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REFLEXÕES INTRODUTÓRIAS

SOBRE SAÚDE MENTAL E


TRABALHO
RELAÇÕES ENTRE DOENÇA E SAÚDE
 Grécia Antiga: Hipócrates → doença
como uma totalidade → elaboração de
regras e conselhos para a prática
médica; atribuição das doenças ao
desequilíbrio entre os quatro elementos
do corpo humano (o sangue, a linfa, a
bílis amarela e a bílis negra).
 Idade Média: Medicina como instituição para cuidar dos
doentes → período de doenças epidêmicas: criação de
clínicas, sanatórios e asilos.
PRIMEIRAS ELABORAÇÕES SOBRE
TRABALHO E SAÚDE
 Século XVI (1556), Georg Bauer: suspeita
de que o trabalho poderia ser causador de
doenças → problemas relacionados à
extração de metais e à fundição de prata e
ouro → "asma dos mineiros".

 Trabalho ignorado: não contribuiu para a


proteção da saúde dos mineiros.

 1700: médico Bernardino Ramazzini (Pai da Medicina do


Trabalho) descreveu várias doenças concernentes a 50
profissões distintas.
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 Revolução Industrial: trabalhadores a serviço dos
capitalistas, máquinas, fábricas, subjugação dos operários,
exploração de mulheres e cças, horas de trabalho ilimitadas,
trabalho noturno, ambiente insalubre (fechado, mal
iluminado) → muitos acidentes de trabalho e doenças.
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 Primeira lei de proteção à saúde dos trabalhadores, a Lei da
Saúde e Moral dos Aprendizes: Parlamento Britânico →
máx. 12 hrs/dia de trabalho, proibição de trabalho noturno
e a necessidade de ventilação nos locais de trabalho →
"lapso": sem limite de idade para o trabalho: crianças
trabalhando → sem fiscalização: nada adiantou.

 1831: parlamento britânico estabelece comissão


parlamentar de inquérito (CPI) → nova legislação de
proteção aos trabalhadores, o Factory Act (1833): idade
mínima para o início do trabalho (9 anos); proíbe o trabalho
noturno para menores de 18 anos; crianças trabalhando no
máximo 12 hrs/dia e 69 hrs/semana.
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 Criação do Inspetorado de Fábricas: garantir cumprimento
das leis.

 1840: doença vista como "desvio da normalidade:


intervenção do médico e adoção de uma terapêutica
adequada → busca pela neutralização dos sintomas,
reconquista da saúde.

 Auguste Comte extraiu conceitos da medicina (organização,


organismo, corpo social, consenso, norma e sistema) para
designar o "estado da sociedade" → doença como uma falha
ou perturbação na estrutura corporal que impedia as
pessoas de produzirem.
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 1913, Inglaterra: publicação de
Psychology and industrial
efficiency → estudo de aspectos
psicológicos relacionados ao trabalho
com objetivos definidos: "Como
encontrar o melhor trabalhador
possível, como produzir o melhor
trabalho possível, como chegar aos
melhores resultados possíveis".
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 1940, EUA, Henry E. Sigerist: pensar em
saúde → considerar aspectos sociais →
o bom equilíbrio entre corpo e mente
(indivíduo sadio) harmonizado com
entorno físico e social, capaz de
adaptar-se às mudanças ambientais,
contribuindo para o bem-estar da
sociedade segundo sua capacidade.

 Pós 2ª G.M, França: obrigação de


serviços médicos em empresas (a partir
de 10 trabalhadores).
RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E SAÚDE
 1959, OIT (com base nos resultados franceses): recomenda
que países-membros organizem serviços médicos em todos
os locais de trabalho .
E NO BRASIL?
 Subordinação colonial à Portugal, estrutura de colônia
agrária e escravocrata até século XVIII → industrialização
tardia + subordinação econômica e política aos países mais
desenvolvidos = práticas orientadas pelo capital estrangeiro.

