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Reflexão sobre o ensino de História e Geografia no século XXI:

Contribuições para o ensino fundamental, para a educação de Jovens e


Adultos e para a Gerontagogia

Prof. Dr. Adilson Marques

São Carlos/SP
2011
Apresentação

O mundo contemporâneo passa por profundas transformações e rupturas


paradigmáticas. Uma nova forma de pensar, sentir e agir coloca-se como desafio para que a
sustentabilidade do planeta, a cultura de paz e a conquista da democracia e dos direitos
humanos se harmonizem e dêem sentido aos avanços tecnológicos em todas as escalas
(local, regional, nacional e planetária), diminuindo as desigualdades econômicas e sociais,
ao mesmo tempo em que valorize a diversidade cultural e a singularidade de cada
experiência humana.
Este desafio também deve estar presente no ensino de História e de Geografia (seja
na educação escolar ou não-escolar), abarcando o ensino fundamental ou mesmo a
educação de Jovens e Adultos e em programas educativos com idosos (gerontagogia).
No caso específico do ensino fundamental, o professor possui um árduo desafio: o
de sensibilizar a criança, através das mais diferentes atividades pedagógicas, para que
valores sócio-ambientais, de solidariedade e de cooperação se transformem em atitudes
duradouras, estimulando a prática da cidadania e dos direitos humanos desde a mais tenra
idade.
A forma de sentir, pensar e agir deste profissional influenciará diretamente no
imaginário da criança, favorecendo ou não sua vontade de participar das aulas e
estimulando um relacionamento afetual com a escola e com os demais alunos e
participantes do processo educativo. A motivação da criança pode facilmente esvanecer
caso não haja a experiência do sensível e as trocas sensoriais que apenas a convivência
fluida, conflitual e “ecológica” com o outro, no tempo e no espaço físico cotidiano, é capaz
de sustentar, pois a vontade, a motivação e o interesse dependem da sinergia entre a razão e
os sentidos para ser constantemente retro-alimentada.
Infelizmente, não é assim que tem sido o ensino de História e Geografia ao longo de
todo o século XX. Independentemente da visão adotada pelo professor (tradicional ou
crítica) a aula quase sempre é expositiva ou baseada na leitura de um livro didático e a
avaliação pautada na memorização de datas, conceitos ou fatos. A mudança nos conteúdos,
ocorrida nas últimas três décadas, não foi acompanhada por uma mudança na forma de
ensinar e de interagir com a criança. Esta continua sendo pensada como se apenas tivesse a
função psíquica pensamento, menosprezando as outras tão bem estudadas por Jung (a
sensação, a intuição e o sentimento). É uma visão integral e holística do fazer educativo que
este documento propõe, recuperando e valorizando também o corpo, a alegria e a felicidade
no interior da sala de aula, em suma o Homo ludens.
Parte 1
Reflexões sobre a Didática

Introdução

Antes de apresentar uma proposta de ensino de História e Geografia para o século


XXI, é necessário fazer breves reflexões sobre a Didática, questionando sua ênfase nos
aspectos cognitivos e menosprezo de outras dimensões importantes da existência humana,
como o papel do corpo e da gestualidade dentro do espaço escolar; assim como a tendência
em dissociar a teoria da prática, tentando exportar para a sala de aula os planos de ensino
que não encontram eco na realidade escolar, por exemplo. Também é necessário refletir
sobre as mudanças importantes no conteúdo e no ensino de História e Geografia, que vem
sendo propostas ao longo das últimas décadas, mas que ainda não foram acompanhadas por
uma mudança na forma de ensinar, muito pautada ainda na racionalização, esquecendo-se
dos aromas, das cores, das formas sensoriais e ruídos que ocorrem na História e na
Geografia vivenciada ou experienciada no cotidiano.

