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Determinismo e liberdade na ação humana

O PROBLEMA DO LIVRE-ARBÍTRIO

Como se pode formular


Não s
o problema do livre-arbítrio? e
LIVRE-ARBÍTRIO deve
conf u
É a liberdade da vo ndir
ntade, livre-
Este problema pode ser formulado através é ter a possibilidad ar bí t r
e io
de questões como as seguintes: de escolher entre e libe
fazer rdade
uma coisa ou fazer
• Será que existe livre-arbítrio? outra.
polític
• Será a crença no livre-arbítrio compatível a.
com a crença no determinismo?

DETERMINIS
MO
Todos os a
contecime
incluindo a ntos,
sa
são deter m ções humanas,
inados por
causas an
teriores e
leis da nat pelas
ureza.
O PROBLEMA DO LIVRE-ARBÍTRIO

De que resulta o problema do livre-arbítrio?


Quase todas as pessoas parecem acreditar que têm
livre-arbítrio.
Quando escolhemos a roupa que vamos usar
ou a comida que vamos comer, quando planeamos
o que vamos fazer no futuro não parece fazer
sentido que não tenhamos a liberdade
de escolher (ou livre-arbítrio).
Por outro lado, quase todas as pessoas parecem
acreditar no determinismo, isto é, que
os acontecimentos têm causas e ocorrem
de acordo com as leis da natureza.
Essa crença faz parte do modo como geralmente
olhamos para o mundo.
O PROBLEMA DO LIVRE-ARBÍTRIO

Mas, sendo assim, se todos os acontecimentos


têm causas anteriores, como podem as nossas
ações ser livres?

É aqui que reside o problema


do livre-arbítrio.
Apesar de o determinismo e de o livre-arbítrio
parecerem ideias plausíveis e justificadas por
boas razões, se o determinismo incluir as ações
humanas então não parece ser possível
fazermos escolhas. Isto é, talvez as ideias
de livre-arbítrio e de determinismo
sejam incompatíveis.
RESPOSTAS AO PROBLEMA
DO LIVRE-ARBÍTRIO
Existem versõ
Estudaremos três perspetivas acerca do problema es
diferentes de
do livre-arbítrio: s t as t r ês
perspetivas.
• determinismo radical No nosso estu
do
teremos em c
• libertismo ont a
sobretudo
as ideias com
• determinismo moderado uma das pers
un s a c a da
petivas.
Principais teses destas três perspetivas:
Perspetivas Temos livre- Alguma ação humana é livre? Todas as ações humanas O determinismo é compatível
-arbítrio? são determinadas? com o livre-arbítrio?

Determinismo Não Nenhuma ação humana é livre Sim Não


radical

Libertismo Sim Algumas ações humanas são livres Não, nem todas Não

Determinismo Sim Algumas ações humanas são livres Sim Sim


moderado
DETERMINISMO RADICAL
O DETERMINISMO
Tese fundamental
RADICAL É
Não existe livre-arbítrio e, portanto, nenhuma
ação humana é livre.
I N C O M PAT I B I L I S TA ?
O determinismo radical
Porque não existe livre-arbítrio? SIM! considera que o determinismo
e o livre-arbítrio são incompatíveis.
O determinismo radical considera que todos
os acontecimentos, o que inclui também as ações Se todas as ações humanas
humanas, têm causas anteriores e estão têm causas anteriores e estão
submetidos às leis da natureza. submetidas às leis da natureza,
o livre-arbítrio não existe.
Se as ações humanas resultam de causas
anteriores e das leis da natureza, então isso
significa que nas nossas ações não temos
realmente liberdade de escolha. Por estar Para o matemático francês Laplace,
com a inteligência e conhecimentos
determinado, o efeito (a nossa ação)
suficientes, seria possível prever
é inevitável. Nunca existem possibilidades
todos os movimentos que ocorrerão
alternativas de ação. no universo, incluindo todas
as ações humanas.
DETERMINISMO RADICAL

O comportamento humano CAUSAS


tem variadas causas DETERMINA
NTES
DO COMPOR
Pode o comportamento humano ser atribuído
HUMANO TA M E N T O
às mesmas causas que afetam os objetos
e os outros animais?