 Controle dos sindicatos por parte do Estado: proibição de


greves e instituição de baixos salários.

 Não seguiu a recomendação da OIT, de 1959.


E NO BRASIL?
 1969: primeiras estatísticas sobre acidentes de trabalho.

 Em 1972: Ministério do Trabalho baixou a Portaria 3.237,


tornando os serviços médicos na empresa obrigatórios.

 Criação dos Serviços Especializados de Segurança e Medicina do


Trabalho (SESMT): equipe multiprofissional (médicos,
enfermeiros, auxiliares de enfermagem, engenheiros e
supervisores de segurança).

 1969: seguro-acidente como política de benefícios acidentários,


incorporada como cobertura prestada pela Previdência.
E NO BRASIL?
 1973: primeiros cursos de medicina do trabalho na USP.

 1978, Portaria 3.214: MTPS estabelece normas reguladoras da


medicina e segurança do trabalho.

 1988: a saúde do trabalhador como prática institucionalizada no


Sistema Único de Saúde (SUS).

 Luta sindical → A Central Única dos Trabalhadores (CUT)


organizou o Instituto de Saúde no Trabalho para assegurar
direitos dos trabalhadores.

 1999: MPAS publica o Decreto 3.048, discrimina os Transtornos


Mentais Relacionados ao Trabalho.
REALIDADE DOS FATOS
 Estatísticas sobre acidentes de trabalho e doenças laborais:
contribuição que o trabalhador paga ao crescimento e
competitividade → imposto do sangue.

 Lógica da produção capitalista: interesse que a força de


trabalho desempenhe tarefas com saúde .

 Condições desfavoráveis de trabalho podem "desgastar" o


trabalhador, que, como qualquer outra peça da
engrenagem, pode vir a ser eliminado do processo de
produção.
REALIDADE DOS FATOS
 Trabalho pode tanto ser benéfico quanto destruidor em
relação à saúde de quem trabalha.

 1980: novas formas de gestão da produção originaram-se


no intuito de contar com a adesão dos trabalhadores,
elevando a produtividade.

 Elementos essenciais da nova estrutura organizacional: a


iniciativa individual, o raciocínio lógico, a atividade cognitiva
intensa, a criatividade, a capacidade de assumir riscos e
reagir com presteza, habilidade para tomar decisões com
fim de solucionar problemas.
REALIDADE DOS FATOS
 Condenação do trabalhador taylorista: apassivado, segue
ordens, não se qualifica, separa corpo x mente →
inadequado.

 Discurso institucional (mídia): exige profissionais capazes de


processar informações complexas → discurso imposto como
lei: ativa mecanismos psíquicos, como o sentimento de
culpa → pressão do sujeito: constante estado de angústia
por não poder corresponder a sua própria idealização.

 Saúde e doença mental tem forte correlação com as


atividades do homem e com sua maneira de lutar pela
sobrevivência e constituir sua identidade.
REALIDADE DOS FATOS
 Grande medo do trabalhador: perder emprego → saúde,
remanejamento, enxugamento, reestruturação produtiva. →
geram impacto paralisante no trabalhador, que se vê usado
como objeto → desemprego surge como violência.

 Trabalhador excluído da realidade de trabalho divide espaço


com trabalhador ainda empregado, mas com medo →
desigualdade no trato social que pode levar ao sofrimento
no trabalho.
PROPOSTAS TEÓRICAS EM S.M E
TRABALHO
 1952: aparecimento da terminologia "psicopatologia do
trabalho" apareceu em 1952, com psiquiatra Paul Sivadon

 1952 e 1954: Louis Le Guillant publica dois artigos relativos


à psicopatologia social e à psicologia do trabalho
(terminologia adotada: psiquiatria ocupacional, saúde
mental ocupacional ou Psiquiatria industrial).

