando este prazo, prolongam-se a obrigatoriedade e o princípio da
continuidade até que a lei seja modificada ou revogada por outra (art. 2.º, caput, da Lei de
Introdução).
Pois bem, pelo que consta do art. 2.º da Lei de Introdução, o meio mais comum para se
retirar a vigência de uma norma jurídica é a sua revogação, o que pode ocorrer sob duas
formas, classificadas quanto à sua extensão:
• Revogação total ou ab-rogação – ocorre quando se torna sem efeito uma norma de
forma integral, com a supressão total do seu texto por uma norma emergente.
Exemplo ocorreu com o Código Civil de 1916, pelo que consta do art. 2.045,
primeira parte, do CC/2002.
• Revogação parcial ou derrogação – uma lei nova torna sem efeito parte de uma lei
anterior, como se deu em face da parte primeira do Código Comercial de 1850,
conforme está previsto no mesmo art. 2.045, segunda parte, do CC.
CC - Art. 2.045. Revogam-se a Lei n o 3.071, de 1 o de janeiro de 1916 - Código Civil e a Parte Primeira do
Código Comercial, Lei n o 556, de 25 de junho de 1850.
Conforme previsão do art. 9.º da Lei Complementar 95/1998, “a cláusula de revogação deverá
enumerar expressamente a lei ou disposições revogadas”. O respeito, em parte, em relação a tal
dispositivo especial pode ser percebido pela leitura do citado art. 2.045 do Código Civil, pelo qual
“revogam-se a Lei 3.071, de 1.º de janeiro de 1916 – Código Civil e a Primeira Parte do Código
Comercial, Lei 556, de 25 de junho de 1850”. Entretanto, o atual Código Civil permaneceu silente a
respeito da revogação ou não de algumas leis especiais como a Lei do Divórcio (Lei 6.515/1977), a Lei de
Registros Públicos (Lei6.015/1973), a Lei de Condomínio e Incorporação (Lei 4.591/1967), entre outras.
Nesse último ponto residem críticas ao Código Civil de 2002, por ter desobedecido à orientação
anterior. A questão da revogação das leis especiais anteriores deve ser analisada caso a caso.
• Revogação tácita (ou por via oblíqua) – situação em que a lei posterior é
incompatível com a anterior, não havendo previsão expressa no texto a respeito
da sua revogação.
Código Civil de 2002 não trata da revogação de leis especiais, devendo ser aplicada
a revogação parcial tácita que parece constar do seu art. 2.043 do CC: “Até que por
outra forma se disciplinem, continuam em vigor as disposições de natureza processual,
administrativa ou penal, constantes de leis cujos preceitos de natureza civil hajam sido
incorporados a este Código”.
Assim, vários preceitos materiais de leis especiais, como a Lei do Divórcio (Lei
6.515/1973), foram incorporados pelo atual Código Civil, permanecendo em vigor os seus
preceitos processuais, trazendo a conclusão da sua revogação parcial, por via oblíqua.
EX: imagine-se o caso do Código Civil de 2002, que dispôs expressamente e de forma
completa sobre o condomínio edilício, entre os seus arts. 1.331 a 1.358. Por tal
tratamento, deve ser tida como revogada tacitamente a Lei 4.591/1964, naquilo que
regulava o assunto (arts. 1.º a 27). Trata-se de aplicação da segunda parte do art. 2.º, § 1.º,
da Lei de Introdução, o que vem sendo confirmado pela jurisprudência nacional (STJ, REsp
746.589/RS, 4.ª Turma, Rel. Min. Aldir Guimarães Passarinho Junior, j. 15.08.2006, DJU
18.09.2006, p. 327).
LINDB, Art. 2º, § 2º. A lei nova, que estabeleça disposições gerais
ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei
anterior.
EX: Como segundo exemplo temos a incidência do art. 2.º, § 2.º, da Lei de Introdução
na seguinte conclusão: o Código Civil dispôs de forma especial sobre a locação (arts. 565 a
578), não prejudicando a lei especial anterior que dispunha sobre a locação imobiliária,
permanecendo esta incólume (Lei 8.245/1991). Tanto isso é verdade que foi introduzida
na codificação material uma norma de direito intertemporal, prevendo que a locação de
prédio urbano que esteja sujeita à lei especial, por esta continua a ser regida (art. 2.036 do
CC/2002).
Esclarecendo:
Contudo, excepcionalmente, a lei revogada volta a viger quando a lei revogadora for
declarada inconstitucional ou quando for concedida a suspensão cautelar da eficácia da
norma impugnada – art. 11, § 2.º, da Lei 9.868/1999. Também voltará a viger quando, não
sendo situação de inconstitucionalidade, o legislador assim o determinar expressamente.
A lei, como fonte primária do Direito Brasileiro, tem as seguintes características básicas:
• Generalidade – a norma jurídica dirige-se a todos os cidadãos, sem qualquer distinção,
tendo eficácia erga omnes.
• Imperatividade – a norma jurídica é um imperativo, impondo deveres e condutas para os
membros da coletividade.
• Permanência – a lei perdura até que seja revogada por outra ou perca a eficácia.
• Competência – a norma, para valer contra todos, deve emanar de autoridade competente,
com o respeito ao processo de elaboração.
• Autorizante – o conceito contemporâneo de norma jurídica traz a ideia de um
autorizamento (a norma autoriza ou não autoriza determinada conduta), estando superada
a tese de que não há norma sem sanção (Hans Kelsen).