O determinismo radical considera que FÍSICAS


as causas do nosso comportamento são E QUÍMICAS SOCIAIS
muito mais variadas do que as dos objetos E CULTURAIS
e outros animais, mas isso não significa BIOLÓGICAS
que as ações humanas escapem
à causalidade.
PSICOLÓGICAS
Segundo esta teoria, as ações humanas resultam OUTRAS…
de uma combinação complexa destas causas.
A série causal que daqui resulta não é controlada
pelo agente.
DETERMINISMO RADICAL
Negar o determinismo contraria
a ciência e é pouco racional
Para sustentar a sua tese, o determinismo radical
apoia-se em estudos e descobertas de várias ciências
– como a Biologia, Psicologia ou Sociologia.
Descobertas como a de genes responsáveis por
doenças ou que muitos dos nossos comportamentos
são fortemente influenciados por padrões sociais
e culturais ou por situações vividas na infância
parecem sustentar a tese determinista.
O determinismo radical defende que através
da articulação entre os contributos de várias ciências
é possível apresentar uma explicação determinista
do comportamento humano e, assim sendo,
negar o determinismo é pouco racional,
uma vez que isso significa contrariar o que
é afirmado pela ciência.
DETERMINISMO RADICAL

A ilusão do livre-arbítrio
Para o determinismo radical, é uma ilusão pensar
que podemos escolher livremente o que fazer
–o livre-arbítrio é uma crença
falsa.
O desconhecimento das inúmeras causas
que influenciam uma ação levam-nos a pensar
que temos liberdade de escolha.

Porém, se conhecêssemos todas essas


causas, perceberíamos que fazemos
apenas o que temos de fazer e que
o livre-arbítrio não existe.
DETERMINISMO RADICAL
A questão da responsabilidade
Se não escolhemos livremente o que fazemos, como podemos ser responsáveis pelas nossas
ações? Como podemos censurar alguém por fazer algo de errado? Como podemos atribuir
mérito a alguém que faz algo corretamente? Isto parece pôr em causa a tese do
determinismo radical.
Se não há genuína responsabilidade moral nas nossas ações, uma vez que não existe livre-
arbítrio, fará ainda assim sentido castigar ou premiar uma determinada ação?

O determinismo radical responde positivamente.


As pessoas devem ser responsabilizadas, uma vez que
assim promovem-se as boas ações e desencorajam-se as más.
Neste sentido, os prémios e os castigos são também causas
que podem determinar os comportamentos humanos.
OBJEÇÕES AO DETERMINISMO RADICAL

Evolutivamente, é mais plausível


Sem livre-arbítrio, a vida que exista livre-arbítrio
não tem sentido
Esta objeção apoia-se na teoria da evolução
Que sentido faria a nossa vida se, por tudo estar das espécies de Darwin, para afirmar que
determinado, fossemos como robôs, programados dificilmente a espécie humana se adaptaria
para fazer o que fazemos? ao meio ambiente se a crença de que
Que motivação teríamos para viver e agir se escolhemos livremente as nossas ações
as nossas ações se devessem a causas que fosse falsa.
não controlamos e não a nós mesmos? Para os defensores desta
Se fosse assim quase toda a nossa vida seria objeção, o facto de estarmos
uma mentira, o que é absurdo. realmente adaptados
ao meio ambiente
sugere que
Atenção! a crença no
sã o a p e n as duas livre-arbítrio
Estas p o ssíveis é verdadeira.
je çõ e s
de várias ob mo radical.
ao determinis
LIBERTISMO
O LIBERTISMO É
I N C O M PAT I B I L I S TA ?
Tese fundamental
Existe livre-arbítrio e algumas Tal como o determinismo radical,
ações humanas são livres. o libertismo considera que o determinismo
e o livre-arbítrio são incompatíveis.
Se uma ação humana tem causas anteriores
Que ações são livres? e está submetida às leis da natureza, não é
Para o libertismo, algumas escolhas uma ação livre. Este é um ponto em comum entre
humanas não estão constrangidas as duas teses, mas há divergência
do mesmo modo que os outros quanto à existência ou não de livre-arbítrio.
acontecimentos do mundo.
Existem ações que não são
determinadas por causas anteriores
O determinismo
às decisões e escolhas do agente radical considera que O libertismo considera
– e por isso são ações livres. não existe (pois tudo está que existe (pois nem
determinado). tudo está determinado).
LIBERTISMO
Causalidade do agente
A ideia de que o livre-arbítrio
consiste na autodeterminação
Para o libertismo, o agente é Ao invés de outros acontecimentos,
pode ser designada
livre quando é capaz de tomar a causalidade do agente não
«causalidade do agente». obedece a leis. Em circunstâncias
uma decisão independentemente
Este é um tipo especial semelhantes, a mesma pessoa
de quaisquer causas anteriores.
de causalidade: só os seres pode, por causalidade do agente,
Nesse caso, o agente
humanos a têm.
autodetermina-se, porque a única realizar ações diferentes.
causa da ação é a sua decisão.

