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APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO
Conforme prescreve o artigo 1º. do CPP, a lei processual penal aplica-se a todas as infrações penais pra-
ticadas em território brasileiro, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de Direito Internacional, apresen-
tando os incisos I a V daquele mesmo artigo as exceções à aplicabilidade do CPP.

Art. 1o O processo penal reger-se-á, em todo o território brasileiro, por este Código, ressalvados:
I - os tratados, as convenções e regras de direito internacional;
II - as prerrogativas constitucionais do Presidente da República, dos ministros de Estado, nos crimes co-
nexos com os do Presidente da República, e dos ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de
responsabilidade (Constituição, arts. 86, 89, § 2 o, e 100);
III - os processos da competência da Justiça Militar;
IV - os processos da competência do tribunal especial (Constituição, art. 122, no 17);
V - os processos por crimes de imprensa.1
Parágrafo único. Aplicar-se-á, entretanto, este Código aos processos referidos nos IV e V, quando as leis
especiais que os regulam não dispuserem de modo diverso.

a) Regra: Locus regit actum

No Processo Penal brasileiro vigora, portanto, o princípio da territorialidade, segundo o qual se impõe a
aplicação da lex fori ou locus regit actum, aplicando-se a lei processual penal nacional aos processos criminais em
curso no território nacional.

Na forma do artigo 6.º do CP, considera-se praticado em território brasileiro o crime cuja ação ou omissão,
ou cujo resultado, no todo ou em parte, ocorreu em território nacional, lembrando que, para fins penais, incluem-
se, como extensão do território nacional, as embarcações e aeronaves públicas ou a serviço do governo brasileiro,
onde quer que se encontrem, e as embarcações e aeronaves particulares que se acharem em espaço aéreo ou
marítimo brasileiro ou em alto-mar ou espaço aéreo correspondente.

b) 1a. exceção: Crimes militares e de responsabilidade

Configuram-se exceção ao locus regit actum, entretanto, os processos por crimes militares, aos quais se
aplica o Código de Processo Penal Militar2, e os processos por crimes de responsabilidade3 do Presidente da Re-
pública, bem como dos Ministros de Estado e dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, dos
Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional
do Ministério Público, do Procurador-Geral da República e do Advogado-Geral da União.

c) 2a. exceção: Tratados e convenções internacionais

Quanto aos tratados, convenções e regras de direito internacional, atualmente, são os mesmos fonte para
interpretação do direito processual penal, desde que compatíveis com as garantias constitucionais brasileiras 4.

Portanto, os mesmos não são mais considerados como exceções à aplicação do Processo Penal brasilei-
ro. É certo que algumas exceções encontram-se presentes quanto à aplicação das normas processuais penais
internas em nome das regras de direito internacional no caso do Tribunal Penal Internacional, instituído pelo Esta-

1
A Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967) foi, através da arguição de descumprimento de preceito fundamental - ADPF no. 130, suspensa pelo
Supremo Tribunal Federal.
2
Aos processos penais militares aplica-se o Código de Processo Penal comum de forma apenas subsidiária.
3
Os crimes de responsabilidade tem seu processo e julgamento regidos pela Lei 1.079/50 (Lei do Impeachment).
4
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 1480, julgada em 04/09/1997, decidiu: "No sistema jurídico brasileiro, os tratados ou
convenções internacionais estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Em consequência,
nenhum valor jurídico terão os tratados internacionais, que, incorporados ao sistema de direito positivo interno, transgredirem, formal ou mate-
rialmente, o texto da Carta Política."

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tuto de Roma. Contudo, mesmo neste caso, as regras internacionais somente serão aplicáveis quando em con-
formidade com as garantias previstas em nosso ordenamento constitucional.

d) Da inaplicabilidade dos incisos IV e V do art. 1o do CPP


O art. 1o do CPP menciona ainda, como exceção, os processos da competência do tribunal especial e os
processos por crimes de imprensa (incisos IV e V do art. 1o. do CPP). No entanto, tais hipóteses não mais se apli-
cam a uma porque a Constituição de 1988 não contempla o Tribunal Especial; a duas porque o Supremo Tribunal
Federal, no julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental n o. 130, entendeu como não
recepcionada a Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa).