 Década de 1950: psicopatologia do trabalho restrita →


crença de que o papel do trabalho no surgimento de
distúrbios psiquiátricos atuaria como elemento
"desencadeante" em um indivíduo predisposto.
PROPOSTAS TEÓRICAS EM S.M E
TRABALHO
 Medicina do trabalho: enfoques preventivos se
concentraram nas "condições de trabalho“ (aspectos físicos,
químicos e biológicos) → desconsidera questão do poder,
ligada à questão administrativa e gerencial, com toda a sua
rede de relações intersubjetivas.

 Organização do trabalho: lugar central na relação entre


saúde mental e trabalho → aspecto culturais e
organizacionais: considerar várias facetas, de questões
jurídicas (legislação trabalhista) à interface família-trabalho.
PROPOSTAS TEÓRICAS EM S.M E
TRABALHO
 Repercussões do trabalho sobre a saúde mental: estudadas
em abordagens diversas:

1) Ênfase o conceito de estresse, salientando perspectiva


psicofisiológica, estudos epidemiológicos, embora alguns
considerem aspectos sociais; pesquisa quanti.

2) Enfoca estudo da subjetividade e dinâmica intersubjetiva,


que integra o referencial psicanalítico à análise da vivência
no trabalho; pesquisa quali. → estudos de origem francesa,
Christophe Dejours, psicodinâmica do trabalho: conceito
central é o de sofrimento mental.
PROPOSTAS TEÓRICAS EM S.M E
TRABALHO
3) Prevalência das ciências sociais: enfatiza a "dinâmica da
dominação" → análise pela "ótica do poder" e "desgaste”
→ desgaste mental => desgaste psicoorgânico.

 Novas correntes: centralidade no reconhecimento ou não


reconhecimento no adoecimento vinculado ao trabalho →
questão identitária no trabalho

 Tdentidade depende da alteridade: noção de quem somos


→ tendência a identificar sujeito com a atividade →
reconhecimento ou negação como fator importante para
saúde do trabalhador.
TRANSTORNO MENTAL E TRABALHO:
BREVES INTERPRETAÇÕES
 Nexo causal entre trabalho e transtorno mental:
constitucional (genética, posição biologicista, indivíduo VAI
adoecer) X psicogênica.

 Constituída nas relações objetais na infância (Dejours) →


polêmica: não existe doença mental específica decorrente
das condições de trabalho (psicoses de trabalho).

 Considerar 3 peculiaridades da relação homem-organização


do trabalho essenciais: a fadiga (limita a versatilidade da
mente); o sistema frustração-agressividade reativa (obstrui
a energia); e a organização do trabalho.
TRANSTORNO MENTAL E TRABALHO:
BREVES INTERPRETAÇÕES
 Organização do trabalho: exerce sobre pessoas ação
específica, que recai sobre aparelho psíquico → choque
entre história individual e forma de organização da
produção que ignora a subjetividade.

 Produção de sofrimento: giro → sofrimento patogênico


(possibilidades de liberdade na transformação laboral já
utilizadas e quando findaram os recursos de defesa
psíquica/impedido de agir-não relação com atividade em
si), e sofrimento criativo (o sujeito consegue elaborar
soluções originais que são favoráveis à produção e à saúde)
TRANSTORNO MENTAL E TRABALHO:
BREVES INTERPRETAÇÕES
 1990: mudança terminológica: de “psicopatologia do trabalho”
para “psicodinâmica do trabalho” → psicanálise como instrumento
inadequado para estudar relações no trabalho: nunca abriu mão
das categorias conceituais da psicanálise.

 Trabalho e transtorno mental para Louis Le Guillant: produto de


contribuições biopsicossociais → multidimensional → compreender
a influência das condições de vida e trabalho sobre a saúde
mental.

 Discussão: interpretação dos fenômenos de ordem psicossocial:


refuta viés sociologizante (nega a singularidade) e psicologizante
(abstrai a pessoa das relações laborais concretas e restringe o
político à dimensão psicodinâmica) → psicopatologia social:
conflito de classes como elemento importante, trabalho como
decisivo para compreender transtornos mentais.

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