• A economia portuguesa, de uma forma resumida, pode ser considerada em
cinco fases sucessivas, durante o período em que o Brasil foi colônia:
• De 1500 a 1581 – período áureo do comércio e do poderio português que
de fato, se estendeu até 1595; • De 1581 a 1640 – período filipino em que Portugal esteve submisso à Coroa espanhola, ocorrendo o esfacelamento de sua economia; • De 1640 a 1675 – período que se caracterizou pelas concessões comerciais feitas pela Coroa portuguesa às grandes potências, principalmente à Inglaterra, para manter seu império; • De 1675 a 1777 – período e que ocorreu a restauração econômica de Portugal; • De 1777 a 1808 – período em que o comércio floresceu.
• Desde 1808, com a transferência da seda da monarquia portuguesa para o
Brasil, este pode ser considerado economicamente independente de Portugal. • A fase inicial da história da economia brasileira antecede a colonização: vai do descobrimento (1500) até o estabelecimento das donatarias (1534). Compreende um período de 34 anos de fatos obscuros, vagos, quando não controvertidos. A falta de documentos fidedignos da época restringe bastante a pesquisa da história luso-brasileira. Alguns dados, no entanto, possibilitam conclusões, genéricas na maioria.
• O fato de não terem sido encontrados, de imediato, metais nobres para o
saque frustrou, até certo ponto, o descobridor. • Além da famosa carta de Pero Vaz de Caminha, Cabral tomou algumas medidas para assegurar a posse e facilitar a tarefa de expedições exploradoras que sucederia a sua esquadra. O Brasil, além de não oferecer condições iniciais para a extração de ouro e prata, que era o objetivo imediato dos descobridores, não possibilitava transações comerciais como as que eram mantidas com o Oriente. Nessas condições, a solução era o próprio colonizador povoar e explorar economicamente a terra, em síntese, colonizar, o que não se ajustava ao interesse imediato da metrópole. • Nas primeiras transações comerciais feitas em portos da costa ocidental africana, os portugueses trocavam tecidos, lenços e mantas por ouro, marfim, escravos, goma-arábica e outros produtos. O comércio do ouro chegou a ser intenso no período 1493-1520, declinando a seguir. As ilhas atlânticas, principalmente Canárias, Açores e Cabo Verde, ofereciam uma promissora produção de açúcar, produto de crescente procura no mercado europeu. A chegada de Vasco da Gama a Calicute, descobrindo a rota marítima para as Índias, seduzira completamente a Corte portuguesa. O Oriente tornou-se, assim, o principal centro de interesse comercial de Portugal, ficando o Brasil em uma posição secundária. • Desde a primeira expedição exploradora (1501), que levou para Portugal diversas espécies de vegetais e animais, o pau-brasil despertou certo interesse comercial, a ponto de a Coroa estabelecer, de imediato, a exploração como seu monopólio. Esse monopólio assinala bem um dos aspectos da política colonial que Portugal iria adotar com relação às novas terras. O pau-de-tinta, como também era conhecido por ser madeira tinturial, era empregado na Europa para tingir tecidos e para a confecção de peças nobres de carpintaria e armação de naus. O produto, embora proporcionasse pouca renda à Coroa portuguesa, ajustou-se bem ao modelo mercantilista-colonialista adotado por Portugal.
• A exploração do pau-brasil, no início, serviu como um período de pesquisas
e estudos das novas terras para o desencadeamento de um processo de aproveitamento adequado da colônia. Os pequenos povoados que pontilhavam o litoral atenderam a esse fim. • A riqueza vegetal do Brasil passou logo a interessar aos mercados europeus. O pau-brasil seria apenas uma amostra. A ameaça constante de piratas e corsos de diversas nacionalidades, principalmente de entrelopos franceses que aqui aportavam, comprometia, no entanto, a segurança do comércio português e da própria possessão lusa. Os franceses desembarcavam constantemente no litoral, onde se estabeleciam um ótimo relacionamento com os autóctones, que os preferiam aos portugueses. • Portugal não podia manter a Colônia em tal estado de abandono; os arrendatários não eram capazes de estabelecer as bases necessárias à sua defesa contra os ataques estrangeiros. Decidiu, por fim, a Coroa portuguesa avocar a si a defesa de suas terras na América. Surgiram então as primeiras povoações, misto de postos militares e núcleos comerciais. • As feitorias eram construções rústicas – sediadas no litoral, em local de fácil atracação de navios – erguidas por grupos reduzidos de homens, na maioria degredados, desertores e náufragos, que se encarregavam da derrubada e transporte de toros para a praia. A participação dos indígenas, que colaboravam na base do escambo, foi de maior importância tanto no transporte de toros como no embarque para as naus, quando o serviço não era executado pela própria tripulação. Na falta de feitorias, a tripulação das naus realizava o abatimento, transporte e carregamento dos toros.