Assim, salvo nas exceções acima indicadas, ou quando a legislação penal extravagante não dispuser de
forma diversa, o Código de Processo Penal aplica-se aos processos criminais que tramitam no país, normalmente
decorrentes de crimes aqui também praticados.

LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO

Conforme dispõe o art. 2º do CPP, a norma processual penal tem aplicação imediata, sem efeito retroativo
e, portanto, sem prejuízo dos atos praticados sob a vigência da norma anterior.

Trata-se de disposição genérica, atinente a todos os ramos do Direito Processual e decorrente da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro, nos artigos 1.º, 2.º e 6.º.

Portanto, o art. 2o do CPP consagra o princípio tempus regit actum. Ou seja, quando do surgimento de
uma norma de caráter processual, importa observar se o ato já foi praticado ou não, em nada interessando se
referida norma é benéfica ou prejudicial ao acusado.

Contudo, devemos estar atentos a eventuais normas de natureza mista, isto é, normas que possuam, si-
multaneamente, conteúdo de direito processual e de direito material. Neste caso, sua aplicação no tempo restará
regida pelas regras de Direito Penal: "lei penal não retroage, salvo em benefício do réu" (art. 5 o., XL, da CRFB e
art. 2o. do CP).

Exemplos no Processo Penal são fartos, já que questões diretamente relacionadas à prisão e liberdade,
prescrição, decadência, natureza da ação penal, dentre outras, são de conteúdo de direito material penal, e, con-
forme estabelece o princípio da irretroatividade da norma penal, “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o
réu”.

Assim, no caso de normas mistas (ao mesmo tempo de natureza processual e material), prevalece o cará-
ter material, devendo ser aplicada a regra do art. 2.º, parágrafo único, do CP: a norma, quando benéfica, retroagi-
rá, aplicando-se mesmo a crimes praticados antes de sua vigência. Mas se a norma for prejudicial, não poderá
retroagir, o que impõe a inaplicabilidade da nova norma a fatos pretéritos. Nestes casos, portanto, o que importa é
a data em que o fato foi praticado.

Observem, a título de exemplo, o art. 366 do CPP, com a redação que lhe foi dada pela Lei n o.
9.271/1996. A norma tem caráter processual ao versar sobre regras de citação e indicar a suspensão do proces-
so, mas também tem natureza penal material, ao determinar, cumulativamente, a suspensão da prescrição. Como
a norma penal não retroage em prejuízo do réu, referido dispositivo não se aplica a fatos praticados antes de sua
vigência, e, na época, não foi possível sua aplicação aos processos que se encontravam em curso.

Dúvida surgiu quando, em 2008, a Lei 11.689, que alterou o procedimento do Tribunal do Júri, revogou o
recurso do Protesto por Novo Júri. Na ocasião, muitos autores sustentaram que a revogação de um recurso afeta-
ria o direito à ampla defesa, e como o Protesto por Novo Júri era um recurso dependente da pena imposta na
condenação, a revogação deste direito teria natureza mista. Este entendimento, entretanto, era e é minoritário,
prevalecendo a posição de que a revogação de um recurso tem caráter de norma exclusivamente processual.
Portanto, aplicando-se de imediato, sem prejuízo dos atos já praticados. Exatamente por tal motivo, aqueles réus

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processados por crimes praticados antes da vigência da referida lei, mas cujo julgamento se realizou após o re-
curso já ter sido revogado, não tiveram direito ao mesmo.

Devemos lembrar ainda que leis especiais prevalecem sobre a geral, e que leis posteriores derrogam as
anteriores, uma vez que a lei tem vigência até que outra a revogue, expressa ou tacitamente. A revogação pode
ser total, ao que chamamos ab-rogação; ou parcial, chamada de derrogação.

IMUNIDADES (APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL QUANTO ÀS PESSOAS)


A princípio, a norma processual é aplicável a todos aqueles que se encontram em território nacional, se-
jam brasileiros ou não.

Contudo, o ordenamento jurídico prevê algumas imunidades processuais. Assim, aos chefes de Estado e
aos representantes de governos estrangeiros não se aplica a jurisdição penal brasileira. Trata-se da imunidade
diplomática, decorrente da jurisdição enquanto expressão da soberania estatal.