Prof. Fabiano Mariano
3. CARACTERÍSTICAS DA NORMA JURÍDICA E SUA APLICAÇÃO. ANÁLISE DO ART. 3.º DA LEI
DE INTRODUÇÃO
Como outra característica básica, está consagrado no art. 3.º da Lei de Introdução o
princípio da obrigatoriedade da norma, pelo qual ninguém pode deixar de cumprir a lei
alegando não a conhecer.
Todavia, até pode-se afirmar que essa continua sendo a regra, mas nem sempre o
respeito a essa ordem deverá ocorrer, diante da força normativa e coercitiva dos
princípios, notadamente daqueles de índole constitucional. Como é notório, a Constituição
Federal de 1988 prevê no seu art. 5.º, § 1.º, que as normas que definem direitos
fundamentais – muitas geradoras de princípios estruturantes do sistema jurídico –, têm
aplicação imediata.
A exemplificar, em casos que envolvem a proteção da dignidade humana (art. 1.º, inc.
III, da CF/1988), não se pode dizer que esse princípio será aplicado somente após o
emprego da analogia e dos costumes e, ainda, se não houver norma prevista para o caso
concreto. Em suma, os princípios constitucionais não podem mais ser vistos somente
como último recurso de integração da norma jurídica, como acreditavam os juristas
clássicos.
• Princípio da Socialidade – Segundo apontava o próprio Miguel Reale, um dos escopos da nova
codificação foi o de superar o caráter individualista e egoísta da codificação anterior. Assim, a
palavra “eu” é substituída por “nós”. Todas as categorias civis têm função social: o contrato, a
empresa, a propriedade, a posse, a família, a responsabilidade civil.
• Princípio da Operabilidade – Esse princípio tem dois sentidos. Primeiro, o de simplicidade ou
facilitação das categorias privadas, o que pode ser percebido, por exemplo, pelo tratamento
diferenciado da prescrição e da decadência. Segundo, há o sentido de efetividade ou
concretude, o que foi buscado pelo sistema aberto de cláusulas gerais adotado pela atual
codificação material. Na opinião deste autor, o sistema de cláusulas gerais também foi adotado
pelo CPC/2015, pela adoção de um modelo aberto, baseado em princípios como a dignidade da
pessoa humana e a boa-fé objetiva
Prof. Fabiano Mariano
4. AS FORMAS DE INTEGRAÇÃO DA NORMA JURÍDICA. ART. 4.º DA LEI DE INTRODUÇÃO
LINDB, Art. 5º. Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais
a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
A partir desses conceitos, pode-se afirmar que o direito adquirido é o mais amplo de
todos, englobando os demais, uma vez que tanto no ato jurídico perfeito quanto na coisa
julgada existiriam direitos dessa natureza, já consolidados. Em complemento, a coisa
julgada também deve ser considerada um ato jurídico perfeito, sendo o conceito mais
restrito. Tal convicção pode ser concebida pelo desenho a seguir:
Tanto isso é verdade que o Código de Processo Civil de 2015 adotou expressamente a
ponderação no seu art. 489, § 2.º, in verbis: “no caso de colisão entre normas, o juiz deve
justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que
autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a
conclusão”.
“Processo civil. Investigação de paternidade. Repetição de ação anteriormente ajuizada, que teve seu pedido
julgado improcedente por falta de provas. Coisa julgada. Mitigação. Doutrina. Precedentes. Direito de família.
Evolução. Recurso acolhido. I – Não excluída expressamente a paternidade do investigado na primitiva ação
de investigação de paternidade, diante da precariedade da prova e da ausência de indícios suficientes a
caracterizar tanto a paternidade como a sua negativa, e considerando que, quando do ajuizamento da
primeira ação, o exame pelo DNA ainda não era disponível e nem havia notoriedade a seu respeito, admite-se
o ajuizamento de ação investigatória, ainda que tenha sido aforada uma anterior com sentença julgando
improcedente o pedido. II – Nos termos da orientação da Turma, „sempre recomendável a realização de
perícia para investigação genética (HLA e DNA), porque permite ao julgador um juízo de fortíssima
probabilidade, senão de certeza‟ na composição do conflito. Ademais, o progresso da ciência jurídica, em
matéria de prova, está na substituição da verdade ficta pela verdade real.
III – A coisa julgada, em se tratando de ações de estado, como no caso de investigação de paternidade, deve
ser interpretada modus in rebus. Nas palavras de respeitável e avançada doutrina, quando estudiosos hoje se
aprofundam no reestudo do instituto, na busca, sobretudo, da realização do processo justo, a coisa julgada
existe como criação necessária à segurança prática das relações jurídicas e as dificuldades que se opõem à
sua ruptura se explicam pela mesmíssima razão. Não se pode olvidar, todavia, que numa sociedade de
homens livres, a Justiça tem de estar acima da segurança, porque sem Justiça não há liberdade‟. IV – Este
Tribunal tem buscado, em sua jurisprudência, firmar posições que atendam aos fins sociais do processo e às
exigências do bem comum” (STJ, REsp 226.436/PR (199900714989), 414113, Data da decisão: 28.06.2001,
4.ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 04.02.2002, p. 370, RBDF 11/73, RDR 23/354, RSTJ
154/403).
Pelo que consta da ementa do julgado, é possível uma nova ação para a prova da
paternidade, se a ação anterior foi julgada improcedente em momento em que não existia
o exame de DNA. Frise-se que a questão pode perfeitamente ser solucionada a partir da
técnica de ponderação, desenvolvida, entre outros, por Robert Alexy e adotada
expressamente pelo art. 489, § 2.º, do CPC/2015.