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O existencialismo

de Simone de Beauvoir

Prof. Kissel Goldblum


Existencialismo, Fenomenologia e Humanismo
Simone de Beauvoir
Simone de Beauvoir (1908-1986) escritora
e feminista francesa, membro da tendência
intelectual de filósofos-escritores que
deram uma transcrição literária aos temas
do existencialismo. Ela é conhecida
principalmente por seu tratado Le
Deuxième Sexe, 2 vol. (1949; O Segundo
Sexo), um apelo erudito e apaixonado pela
abolição do que ela chamou o mito do
"eterno feminino". Tornou-se um clássico
da literatura feminista.
Simone de Beauvoir (por Nathan Menezes)
Beauvoir contra o eu liberal

(Citação organizada por Nathan Menezes)


Uma Moral existencialista
O sujeito é liberdade e necessidade.

Embora transcendente, consubstancia-se num solo material.

Estrutura existencial do sujeito.

Modo se ser particular à subjetividade humana.

Ontologia marcada por uma ambiguidade. Essa ambiguidade será um operador conceitual.

O sujeito é Liberdade e Necessidade (Um operador ambíguo)

Ele se lança, mas tem um ponto de partida. Ele se escolhe de acordo com o que foi feita
socialmente.
O Eu de Beauvoir
“Infra Estrutura ontológica” (como ela diz no Segundo Sexo) marcada pela ambiguidade, que tem três
pontos fundamentais:

1. Sujeito é um movimento livre comprometido com o ser ou (fenomenologicamente falando, com


o mundo). Ele desmonta, ele vai além (por isso uma transcendência, Ao mesmo tempo ele não
perde seus vínculos. Ele está sempre vinculado.

2. Esse vínculo de presença “fenomenal de sujeito” é realizado pelo corpo. O sujeito é um


movimento corpóreo antes de ser um movimento intelectual. O sujeito é um movimento sensível
corpóreo. Um “abertura motora”.

3. Essa subjetividade se constitui com o outro, quer dizer, com algo que não é ele mesmo.
(Citação organizada por Nathan Menezes)
O que é o sujeito?
O sujeito não é uma interioridade.

O sujeito não é um eu. Um subjetividade em si mesmo.

O sujeito é movimento em direção àquilo que não é ele mesmo. Ele está sempre em direção
ao outro. É própria à sua constituição ontológica ser um movimento que se abre em vínculo
com aquilo que lhe é outro.

Esse movimento é livre pelo fato de que ele não tem um ser predeterminado. Ele é
determinado pela espontaneidade.

Ele está sempre se constituido, se realizando.

O sujeito é um devir (Segundo Sexo)


Enraizamento do sujeito

Como o sujeito está enraizado, ele submerge, mas ele nunca deixa de estar vinculado, ele
não desfaz da concretude de suas raízes.

As situações apresentam uma certa organização específica. Estrutura material da


sociedade.

O sujeito não define sua situação por si mesmo.


Situações hierarquizada

Pretensões ontológicas sempre assumem uma posição concreta segundo as possibilidades


materialmente constituídas.

Então a ambiguidade serve para marcar: o sujeito é determinado porque é um corpo. Esse
corpo é uma abertura sensível - vulnerável -

O sujeito é um corpo que se abre para aquilo que ele não é. O sujeito está sempre apelando
à alguma coisa que não é ele mesmo para se constituir. As estruturais materiais e as
relações com os outros, essas relações empíricas, diretamente com outros singulares, elas
fazem parte do que essa subjetividade é.
A Morte do corpo
O ponto da finitude do sujeito é que ele não é sozinho. Ele se constitui com o outro.

“O corpo é uma situação” (Segundo sexo II) Porque ele é a minha tomada de posse do mundo”

“O corpo depende da situação, não é a situação que depende do corpo”.

O corpo me mostra esse comprometimento com o campo fenomenológico do mundo, e ao


mesmo tempo, ele depende da situação, porque a maneira que ele se torna inteligível depende
da estrutura cultura, contingente historicamente. Porque quando ele se experimenta, ele se
experimenta pelo corpo, carregado de significados históricos. Não existe essa apreensão
“pura” do corpo, é em cima da cadeia de significados do corpo que o conhecemos. Não o
conhecemos em seu “fenômeno puro”.
A existência da Moral
Em cima disso ela vai resgatar na Moral da Ambiguidade.