O papel e a importância da Didática no ensino fundamental

A expressão Didática é frequentemente compreendida como a arte ou a técnica de


ensinar. Em nossa reflexão, ela será entendida como o ramo da Pedagogia que estuda os
modos e as condições de se processar o ensino e a instrução na educação escolar e não-
escolar.
No século XX, duas grandes escolas dominaram as reflexões sobre o tema, a “escola
nova”, baseada em princípios humanistas e pautada nos interesses do aluno, e a que
podemos chamar de “tecnicista”, de cunho neoliberal e apoiada pelo Banco Mundial,
principalmente após a década de 1960.
Em meados da década de 1990, uma proposta que vem sendo chamada de
“interacionista” vem ganhando força neste debate, não como uma mera síntese das duas
anteriores, mas como uma terceira força, capaz de se relacionar de forma dialógica e
complementar com ambas, reconhecendo os seus valores, mas as conduzindo aos seus
respectivos lugares. Essa nova visão pode ser chamada também de humanista, mas não
ignora o valor das novas Tecnologias de Comunicação e Informação (TICs), na reflexão
sobre as estratégias de ensino.
Como salientamos, a Didática é o instrumento pedagógico para melhor realizar o
ensino e a instrução. Porém, podemos dizer que cada professor promove em si, ao longo de
sua formação, competências didáticas, relacionando dialogicamente a sua experiência com
a educação (seja em âmbito escolar ou não-escolar) e o estudo teórico. Assim, podemos
dizer que as competências didáticas são também habilidades sócio-pedagógicas que vão
orientar a atuação profissional. Nesse sentido, acreditamos que um profissional para atuar
no ensino fundamental, necessite, entre outras, das seguintes competências didático-
pedagógicas:

- Ser capaz de integrar teoria e prática em sua atuação profissional;

- ter habilidade cognitiva e sensibilidade para transformar informações em conhecimento;

- Compreender que a educação não é mercadoria e que a implementação de novas


tecnologias não é suficiente para melhorar a qualidade de ensino.

- Saber inserir e trabalhar com novas tecnologias de ensino e comunicação.

- Incluir democraticamente no ambiente educativo escolar ou não-escolar as crianças com


características diferentes (culturais, religiosas, portadoras de necessidades especiais etc.).

- Focar na interação do educando com o meio sócio-cultural e ambiental e valorizar a


responsabilidade (direitos e deveres), em todas as escalas (do local ao global).

- Ser capaz de investigar, refletir, gerar conhecimento, gerir e ensinar tanto no âmbito
escolar como em espaços não-escolares.

Para que tais competências e habilidades sejam alcançadas, alguns desafios se


colocam para o professor:

01 - Como sua Didática pode contribuir para uma educação de qualidade em todos os
aspectos pedagógicos?

02 – Como garantir uma coerência teórico-prática no processo educativo, superando a visão


empírica (formada na base da tentativa e erro) e a teórico-acadêmica (que cria métodos,
procedimentos pedagógicos quase sempre sem vínculos necessários com a realidade do
aluno)?

03 – Como integrar, mas transcender as exigências do mercado, quase sempre pautadas por
perspectivas individualistas e privatistas, inclusive no campo educacional?
04 – Como estabelecer um compromisso com a transformação sócio-cultural, valorizando a
capacitação do aluno no âmbito técnico-científico, mas também nas relações interpessoais
humanizadoras?

05 – Como conciliar a Didática, enquanto instrumento de ensino e instrução, com as


diferentes concepções de sociedade, de ser humano e de educação, em suma, valorizando a
diversidade cultural e a sustentabilidade na educação escolar e não-escolar?

06 – Como proceder os mecanismos de avaliação, de forma que esta não se resuma a exigir
do aluno que decore dados e fatos e nem venha a ser um instrumento de dominação e de
condenação ao aluno?

