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Disciplina : Didática
Editora: DP&A
Ano: 2000
um livro voltado para que o professor possa desempenhar melhor seu trabalho
Trata-se de um Livro curto, mas nem por isso de leitura rápida. Ele depende do
Leitor. Ele visa um leitor que esteja curioso em saber que rumos pode tomar o
ensino, na sala de aula, agora, no limiar do século XXI, em uma sociedade que
claro, mas que acredita que sem um estudo das teorias educacionais muito do
idealizada.
Título:
Coleção
FICHA TÉCNICA
Revisão de provas:
Paulo Telles Ferreira
Capa:
Rodrigo Murtinho
CIP-BRASIL. Catalogação-na-fonte
com busca, apreensão e indenizações diversas (Lei 9.610i98 - Lei dos Direitos
DP&A editora
Tel./Fax: (21)232.1768
e-mail: dpa@dpa.com.br
2000
Sumário
Introdução 9
Capítulo 1
Capítulo II
na modernidade e pós-modernidade 39
Conclusão
Sugestões de leitura 75
Apêndice
Teorias da educação na história da filosofia da educação 77
Referências bibliográficas 99
Introdução
ingleses e norte-americanos
aprendizagem". Todavia, se
falarmos com ingleses e norte-americanos, veremos que eles têm certa dificuldade
como um tipo de
principalmente os norte-
pág.10
de
termo didática como apontando para o centro de um conjunto que reúne o que, em
processos
lidar diretamente com o que foi traduzido nas "disciplinas aplicadas". Uma
pessoa com didática é alguém que "sabe dar aula" ou que "explica bem um
professor do ensino básico ou médio "sem didática". O mesmo vale para um diretor
são chamados os que atuam em trabalhos como o Projeto Axé, na Bahia, entre
outros) etc. Sem didática, nestes casos, significaria "sem qualquer coisa", ou
seja, alguém sem a capacidade que seu diploma profissional diz que ele detém.
introdução
pág.11
estudam educação, admite que os educadores possam até mesmo não entender
muito
mostrar como considero "o campo de saberes necessários àqueles que estudam
Muito menos, tendo a vê-la como uma "teoria geral da educação", estando
estar afastada de nós desde há muito. Prefiro, neste trabalho, vê-la como um
A filosofia da educação também faz o mesmo. Mas ela o faz a partir da linguagem
sociológica e filosófica -' mas não técnica, não específica de cada uma das
pág.12
modernos, elas são discursos que se desenvolvem em torno de três elementos: uma
isto sofre uma certa variação. Nos tempos pós-modernos - a nossa época - muitos
um bom número de professores e pais, mas já não seria mais possível vê-los como
mais complexo do que a frase "não há somente uma didática moderna". Mas não me
educacionais e suas implicações atuais é alguém que está equipado para ser
chamado de professor que "tem didática". Pois é alguém que deverá saber,
pág. 13
seu próprio posicionamento. Mas, se ainda assim ele for uma pessoa qualificada
como "sem didática", isso estará fora do meu controle e boa vontade como
autor.
Por que digo isso? No final do livro o leitor ficará sabendo - pois a verdadeira
o tema que aparece num texto de Richard Rorty, no final deste livro.
Por fim, faço, ainda, um breve comentário sobre a dedicatória desse livro -
"para os professores que amam a liberdade". É a primeira vez que faço uma
dedicatória genérica. Mas ela tem sua razão de ser. Mesmo depois dos movimentos
elitistas e endurecidas - como aquelas que querem ver a formação dos professores
inexperientes, pagam para publicar seus próprios livros, fazendo uma carreira
meio esse tipo de gente. Essas pessoas são reacionárias. Algumas são
perversas.
Não escrevo este livro de didática para os reacionários, muito menos para os
professores que querem aventuras e que seus alunos tenham mais imaginação e
esperança do que dogmas. Este livro é para aqueles professores que gostam de
alunos curiosos mais do que os politicamente engajados, e não para os que fazem
que, gostando da liberdade, querem que todos a tenham e que estão dispostos a
fazer o tipo de política de que gosto: aquela que busca proteger os fracos da
Este é um livro para professores que ainda preparam suas aulas, que
estudam para as ministrar, e não para aqueles que, menosprezando seus ouvintes,
dissertam aqui e ali sobre todo e qualquer assunto (mas sempre pela mesma
cartilha!). Para esses, de que vale um livro de didática? Aliás, de que vale um
livro para essas pessoas? Elas já têm um discurso pronto e não mudariam em
nada a partir da leitura deste ou de qualquer outro livro! Muitas dessas pessoas
procuram livros apenas para confirmar seus dogmas - chamam a isto coerência.
como é a vida. Ter uma vida coerente nem sempre é uma virtude - muitas vezes, é
pote de ouro.
Pág.15
CAPÍTULO 1
e no mundo contemporâneo:
unidade no interior das formulações que podem ser aglutinadas sob a rubrica
No advento dos tempos modernos, nos séculos XVI, XVII e XVIII, geramos a noção
pequeno adulto, um ser menor e menos perfeito. Uma parte dos intelectuais
começou a dizer que havia duas fases na vida humana e que ambas eram
qual deveria ser o nosso destino como humanos. E o que seria a "natureza
razão que, uma vez trabalhada, educada, o levaria da vida infantil para a
levaria a ser um verdadeiro indivíduo - aquele que pensa e age segundo a razão,
podendo, então, viver livre como ser inteligente (sujeito epistemológico), como
pessoa (sujeito moral) e como cidadão (sujeito político). Assim, o homem,
Pág.1 7
com que o homem pudesse, uma vez adulto, ser efetivamente livre, cumprindo,
assim, o seu destino. Para tal, a boa educação seria a educação da razão e pela
razão. Uma educação que prezasse a racionalidade como meio e fim não falharia na
pergunta de um modo bem claro. Falando a respeito da criança que está sendo
educada, escreveu:
Se seu preceptor for como eu, forma-lhe a vontade para que sirva seu Príncipe
por dever cívico. (...) Que a consciência e a virtude brilhem em suas palavras e
que só a razão tenha por guia. Ensinar-lhe-ão que confessar o erro que
Príncipe (o Estado) para além do exclusivo "dever cívico". Ou que tivesse levado
seu aluno, uma vez adulto, a ter o hábito de esconder um erro de raciocínio que
sinceridade).