Fazer uma espécie de retorno a esse momento primeiro onde o sujeito é,

A gente pode encontrar aí uma espécie de direções mínimas de como o sujeito deve agir.

A moral não é algo a priori que eu tenho que enquadrar em cada situação particular, mas isso não
quer dizer que não exista moral. É preciso disputar esse terreno da moral. Porque ou você assume
a moral e cai num moralismo conservador abstrato, ou você foge disso e aí não tem
normatividade mínima para conduta do sujeito.

O ponto dela é que tem sim: uma moral da ambiguidade calcada nessa estrutura mínima que é o
próprio sujeito.
Ela reconhece essa ambiguidade do sujeito entre o mundo histórico feito em relação aos
outros. Estão, portanto, separados e ligados ao mesmo tempo, essa ligação é mediada pelo
mundo. Eu reconheço o outro a partir do que a minha situação permite em relação ao
outro e a si mesmo.
Mas como formalizar isso? A partir de uma inspiração kantiana, ela afirma que há uma
intuição que devemos notar, na Fundamentação da Metafísica do Costume: o sujeito já é
livre, porque ele não é determinado pela mecânica fenomenológica da natureza, mas como
essa liberdade é negativa, ela não garante nada, é só a apreensão do distanciamento radical
que existe entre a natureza e o sujeito. Então essa moralidade é uma moralidade de adesão
em se comprometer em permanecer livre tal como ele já estava dado, e nesse movimento
já está dado a possibilidade de ele se escolher livremente, de tal modo a não comprometer
a liberdade dos outros. Então esse sujeito pensa em como pode ser livre em relação aos
outros. É isso que ela resgata do Kant. Ela afirma na Moral da Ambiguidade. Pra mim a
escolha moral
Eu sou uma liberdade espontânea, eu sou livre com o vir a ser no mundo, não
depende do que eu quero conscientemente. Isto é o momento negativo da
liberdade, “uma irrupção original contingente” é o fato de eu estar aqui nesse
devir contínuo. Mas para eu ser livre, preciso me querer livremente.
Eu posso retornar à essa liberdade para extrair dela um certo princípio que, embora oriente
as ações, precisa ser sempre recalculado às situações concretas. Não existe um princípio
que se aplique verticalmente.

O que nos remete à questão do enraizamento.

Quando eu retorno a essa ambiguidade constituinte, eu percebo que sou um movimento


que se compromete e se conquista sempre a partir do mundo. Então eu posso utilizar isso
como uma normatividade ambígua.

Todo sujeito está comprometido em se recuperar a partir de sua situação mundada, de


acordo como seu solo é constituído. Estou comprometido com um mundo que é feito
também pelos outros. Quando eu me escolho eu já fui feito fundamentdo pelos outros.
Quando me coloco como fim a mim mesmo, me coloco no meio de uma ação constituída
pela série de sujeitos também enraizados nestas situações.

Então querer-se livre genuinamente é querer uma situação liberaladora. E como essa ação
é coletiva, querer-se livre é querer-se livre em uma situação liberadora coletiva.

A liberdade como privilégio é uma ilusão do eu liberal.

Essa ambiguidade essencial nos mostra que não tem como ser livre sozinha.
No campo em que me constituo com outros posso ser violentado por outros ou violentar
outros. A interdependência é o que me permite me relacionar com outros e isso,
obviamente, permite que essa relação possa ser problemática. Porque o sujeito é
dependente. Mas o problema não é a dependência, porque ela é ontológica, o problema é
como procuramos nossa liberdade.

E construir essa liberdade exige, para uma verdadeira realização, a noção de coletividade.
Porque enquanto conservarmos privilégios nunca alcançaremos a verdadeira liberdade do
indivíduo.

Sempre que estiver em jogo a partilha das situações, está em jogo um noção de política
que não pode ser negligenciada.
Uma Moral Ambigua

Neste livro, Beauvoir relata um caso particular: Eu posso ter um amigo que me procurou
para pedir dinheiro para comprar uma droga. Se eu partir de uma moral absoluta eu
deveria pensar “drogas são ruins não devo emprestar”. No entanto, ela vai dizer, eu
preciso ver como minha ação vai situar esse sujeito aqui e agora, as vezes, por exemplo, se
eu sei que se eu não der algo sabendo que se eu não der, eu sei que ele vai se relacionar
com situações mais perigosas. E, daí, posso pensar a longo prazo para otimizar essa
relação. Quer dizer, cada questão precisa ser pensada de acordo com a organização da
situação. Ou seja, não estamos aplicando uma moral abstrata à situações práticas.
Como se situar no mundo

Pela situações dadas pelo enraizamento eu percebo que não sou um resultado mecânico do
mundo, também não sou uma tábula rasa. Eu me reinvento, dado que sou um devir. No
entanto, o sujeito se reinventa de acordo com o que já foi feito.

