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Legislação Penal Especial 2

Lei de Execução Penal


Aulas 1 e 2
Prof. Dr. José Eduardo L. dos Santos
ASPECTOS GERAIS
O sistema repressivo (punitivo) é o mais rigoroso instrumento de
controle social, pois usa a sanção penal como ameaça e punição (ortopedia
moral, medicina da alma).

a) Teorias sobre os fins (finalidades) da pena:


A doutrina tem feito uso das mesmas para tentar explicar os
fundamentos da pena. Existem várias teorias, mas todas elas decorreram das
principais abaixo:
- Teorias absolutas: quem pratica um mal, deve sofrer um mal. A pena se funda
na “justa retribuição”, não servindo para outra coisa a não ser recompensar
mal com mal. Punir o passado. Racionalmente não se pode apagar mal
cometido, com outro sofrimento (não é democrático e nem científico).
Vingança divina/privada/pública;
- Teorias relativas: partem da concepção utilitária da pena
(“prevenção”), por meio de seus efeitos preventivos:

* prevenção geral (sociedade): pelo aspecto “positivo” reafirma a


existência do Direito; pelo aspecto “negativo”, representa a pena
uma intimidação, uma ameaça contra todos;

* prevenção especial ou específica (criminoso): pelo aspecto


“positivo”, busca evitar a reincidência, com a ressocialização do
condenado; pelo aspecto “negativo”, busca intimidar o criminoso,
aplicando-lhe a sanção penal, que, em alguns casos, pode
representar sua prisão (ou morte).
Roxin: prevenção especial e geral positivas (T. unificadora dialética).
- Teorias unitárias (mistas ou ecléticas): combinam as duas
anteriores, “reprovação e prevenção” (em todos os seus
aspectos).
Obs: artigo 59 do CPB

- Teorias absolutas:
* abolicionismo;
* direito penal máximo.

Destaca-se que finalidade da pena se refere para o que ela


serve. Já função da pena significa o papel que ela desempenha
em uma sociedade concreta.
b) Fundamentos da pena: devem ser considerados 3 momentos:

- Da cominação (ameaça): visa a pena a proteção de bens jurídicos de


especial valor, sendo o Direito Penal a ultima ratio. No momento em
que uma pena é “prevista” em lei para determinado crime, seu fim
principal é atuar sobre os destinatários (cidadãos) para que estes não
pratiquem crimes (prevenção geral);

- Da imposição: com a transgressão da lei se impõe a pena, por meio


da perda de bens jurídicos (fundamento é a prática do delito). O
objetivo é demonstrar a efetividade da ameaça (prevenção geral e
especial);
- Da execução: a pena tem como fundamento a
sentença condenatória, a qual limita os direitos a
serem atingidos pela mesma, com a perda ou
diminuição de bens jurídicos do condenado. Visa-se a
ressocialização, isto é, a finalidade é de reincorpora-lo
à sociedade (prevenção especial).
c) Conceito de pena: é a perda de bens jurídicos imposta por
órgãos da Justiça à quem comete crimes. Trata-se de sanção
característica do Direito Penal, sendo retributiva e preventiva,
conforme teoria adotada no nosso Direito. É sinônimo de
castigo.

Existem princípios relacionados à pena: da legalidade;


da personalidade; da proporcionalidade; da individualização;
da humanidade; da inderrogabilidade (constatada a prática
de um crime, a pena não pode deixar de ser aplicada, como
regra).
d) Medidas de segurança: As insuficiências do sistema penal clássico
fizeram surgir as medidas de segurança, que, fundadas na
periculosidade do agente, deveriam ter natureza assistencial,
medicinal ou pedagógica. As medidas de segurança também se
dirigem à defesa social e através dela se justificam. São medidas de
caráter penal (e não administrativo), aplicadas pelo órgão da justiça
criminal.
Não existe diferença ontológica entre a pena e medida de
segurança.
O CP vigente, bem inspirado, abandonou o sistema do duplo
binário (pena e medida de segurança impostas sucessivamente), e não
mais prevê medidas de segurança detentivas para imputáveis. As
medidas de segurança hoje restringem-se às medidas terapêuticas
aplicáveis aos inimputáveis e aos semi-imputáveis. Em relação a estes
últimos, adotou-se o sistema vicariante, que permite substituir a pena
ESPÉCIES DE PENAS

