Você está na página 1de 80

LIVRO TEXTO

1
“Inteligência não é possuir todas as ferramentas.
Inteligência é possuir poucas (para andar leve) e saber
onde encontrar as que não se têm, na eventualidade de
se precisar delas. Sabedoria não é ter. É saber onde
encontrar.”
(Rubem Alves)
2
Governador do Estado de Pernambuco

João Lyra

Secretário de Educação do Estado de Pernambuco

José Ricardo Wanderley Dantas de Oliveira

Secretária Executiva de Desenvolvimento da Educação

Ana Coêlho Vieira Selva

Secretária Executiva de Gestão de Rede

João Charamba
Secretário Executivo de Educação Profissional

EQUIPE TÉCNICO-PEDAGÓGICA UEJAI

Claudia Mendes de Abreu


Jandy Feitosa Carlos da Silva
Ana Lucia Gomes Cavalcante Neto
Ângela Cristina Pascaretta Gallo
Danielle da Mota Bastos
Danubia Charlene da Silva Nascimento
Diego Bruno Barbosa Felix
Emanuella de Jesus Ferreira da Silva
Helder Domingues Mendes da Silva
Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva
Katarina Vasconcelos de Melo
Márcio Tiago dos Anjos
Mariana Silvia Bezerra
Raimundo Ferreira de Arruda
Rita de Kássia Pontes Silva

3
Roberto de Carvalho Ventura
Roseane Pereira da Silva
Thiago de Oliveira Reis Marques Freire
Valdenice Leitão da Silva
Verônica Luzia Gomes de Sousa

Organização e Sistematização do Caderno


Danielle da Mota Bastos
Diego Bruno Barbosa Felix
Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva
Rita de Kássia Pontes Silva
Roseane Pereira da Silva
Thiago de Oliveira Reis Marques Freire

4
SUMÁRIO

Apresentação...................................................................................................................06

Unidade 1 – .Livros em sala de aula – modo de usar......................................................10

Unidade 2 – O lúdico na Educação de Jovens e Adultos................................................18


Texto complementar – Ludicidade como instrumento pedagógico.................................27

Unidade 3 – Deuses e monstros.......................................................................................35

Unidade 4 – Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no espaço escolar............48

Unidade 5 – Principais recursos didáticos analisados no ensino de geografia do


Brasil................................................................................................................................62

5
APRESENTAÇÃO

O tema desse caderno – como o próprio título sugere – trata de Recursos


Didáticos. Sua confecção surge da necessidade de tecer considerações e novas leituras
sobre as concepções e os usos desses importantes instrumentos pedagógicos nos
processos de ensino e aprendizagem de jovens e adultos, proposta, aliás, sugerida pelos
próprios formadores e professores dessa modalidade de ensino. É fruto também do
compromisso da Secretaria Executiva de Desenvolvimento da Educação/SEDE,
representada pela Gerência de Políticas Educacionais de Jovens, Adultos e
Idosos/GEJA, de fortalecer e renovar as práticas de formação continuada em serviço de
multiplicadores e professores atuantes na EJA em todo o Estado.
Nesse sentido, e na tentativa de contribuir para o trabalho do professor, visto
aqui como profissional autônomo e reflexivo, organizamos esta coletânea de textos com
o propósito de estabelecer diálogos com os profissionais da EJA e suscitar reflexões –
juntamente com o Livro Guia – sobre questões comuns e atuais do cotidiano da sala de
aula, utilizando-se de um aporte teórico e de encaminhamentos didáticos que
contribuam para uma prática docente mais crítica, reflexiva e em sintonia com as
especificidades da EJA. Em outras palavras, ousamos sugerir textos e atividades
didáticas que fossem relevantes para os saberes docentes, especialmente no momento de
escolher e propor estratégias com os mais diferentes recursos didáticos. Com isso, é
importante melhor definir recurso didático, bem como apresentar a estrutura desse livro.
Assim, iniciamos a discussão conceituando recurso didático, como sendo
qualquer meio, instrumento ou ferramenta que subsidie o professor em sua prática
pedagógica. É, portanto, um elemento pedagógico que está presente no ambiente de
aprendizagem, que ajuda a estimular o aprendiz a construir e consolidar saberes e
competências e que torna os processos de ensino e aprendizagem mais concretos, mais
eficazes e eficientes. Temos os livros, os jogos, as novas TICs (Tecnologias da
Informação e da Comunicação), e também outros materiais, como equipamentos de
laboratório, vídeos, áudio, recursos da natureza etc., que são necessários como suportes
para os processos de ensino e aprendizagem.
Os recursos didáticos são grandes instrumentos de apoio aos professores nesses
processos, se forem bem escolhidos e usados adequadamente, de acordo com as
condições estruturais da escola e as necessidades de seus alunos, e ainda relacionados ao