Em ambos os casos, o professor não teria cumprido a sua tarefa. Não teria
conseguido fazer da criança um autêntico indivíduo, aquele que não deixa a sua
aquela em que os homens que nela vivem conferem sentido ao mundo a partir do
sociedades ocidentais que tiveram seu apogeu durante o século XX, que o discurso
Na sociedade do trabalho, a infância continuou a ser vista cada vez mais como
redefinida pelos intelectuais. O que seria natural nos homens? Sem dúvida, não
movimento, que pega e muda as coisas ao seu redor - a criança é um ser prático
e,
como tal, evidencia sua inteligência humana. No adulto, tal capacidade prática e
humanista, achava que o seu papel era fazer o homem "reencontrar-se consigo
Homo faber, homo sapiens, diante de um e diante do outro, que aliás, tendem a se
um pouco, ainda hoje? Certamente, o defeito é menos grave entre nós do que em
tanto a iniciativa do aluno. Entretanto, resta-nos muito a fazer. Não vou falar
menos começou assim, que tal era a intenção da natureza. Como, então, não se
Para uma boa parte dos intelectuais dos séculos XIX e XX, que, de alguma forma,
iniciado com Saint Simon, e que teve eco no "Manifesto Comunista" de Marx e
variou
Pág. 21
As TEORIAS EDUCACIONAIS NA MODERNIDADE E NO MUNDO
CONTEMPORÂNEO...
intelectuais e, cada vez mais, reivindicaram, junto com outros setores, o posto
de "trabalhadores da educação".
esse termo como algo um pouco diferente da concepção humanista. O ser pensante e
trabalho - uma ética do trabalho, que passou a punir duramente uma figura
inexistente até então: o "vagabundo" - aquele que não trabalha (na transição do
século XIX para o XX, sociólogos como Veblen criaram a teoria do desprezo às
antigas
discurso
O mundo pós-moderno
mudar de maneira nunca vista. Nos últimos trinta anos, aconteceram duas crises
essas crises preferiram chamar o mundo que vem emergindo a partir delas de
"mundo pós-moderno".
pág.23
Falaremos sobre cada uma dessas questões abaixo e, em seguida, veremos como
isso
traria
para todos realização pessoal, e a desconfiança de que, mesmo que trouxesse, não
seria para todos, pois nem todos conseguiriam trabalho, teriam se tornado
rodapé
Em boa parte dos meus textos recentes venho chamando de "Velha Escola de
Frankfurt" aquela ligada aos impasses gerados com Horkheimer, Adorno, Benjamin,
envolveu em dilemas filosóficos de que não conseguiu dar conta. Já, a Nova
- que não receberam nenhum dom natural -, mas que usam ruídos e sinais e que,
usos.
através dele,
como também teriam diminuído ainda mais sensivelmente suas esperanças nas
propostas
poder marcar presença em boa parte do tempo de nossas vidas, pois se tornou
Assim, segundo a sociologia que tomo como referência, uma das características
"indivíduo" tal como foi gerada nesta mesma sociedade. A consciência de ser
trabalhador 11ã0 é mais a consciência par excellence. Ser indivíduo não é mais
ser "profissional".
O que teríamos, então? Uma volta à individualidade tal qual foi definida pelos
Velha Escola de Frankfurt, é um fenômeno que pode ser visto desde o final do
ambiente.
vinculados ao corpo - tudo o que se refere à beleza, à saúde, e assim por diante
estaria ganhando fantástica importância.
Há quem diga, inclusive - como o sociólogo francês, Lucien Sfez - que, se temos
ainda uma grande utopia, ela poderia ser chamada de "A Grande Saúde". Em uma
not fat. Fala-se disso como, na Europa, se conversa sobre política. Um dia encontrei
uma amiga, que faz parte desse meio chique, o novo meio radical chique, universitário
e elegante da Costa Leste americana. A conversa, a mesma de sempre, a comida
certa. Perguntei como ia. Não muito bem, um problema de saúde. Era grave?
"Poderia ser, virtualmente". Ela tinha pedido para o médico tirar-lhe os ovários
preventivamente! Porque a mãe e a tia tiveram problemas com os ovários, mas ela
Fiquei estupefato e perguntei como o médico tinha concordado com uma coisa
dessas, pois na França isso jamais seria feito. Ela me disse que negociou com os
médicos:
se tirassem os ovários ela não tiraria os seios! Foi então que descobri que uma
(...).O termo
A Grande Saúde se aplica a este homem novo, que estaria além da nossa infeliz
O que vale a pena ser observado no comentário de Sfez é menos o seu pessimismo e
pág.27
que lembram um certo ascetismo presente em boa parte das análises das
Nosso verdadeiro eu teria passado a ser o corpo. Mas é claro que, numa análise
metafísica e política, como disse Sfez. O "corpo" seria, muito mais: uma
portanto, uma nova entidade metafísica (a Física pode muito bem ser uma
mas esta passou a ter o corpo como referência, como nos ensinou Foucault em sua
pós-modernidade.