• Ocorreram nessa época os primeiros ensaios de uma agroindústria
açucareira rudimentar. As noticias sobre as feitorias são, no entanto, por demais deficientes. Algumas desapareceram com o ataque dos silvícolas e dos piratas e corsários; houve, no entanto, uma preocupação constante da metrópole em mantê-las e fortificá-las, até que surgissem condições para melhor exploração da nova terra. • A notícia da existência de ricas minas de metais dos incas chegou à Europa, mesmo antes de Pizarro e Almagro desembarcarem na costa do Pacífico. Fácil se torna, então, compreender o fato de a expedição de Martim Afonso de Sousa se dirigir para o sul e permanecer mais tempo em Cananéia e São Vicente, bem mais distante da Europa do que o Nordeste, onde já se extraiam alguns produtos de valor comercial para o mercado europeu. Martim reconheceu o litoral e, ao retornar, fundou a Vila de São Vicente, a primeira instalada no Brasil (1532).
• A busca dos metais foi, sem dúvida, o fator principal dessa
expedição, mas não se pode, por outro lado, deixar de reconhecer o seu trabalho pioneiro colonizador, deixando mudas de plantas, gado e, provavelmente, escravos da Guiné, no sentido de promover experiências em diversos pontos do litoral, principalmente em São Vicente. Na ausência de metais impunha-se a colonização, pois inclusive, havia outros fatores a considerar: • As descobertas auríferas em Cuba (1512) e no México (1519) e a confirmação de indícios de minas de prata no Peru (1526) provocavam a miragem do El Dorado no interior das terras portuguesas, aguçando, ainda mais, a cobiça dos países não- tordesilhanos;
• A ascensão de Henrique VIII ao trono na Inglaterra, e de Francisco
I, na França, aumentava a pressão política sobre os países ibéricos no sentido de povoar as colônias, sob a alegação de que só tinham direito às terras que efetivamente ocupassem;
• A ação constante dos corsários e entrelopos no litoral da colônia,
na pilhagem de espécies vegetais de valor comercial, ao ponto d se fixarem no Nordeste e no Norte, ameaçando os direitos portugueses; • A colônia no continente americano constituía fator de segurança para o trafego marítimo português pelo périplo africano, entre a Europa e as Índias orientais;
• O mercado europeu apresentava os primeiros sintomas de saturação dos
produtos orientais, com efeitos depressivos sobre o comércio com a Ásia; além do mais, a retomada, por Veneza, do comércio de especiarias com o Oriente Médio, pela via mediterrânea, em 1516, aumentava a oferta de produtos, até então monopólio de Portugal, baixando seus preços na Europa;
• A queda do comércio aurífero em portos africanos, a partir de 1521,
deixava de ser atraente por não possibilitar maior acumulo de metais ao Tesouro Real português;
• A falta de capacidade da metrópole em manter a lucratividade desejada,
como intermediário, provoca um natural declínio do comercio de especiarias do Oriente e produtos manufaturados da Europa, exigindo novas fontes de renda para a Coroa Portuguesa. • Portugal não apresentava, todavia, condições para investir na colonização de terras com tão extensa faixa marítima. Os gastos com as Índias orientais, agravados com a inflação crescente na Europa, haviam depauperado o Tesouro Real. A situação interna de Portugal dava mostras de a léguas exaustão, a administração tornara-se por demais onerosa. A colonização teria que ser atribuída, então, à iniciativa privada. A solução seria o sistema de donatarias. • A solução das donatarias já havia sido adotada nas ilhas atlânticas por Portugal, bem como, posteriormente, em toda a América, por espanhóis e ingleses.
• A área do Brasil, então estimada em cerca de 80.000 léguas
quadradas (480.000 km2), foi dividida em quatorze lotes de cinqüenta léguas de costa e paralelas perpendiculares à linha de Tordesilhas. Esses lotes foram doados – entre 1534 e 1536 – a doze donatários ou capitães, aos quais a Coroa delegou poderes para governar soberanamente, administrar justiça e mobilizar recursos para lutar contra o eventual invasor. Eram na maioria fidalgos, e muitos financiados por capitais estrangeiros. O total de das áreas abrangia, de modo geral, um terço do atual território brasileiro. Foram criadas, posteriormente, outras donatarias, pela expansão da fronteira política e pelo valor econômico adquirido por certas regiões. • Iniciou-se, assim, de modo efetivo, o processo de colonização do Brasil.