As respostas a essas questões são processuais, mas tê-las sempre em foco é


importante para que a Didática, sobretudo daquele profissional que atua no ensino
fundamental, na educação de jovens e adultos ou com idosos esteja pautada no
compromisso com a garantia de um ensino de qualidade, não simplificando as experiências,
as relações e os valores necessários para o desabrochar de um sujeito pleno, capaz de
interagir, com sabedoria e ética, em todos os domínios existenciais.

A Didática e as novas tecnologias de comunicação e de informação

Também não é mais possível ignorar o papel das novas tecnologias de comunicação
e de informação (TICs) no mundo contemporâneo. Diferentemente dos meios de
comunicação de massa, elas mobilizam competências sociais e cognitivas que necessitam
do estabelecimento de relações sociais mais interativas e cooperativas. Nesse sentido, a
Didática deve interpretar este processo de formação a partir da relação dialógica entre duas
polaridades interdependentes e complementares: a pessoal e a sócio-cultural. Ou seja:
A dimensão pessoal é aquela relacionada à aspiração ou ao desejo pessoal do
aluno. Cada um desenvolve valores e estratégias singulares de compreensão do processo
educativo, apesar da influência dos fatores externos ou sócio-culturais (família, religião,
ideologia etc.) nesta experiência vivida.
A outra polaridade é a dimensão sócio-cultural que se refere, portanto, aos
programas e às instituições educativas. Ela compreende o conjunto de práticas e saberes
reconhecidos publicamente como fundamentais no processo educativo.
Esta relação dialógica entre a dimensão sócio-cultural e a pessoal é importante para
definir quais os métodos mais adequados de ensino em função das características de cada
grupo de alunos.
Essa tensão deve ser estimulada para que o processo didático adotado vá além
daquele denominado como abordagem tradicional na formação de professores. Ou seja,
daquela didática na qual o professor se apropria das instruções necessárias para o exercício
profissional na prática escolar diária, uma vez que sua formação se baseou em um simples
processo de socialização, adquirido por tentativa e erro, ao longo dos anos. Esta abordagem
se sustenta através do pressuposto que o docente para desempenhar suas tarefas não
necessita de nenhum treino prévio. O “saber-fazer”, o empirismo, capacitá-lo-ia para o
exercício profissional. Essa postura profissional ainda é muito comum em sala de aula. O
professor acredita que tem longa experiência e que não precisa mudar sua forma de ensinar.
Tal postura dificulta a introdução de novas tecnologias de ensino, por exemplo.
Porém, a relação dialógica apontada acima também é de fundamental importância
para superar a outra perspectiva didática, chamada de abordagem técnico-academicista na
formação de professores. Ou seja, a que estabelece uma nítida separação entre teoria e
prática, considerando que o conhecimento prático está subordinado ao conhecimento
teórico. Dessa forma, a atividade docente se reduz aos pressupostos da racionalidade
técnico-científica, desconsiderando as singularidades escolares. O chamado “fracasso
escolar” está muito relacionado a essa postura didática que parte de planos elaborados para
um aluno imaginado, mas que ignora o aluno concreto, aquele que está inserido em um
contexto único e singular. Muitas das criticas aos projetos educativos do Banco Mundial
focam neste aspecto: o não-conhecimento da realidade escolar e a imposição de uma
proposta desvinculada dessa realidade.
Uma tentativa didática de superação desse quadro aparece com a abordagem
reflexiva na formação de professores. Ou seja, trata-se de um enfoque didático-pedagógico
que valoriza a pesquisa-ação, e que concebe o futuro professor como um profissional
autônomo que reflete criticamente sobre a prática educativa cotidiana. O objetivo central é
fazer com que o professor compreenda melhor o processo de ensino, contextualizando-o.
Assim, apesar do conhecimento profissional surgir na e a partir da prática escolar, passa a
exigir uma constante experimentação reflexiva e democrática para construir e reconstruir a
prática educativa, interagindo teoria e prática.
E, felizmente, do interior do ensino tecnicista surgiu o gérmen de sua
transformação: as TICs. É justamente o caráter dinâmico e interativo das novas tecnologias
que podem humanizar a Didática, propiciando uma nova prática, baseada na reflexão e na
interação.