1 – Classificação das penas:


De acordo com o artigo 32 do CPB, no Brasil
existem 3 espécies de penas, sendo elas as privativas
de liberdade, as restritivas de direitos e a pena de
multa.
São proibidas (vedadas), de acordo com o artigo 5º,
XLVII da C.F., as penas de: morte, perpétua, de trabalhos
forçados, de banimento e as cruéis.
2 – Cominação das penas:
Pena cominada é aquela prevista em lei de forma
abstrata. Pode existir:
- isoladamente: somente uma espécie de pena é prevista
para o crime. Exemplo, artigo 121;
- cumulativamente: quando o tipo penal prevê mais de uma
espécie de pena ao crime, devendo o juiz aplicar todas elas.
Exemplo, artigo 155;
- alternativamente: quando o tipo penal prevê mais de uma
espécie de pena ao crime, devendo o juiz escolher qual delas
irá aplicar. Exemplo, artigo 147.
PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

1 – Tipos e distinção:
- prisão simples: cominada em lei para as contravenções penais, devendo ser
cumprida em regime semiaberto e aberto, onde o preso fica separado
daqueles que cometeram crimes. Sem aplicação hoje.

- reclusão: destinada aos crimes mais graves. Deve ser cumprida em regime
fechado, semiaberto e aberto. Medida de segurança do tipo internação.
Permite interceptação telefônica na investigação dos crimes.

- detenção: destinada a crimes menos graves. Cumprimento em regime


semiaberto e aberto. Medida de segurança do tipo tratamento ambulatorial.
Obs. A previsão é do próprio tipo penal (artigo).
2 – Limite de cumprimento de pena privativa de liberdade:

De acordo com a redação atual do artigo 75 do CPB, o tempo máximo de


cumprimento de pena não pode ser superior a 40 anos. Tal limite se refere ao
“tempo de cumprimento”, mas não para benefícios legais (penais e
processuais), daí se considera o total da condenação sofrida. Ver Súmula 715
do STF.

- conforme o § 1º do artigo 75, se o agente for condenado a penas cuja soma


ultrapasse os 40 anos, deverá ocorrer unificação das mesmas para obedecer o
limite legal (retroatividade?);

- de acordo com o § 2º do mesmo artigo, ocorrendo condenação por fato


posterior ao início do cumprimento da pena, realiza-se nova unificação das
penas, abatendo-se o que já se cumpriu (perde o já cumprido?).
3 – A questão dos regimes de cumprimento de pena privativa de liberdade e
a progressão de regimes:
Nosso CPB adotou um sistema progressivo que se destina a estimular o bom
comportamento do preso, mantendo a disciplina e ordem nas prisões. Parte-se do
regime fechado e termina-se com o livramento condicional.
A lei prevê 3 regimes (arts. 110 a 118 da LEP) :
a) fechado: se executa em penitenciária, em estabelecimento de segurança máxima
ou média. Os presos ficam recolhidos à noite em celas individuais, trancadas,
encerradas em galerias fechadas. Condenações superiores a 8 anos (artigos 87 e 88
da LEP);
b) semiaberto: a execução se dá em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento
similar. Condenações superiores a 4 e que não excedam 8 anos;
c) aberto: é a execução da pena em casa do albergado ou outro estabelecimento de
segurança mínima, em que não existam obstáculos (funciona a palavra do preso e o
propósito dele em se submeter as regras). Condenações iguais ou inferiores a 4 anos.
Obs.: não existindo casa do albergado deve se permitir a prisão domiciliar.
O dependente da pessoa presa no regime
fechado, (cônjuge, companheiro, filhos menores
ou inválidos, etc), tem direito ao recebimento do
auxílio-reclusão pago pelo INSS, desde que seja
ele trabalhador e que atenda aos requisitos: baixa
renda (em 2021 fixada em 1.503,25); não receba
nenhum outro tipo de remuneração ou benefício
previdenciário; tenha contribuído para o INSS por
pelo menos 2 anos – Lei 8.21391.
Caso seja reincidente, o regime é o fechado, em qualquer caso, de
acordo com o CPB:
- condenação a pena superior a 8 anos, regime fechado;
- condenação superior a 4 e não excedendo a 8 anos, não reincidente,
regime semiaberto (reincidente, fechado);
- condenação igual ou inferior a 4 anos, regime aberto, desde que não
reincidente.

