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O QUE É CULTURA?

CULTURA E CIÊNCIAS DA Profa. Dra Carla Soares

SAÚDE
QUAL A DEFINIÇÃO DE CULTURA
EXPRESSA NA TIRINHA ABAIXO? ELA
CONCORDA COM A ANTROPOLOGIA?
Cultura pode ser definida como um conjunto de elementos que
mediam e qualificam qualquer atividade física ou mental, que não
seja determinada pela biologia, e que seja compartilhada por
diferentes membros de um grupo social.
Elementos sobre os quais os atores sociais constroem significados
para as ações e interações sociais concretas e temporais, assim
como sustentam as formas sociais vigentes, as instituições e seus
modelos operativos.
Inclui valores, símbolos, normas e práticas.

(LANGDON; WIIK, 2010)


IDEIAS SOBRE A ORIGEM DA
CULTURA
Claude Lévi-Strauss - considera que a cultura surgiu no
momento em que o homem convencionou a primeira
regra, a primeira norma (proibição do incesto)

Leslie White - a passagem do estado animal para o


humano ocorreu quando o cérebro do homem foi capaz de
gerar símbolos.

(LARAIA, 2001)
TEORIAS MODERNAS SOBRE A
CULTURA
CULTURA COMO SISTEMA ADAPTATIVO – NEOEVOLUCIONISTAS
"Culturas são sistemas (de padrões de comportamento socialmente
transmitidos) que servem para adaptar as comunidades humanas aos seus
embasamentos biológicos.”
Tecnologias, modos de organização econômica, padrões de estabelecimento,
de agrupamento social e organização política, crenças e práticas religiosas.
"Mudança cultural é primariamente um processo de adaptação equivalente à
seleção natural.“
A tecnologia, a economia de subsistência e os elementos da organização
social diretamente ligada à produção constituem o domínio mais adaptativo
da cultura.
(LARAIA, 2001)
TEORIAS MODERNAS SOBRE A
CULTURA
TEORIAS IDEALISTAS DE CULTURA
1 Antropologia cognitiva
Consideram cultura como sistema cognitivo
W. Goodenough - cultura é um sistema de conhecimento: "consiste em tudo
aquilo que alguém tem de conhecer ou acreditar para operar de maneira
aceitável dentro de sua sociedade."

(LARAIA, 2001)
TEORIAS MODERNAS SOBRE A
CULTURA
TEORIAS IDEALISTAS DE CULTURA
2 Cultura como Sistemas Estruturais
Claude Lévi-Strauss - define cultura como um sistema simbólico que é uma
criação acumulativa da mente humana  descobrir na estruturação dos
domínios culturais (mito, arte, parentesco e linguagem) os princípios da
mente que geram essas elaborações culturais.

O pensamento humano estaria submetido a regras inconscientes, ou seja, um


conjunto de princípios que controlam as manifestações empíricas de um dado
grupo.

(LARAIA, 2001)
TEORIAS MODERNAS SOBRE A
CULTURA
TEORIAS IDEALISTAS DE CULTURA
3 Cultura como Sistemas Simbólicos
Geertz - todos os homens são geneticamente aptos para receber um programa,
e este programa é o que chamamos de cultura.
Estudar a cultura - estudar um código de símbolos partilhados pelos membros
dessa cultura (antropologia busca interpretações)
David Schneider - "Cultura é um sistema de símbolos e significados.
Compreende categorias ou unidades e regras sobre relações e modos de
comportamento” (que não dependem da sua observabilidade ou concretude)

(LARAIA, 2001)
COMO OPERA A CULTURA?