Contudo, devemos atentar para outra espécie de imunidade: a imunidade parlamentar.

A imunidade parlamentar pode ser material ou absoluta, que alcança os membros do Congresso Nacional
(Deputados Federais e Senadores), bem como os Deputados Estaduais e Vereadores, garantindo-lhes a inviolabi-
lidade por suas palavras, opiniões e votos no exercício e limite do mandato parlamentar. A imunidade material,
prevista no caput do art. 53 da CRFB/88, é também chamada inviolabilidade ou indenidade parlamentar. É uma
imunidade irrenunciável, verdadeira garantia à liberdade dos membros do Poder Legislativo no exercício de suas
funções.

A imunidade processual, formal ou relativa alcança Senadores, Deputados Federais e Deputados Estadu-
ais, não sendo estendida a Vereadores, e decorre do disposto nos parágrafos do mesmo art. 53 da Constituição
Federal.

No âmbito das imunidades processuais, destaque para a necessidade de comunicação à Casa Legislativa
correspondente, que poderá, por maioria de seus membros, sustar o processo criminal em curso (§ 3º. do art. 53,
acima indicado).

INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROCESSUAL PENAL


A lei processual penal admite interpretação extensiva e analogia, pois não contém dispositivo versando
sobre direito de punir. Entretanto, da mesma forma que em sua aplicação no tempo, devemos atentar para as
normas de natureza mista que versem, simultaneamente, sobre direito processual e material penal, já que a nor-
ma penal não admite analogia e interpretação extensiva in malam partem.

FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL


São fontes do Direito Processual Penal imediatas: a Constituição Federal, o Código de Processo Penal e
as leis penais e processuais penais extravagantes.

São fontes mediatas: os costumes e princípios gerais do direito.

CONTRADITÓRIO (ART. 5º., LV, CRFB/88)


O princípio do contraditório decorre do brocardo romano audiatur et altera pars e é identificado na doutrina
pelo binômio “ciência e participação”.

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O juiz coloca-se equidistante das partes, só podendo dizer que o direito preexistente foi devidamente apli-
cado ao caso concreto se, ouvida uma parte, for dado à outra o direito de manifestar-se em seguida.

Destarte, as partes têm o direito de serem cientificadas sobre qualquer fato processual ocorrido e a opor-
tunidade de se manifestarem sobre ele antes de qualquer decisão jurisdicional.

O contraditório, no Processo Penal, não se demonstra tão facilmente como ocorre no Processo Civil, onde
o réu, desde logo, deve contra-argumentar todos os fatos alegados pelo autor. Ainda que, após a reforma de
2008, a lei estabeleça a citação do réu para a apresentação de uma resposta à acusação que pode adentrar no
mérito (art. 396 do CPP), não há no Processo Penal confissão ficta. Ao mencionar que a peça entra no mérito, a
lei apenas quis indicar que deve o advogado buscar a absolvição sumária a que alude o art. 397 do mesmo CPP.

O grande momento de consagração do contraditório no Processo Penal continua sendo o das alegações
finais, hoje consagradas nos debates orais ou memoriais.

Por tal motivo, a ausência de alegações finais da defesa caracteriza nulidade absoluta, seja por violação à
ampla defesa como também ao contraditório. Da mesma forma, embora a ausência de alegações finais do Minis-
tério Público seja encarada majoritariamente como nulidade relativa (sob o argumento de que a denúncia seria
suficiente a viabilizar a ampla defesa e o contraditório), há entendimentos de que sua ausência também configura
nulidade absoluta, por inviabilizar o contraditório sobre o entendimento da acusação acerca das provas colhidas
durante o processo.

É certo, entretanto, que o contraditório está presente durante toda a instrução criminal, através do princí-
pio da audiência contraditória: as provas devem ser colhidas sob o crivo do contraditório, ouvindo-se sempre a
parte contrária.

PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (ARTIGO 5º, LVII, CRFB/88)

Dispõe o artigo 5.º, LVII, da Constituição Federal:

Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

O princípio da presunção de inocência tem três efeitos diretos:

I - Trata-se de uma regra de tratamento, cujo primeiro destinatário é o legislador, seguindo-se do opera-
dor do direito e, finalmente, da sociedade em geral. Por tal motivo, foi recentemente revogado o inciso II do artigo
393 do CPP, que determinava, em flagrante afronta à presunção de inocência, a inclusão do nome do réu no rol
dos culpados através da sentença de primeiro grau. O réu tem o direito de ser tratado como inocente até o trânsito
em julgado da sentença condenatória.