Sujeito ambiguo
Sartre vs. Beauvoir

No Ser e o Nada, Jean-Paul Sartre afirma:

O para si não depende da situação, ele se projeta sobre a situação. A situação muitas vezes
é um campo passivo que se constitui apenas do sujeito. Quando o sujeito se lança, ele se
lança absolutamente de si, do nada.

A separação absoluta entre meio e fins. Porque o ponto de partida é a forma como essa
subjetividade está encarnada e enraizada no mundo. Quando a liberdade se compromete
com o mundo ela se afirma como liberdade, ela se afirma livre aqui e agora, mas querendo
se conquistar depois, ela está sempre se manter livre mas se manter livre enquanto ela é
livre em direção a si. O fim está remetido ao meio e o meio está remetido ao fim.
Destino (Segundo Sexo)

Quando você tenta pré determinar o sujeito, determinar uma conduta moral à qual todos os
sujeitos caminhariam. Você está fechando as situações do sujeito. Querendo impor um
destino ao sujeito.

Então devemos pensar nestas questões relacionadas à conscientização da necessidade de


atentar a ecessidade de não fechar a situações dos outros.

Se reconheço minha liberdade, a necessidade de conquistá-la.

Tenho que estar comprometido que o mundo permita isso de uma


O conceito de má fé para Beauvoir é que má fé é não reconhecer que minha liberdade está
comprometida com a dos outros. Eu tenho que lidar com isso de qualquer forma.

Considerar o outro nestes termos.

Preciso desejar situações abertas devido a essa intrínseca relação.

Quando me escolho, eu estou levando em consideração o outro. Por isso não existe uma
subjetividade fundada em si.

A minha liberdade está situada - enraizada.


Princípio moral da ambiguidade

Relação do existencialismo com o marxismo:


O sujeito não é - antes de tudo - uma consciência.

O sujeito, antes de tudo é corpóreo. Então essa dependência precisa ser trabalhado. Esse
solo precisa ser cultivado.

A liberdade só se realiza em comunidade.

No fim das contas, a liberdade é alguma coisa coletiva. Quando existe uma estrutura social
coercitiva, você constrói uma sociedade coletivamente coercitiva.
A moral não está morta

A universalidade da moral ela precisa ser ambígua, não pode perder esse horizonte livre.
Mantendo o solo livre.

A situação determina, mas determina ambiguamente.

A liberdade não é alguma coisa jogado ao futuro nunca recuperado. Eu preciso querer a
liberdade, mas querê-la atualizando-a aqui e agora.

O sujeito sempre introduz o nada no que ele faz, mas essa nadificação é feita a partir de
um comprometimento prévio. E esse comprometimento não é tirado do abstrato.
A liberdade como ponto de partida

Esse ponto de partida é o que permite a liberdade. Permite confirmar que estou sendo livre
genuinamente. Preciso compartilhar esse solo, abandonando as situações privilegiadas.

O que esse sujeito da Beauvoir está dizendo que precisamos resgatar a importância.

Não é problema que haja uma raiz, o problema é que haja uma estruturação que impeça a
ação da subjetividade.
Um perspectiva moral
Então estou analisando a situação da mulher, estou dizendo que essa situação é inaceitável
moralmente.

Pensar a moralidade de maneira radical, preciso entender que o sujeito homem não pensa a moral da
perspectiva da mulher. E esse é um problema moral.

Porque se analisarmos isso a partir de ambiguidade moral, compreenderemos as diferenças das


situações, diferenças das raízes.

É um problema moral de liberdade e ao mesmo tempo político. Porque para modificar isso, preciso
modificar as estruturas políticas e econômicas da sociedade. Modificar de fato essa situação que
influencia a subjetividade de um gênero específico. É sempre um problema do ponto de vista político.
Relação entre moral e política

O sujeito está comprometido moralmente e politicamente devido à essa estrutura ambígua


que lhe faz comprometido a esse solo comum que ele depende e ao mesmo tempo depende
dele para que seja refeito continuamente.

Todo mundo deveria ser genuinamente moralmente livre.

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