Obs. os critérios adotados para se decidir a que regime deve submeter-se


o condenado são os mesmos que orientam a aplicação da pena – art. 59
do CPB.
Obs. Ver Súmula 269 do STJ, admitindo o regime semiaberto aos
reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 anos, se favoráveis
as circunstâncias judiciais. Ver Súmula 718 do STF.
Saídas:

- Permissão de saída: artigos 120 e 121 da LEP.

- Saída Temporária: artigo 122 a 125 da LEP.


Sobre progressão de regimes:
A progressão faz parte da reeducação da pessoa humana, para
voltar ao convívio em sociedade. Deve a decisão que a concede ser
motivada, precedida de parecer do Ministério Público e da defesa,
com procedimento do parágrafo 2º do art. 112 da LEP (7.210/84).
No art. 33, parágrafo 2º, está previsto que as penas privativas
de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo
o mérito do condenado. Antigamente tal mérito dependia de um
parecer obrigatório da Comissão Técnica de Classificação (membros
do presídio). Hoje tal parecer está dispensado, exigindo-se o atestado
de boa conduta carcerária, fornecido pela direção do presídio,
exigindo-se do juiz de execução maior liberalidade em relação ao
preso que cometeu crime não violento contra a pessoa.
Progressão de regimes na lei vigente hoje, leva em conta: fração de
cumprimento de pena; natureza do crime praticado; modalidade de
execução; condição pessoal do condenado; bem como seu
comportamento (Lei de execução Penal nº7.210/84, com alterações):
- cumprir 16% da pena, se não for reincidente, e o crime praticado não
tiver violência ou grave ameaça;
- cumprir 20% da pena se for reincidente e o crime foi praticado sem
violência ou grave ameaça;
- cumprir 25% da pena, se primário, e crime com violência ou grave
ameaça;
- cumprir 30% da pena, se reincidente, e crime com violência ou grave
ameaça;
- cumprir 40% da pena se for primário, nos casos de crimes hediondos e
assemelhados;
- cumprir 50% da pena se o sentenciado for: a) primário, tiver
vedado o livramento condicional, em caso de prática de crime
hediondo ou assemelhado, com resultado morte; b) condenado
por exercer comando individual ou coletivo de organização
criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou
assemelhado; c) condenado pela prática do crime de constituição
de milícia privada;
- cumprir 60% da pena se reincidente na prática de crime
hediondo ou assemelhado;
- cumprir 70% da pena se reincidente em crime hediondo ou
assemelhado com resultado morte, se vedado o livramento
condicional.
Além disso deverá o condenado ter boa conduta carcerária,
comprovada pelo diretor do estabelecimento penal.
Não se aplica a parte final do parágrafo 1º do artigo 112, a
qual veda a progressão, o que é inconstitucional.
Não mais se considera hediondo ou equiparado, para fins
de progressão, o tráfico de drogas com causa de diminuição de
pena (art.33, § 4º da lei 11.343/06).
No caso de prática de falta grave durante a execução da
pena, o tempo que já cumpriu da pena é desconsiderado, sendo
zerado e iniciando a contagem a partir de tal prática (falta grave
encontra-se prevista no artigo 50 da LEP). § 6º da LEP
Em tese, o condenado não poderá passar diretamente do
regime fechado para o semiaberto – Súmula 491 do STJ. Na
prática é diferente.