(LARAIA, 2001)
CONDICIONANDO A VISÃO DE
MUNDO
Ruth Benedict - a cultura é como uma lente através da qual o
homem vê o mundo.
Homens de culturas diferentes usam lentes diversas e,
portanto, têm visões desencontradas das coisas. (ex: floresta
amazônica)
O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral e
valorativa, os diferentes comportamentos sociais e mesmo as
posturas corporais são assim produtos de uma herança
cultural, ou seja, o resultado da operação de uma determinada
cultura.
(LARAIA, 2001)
CONDICIONANDO A VISÃO DE
MUNDO
Todos os homens são dotados do mesmo
equipamento anatômico, mas a utilização do mesmo,
ao invés de ser determinada geneticamente, depende
de um aprendizado e este consiste na cópia de
padrões que fazem parte da herança cultural do
grupo.
Mesmo o exercício de atividades consideradas como
parte da fisiologia humana podem refletir diferenças
de cultura.
Exemplo: parto
(LARAIA, 2001)
CONDICIONANDO A VISÃO DE
MUNDO
O fato de que o homem vê o mundo através de sua cultura tem
como consequência a propensão em considerar o seu modo de vida
como o mais correto e o mais natural.
Etnocentrismo  responsável em seus casos extremos pela
ocorrência de numerosos conflitos sociais.
Comportamentos etnocêntricos resultam também em apreciações
negativas dos padrões culturais de povos diferentes.
Práticas de outros sistemas culturais são catalogadas como
absurdas, deprimentes e imorais.

(LARAIA, 2001)
RELATIVISMO CULTURAL

A perspectiva antropológica requer que, quando se deparar com


culturas diferentes, não se faça julgamentos de valor tomados com
base no próprio sistema cultural, passando a olhar as outras
culturas segundo seus próprios valores e conhecimentos – através
dos quais expressam visão de mundo própria que orienta as suas
práticas, conhecimentos e atitudes.

(LANGDON; WIIK, 2010)


INTERFERINDO NO PLANO
BIOLÓGICO
Apatia diante do distanciamento da própria cultura (ex: banzo)
Mortes causadas por feitiçaria  a vítima, acreditando efetivamente no
poder do mágico e de sua magia, acaba realmente morrendo
Brasil - os sintomas de mal-estar provocados pela ingestão combinada de
alimentos (p. ex: leite com manga)
A sensação de fome depende dos horários de alimentação que são
estabelecidos diferentemente em cada cultura.
A cultura também é capaz de provocar curas de doenças, reais ou
imaginárias >> quando existe a fé do doente na eficácia do remédio ou no
poder dos agentes culturais.
(LARAIA, 2001)
COM PARTICIPAÇÃO
DIFERENTE DOS INDIVÍDUOS
A participação do indivíduo em sua cultura é sempre limitada:
nenhuma pessoa é capaz de participar de todos os elementos de sua
cultura.
Tanto nas sociedades complexas com um alto grau de especialização,
quanto nas simples, onde a especialização refere-se apenas às
determinadas pelas diferenças de sexo e de idade.
Sexo - a maior parte das sociedades humanas permite uma mais ampla
participação na vida cultural aos elementos do sexo masculino
Idade – limitações objetivamente determinadas por idade X limitações
de idade culturalmente impostas (limite entre classes etárias)
(LARAIA, 2001)
COM PARTICIPAÇÃO
DIFERENTE DOS INDIVÍDUOS
Nenhum indivíduo conhece totalmente o seu sistema cultural, mas é
necessário ter um conhecimento mínimo para operar dentro do mesmo.
Conhecimento mínimo deve ser partilhado por todos os componentes
da sociedade de forma a permitir a convivência dos mesmos.