• A legislação das donatarias é apontada por vários como confusa,
mas é admissível que seu caráter circunstancial tenha ocorrido para tanto. Sob o ponto de vista econômico, as cartas de doação, salvo variação de detalhes, assegurava aos donatários, entre outros, o direito de: • Uso efetivo de 20% das terras da donataria, sendo que os 80% restantes deveriam ser divididos em sesmarias e entregues aos cristãos que as requeressem ara cultivar, mediante o pagamento de tributo; • Exploração das marinhas de sal, moendas de água e quaisquer engenhos, não podendo, inclusive, outra pessoa instalá-las sem sua prévia licença e sem lhes pagar o foro devido; • Escravização dos indígenas em número limitado e autorização para a venda de uma certa quota - em média, 19 indígenas – por ano, no mercado de Lisboa; • Recebimento de 50% do valor do pau-brasil e do pesado, que eram monopólio da Coroa portuguesa; • Cobrança de impostos, principalmente da redízima, que correspondia a 10% da dízima recolhida pelo Tesouro Real. • Sobre as perspectivas da exploração econômica, destacam-se dois pontos de interesse na fase das donatarias:
• Previsão de descobrimento de minas de metais nobres e pedras
preciosas – objetivo que jamais deixou de ser perseguido no período colonial;
• Inicio de implantação de uma agroindústria baseada no açúcar –
produto considerado mais indicado, em face a grande procura no mercado europeu e dos resultados favoráveis na colônia, nas experiências realizadas no período anterior. • A falta de um órgão coordenador das donatarias provocou, no entanto, ma crescente dispersão administrativa. À medida que a colônia expandiu suas atividades, os interesses das donatarias tornaram-se mais independentes, e o mais grave é que surgiram condições para hostilidades recíprocas. A propósito, tem-se a considerar, alem do fato de os donatários terem sido escolhidos com base em sua posição social e capacidade financeira, que a maioria tinha pouca ou nenhuma experiência administrativa, procediam de diferentes regiões e a concepção de colonização vaiava bastante entre eles. O empreendimento, na realidade, estava acima de suas possibilidades. • O caráter hereditário da doação das donatarias e o pagamento de mão-de-obra in natura imprimiam-lhes um sentido feudal; os poderes delegados aos donatários se aproximavam muito dos que eram outorgados aos suseranos, na Idade Média. Havia, no entanto, certas características marcantes do regime capitalista, principalmente o lucro visado, a propriedade privada e a política de monopólio imposta pela Coroa portuguesa sobre alguns produtos.
• A estrutura sócio-econômica colonial com essas características
originais perdurou séculos, principalmente na região rural do Nordeste. • O insucesso das donatarias – senão total, pelo menos parcial – pode ser atribuído, basicamente, à carência de capital, às hostilidades do meio ambiente, à falta de espírito empresarial na exploração econômica da terra e, principalmente, como já foi destacado, à inexistência de um órgão central coordenador. • O século XVI assinalou o crescente poderio econômico e político da região de Flandres. As sete províncias em que se dividia a região constituíram a União de Utrech (1565), que, mais tarde, deu origem às Províncias Unidas (1572). O estado de beligerância mantido por essas províncias com a Coroa espanhola causou múltiplos efeitos sobre a economia luso-brasileira, até mesmo depois de a Coroa espanhola reconhecer a independência da Holanda.
• As crises acabaram por comprometer o poder político e militar de
Portugal e permitir que Felipe II, rei da Espanha, assumisse o trono português. Estabeleceu-se assim a União Ibérica, em 1581, iniciando-se o período filipino da história brasileira. • Os inimigos da Espanha tornaram-se inimigos de Portugal, apesar dos esforços despendidos pela Coroa e pela burguesia lusitana para manter as ligações comerciais e financeiras com os ingleses e, principalmente, com os flamengos. A interrupção desse enlace comercial atingiu profundamente a distribuição dos produtos coloniais portugueses e impediu um maior acesso de Portugal aos produtos manufaturados e aos recursos financeiros da Holanda e da Inglaterra par atender ao comércio ultramarino. • A mudança política refletiu-se no Brasil.
• A administração tornou-se mais centralizada;
• os donatários perderam grande parte de seu poder, e as câmaras
municipais sofreram restrições em sua autonomia.
• A colônia já não teve a mesma liberdade de comércio, e o poder do
Estado sobre a economia não foi maior porque encontrou forte resistência dos colonos, que tinham costumes liberais enraizados.
• No âmbito externo, o governo fechou os portos a outros países, e aos
poucos estrangeiros que viviam na colônia eram malvistos pela Coroa espanhola.
• As costas brasileiras passaram a sofrer ataques das grandes
potencias inimigas da Espanha, que tentaram, inclusive, estabelecer bases da natureza política em seu litoral.