A importância de se formar um professor de História e de Geografia reflexivo-


interativo

Hoje, mais do que nunca, saber transformar a informação em conhecimento e este


em sabedoria de vida é de fundamental valor. E dentre os processos identificados como
fecundos na formação de um professor capaz de participar ativamente da sociedade
contemporânea está a reflexão individual ou partilhada sobre a prática e a pesquisa-ação.
Ou seja, o conhecimento profissional do professor não resulta unicamente da pesquisa de
especialistas, mas, também, da sua própria experiência.
Alguns pesquisadores da educação apontam que o conhecimento produzido pelos
professores, na prática profissional, é prático, experiencial e situado no contexto em que é
produzido e exercido, diferenciando-se dos acadêmicos por interligar aspectos
instrucionais, formativos, cognitivos, conceituais, emocionais, culturais e ético-políticos.
Tal práxis reflexiva e investigativa é de fundamental importância para que o professor
adquira autonomia para enfrentar os problemas e desafios de seu tempo, re-significando
continuamente sua prática docente e seus saberes. A aquisição dessa nova mentalidade faz
com que o processo de formação e desenvolvimento profissional do professor seja contínuo
e sempre inconcluso, pois está em constante transformação. Além disso, esse processo
reflexivo-interativo facilita a habilitação do futuro professor para:

- Ter uma formação teórica consistente, tanto em relação ao conhecimento da


disciplina, concebida sob uma perspectiva histórico-cultural, quanto em relação à
apropriação e uso dos recursos e ferramentas tecnológicas em sua prática didático-
pedagógica;
- Valorizar a cooperação, ao invés de se isolar em sua sala de aula ou em sua
escola, a fim de compartilhar seus saberes e experiências com os demais profissionais;
- Acompanhar o que vem sendo produzido em termos de conhecimento novo
relativo ao seu campo profissional, visando promover, permanentemente, melhor qualidade
de ensino.

Nesse sentido, a presença de um professor interativo que procura acompanhar


(recebe, contribui e troca) o aprimoramento de seu campo profissional e científico,
participando coletivamente de grupos ou projetos de estudo dentro ou fora da escola é de
fundamental importância na sociedade contemporânea. Esta necessita de professores
capazes de buscar no outro e com o outro novas experiências e saberes para adotar em sua
prática profissional. Daí a importância também desse professor participar de cursos,
seminários e congressos, mas não somente como ouvinte, mas, principalmente, como
comunicador e debatedor de experiências e reflexões.
O professor não pode mais pensar sua prática como um ato solitário ou
individualista. Ao contrário, trata-se de um processo educativo que exige ser solidário e
cooperativo. E hoje em dia, com a facilidade de acesso a informação, possibilitada pelos
ambientes virtuais e da mediação das tecnologias de informação e de comunicação, o
professor pode interagir com outros profissionais, ressignificando constantemente a sua
prática.
Essa nova atitude desconstrói o paradigma que defendia a necessidade do
conhecimento (ou o saber científico) ao ser construído adquirir uma materialidade própria e
o cientista, por sua vez, passar a ser “objetivado”, ou seja, tornar-se anônimo. PIAGET, um
dos mais importantes defensores dessa idéia, afirmava que era justamente no anonimato
que se encontrava uma das grandes vantagens da Ciência sobre outras formas de saber, uma
vez que isso tornava possível a descentração do sujeito individual na direção do sujeito
epistêmico. Mas o que isso significa? Em resumo, tornar o produto do saber científico
socialmente compartilhado através da Didática ou dos manuais de divulgação científica
separado e alienado de seu criador.
Em qualquer livro didático podemos conseguir exemplos de como se processa a
descentração do sujeito defendida por PIAGET. Tomemos, por comodidade, um exemplo
encontrado nos livros de História e Geografia para o ensino fundamental e médio. Um
conteúdo sempre presente no ensino dessas duas disciplinas é a colonização da América.
Assim, ano após ano, os alunos ouvem e decoram que na América após o
descobrimento passou a existir dois tipos de colônia: a de exploração e a de povoamento.
Os autores enumeram com cuidado as diferenças entre elas, os professores reproduzem tais
informações com muita seriedade e convicção e os alunos aceitam e as decoram para as
provas.
Se perguntássemos para algum professor de História e/ou Geografia do ensino
básico ou fundamental quem foi o pesquisador que criou ou que propôs a teorização desses
dois conceitos, ou mesmo quando eles foram criados, será que ele seria capaz de nos
responder? Provavelmente não, caso sua formação tenha sido realizada a partir de um
enfoque que valoriza a ciência sem autor e descontextualizada. Assim, podemos afirmar
que a Ciência Moderna, além da linguagem desencantada que possui, trata-se, de fato, de
uma ciência sem consciência.