Um médico pode desconhecer qual a melhor época do ano para o


plantio de feijão, um lavrador certamente desconhece as causas de
certas anomalias celulares, mas ambos conhecem as regras que regulam
a chamada etiqueta social no que se refere às formas de cumprimentos
entre as pessoas de uma mesma sociedade.
(LARAIA, 2001)
COM UMA LÓGICA PRÓPRIA
Todo sistema cultural tem a sua própria lógica e não passa de um ato
primário de etnocentrismo tentar transferir a lógica de um sistema para
outro.
Coerência de um hábito cultural somente pode ser analisada a partir do
sistema a que pertence.
Claude Lévi-Strauss - ao invés de um contínuo magia, religião e ciência
(como se o mágico fosse o primitivo e a ciência o avançado), temos de fato
sistemas simultâneos e não-sucessivos na história da humanidade.
As explicações encontradas pelos membros das diversas sociedades
humanas, portanto, são lógicas e encontram a sua coerência dentro do
próprio sistema.
(LARAIA, 2001)
COM UMA LÓGICA PRÓPRIA
As explicações encontradas pelos membros das diversas sociedades
humanas, portanto, são lógicas e encontram a sua coerência dentro do
próprio sistema.
Da explicação que o grupo aceita para a reprodução humana resulta o
sistema de parentesco.
Trobriand (Pacífico) - não existe nenhuma relação entre a cópula e a
concepção. Jovem não deve mais ser virgem para ser penetrada por um
"espírito" de sua linhagem materna, que vai gerar em seu útero uma
criança. Não existe nessa cultura a palavra “pai”, e sim “companheiro da
mãe”
(LARAIA, 2001)
COM UMA LÓGICA PRÓPRIA
As explicações encontradas pelos membros das diversas
sociedades humanas, portanto, são lógicas e encontram a sua
coerência dentro do próprio sistema.
Da explicação que o grupo aceita para a reprodução humana
resulta o sistema de parentesco.
Indígenas Jê (Brasil) - correlacionam a relação sexual com a
concepção, mas acreditam que só uma cópula é insuficiente para
formar um novo ser. Várias relações para que a criança seja
totalmente formada e torne-se apta para o nascimento.

(LARAIA, 2001)
COM UMA LÓGICA PRÓPRIA
As explicações encontradas pelos membros das diversas sociedades
humanas, portanto, são lógicas e encontram a sua coerência dentro do
próprio sistema.
Da explicação que o grupo aceita para a reprodução humana resulta o
sistema de parentesco.

Indígenas Tupi (Brasil) - a criança depende


exclusivamente do pai. Ela existe anteriormente como
uma espécie de semente no interior do homem, muito
tempo mesmo antes do ato sexual que a transferirá para
o ventre da mulher.
(LARAIA, 2001)
DE FORMA DINÂMICA
“os homens, ao contrário das formigas, têm a capacidade de questionar
os seus próprios hábitos e modificá-los.”

Duas formas de transformação cultural:


1. mudança lenta, quase imperceptível
2. mudança rápida e brusca - No caso dos índios brasileiros, catástrofe.
Mas também pode ser um processo menos radical, onde a troca de
padrões culturais ocorre sem grandes traumas.
O tempo constitui um elemento importante na análise de uma cultura:
Em um quarto de século, mudam padrões de beleza e regras morais
(LARAIA, 2001)
DE FORMA DINÂMICA
Pensar a mudança raciocinando em termos de padrões ideais e padrões
reais de comportamento.
Ex: Indígenas Akuáwa-Asurini:
(1) casamento muito bom (filha do irmão da mãe, filha da irmã do pai ou
fiha da própria irmã); (2) casamento bom (qualquer união fora do ideal e
fora das proibições); (3) casamento ruim (mãe, filha ou irmã).
Os casamentos “bons” são maioria, porém só se pode considerar que
efetivamente houve mudança quando o ideal passa a ser questionado
Mudança representa o desenlace de numerosos conflitos - embate entre as
tendências conservadoras e as inovadoras.

(LARAIA, 2001)
CULTURA E CIÊNCIAS DA
SAÚDE

COMO VOCÊ CUIDA DA SUA


SAÚDE?
CULTURA, SOCIEDADE E
SAÚDE
A doença e as preocupações para com a saúde são universais na
vida humana, presentes em todas as sociedades.
Cada grupo organiza-se coletivamente para compreender e
desenvolver técnicas em resposta às experiências, ou episódios de
doença e infortúnios, sejam eles individuais ou coletivos.
Maneira através da qual um determinado grupo social pensa e se
organiza, para manter a saúde e enfrentar episódios de doença, não
está dissociado da visão de mundo e da experiência geral que esse
tem a respeito dos demais aspectos e dimensões
socioculturalmente informados. (LANGDON; WIIK, 2010)
ARTHUR KLEINMAN E O “MODELO DO
SISTEMA DE CUIDADOS DE SAÚDE”
As experiências das doenças, papéis sociais, práticas terapêuticas e instituições
relacionadas à saúde estão sistematicamente ligadas, e sua totalidade compõe
“o sistema de atenção à saúde” construído culturalmente.