Acontecimentos Causalidade As mesmas causas conduzem


da natureza mecânica a efeitos semelhantes e previsíveis

Ações Causalidade Em situações exatamente iguais


humanas do agente podem ser feitas ações diferentes
LIBERTISMO
Nem tudo está determinado Possibilidades alternativas de ação

Para o libertismo, nem todos os Para o libertismo, a existência


acontecimentos têm causas anteriores. de possibilidades alternativas
de ação é essencial para podermos
Algumas ações devem-se ao livre-arbítrio dizer que agimos livremente: isso só
e não às leis causais que determinam acontece se escolhemos uma
muitas outras coisas.
coisa mas podíamos ter
escolhido outras, realizamos
uma ação mas podíamos ter
realizado outras.
Para o libertismo, essa é uma
característica fundamental da vida
humana: o futuro está em aberto, há
uma pluralidade de caminhos.
LIBERTISMO
Argumento da experiência
Uma possibilidade de defender a existência de livre-arbítrio
é alegar que temos experiência do livre-arbítrio e,
portanto, este existe.
Mas que experiência é essa?
Temos experiência do livre-arbítrio quando não sentimos
qualquer constrangimento para fazer uma escolha, não
sentimos nenhuma força a obrigar-nos a fazer algo.
Esta é uma experiência oposta à da falta de liberdade,
que sentimos quando somos forçados a fazer algo
e não o conseguimos evitar por muito que tentemos.

Para o libertismo, uma vez que o sentimento de livre-arbítrio


é muito frequente e generalizado, seria implausível que
essas experiências não fossem verídicas. Assim, é muito
provável que algumas das nossas ações
sejam livres .
LIBERTISMO
Argumento da responsabilidade
Se não houver livre-arbítrio é difícil entender Durante a II Guerra
como pode existir responsabilidade. Mundial, o regime
nazi
alemão liderado po
r Adolf
Se o livre-arbítrio não existir, as pessoas não Hitler matou
são verdadeiramente as autoras das suas cerca de seis milhõ
es
ações, isto é, farão coisas inevitáveis. de judeus aprision
a d os em
vários campos
A ser assim, Adolf Hitler não seria culpado
de concentração
pelo Holocausto – o que é muito implausível. espalhados pela E
uropa.
Do mesmo modo, sentimentos como Este acontecimento
é conhecido como
o orgulho ou a vergonha não farão sentido
Holocausto.
se as nossas ações forem o produto
de causas que não controlamos
– o que também é implausível.
LIBERTISMO
Sartre

O filósofo francês Sartre considera a liberdade como


fundamental para a vida humana, e afirma que ela é
que faz dos seres humanos aquilo que são.

Para Sartre, a existência precede a essência:


os seres humanos são diferentes dos objetos, não
têm à partida uma natureza que estabeleça aquilo
que são e o que devem fazer; os seres humanos
é que têm de escolher o que são e como devem agir.
Jean-Paul Sartre
Deste modo, não podemos recusar a necessidade
Sartre não se intitulava libertista nem
de escolher. Mesmo nas circunstâncias mais difíceis,
recorria à terminologia usada pelos
podemos pelo menos optar pela maneira como vamos defensores do libertismo.
reagir aos problemas. Por isso, somos totalmente Porém, as suas ideias podem ser
responsáveis pela nossa vida e pelas nossas enquadradas nesta perspetiva filosófica.
ações.
OBJEÇÕES AO LIBERTISMO Atenção!
Estas são
duas de v apenas
árias obje
ções
Não há ações sem causa possíveis
ao libertis
Os defensores desta objeção consideram mo.
que a ideia libertista de ações sem causas
anteriores à decisão do agente é Não sentir as causas não
implausível e anticientífica. prova a sua inexistência
Alegam que em qualquer ação encontramos
É possível não sentir ou não reconhecer,
sempre causas anteriores e que qualquer
numa ação, aquilo que é efeito de causas
decisão tem ela própria causas anteriores.
anteriores, mas ainda assim essas
causas existirem e determinarem
a nossa vontade.
Por isso, os defensores desta objeção
consideram que o argumento libertista
da experiência não prova a existência
de livre-arbítrio.
DETERMINISMO MODERADO