Com outras escolas, através da internet - As apresentações e trocas de experiências


podem ser feitas utilizando os recursos das TICs e transmitidas pela internet para as escolas
envolvidas e acompanhadas por todos os interessados, tornando-se uma forma de contribuir
para melhoria da qualidade da educação em todas as escolas, local, estadual e nacional.
Mas toda essa reflexão só faz sentido quando se compreende o papel motivador e
formativo da interatividade e da pesquisa como recursos pedagógicos na Prática de Ensino
e no Estágio Supervisionado.
A interação, virtual e presencial, é a chave mestra de um programa bem sucedido de
Prática de Ensino e de Estágio Supervisionado, que devem ser constantemente reavaliados.
Parte 2
Os conteúdos e o ensino de História e Geografia

Introdução

Apontam o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, elaborado


pelo MEC, em 1998, a valorização e o respeito à cultura de um determinado grupo de
origem, sem deixar de levar em consideração a cultura de outros grupos sociais. Nesta
perspectiva, o professor tem como tarefa individualizar as situações de aprendizagens
oferecidas às crianças, considerando as suas capacidades afetivas, emocionais, sociais e
cognitivas assim como os conhecimentos que possuem dos mais diferentes assuntos e suas
origens socioculturais diferentes.

E para se alcançar tais objetivos, as disciplinas História e Geografia podem exercer


um papel preponderante, ajudando a difundir a diversidade cultural dentro do ambiente
escolar, valorizando a trajetória de vida de cada criança e a particularidade de cada
comunidade.

Porém, como apontam os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de


História e de Geografia, estas disciplinas quase sempre enfatizaram a memorização e as
aulas expositivas, independentemente da escola adotada, tradicional ou crítica. Assim,
mesmo quando se procura trabalhar com conteúdos mais condizentes com uma sociedade
em transformação, que valoriza os direitos humanos e a sustentabilidade, os recursos
didáticos não costumam acompanhar esta mudança.

Segundo a orientação de alguns estudiosos do assunto, uma forma eficaz de se trabalhar


um conteúdo está na seguinte organização didática:

a. Preparação e introdução da matéria - visa criar as condições de estudo,


motivacionais e de atenção. Pode se processar através de um filme, poesia, matéria
publicada em um jornal ou revista etc.
b. Tratamento didático da matéria nova - a assimilação da matéria nova é um processo
de interligação entre percepção ativa, compreensão e reflexão, sendo o processo de
transmissão-assimilação a base metodológica para o tratamento didático da matéria
nova. O processo acontece ouvindo as opiniões e vivencias dos alunos sobre aquele
tema proposto.
c. Consolidação e aprimoramento dos conhecimentos e habilidades - este é um
importante momento de ensino e muitas vezes menosprezado ou diminuído na
escola, por raramente valorizar a sabedoria que os alunos trazem e a possibilidade
de trocas no ambiente educativo.
d. A aplicação – esta fase é a culminância do processo de ensino. Seu objetivo é
estabelecer vínculos entre os conhecimentos e a vida, o que pode ser feito através de
pequenas pesquisas utilizando a história oral e outros recursos para se estudar
melhor aquele assunto.
e. Controle e avaliação da atividade – esta função percorre todas as etapas de ensino,
cumprindo três funções: a pedagógica, diagnóstica e de controle. A integração
destas funções dá à avaliação um caráter mais geral e não isolado. Não se trata de
avaliar se o aluno decorou ou não o conteúdo, mas o que apreendeu