Isso tudo vem reformulando nossa noção de infância, de educação (ensino, escola)
que vem sendo entendido como "mundo pós-moderno" Por um lado, temos uma
apareceram nos últimos anos. Por outro lado, temos também justificativas
Segundo uma análise herdeira da Velha Escola de Frankfurt, nas novas condições,
infância ter-se-ia volatilizado. Na medida em que cada indivíduo é o que é o seu corpo,
criança é vista de outra maneira: ela é o "pequeno corpo" que ganha identidade
no ato do consumo. Quais são as coisas que esse corpo consome? O que ele
faz? Este "corpo" é o "corpo que consome o danoninho" ou o "corpo que se mexe
ideais - o que chamamos de asiatização dos heróis da TV: sai de cena o novo
Capitão América, de Stan Lee, que nos anos 1960/1970 foi ao Vietnã e teve a
coragem de não lutar contra os vietnamitas, pois não viu a Guerra como uma
apenas Lutam, por nada e para nada, contra monstros tão imbecilizados quanto
Ainda segundo essa análise, herdeira dos velhos frankfurtianos, como atua o
da
pág.29
imposição do que deve ser consumido pelo seu corpo, então, devemos, para fazer
sim, aquela montada pela TM a que cristaliza a própria vida em uma academia: por
O professor não seria mais alguém que visa tornar o jovem conscientemente livre,
se posicionando, sim, como alguém que lida com "corpos". Por isso seu
que os empregos fixos tendem a desaparecer - que devem ser realizadas segundo
autoridades externas aos indivíduos. Cada professor, então, estaria sendo apenas
texto
Filosofia que lhes desse uma visão geral sobre o que fizeram e fazem os
filósofos.
Folha de S. Paulo, Robert Reich explicou que todos viveríamos numa sociedade sem
demanda. Nada substitui você ser alguém de quem o mercado precisa. O papel
enquanto os jovens estão ainda na escola, para que os jovens que não vão
as tais pontes].
mercado de trabalho, mas não mais como algo que possibilitaria aos indivíduos
quando entrar e, talvez, viver de uma maneira menos sofrida do que os outros,
por algum tempo, nos padrões da nova economia. Assim, o professor não seria
educação
penetrando
cada vez mais nos meios acadêmicos. Porém, se a Velha Escola de Frankfurt via
isso segundo óculos marxistas, como reificação, fruto das condições industriais
nunca resolveu: se não confiamos mais no "sujeito", se não nos consideramos mais
descrição das relações entre o nos e o "mundo" que vem sendo assumida, sem
filosófica?
Se olharmos não só para as análises vindas do marxismo, mas também para as novas
entendimento da subjetividade pode ser tomada de forma muito mais ampla. Por um
lado, talvez não possamos negar que ela tenha a ver com transformações negativas
Por outro lado, ela é uma conquista do processo de melhoria de nossa capacidade
-o
noção das
as novas teorias
postos na pós-modernidade.
certo modo, estão presentes tanto no ideal humanista quanto nas diretrizes da
sociedade do
professor.
Platão e de
sentidos e das
universalidade e a
a particularidade e a emoção,
pág.33
ter-se-ia acoplado ao modelo platônico, por sua vez, complexificou um pouco mais
subjetividade, mas não teria alterado essa noção a ponto de tirá-la da visão
pelos neokantianos segundo um modelo que contém três esferas concêntricas, cada
exatamente as crenças
Verdadeiro, o lugar do
ainda mais
vulgarmente, o lugar que permitiria insinuações sobre a Imortalidade.
Seguindo-as,
essas concepções, o homem tem, em seu íntimo, enquanto "eu", um núcleo que não
se pode
alterar, seja por si mesmo seja por qualquer outro agente - tanto o "eu" nobre
do mundo
de
trabalho cuja
tais elementos
e no da
cada um de nós.
Assim, a educação em Platão dependeu fundamentalmente de rememoração -
como está no célebre A República. Em Adorno, por exemplo, ela era auto-reflexão
estava sob o
famoso texto Educação após Auschwitz, dos anos 1960. Aliás, para corroborar essa
análise
ducere, que
teria estado
correto do
com o bem em
autoconstrução, mas
35
AS TEORIAS EDUCACIONAIS NA MODERNIDADE E NO MUNDO
CONTEMPORÂNEO...
de
situações, no
naturalizado.
semi-
organismos e, portanto, também o "bípede sem penas são observados pelo seu
que
observador da
atividade comunicacional deste ser) devem seguir as leis de causação do mesmo
modo que os eventos que ocorrem no seu exterior, ou seja, "no mundo". Podem-se,
então,
observar e/ou postular elementos internos ao "bípede sem penas" que podem ser
incluem
ânimo, enfermidades.
estados
que certos relatos neurais são estados psicológicos descritos num vocabulário da
ordem
Feito tudo isso, ou seja, assumindo o "bípede sem penas" como imerso em um
observador
medo (não precisamos mais pensar no sujeito como um ponto de conexão entre o
mundo
fazê-lo, mas
a definiremos, agora, como "a rede de crenças e desejos que devemos postular
definição
todo o
situações no mesmo
e único mundo (mundo ao qual o "interior" deste ser pertence integralmente); não
sobre esses
37
Física pode ser muito bom para falar de uma maçã que está na nossa frente, sob o
ponto de
de
linguagem que nada tem a ver com "conjunto de átomos", mas apenas com "maçã".
pode
ser hierarquizado metafísica e epistemologicamente em relação ao ruído "conjunto
de átomos". Em razão disto não se pode afirmar que um jogo de linguagem "diz
mais
físicos a descrevem, não é nem mais nem menos real do que "maçã", o nome de uma
fruta
laboratório e comem uma maçã" - aliás, duvido que eles consigam ter a fome
saciada com um
"conjunto de átomos").