6
planejamento do professor, uma vez que sua presença por si não é capaz de transformar
significativamente os processos de ensino e aprendizagem.
Segundo Cerqueira e Ferreira (2011)1,

Recursos didáticos são todos os recursos físicos, utilizados com maior


ou menor freqüência em todas as disciplinas, áreas de estudo ou
atividades, sejam quais forem as técnicas ou métodos empregados,
visando auxiliar o educando a realizar sua aprendizagem mais
eficientemente, constituindo-se num meio para facilitar, incentivar ou
possibilitar o processo ensino-aprendizagem.

Deste modo, considerando as definições de recursos didáticos dadas acima,


entendemos que muitos instrumentos em um ambiente no qual ocorrem os processos de
ensino e aprendizagem, que não foram especificamente criados para funcionarem como
recursos didáticos, podem ser tomados como tal, dependendo da forma como forem
utilizados.
Destacamos que os artigos disponibilizados nesta coletânea são explorados – por
meio de atividades didáticas – no Livro Guia que juntos compõem os materiais
didáticos produzidos para subsidiar o programa de formação continuada de professores
atuantes na EJA. Ao selecionarmos estes textos, procuramos ver a relevância dada ao
tema tratado e às especificidades da EJA, bem como a maneira como os autores o
apresentam, embora tenhamos percebido, em alguns textos, certas fragilidades de ordem
textual e normativa.
O livro foi dividido em 5 unidades, cada uma representando uma categoria
específica de recursos didáticos. Há um capítulo específico para mídias e TICs, pois
entendemos que, apesar de comportarem também os recursos audiovisuais, possuem um
largo espaço nas práticas didáticas em sala de aula e por isso merecem uma discussão
mais aprimorada. No mais, são 5 textos mais 1 complementar, de diferentes autores, que
abordam diferentes recursos didáticos. Além disso, é importante não perder de vista o
forte diálogo entre Livro Texto e Livro Guia, em que cada capítulo do Livro Texto
corresponde a uma unidade do Livro Guia.

1
CERQUEIRA, Jonir Bechara; FERREIRA, Elise de Melo Borba. Recursos didáticos na educação
especial. Revista Benjamin Constant. Edição 05. Vol. 6, nº 15. Rio de Janeiro- Dezembro de 1996.
Disponível em: <http// www.inep.gov.br>. Acesso em: 26.04.2011.