Para tanto, as metodologias qualitativas em Ciências Humanas e Pedagógicas, como


o interacionismo simbólico, a etnometodologia, a dramaturgia social, a história oral, a
pesquisa-ação, a mitocrítica, entre outras, são instrumentos heurísticos fundamentais para o
desenrolar do processo de ensino, em uma perspectiva interacionista.

Dez eixos temáticos propostos para a criação de um projeto integrado de ensino de


História e de Geografia no século XXI

Esta proposta abrange de forma plena questões contemporâneas para que o aluno
(seja do ensino fundamental, da educação de jovens e adultos ou idosos) possa sentir
interesse por essas disciplinas. Ele aborda dez eixos temáticos, que se complementam, e
que visam, durante a prática educativa, ajudar o educando a transformar informação em
conhecimento e, este, em sabedoria de vida.
Os conteúdos ou conhecimentos específicos que serão tratados nas aulas podem
dialogar com um ou mais eixos temáticos, valorizando uma formação crítica e
compreensiva do aluno, de forma que o conhecimento específico que será alvo da prática
de ensino não se aliene de uma reflexão mais profunda sobre a sociedade, e que a aula não
se limite a um aglomerado de dados e informações que podem ser facilmente encontradas
nos meios de comunicação de massa. Estes conhecimentos, quando contextualizados,
precisam levar em consideração a realidade e o meio em que a aula será realizada, de forma
que o aluno possa vir a ser sujeito do processo, de forma que sua experiência subjetiva seja
importante em sua formação.
Os dez eixos temáticos propostos são os seguintes:
- Educação e os desafios sócio-ambientais da pós-modernidade;
- Educação, ciência e novas tecnologias de ensino;
- Educação, cooperativismo e terceiro setor;
- Educação, sustentabilidade e meio ambiente;
- Educação, diversidade cultural e alteridade;
- Educação patrimonial, memória e identidade;
- Educação em direitos humanos, cidadania e ética;
- Educação para o lazer, ação sócio-cultural e tempo livre;
- Ensino religioso escolar, ecumenismo e cultura de paz;
- Educação para o envelhecimento, tanatagogia e a consciência da finitude.

Estes eixos temáticos deverão orientar a elaboração de planos de aula e de material


didático. São como quadros de referências para se pensar a formação de um currículo,
planos de ensino e a própria legislação vigente, de forma que os temas possam ser inseridos
no ensino fundamental, na educação de jovens e adultos e em programas de gerontagogia
sempre adaptados à dimensão cognitiva, afetiva e social de cada faixa-etária.
O objetivo é fazer com que, a partir destes eixos temáticos, o aluno reflita e seja
capaz de intervir no processo educativo, construindo sua identidade como “eterno aprendiz”
e como cidadão consciente de seu papel na sociedade contemporânea.
Vamos abordar, resumidamente, cada eixo, visando compreender sua importância
no ensino de História e Geografia.

Educação e os desafios sócio-ambientais da pós-modernidade


Compreendendo os novos desafios que se colocam para o mundo contemporâneo,
enfatizando a necessidade da sustentabilidade como um princípio universal, a valorização
dos direitos humanos e da diversidade cultural e a revolução tecnológica, o professor de
História e Geografia será desafiado a pensar em estratégias de ensino que ajudem na
difusão desses princípios e valores, revendo e superando práticas e atitudes incompatíveis
com a sustentabilidade do planeta ou que desrespeitem os direitos humanos, visando
promover no aluno valores como a paz e a igualdade social.