A lei de Lavagem de Dinheiro (9.613/98, alterada pela Lei


12.683/12), admite a substituição da pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos se autor, coautor ou partícipe
colaborarem espontaneamente com as autoridade, prestando
esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais,
à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou a
localização dos bens, direitos e valores do crime.
Os 16% é mais benéfico para o criminoso, retroagindo
(antes 1/6 representava 16,666%), as demais porcentagens
não o são.

No caso dos 30%, quando se fala em reincidência, não


se especificou de que tipo, sendo o melhor entendimento o
de que se trata da específica.

Alguns autores defendem que os 70% são de duvidosa


constitucionalidade, pois praticamente impediu a progressão.

Ver Súmulas 716 e 717 do STF.


4 – Cumprimento da pena mais grave em
primeiro lugar:

As penas mais graves devem ser cumpridas


em primeiro lugar, independentemente da ordem
de chegada das guias de recolhimento (peça
inaugural da execução penal). Havendo pena por
crime hediondo a ser cumprida, estas o devem ser
em primeiro lugar. Artigo 76 do CPB.
5 – A questão da regressão para regime mais grave: duas
situações provocam a transferência para regime mais
rigoroso:
a) adaptação do regime: nos termos do art. 111 da LEP,
quando houver condenação por mais de um crime, no
mesmo processo ou em processos distintos, a determinação
do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma
ou da unificação das penas, observada, quando for o caso, a
detração ou a remição. Sobrevindo condenação no curso da
execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo
cumprida, para determinação do regime.
b) regressão por falta: nos termos do artigo 118 da LEP, o condenado
pode ser regredido a regime mais rigoroso quando praticar fato
definido como crime doloso, praticar falta grave ou sofrer
condenação, por crime anterior, cuja pena somada ao restante da
pena em execução, torne incabível o regime. No caso de
cometimento de crime doloso, susta-se os benefícios do regime que
está sendo cumprido, aguardando a condenação com trânsito em
julgado, que leva ao regime mais grave (se absolvido, restabelece o
regime sustado).
Obs: O condenado será transferido do regime aberto, se frustrar os
fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa
cumulativamente aplicada.
Obs: a regressão pode se dar por saltos.
6 - Utilidade do artigo 59 do CPB: tem várias
utilidades.
As circunstâncias ali previstas são utilizadas
desde o momento de escolha do montante da
pena privativa de liberdade, passando pela eleição
do regime, até culminar na possibilidade de
substituição da privativa de liberdade pela
restritiva de diretos ou multa ou outros
benefícios.
7 – Exigência da reparação do dano ou devolução do
produto ilícito para a progressão de regime: a lei 10.763/03
passou a exigir ao condenado por crime contra a
administração pública, ainda que possua merecimento, que
seja obrigado a reparar previamente o dano causado ou a
devolver o produto do ilícito (Nucci considera
inconstitucional – atenta-se contra a reeducação e a
ressocialização da pena, ocorre discriminação econômica de
réus, a maioria dos crimes contra a administração pública
tem pena menor de 4 anos, e por isso tem vários outros
benefícios, não precisando da progressão).
8 – Conceito de Execução Penal: é a fase do
processo penal em que se faz valer o comando
contido na sentença condenatória penal,
impondo-se, efetivamente, a pena privativa de
liberdade, a pena restritiva de direitos ou a
pecuniária.
Trata-se do momento em que se faz valer a
pretensão punitiva do Estado, agora transformada
em pretensão executória.
9 – Natureza jurídica da Execução Penal: é um processo
jurisdicional com a finalidade de tornar efetiva a pretensão
punitiva do Estado, envolvendo atividade administrativa. A
execução penal é atividade complexa, que se desenvolve,
entrosadamente, nos planos jurisdicional e administrativo,
envolvendo órgãos do poder Judiciário e Executivo
(estabelecimentos penais).
É de se ressaltar que cabe exclusivamente a União, legislar
em matéria relacionada a execução penal, no que se refere a
normas de direito penal e processual penal. Já se a matéria for
relativa ao direito penitenciário, tal competência é concorrente
com Estados e Distrito Federal.

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