O sujeito assim considerado, ou seja, tomado como uma rede de crenças e desejos,
homogêneo.
Suas crenças e desejos diferem entre si única e exclusivamente por graus e não
por espécie. Nenhum sujeito individual, portanto, deteria crenças e desejos tão
especiais,
capazes de formar outras crenças e desejos, sem terem sido, por sua vez, também
formados por crenças e desejos, ou sem terem sido tocados de alguma maneira. O
lugar
uma
incrível força. Uma força jamais vista. Ela é tomada como um processo sem
construirmo-nos
mesmos, a idéia platônica de nos vermos novamente diante daquilo que vimos no
ciências da
educação poderia, então, assumir o sentido que Dewey lhe conferiu: unicamente,
um processo de
sorte, em
neopragmatismo,
didática
enquanto um campo que deve preparar pessoas para "organizar e otimizar processos
educação sem
políticos de redescrição de nós, por nós mesmos, e do mundo, por nós mesmos.
39
CAPÍTULO II
na modernidade e pós-modernidade
A maioria dos livros que dissertam sobre didática é feita a partir do que eu
didática e,
seguiram esta
fórmula e, não raro, criaram um público que, ao ouvir falar de didática (ou
um rol de
tendências seguido por uma proposta "superadora". A meu ver, esse tipo de
trabalho, que veio na esteira de uma vasta produção de teses geradas nos
programas de pós-
rodapé
2 Em minha tese de livre docência, nomeei Dermeval Saviani, em virtudes e
defeitos, como o mentor maior desse tipo de marxismo, nos anos 1980: Educação e
um
procedimento pedagógico que poderia ser visto como típico de uma das
se configurar como
de teoria
Ocidente, hoje em
sua
algum
pensamento seja em filosofia seja em filosofia da educação, estaria, a meu ver,
quadro,
que visa estabelecer um elo, ainda que nem sempre possível de ser tomado ao pé
teorias da educação
rodapé
Entre outros artigos que exemplificam essa postura, o leitor poderá localizar
tanto o meu texto quanto o texto de Nick Burbules, no livro O que é filosofia da
Pág. 41
As teorias educacionais
humanismo se
sua forma
mais acabada. Escolhi J ohn Dewey não exclusivamente porque foi o maior e mais
transitou entre
ambiente onde o
diretrizes da
sociedade do trabalho quanto nas críticas a esta, mas levando em conta os povos
neocolonialismo,
humanista,
dando características bastante amplas ao seu discurso - não por acaso, mesmo
falando a partir do Terceiro Mundo, ele foi ouvido em todo o Ocidente. Por fim,
tento
mais envolvidos com o clima pós-moderno. Não se trata de dizer que esta postura
discurso
saberes como sendo saberes narrativos; estes, para vários professores, não podem
mais ser
escola sob a forma hierárquica moderna, isto é, com as ciências que consideram
que
históricas. Além do mais, da maneira que Rorty e eu lemos Davidson, penso que
estamos
palavra.
narrative tum", uma reformulação explícita sobre o que são a criança (infância),
fases da
epistemologia e
educacional
43
vontade, direito e
termos
débito
para com as idéias (conceitos). As idéias, pela sua própria natureza, gostariam
ia facilitar
o interesse fazendo presentes as idéias e estas, por sua vez, estariam presentes
Herbart não admitia qualquer distinção entre instrução e educação. Sua doutrina
consciência,
Ou, nas palavras do próprio Herbart: "a disposição do coração (...) tem sua
condições mutáveis
generalização e aplicação.
Os cinco passos de Herbart podem ser vistos no quadro abaixo:
Preparação
trazidas para o centro das atenções. Assim, surge o interesse vital pelo novo
Apresentação
concretos possíveis.
Associação
preparando a indução.
Generalização
do individual, e formular
Aplicação
Exercício do novo conhecimento, o que significa que toda idéia nova deve
interesse. Ela se tornou seu calcanhar de Aquiles, quando a nova psicologia veio
abaixo:
uma necessidade.
formulação de hipóteses.
experimentação
para
isto,
dificuldade experimentada.
Aqui, abro parêntese. Vários autores criticaram Dewey, dizendo que substituíra o
errado. Porém, errado estava quem pensou assim. E simples constatar que tanto
problema é que Dewey queria mostrar que a pesquisa, era a mesma que o moderno
uma heurística, e que isso estava mais condizente com a modernidade do que a
Mas não foi só nessas coisas que Dewey divergiu de Herbart e do seu projeto
interior, o
diante
por meio do aumento das capacidades individuais". Assim, pode-se dizer, os cinco
mente - resolver problemas novos. Ser um bom ser humano, para Dewey, não era ser
alguém com erudição, mas alguém capaz de resolver problemas. Daí que, neste
aspecto, Dewey não podia divergir daqueles que viam o seu método de ensino
naturalmente ativo,
47
trabalhador
- um profissional.