Nesta abordagem, o sistema biomédico torna-se também um sistema cultural


passível de análise antropológica como outros sistemas de saúde encontrados
nas diversas culturas.

(LANGDON, 2014; LANGDON; WIIK, 2010)


ARTHUR KLEINMAN E O “MODELO DO
SISTEMA DE CUIDADOS DE SAÚDE”
O sistema de saúde de um grupo tem três “arenas”: a
profissional; a popular (ou folk); e a leiga (ou
familiar)

Num contexto clínico, os diferentes atores têm


diferentes “modelos explicativos”, ou seja, diferentes
percepções sobre a doença.
O sistema cultural de saúde
Ressalta a dimensão
simbólica do entendimento
que se tem sobre saúde e
inclui os conhecimentos,
percepções e cognições O sistema social de saúde
utilizadas para definir, Composto pelas instituições
relacionadas à saúde, à
classificar, perceber e
organização de papéis dos
explicar a doença. profissionais de saúde nele
envolvidos, suas regras de
interação, assim como as
relações de poder a ele
inerentes.

(LANGDON; WIIK, 2010)


Somos todos sujeitos da cultura,
experimentada de várias formas, inclusive
quando se adoece e se procura por
tratamento.
Porém, na atuação como profissionais e
pesquisadores da área da saúde, depara-se
com sistemas culturais diversos ao nosso
(ou no qual se foi treinado), sem relativizar
o próprio conhecimento médico.
Naturaliza–se o campo médico, cobrindo-o
de verdade universal e absoluta, afastando-o
das formas de conhecimento culturalizado,
isto é, cuja verdade é particular, relativa e
condicional.
DOENÇA X ENFERMIDADE X MAL-
ESTAR
Doença (disease) - anormalidade na estrutura e/ou no funcionamento dos
órgãos e de seus sistemas; paradigma biomédico
Enfermidade (illness) - percepções que o paciente tem para interpretar
seu estado e atribuir seu significado; influenciado pelo contexto
sociocultural
Mal-estar (sickness) - processo sociocultural de interação e negociação ao
longo do episódio; legitimação da doença

(LANGDON, 2014)
NARRATIVAS DA DOENÇA
As narrativas revelam os processos sociais relacionados com a doença e a
dinâmica da busca da cura conhecida como itinerário terapêutico

A doença é uma experiência que gera narrativas que procuram dar


sentido ao sofrimento e também ajudam as pessoas a negociar as
decisões.

(LANGDON, 2014)
MENÉNDEZ - “MODELOS DE
ATENÇÃO À SAÚDE”
Modelo médico hegemônico - biologicismo, a-historicidade,
aculturalidade, eficácia pragmática, orientação curativa e medicalização

Práticas terapêuticas populares e “alternativas”- conhecimentos populares


sobre saúde; etnomedicinas de grupos indígenas; práticas terapêuticas
new age; grupos centrados na autoajuda.

Práticas de autoatenção - as representações e as práticas que a população


utiliza no nível do sujeito e do grupo social para diagnosticar, explicar,
solucionar ou prevenir os processos que afetam sua saúde, sem a
intervenção direta de curadores profissionais
(LANGDON, 2014)
MENÉNDEZ - “MODELOS DE
ATENÇÃO À SAÚDE”
Através dos atores sociais, que se inserem em redes de trocas de
conhecimentos, constroem-se influências mútuas entre diferentes
modelos de atenção à saúde.

Desta maneira, as práticas e as concepções a respeito de saúde/doença


são construídas e reconstruídas num processo contínuo, dando lugar à
emergência de novos modelos de atenção.

(LANGDON, 2014)
INTERMEDICALIDADE
Aborda contextos caracterizados pela convivência de diversos sistemas
médicos distintos e estratégias de poder, originando sistemas médicos
“híbridos”

Analisa a realidade social como sendo constituída por negociações entre


sujeitos politicamente ativos

(LANGDON, 2014)

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