II - A presunção de inocência altera as regras de distribuição do ônus da prova no Processo Penal, im-
pondo ao juiz, no momento da sentença, em caso de dúvida acerca das provas existentes nos autos, a absolvição
do réu por insuficiência de provas. Em regra, deve a acusação provar o que ela própria alega de forma suficiente a
derrubar as alegações apresentadas pelo réu, a quem o ordenamento jurídico entrega mera faculdade de prova.

III - Como o réu goza da presunção de inocência, não poderá o Estado impor a ele antecipação de pena.
Isto significa dizer que eventual prisão durante o processo somente será possível se extremamente necessária. A
prisão anterior ao trânsito em julgado da decisão reveste-se de caráter meramente cautelar. Por tal motivo, recen-
temente, a Lei no. 12.403/2011 revogou o artigo 393 do CPP

Observação:

Posição ATUAL do STF:


STF. Plenário. HC 126292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/02/2016.

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É possível o início da execução da pena condenatória após a prolação de acórdão condenatório
em 2º grau e isso não ofende o princípio constitucional da presunção da inocência.

O recurso especial e o recurso extraordinário não possuem efeito suspensivo (art. 637 do CPP e art. 27, §
2º da Lei nº 8.038/90). Isso significa que, mesmo a parte tendo interposto algum desses recursos, a decisão recor-
rida continua produzindo efeitos. Logo, é possível a execução provisória da decisão recorrida enquanto se aguar-
da o julgamento do recurso.

O Min. Teori Zavascki defendeu que, até que seja prolatada a sentença penal, confirmada em 2º grau, de-
ve-se presumir a inocência do réu. Mas, após esse momento, exaure-se o princípio da não culpabilidade, até por-
que os recursos cabíveis da decisão de segundo grau ao STJ ou STF não se prestam a discutir fatos e provas,
mas apenas matéria de direito.

Para o Relator, “a presunção da inocência não impede que, mesmo antes do trânsito em julgado, o acór-
dão condenatório produza efeitos contra o acusado”.

"A execução da pena na pendência de recursos de natureza extraordinária não compromete o núcleo es-
sencial do pressuposto da não culpabilidade, na medida em que o acusado foi tratado como inocente no curso de
todo o processo ordinário criminal, observados os direitos e as garantias a ele inerentes, bem como respeitadas
as regras probatórias e o modelo acusatório atual. Não é incompatível com a garantia constitucional autorizar, a
partir daí, ainda que cabíveis ou pendentes de julgamento de recursos extraordinários, a produção dos efeitos
próprios da responsabilização criminal reconhecida pelas instâncias ordinárias".

O Ministro Teori, citando a ex-Ministra Ellen Gracie (HC 85.886) afirmou que “em país nenhum do mundo,
depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa aguardando refe-
rendo da Suprema Corte”

STF admite execução da pena após condenação em segunda instância

Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que o artigo 283 do Código de Pro-
cesso Penal (CPP) não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância e indeferiu
liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44.

O Partido Nacional Ecológico (PEN) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), au-
tores das ações, pediam a concessão da medida cautelar para suspender a execução antecipada da pena de
todos os acórdãos prolatados em segunda instância. Alegaram que o julgamento do Habeas Corpus (HC) 126292,
no qual o STF entendeu possível a execução provisória da pena, vem gerando grande controvérsia jurisprudencial
acerca do princípio constitucional da presunção de inocência, porque, mesmo sem força vinculante, tribunais de
todo o país “passaram a adotar idêntico posicionamento, produzindo uma série de decisões que, deliberadamente,
ignoram o disposto no artigo 283 do CPP”.

O caso começou a ser analisado pelo Plenário, quando o relator das duas ações, ministro Marco Aurélio,
votou no sentido da constitucionalidade do artigo 283, concedendo a cautelar pleiteada. Contudo, prevaleceu o
entendimento de que a norma não veda o início do cumprimento da pena após esgotadas as instâncias
ordinárias.

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