Agora, a sua crítica à sociedade do trabalho. Dewey, como já adiantei, não foi o
Portrait:
A situação histórica, hoje, na América, é que os educadores têm um número de
tarefas importantes para realizar. Uma vez que as condições efetivas do ensino
sociedade onde
eles são selecionados, entre outras razões, pelo fato de serem considerados como
inegáveis porque seus principais termos não estão definidos ou, quando estão,
revelam-se
ordem
aceitação seria bem útil para algum partido ou igreja, no presente. A evidência
dessas crenças
teoria moral e social. Elas clamam por uma dedicação à luta, em termos práticos,
pela
problemas humanos, até agora exercido pelo dogma, sagrado ou não, pelo poder
particular, no Brasil, que procuraram ver em Dewey alguém que teria levado o
para o âmbito
anos 1980 -já declarei isto em outros textos:4 tanto os educadores considerados
de direita
49
justamente o
educacional de
Dewey era política, em favor da ampliação da democracia. Rorty, por sua vez,
chega a dar um passo a mais que Hook, levando em conta essa passagem final do
trecho citado:
para Rorty, Dewey acreditava menos na ciência do que Hook pensou; a ciência
com olhos atentos a postura de Paulo Freire: sendo aquele que enfatizou
a educação como ato político, teria sido mais herdeiro de Dewey do que ele mesmo
rodapé
Vanilda Paiva assim o fez para mostrar que eram especializados em estudos
educacionais, e não para dizer, como interpretou Libâneo, a meu ver erradamente,
Paulo Freire, como Dewey, via a educação imbricada na política. Ao mesmo tempo,
keynesiano,
vários países do Terceiro Mundo, mas que, até hoje, não se tornou realidade.
Por essa razão, a teoria educacional de Paulo Freire tornou-se uma outra face,
rodapé
como marxista do que como alguém que tinha a ver com os métodos pedagógicos de
ideológicos do seu país e dos países onde esteve. A aproximação com o marxismo
de tipo jacobinista foi uma fase de sua vida que acabou nublando seu maior
suas últimas entrevistas, em Nova York, Paulo Freire elogiou abertamente Anísio
Freire e o americanismo.
51
termos do que afirmei anteriormente, diria que, para Paulo Freire, a educação
Em seus primeiros escritos, Paulo Freire via o homem como possuindo uma vocação
para sujeito da história e não para objeto, mas, nas condições do Terceiro
Mundo,
esta vocação não estaria se explicitando, dado que as populações mais pobres
colonialismo,
então,
cada país do Terceiro Mundo, frente aos seus problemas nacionais, e engajar este
"não têm voz na sociedade, mas que, obviamente, ao contrário do que diziam as
Brasil. Neste país, ao contrário dos Estados Unidos, a história da escola fez-se
alemão. Nos Estados Unidos, a escola sempre foi paroquial, comunitária. Paulo
ao Brasil uma pedagogia capaz de ter êxito em alguns lugares com total falta de
pessoas que deixavam a vida rural e migravam para as cidades, ficando, então, à
povo" através da instauração de uma "pedagogia do diálogo", que deveria ter por
"conscientização".
destinado a se tornar depósito dos dogmas do professor. Assim, como Dewey, Paulo
Freire visou à educação contra o dogmatismo. Também como Dewey, recusou a idéia
de uma educação onde os alunos fossem passivos diante da ação pedagógica. Contra
o que seria a educação bancária, Paulo Freire elaborou um procedimento que, para
efeito de comparação com Herbart e Dewev, ilustro sob a forma de cinco passos
didáticos:
por uma série de razões, poderiam não estar aptos a entender a realidade
realidade".
Generalização: Aplicação
Hipóteses: Experimentação
ou mesmo situações curiosas e difíceis. Mas que tipo de problemas e/ou situações
os mais fracos, etc. Esses problemas são apresentados pelo cinema e pelo romance
Todavia, há de se lembrar, esses meios serão tomados como mais do que simples
veículos:
serão levados a sério como nunca, pois os problemas não existiriam sem eles.
vida cotidiana dos estudantes, dos seus avós e pais, enfim, do seu grupo social
desdobramentos
a ver sua vida inserida em um romance nacional pode, ele próprio, desejar ser um
dos heróis nacionais que darão continuidade à luta pela liberdade, como fizeram
diante das crianças, é saber distinguir quem é o herói: seria saudável, diz
Rorty, que as crianças aprendessem que ser americano é ser menos parecido com
John Wayne do que com Martin Luther King. Eu diria, para o caso brasileiro:
mesmo de gente como Florestan Fernandes enquanto deputado, mas que fossem
estudante perceba que essas narrativas que redescrevem as primeiras não estão
rodapé
linguagem distintos que estão aptos, pragmaticamente, para uma coisa e não para
outra. Se quero saber como uma nave espacial funciona, então, um bom vocabulário
é o dos físicos, mas se quero dizer para minha namorada como a nave atravessa os
céus, numa noite estrelada, creio que seria melhor um vocabulário ficcional -
acho que seria pedante e inútil para o namoro a explicação da Física! Penso que,
neste caso, deveríamos ir de Júlio Verne! Mas o erro seria achar que, no segundo
cuja distinção se dá pela utilização lingüística que o "bípede sem penas" faz
ser um texto filosófico ou científico - até é bom que seja assim, contanto que
uma chave para se chegar mais próximo da realidade, como não há uma chave para
forte, pressupõe a idéia metafísica de que existiria uma realidade última capaz
de ser desvelada, justamente, pela crítica. Em razão disso, educação, nessa
considerado inútil, pois todas as narrativas são distinguíveis não por estarem
umas mais, outras menos enganchadas no "mundo", mas sim, por serem umas mais
portanto. Não há uma narrativa que tocaria o chão ontológico mais que outra.
algo sem mensagem), deve fazer tremer a linguagem estabelecida. Agora, se ela
em favor da democracia. Mas que fique claro: nem sempre a metáfora acontece; por
isso, nem sempre estamos no passo 4 quando queremos estar. A metáfora pega-nos
de surpresa.