Tese fundamental O DETERMINISMO


MODERADO É
Existe livre-arbítrio e algumas
ações humanas são livres.
C O M PAT I B I L I S TA ?
Sim, ao contrário
O determinismo moderado defende do determinismo radical
esta tese por razões diferentes
e do libertismo.
do libertismo.
O determinismo moderado considera
O determinismo moderado alega
que há efetivamente ações
que HÁ!
livres e ações não livres
e o mais importante é encontrar
o que distingue umas das outras. determinismo
As ações são
livre-arbítrio
determinadas por
causas anteriores…
… mas algumas
delas são
livres.
DETERMINISMO MODERADO
Se todas as ações são determinadas por causas
anteriores, mas algumas delas são livres,
isso significa que as ações livres são Redefinição do conceito
também determinadas. de livre-arbítrio
Mas como pode uma ação ser O determinismo moderado
simultaneamente livre e determinada?
entende livre-arbítrio
Para responder a esta questão, como o poder de
o determinismo moderado
fazermos o que
reformula o conceito
de livre-arbítrio (autodeterminação)
queremos Rejeita, assim
que está em causa no debate entre e não fazer o que ,o
de livre-arbítr conceito
io como
deterministas radicais e libertistas.
não queremos. autodetermin
ação
(isto é, o pod
e
independente r de agir
m
de causas an ente
teriores).
DETERMINISMO MODERADO

O que é, então, uma ação livre?

Uma ação é livre quando:


• é realizada sem coações (internas ou externas ao agente);
• deriva das crenças e desejos do agente.

Mas essas ações não têm causas anteriores à decisão do


agente?

Sim, têm. Mas não impedem que o agente realize uma ação livre.
O facto de o agente estar envolvido numa cadeia causal que não
controla não lhe retira a liberdade. O que retira a liberdade
ao agente é a existência de alguma coação que o impeça
de agir de acordo com o seu desejo. Quando a coação não
existe, a ação é livre (e, simultaneamente, determinada).
DETERMINISMO MODERADO

Possibilidades alternativas de ação


O determinismo moderado rejeita a ideia de estarmos limitados
a fazer uma só coisa, ao considerar que existem ações livres.
Numa ação livre, afirma o determinismo moderado, temos
a possibilidade de fazer uma coisa podendo fazer outra.
Mas como é que temos alternativa ao que está determinado
pelas causas anteriores?

Imaginemos que um agente realiza uma ação a que chamamos A.


Para o determinismo moderado, o agente realizou a ação A,
mas poderia ter realizado a ação B. Se o agente tivesse
desejado realizar a ação B e não a A, podia tê-lo feito.
Para o determinismo moderado, uma situação
como esta permite dizer que o agente teve
possibilidades alternativas de ação.
OBJEÇÕES AO DETERMINISMO MODERADO Atenção!
Estas são
de várias apenas d
objeções uas
ao determ possíveis
Não permite compreender a existência inismo mo
derado.
de possibilidades alternativas de ação
Esta objeção põe em causa a ideia de possibilidades Baixa a fasquia
alternativas de ação defendida pelo determinismo
moderado. Esta objeção alega que a redefinição
de livre-arbítrio apresentada pelo determinismo
Uma vez que esta teoria defende simultaneamente
moderado tenta contornar
que uma ação é livre e sempre determinada por
o problema simplificando-o de modo
causas anteriores, não parece haver possibilidade
inaceitável.
de um agente fazer algo de diferente e alternativo.
Considera-se que restringir o livre-arbítrio
Poder fazer algo diferente do que fizemos caso
à ausência de coação é demasiado
o tivéssemos desejado não corresponde a uma
simplista – é fácil mostrar que certas
genuína possibilidade alternativa de ação,
ações são feitas sem coação
pois esse desejo tem causas anteriores que
(até um determinista radical aceita isso).
o agente não controla.
Para os incompatibilistas, não é esta
a questão que está em discussão.

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