Educação, ciência e novas tecnologias de ensino


Integrado ao anterior, este eixo temático valorizará o papel da ciência na melhora da
qualidade de vida, em todos os aspectos da existência humana, assim como na conservação
e recuperação do meio ambiente. Deverá também refletir sobre a inserção e difusão de
novas tecnologias de ensino, visando tornar a educação escolar e não-escolar um espaço
mais agradável e estimulante para o aluno do terceiro milênio, mais adaptável e fascinado
pelo mundo cibernético que nos rodeia, sem deixar de pensar no valor da afetividade e das
relações inter-subjetivas na educação, estimulando encontros inter-geracionais.

Educação, cooperativismo e terceiro setor


No atual cenário sócio-cultural e econômico, as cooperativas e o terceiro setor
aparecem como campo privilegiado para a atuação social e profissional. Porém, uma nova
mentalidade e uma diferente relação com a natureza, com o outro e com sua própria
estrutura psíquica é esperada desse profissional, substituindo a competição pela cooperação.
Criatividade, afetividade, liderança democrática, sensibilidade e outros atributos são
necessários para se atuar nesta área.

Educação, sustentabilidade e meio ambiente


Aprofundando o eixo temático anterior, colocamos como necessária uma discussão
sobre as formas de desenvolvimento atualmente adotadas em todas as escalas, da local à
global, assim como as interações e impactos sobre o meio ambiente e sobre a natureza que
estas formas de desenvolvimento acarretam. Uma reflexão sobre as políticas de educação
ambiental, sobre os diferentes tipos de imaginários que envolvem essa problemática e os
sentimentos nutridos na relação sociedade/natureza pelo aluno, serão alguns dos assuntos
que deverão ser discutidos nesse tópico.

Educação, diversidade cultural e alteridade


Se o foco do eixo anterior foi a natureza, aqui são as relações sócio-culturais e
psíquicas que são focalizadas. Como trabalhar a questão da diversidade cultural e da
alteridade sem que uma nova forma de exclusão seja criada a partir desse processo? Vários
autores apontam que, paradoxalmente, a busca pela diferença tem provocado o esgotamento
da diferença e a eliminação do Outro. Estudar quais são os critérios, os conceitos e até
mesmo os estereótipos que estão por trás do discurso legitimador da diversidade cultural e
da alteridade são alguns dos objetivos desse eixo.

Educação patrimonial, memória e identidade


E, complementando a mesma linha de raciocínio, o foco em questão é a memória
patrimonial, abordando tanto o patrimônio material e o imaterial na formação da identidade
cultural, abordando os patrimônios da humanidade e também aqueles que valorizam a
história de uma comunidade específica.

Educação em direitos humanos, cidadania e ética


Em 2003 foi apresentado à sociedade brasileira o Plano Nacional de Educação em
Direitos Humanos – PNEDH. Seu objetivo é contribuir para a construção de uma cultura
voltada para o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o estatuto do Idoso, a declaração
universal dos direitos humanos, entre outros documentos importantes para a consolidação
da cidadania ainda são praticamente desconhecidos pela sociedade em geral. A importância
da educação escolar e não-escolar, como também da educação formal e não-formal para
auxiliar nesse processo faz desse tema um campo de ensino e de investigação fundamental
para a educação do século XXI.

Educação para o lazer, ação sócio-cultural e tempo livre


Diferentes pesquisadores vêm se dedicando ao estudo do chamado tempo livre e,
particularmente, às formas de ocupação e vivência do mesmo através dos lazeres. Difundir
e valorizar formas saudáveis de (re)criar o tempo livre é o foco deste eixo temático.