Passo 5. Por fim, o que se tem, é a coleta das idéias e sugestões vindas das
no campo cultural, social e político de cada um. Cabe aqui, a ação moral e
narrativa e sua divulgação, a criação de uma nova metáfora que, não só garanta
Redescrever é um ato que afeta a polis. Talvez o único ato que sempre fez o
que borrou a nítida linha que separava o que é metafórico do que é literal. Foi
Nietzsche quem, no final do século XIX, colocou a linguagem num plano articulado
filosofia da educação adequada aos procedimentos dos cinco passos acima, e para
tal, quiserem utilizar a linguagem atual da filosofia, penso que a leitura dos
Richard Rorty.
teria uma
explicada.
A objeção de Davidson a essa formulação aparentemente tranqüila da metáfora é
para além dos cânones tradicionais. Para ele, como Rorty e eu o lemos, a
metáfora não é uma mensagem, não tem um conteúdo cognitivo a ser decodificado.
Ela não é um outro modo de dizer as coisas". Ela é, sim, um ato inusitado no meio do
processo comunicacional que, embora tenha efeitos de grande impacto sobre o
ouvinte, não pretende dizer-lhe coisa alguma. E claro que uma metáfora, depois
mortas. Mas, num primeiro momento, a metáfora não é uma explicação nem tem valor
de verdade, na medida em que não está nos quadros do jogo semântico tradicional.
Por isso mesmo, sua utilização numa conversa é muitas vezes espontânea, e quem a
utilizou pouco sabia o que significava (pois ela não significava!). Duvido que
Galileu soubesse o que estava dizendo - da mesma forma que nós o sabemos hoje -
quando falou diante dos padres da Igreja, "a Terra se move". Assim, duvido que o
Movimento Negro pudesse, no seu auge, explicar o que era Black is beautiful. Do
mesmo modo que agora seria uma péssima idéia tentar explicar o que é Gay is
destruiria
good"! Mas, num futuro próximo, essa expressão talvez possa ser explicada da
mesma forma que explicamos hoje "a Terra se move". Ou como contamos hoje, para
próximo, a expressão Gay is good seria uma metáfora morta, estaria inserida num
Quem recebe a metáfora, segundo Rorty, recebe algo que é como uma foto
comunicação, no qual há uma semântica prévia, que estaria implícita. Porém, não
e, assim, ganhar vez e voz na sociedade, na medida em que possam colocar seus
Com isso, colabora-se com Paulo Freire, na luta por uma educação em favor do
desses ideais.
A praxe dos textos que falam sobre didática, diria que eu deveria dissertar
pedagogias tradicionais e pedagogias novas etc. Entretanto, este livro não segue
a praxe. Este livro está cansado da praxe. Escrevi este livro porque eu mesmo já
não suportava mais a velha cantilena dos autores de livros sobre didática. Por
isso, "detalhes", neste livro, irão remeter o leitor para um campo exterior à
Há toda uma literatura em estudos educacionais que buscou mostrar que a noção de
"aula", por mais ampliada que seja, é sempre uma redução, e que a didática
prática não ocorre dentro do que o senso comum chama de "aula", mas dentro do
a força da palavra "aula" permanece entre nos. Quando se fala em nova teoria
educacional e em nova didática, não há quem não pergunte: "mas, e a aula, como
fica?" Muitas vezes, essa pergunta é ridicularizada, pois vem de um sentimento
muito prático dos professores. Mas mesmo quem a critica, muitas vezes, no
Assim, não se pode fugir do assunto. Temos que admitir, num determinado nível
discursivo, que utilizamos algo parecido com "aula" - e que, no limite, é ela
vários quadros. No entanto, por que isso ocorreu? Por razões filosóficas? Bem
emergentes distintos para cada uma das teorias. Mudamos nossa didática porque
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Herbart está viva. No caso de Dewey, temos ainda mais a sensação de algo vivo:
não passaria pela maioria das cabeças dos filósofos da educação, no Ocidente,
educação numa situação social não dinâmica e não livre. Fora alguns ressentidos
educação. Paulo Freire, por sua vez, está presente, na medida em que os países
ricos se tornaram mais ricos, e os países pobres, mais pobres, e que o fenômeno
articuladas à filosofia da educação pré -linguistic turn. Por sua vez, a teoria
da educação que melhor se insere no campo pós-moderno e, com sorte, talvez possa
educação seja o fundamento da teoria educacional. Creio que ela é apenas uma
forma de discurso ad hoc, que permite melhorar nossa coerência
fato, na "aula".
Se o leitor prestou atenção aos quadros expostos até aqui, viu claramente que
cada teoria educacional permite, e mesmo obriga, que suas respectivas "aulas"
sejam bem diferentes. E isso passa pela própria arquitetura que envolve a
Ocidente no decorrer dos séculos XIX e XX, forjadas na expansão das redes
a que o professor se transforme no centro dos olhares. Este, por sua vez, pode
estar atrás de uma mesa, na frente ou um pouco ao lado das fileiras e linhas. Ou
Herbart: todos os olhares devem estar voltados para o local onde irá aparecer,
arquitetônica não combina com a teoria deweyana. É difícil que alguém possa
Dewey, em um lugar assim, como a sala convencional. Nesse Lugar, para a teoria
poderia acontecer, não poderia se realizar. Por quê? Pela simples razão de que,
ter salas convencionais, é claro, mas seria incompreensível que ela tivesse "a"
sala na qual ocorreria a" aula. A teoria de Dewey é, antes de tudo, uma teoria
contar com uma arquitetura ampliada, não só no sentido físico do termo, mas no
de rua", como é conhecido o educador que tem como "sala de aula" a arquitetura
ensino:
necessitam ter seus olhos comprometidos livremente, antes de qualquer coisa, por
meio de seres humanos. Esta é a razão pela qual liberdade de cátedra e liberdade
rodapé
mas alguns serão com os professores vivos, que estão ministrando as lições. Em
conectando-os num relacionamento que tem pouco a ver com a socialização, e muito
estudante, não há "aula". Portanto, nem sempre a aula acontece quando ela parece
qualquer outro tipo de instituição que acolhe a educação. Muitas vezes, ela só
acontece quando o professor e o aluno já, há muito, estão distantes. Eis então
a saudade. Quantas vezes, percebemos que é na saudade de uma sedução que não
volta mais que está ocorrendo a educação, que o ensino está se efetivando? E não
institucional?
cabeça para que ele pense através dela. Ou seja, temos que nos deixar dominar,
por um momento, pelo pensamento do outro. Por um momento, ainda que breve,
temos
desenvolve o jogo erótico, que é a aula. Para tal, como Rorty aponta, o chão é a
liberdade - a mesma liberdade que Sócrates necessitava para que o agon dialético
a liberdade está nos dois pólos da aula pós-moderna, porque ela é um jogo
erótico, que sem liberdade não pode ocorrer (Rorty), e porque ela é o locus da
metáfora (Davidson), que não pode ser saboreada sem liberdade, nem pode produzir
um jogo de linguagem capaz de ser usado por nós a fim de gerar novos direitos
democráticos.
portanto não só de seus cinco passos expostos no último quadro, mas depende,
como... o amor!
Amor? Essa palavra, nas mãos dos hipócritas e dos medíocres, é distorcida
rapidamente, por isso vou adiante: de maneira alguma essa concepção de "aula"
pós-moderna pode ser tomada como uma proposta piegas. Para compreendê-la, é
preciso uma certa, digamos, sensibilidade filosófica. Outros diriam, talvez mais
perigoso, pelo espanto, pela aventura, pelo caminho que ainda não está de todo
aberto e que necessita do estudante, junto como mestre ou com o livro, para
temos a sensação de que eles eram tão ingênuos quanto os personagens femininos
nietzschiano bem notaria, todos eles esperavam dar cabo de problemas milenares e
viver em um mundo sem a contingência. Nietzsche, por ser tão ingênuo quanto
eles, nos faz espantar com a ingenuidade deles, denunciando-a. Essa ingenuidade
souberam o que era aula, nessa acepção pós-moderna, que pode ser resumida no
corajosos, podem entrar. E só eles conseguem sair e emergir dela. Mas a aula, na
professor, é também a paz. É a paz cansada mas satisfeita dos amantes que
para o... casamento. "A aula" é a sensação que temos de um casamento dando
intelectual ao mesmo tempo. Assim, para a didática pós-moderna, não há aula onde
ensino-aprendizagem".
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Conclusão
O LEITOR PODE ESTAR INQUIETO COM ESTE LIVRO, achando que muita coisa
não foi
- no sentido em que Thomas Kuhn usou esta palavra - de teorias educacionais que,
didática efetiva nos últimos duzentos anos. Mas não se deixe enganar, leitor: a
palavra que acabei de utilizar - ocorreu - não implica que este seja um livro de
a outros. Assim, para falar da teoria humanista, preferi Herbart e não Kant,
pois achei que num trabalho sobre didática, um passo maior seria dado se
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trabalho, preferi Dewey e não Habermas. Este Último é tão defensor da democracia
libertadora, optei por Paulo Freire e não por qualquer outro teórico de
dívida ainda grande para com o marxismo. Não vejo porque meu livro teria de ser
pessimista. Desde o início, eu queria que fosse um livro que propusesse uma
postura. E nele há sugestões para uma nova postura pedagógica. Muitos jovens
século XXI, já não podem ser vistos pela velha guarda marxista, como não-
alinhados com a luta por um mundo melhor. Ao contrario, segundo a perspectiva
que aquele que os marxistas desejaram, pois almejam, além da justiça social,
também a liberdade para todos - como os bons filósofos gregos, querem que a
felizes.
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Sugestões de leitura
FAÇO ALGUMAS INDICAÇÕES DOS MEUS LIVROS QUE, acredito, podem Levar o
leitor para outras paragens, outros autores e outros temas.
_________ Filosofia da Educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2000, Coleção "O que você
todo o mundo.
76
vazia
77
APÊNDICE
Teorias da educação na
humanidade. Mesmo quando acreditam que a filosofia deixa tudo como está, mesmo
nosso lugar dentro dele - nos livrariam da ilusão, nos direcionariam para
aquelas atividades (vida cívica, contemplação da ôrdem divina, progresso
Este texto foi cedido pela professora Amélie Rorty. Foi publicado com
sociedade, seu conhecimento e seus valores.10 Cada época histórica é marcada por
uma luta pelo poder, que pode ser a autoridade da tradição ou o poder manifesto
rodapé
A etimologia mostra que "educação" deriva de e-ducare: extrair, fazer sair por
tipicamente, sugere tirar alguém ou algo de uma condição rude ou crua. Nossos
struere: "construir dentro de". Daí deriva a palavra alemã Bildung: desenvolver,
limitados.