Ensino religioso escolar, ecumenismo e cultura de paz


Como conseqüência dos temas abordados anteriormente, a religiosidade não poderia
deixar de ser abordada, já que ela é uma das atividades humanas mais popularmente
vivenciadas no chamado tempo livre. Além disso, é uma realidade social o número
crescente de pessoas que buscam “espiritualizar-se”, seja através das religiões instituídas ou
de formas alternativas e pessoais. Assim, o respeito ao Outro passa, necessariamente, pelo
respeito por todas as formas organizadas ou espontâneas de vivência do sagrado, do místico
ou da espiritualidade. Nesse sentido, e tendo em vista que o governo federal instituiu o dia
21 de janeiro como o dia de combate à intolerância religiosa, faz-se necessário que o
professor de História e Geografia ajude a valorizar o ecumenismo e o dialogo inter-
religioso, uma vez que dentro ou fora da sala de aula esse é um assunto que não pode mais
ser negligenciado, estimulando uma verdadeira cultura de paz na escola e na sociedade.

Educação para o envelhecimento, tanatagogia e a consciência da finitude


Por fim, a último eixo, abordará um assunto pouco explorado no meio acadêmico,
mas de fundamental importância sócio-cultural: o envelhecimento e a morte.
Gradativamente, a tanatologia vai se constituindo em uma área de pesquisa, mas não temos
conhecimento de pesquisas no âmbito da educação para a morte (tanatagogia). Ao mesmo
tempo, aumenta gradativamente o numero de pessoas que vivenciam e relatam experiências
(chamadas rotineiramente de EQM, saída consciente do corpo, contato ou comunicação
com seres incorpóreos etc.) que levantam a hipótese da possível sobrevivência da
consciência após a morte física. Curiosamente, já são vários os pesquisadores no âmbito da
chamada física quântica e da neurociência que sustentam essa hipótese, reformulando
vários paradigmas sobre a relação entre o cérebro e a consciência humana. Além disso, há
relatos de crianças, sobretudo, até os sete anos de idade, que afirmam se lembrar de
supostas vidas passadas, que ouvem vozes ou que dizem ver parentes já falecidos.
Normalmente, tais fatos são classificados como alucinações ou como sintomas de
esquizofrenia, sem que um estudo mais profundo com a criança seja realizado. Esse eixo
temático tem como objetivo fazer o aluno refletir sobre a morte e o morrer, de uma forma
filosófica e científica, compreendendo como o homem se colocou diante da morte ao longo
da história.

Os dez eixos temáticos não são estanques. Eles se integram visando uma formação
integral do aluno e os temas se modificam ou são atualizados de acordo com as
transformações do mundo. Porém, no âmbito da metodologia de ensino, as heurísticas a
serem utilizadas devem ser, predominantemente, aquelas que formam a chamada pesquisa
qualitativa, servindo-se, dessa maneira, das técnicas de história oral, da etnografia, da
observação participante, da análise de documentos e outros materiais etc., visando a
construção de um curso de História e Geografia dinâmico, capaz de acompanhar as
transformações sócio-culturais que acontecem em todas as instâncias de poder e escalas de
observação, propiciando uma preparação crítica, criativa e sensível do aluno.
É importante salientar a necessidade de parcerias com os mais diversos setores
sociais, buscando constituir uma rede em várias escalas de ação, do local ao global, de
forma a propiciar um intercâmbio de idéias e de informação, explorando de forma plena os
recursos possibilitados pela internet. Dessa forma, na troca de experiências e informações,
seja através de blogs, listas de discussão, canal de vídeos, revista virtual etc. é possível
estabelecer uma relação interativa com alunos de outras escolas, por exemplo, sem perder
de vista que o objetivo central do ensino de História e Geografia, conforme proposta acima,
é a promoção e a garantia dos direitos humanos, da sustentabilidade planetária, em todas as
escalas de ação e a educação integral do Ser, abarcando sua integridade física, mental,
emocional e espiritual.

São Carlos, 03 de janeiro de 2011.

Prof. Dr. Adilson S. Marques

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