em nossas crenças e práticas. Ela fornece a compreensão mais clara das questões
Hobbes, Miii e Marx - é não apenas direcionar para a estrutura das instituições,
Alguns filósofos - Locke, Rousseau, Bentham e Miii, por exemplo - fizeram dos
filosóficos. Outros -Descartes, Spinoza e Hume - tiveram boas razões para não
soa falsa sem dar atenção crítica para seu significado educacional. Uma
Hegel marca o estudo da História, amplamente concebida como uma parte essencial
da educação. Uma vez que a política educacional é formulada por aqueles que
(Santo Agostinho
selecionados por suas capacidades para engajar-se, devendo ser orientados pela
investigação filosófica
matemática e a
ordenadores do cosmos que servem como um modelo para a Polis. Além das
pensar a cidade como uma espécie de cosmos precário cujas partes são mantidas em
harmonia estável umas com as outras, e o todo unido pelo reconhecimento da força
cidadãos (Pol. 3.15 1286 a 23.ff; NE 10.9 1180 a 33ff). Platão e Aristóteies
concordam que "aqueles que comandam.., teriam primeiro que aprender a obedecer"
(Pol. l333a2); e que "três coisas fazem os homens bons e virtuosos: o caráter, o
hábito e a razão" (Pol. 133 lal 1). Mas, enquanto Platão considera que os
da razão e do hábito para uma vida de virtude pratica. Não há garantia de que
diferentes. Ainda que as virtudes sejam exercidas em seu próprio benefício, elas
Essas mudanças marcam uma revisão radical em suas concepções sobre as direções
próprias de uma vida humana; elas também redirecionam suas concepções sobre os
educação deveria ser direcionada para devolver a alma à harmonia com a ordem
original bloqueia o acesso direto da alma a Deus: não apenas os nossos desejos,
mas a reconstituição da alma: a Graça divina deve interceder para fornecer uma
iluminação da Graça. Mas Santo Agostinho não entregou sua confiança a uma
criticamente não possa trazer a salvação, continua a ser uma aliada essencial da
Boa Vontade. Parece não ter enfrentado a tensão implícita entre as diretrizes
que formam as virtudes cívicas dos cidadãos e a glória do Estado. É porque seu
como controlar aparências, comandar sua milícia, manipular tanto aliados quanto
inimigos,
rodapé
até mesmo para desenvolver um estilo retórico lacônico. Mas como seu poder é
saber como conquistar a admiração e a obediência dos cidadãos. Uma vez que
virtü são direcionadas para alcançar a glória, assim como para garantir a
Graça:
equitação, arco e flecha, esgrima. O cortesão deve colocar seus dotes mentais e
corporais no trabalho de arte: deve vestir-se elegantemente, dançar bem, compor
modo, psicologicamente
Cristo. Ele sofre com o Cristo carregando a cruz, compartilha seu momento de
Lutero, ele mesmo educado na Ordem Agostiniana, lança, ainda, outra revolução,
primazia que ele concede à preparação espiritual em favor da Graça da fé, Lutero
De uma forma mais cética, Education of the Prince (1516), de Erasmo, fornece um
devendo ser exercitadas por todos da mesma forma. Harmonia cívica e paz, em vez
os recursos aos quais o indivíduo pode recorrer. Embora Erasmo acredite que a
cavalheiros eram educados por tutores que podiam moldar os hábitos e direcionar
inovação pedagógica:
os idiomas eram adquiridos pela conversação e pelas viagens mais que pelo estudo
Locke pensasse que a Divindade tivesse dotado o homem com idéias morais e
teologia ou pela casuística. Uma vez colocado no caminho certo do senso comum e
90) e Condorcet (1743-94) argumentaram que ela é um bem intrínseco; e que ela
humano
Como as outras virtudes artificiais, a justiça surge quando tomamos "um ponto de
a fonte da aprovação moral que atende àquela virtude" (Treatise of Human Nature,
111.2.2, 1739-40). Ela é, argumenta Hume, facilmente movida por uma compreensão
simpática dos interesses dos iguais, numa sociedade homogênea. Mas até mesmo
numa sociedade diversa a educação moral pode alargar o escopo da imaginação para
estimular idéias de bem comum, com a força e a vivacidade das paixões motivadas.
Dictionaire raisonné des sciences, des arts et des métiers (1751-1772) anuncia
progressivo:
todos os homens; isto é, deve ser igualmente disponível para todos, e todos são
central da vida moral -, a moralidade estrita requer que se seja capaz de querer
compreende a lei da não contradição pode determinar o que é correto: a máxima que
direciona um dever moral pode, sem contradição, ser legada como uma lei
ser atraída à moralidade pelo desejo de agradar, ou pelo medo de punição, ou até
"ela só pode atingir seus próprios fins permitindo aos outros atingir os seus"
Embora as visões de Kant sobre a moralidade fossem, como ele próprio admitiu,
lei moral e como seu legislador universal. Mas Rousseau projeta nossa condição
natural como muito mais benigna e nossa condição social como muito mais
1) The Two Discourses (1750, 1755) e a Letter to D'Alembert (1758) são contos
artes. Não deveriam, então, atacar as causas? Rever como elas inflamam a
vendo as conseqüências naturais das suas ações. Para ter certeza, o tutor
despojados; ele aprende sobre promessas sendo colocado em situações onde ele
das emoções sexuais, Emílio -que é, neste período, um jovem saudável e sensato -
pode ser enviado para aprender como o mundo funciona. Sofia, que será sua esposa
imparcial. Como não está qualificada para ser uma cidadã ativa, apenas por
cortesia ambígua para com a pureza dos seus sentimentos é que ela pode ser
3) The Social Contract (1762) fornece uma descrição das condições políticas
por vontade própria, é que o indivíduo obtém a promessa de sua natureza. Um novo
compreensão; ele também concorda com Kant que a liberdade é uma precondição
para
a moralidade. Colocando essas duas visões juntas, ele surge com uma conclusão
abertamente o push-pin tão bom quanto a poesia; Miii ampliou a educação para
além dos fatos e da lógica - para a educação do sentimento social e cívico -, tanto
como um bem humano
habilidades para
Mesmo se desejamos, não podemos colocar esta História aquém de nós; ela forma e
sentimento sociil toma, numa nação cujos cidadãos compartilham uma cultura
comum, uma forma diferente da que toma onde uma cultura dominante se depara com
essas configurações, ainda sem que se comece por refletir sobre como a história
da educação moral emerge no Segundo e no Terceiro Mundo, ou como ideais
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