7
No texto 1 “Livros em Sala de Aula- Modo de Usar”, a autora Roxane Rojo
historia de forma sucinta a escrita e o livro na escola, trazendo as principais categorias
do livro escolar, a partir de Chopin(1992), situando e delineando o perfil do livro
didático no Brasil e o relaciona com outros impressos e veículos de textos que fazem
parte da escola contemporânea. Logo após, a autora discute o livro didático como
suporte de textos ou como discurso de autor em gênero didático e aborda três modos
mais frequentes na escola de usar o livro: o livro como arquivo de textos e propostas; o
livro “de fio a pavio” e a escolha consciente e criteriosa do livro, de partes e textos de
livros e de outros impressos para a composição de um projeto de ensino situado. Rojo
conclui o texto chamando a atenção para algo fundamental na formação cidadã que é ser
capaz de discriminar e avaliar discursos hegemônicos na globalização, e fazer escolhas
éticas entre discursos presentes na sociedade.
No texto 2 “O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos”, de Eliene de Oliveira,
Marcia do Socorro Rodrigues, Rejanete Silva e Souza e André Rodrigues Guimarães,
temos a abordagem de um trabalho de investigação sobre as práticas lúdicas
desenvolvidas na Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos. Os
pesquisadores pretendiam saber se essas práticas com os adultos estão respeitando a
realidade deles, pois a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de
ensino que tem especificidades que precisam ser levadas em conta no cotidiano escolar.
O texto está estruturado em duas partes. Na primeira parte, eles trazem uma abordagem
teórica sobre a temática ludicidade na EJA, e levantam questões que envolvem a
importância e a necessidade de aulas direcionadas com dinâmicas e jogos que
envolvam, divirtam, ensinem e formem novas aprendizagens. Na segunda parte, eles
enfocam o resultado da pesquisa de campo, em que verificaram pontos relevantes
quanto à utilização do lúdico na EJA. Por fim, fazem algumas considerações sobre a
importância da busca de novas metodologias que atendam e desperte o interesse a
motivação dos alunos da EJA.
No texto 3 “Deuses e monstros” fragmento da dissertação de Mestrado de
Roseli Pereira Silva, a autora aborda a introdução do cinema como uma das formas
culturais mais significativas e traz exemplos de experiências locais que incentivam a
utilização do cinema como recurso educativo. Mostra ainda a importância de se
reconhecer o trabalho com o audiovisual como uma ferramenta pedagógica, abordando,
inclusive, diferentes visões sobre o audiovisual: enquanto alguns o consideram a

8
solução para todos os problemas, outros o encaram como um vilão, que subverte as
mentes mais pacíficas.
Já os autores do texto 4 “Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no
espaço escolar”, Gilza Maria Leite Dorigoni e João Carlos da Silva, trazem uma
reflexão sobre o uso das mídias na área educacional. Eles abordam os elementos
históricos sobre a mídia ao longo do século XX e falam também da influência do
avanço tecnológico na educação. O texto também traz questões sobre a efetivação e
aplicação da tecnologia na escola e, por fim, aborda o uso pedagógico da internet.
O último capítulo “Principais Recursos Didáticos Analisados no Ensino de
Geografia do Brasil”, de Inêz de Deus Neiva Brandão e Márcia Cristina de Oliveira
Mello, trata de uma investigação sobre as atuais tendências das metodologias de ensino
de Geografia difundidas pelos livros paradidáticos brasileiros, tendo os recursos
didáticos como ponto principal, considerando as técnicas tradicionais e as introduzidas
pelas novas tecnologias. Eles apresentam um panorama geral da estrutura metodológica
difundida por autores brasileiros que apontam novos caminhos e possibilidades de
materiais e suas aplicações, buscando facilitar a aprendizagem e o diálogo entre
professores e alunos. Os resultados preliminares apontam que, à luz da bibliografia
especializada, tais estudos concentram-se mais em explorar as técnicas de aplicação de
tal ou qual recurso, ou sua importância na relação ensino-aprendizado, nem sempre
apresentando um panorama da utilização real dos mesmos in loco, bem como eles se
concentram no tema cartográfico, havendo uma lacuna nos demais temas,
principalmente na Geografia Humana. Esta realidade será explicada através do breve
histórico do ensino de Geografia no Brasil, e o atual foco na cartografia escolar.
Após a leitura desses cinco capítulos, esperamos que o professor encontre
elementos que ampliem sua compreensão sobre recursos didáticos, bem como suas
implicações na prática de quem tem feito uso desses recursos, e que, participando de um
processo de formação continuada, reflita sobre sua prática e possa aprimorar seu
desempenho profissional, melhorando a qualidade de ensino nas escolas.

9
CAPÍTULO 12

LIVROS EM SALA DE AULA – MODO DE USAR


Roxane Rojo1

Este texto historia brevemente a escrita e o livro na escola, distinguindo as principais


categorias de livro escolar, a partir de Choppin (1992). Com isso, situa e delineia
brevemente o perfil do livro didático hoje no Brasil em suas relações com os outros
impressos e veículos de textos que estão presentes na escola contemporânea. A partir
daí, discute-se o livro didático como suporte de textos ou como discurso de autor em
gênero didático, abordando três modos de usar o livro muito freqüentes em sala de aula:
o livro como arquivo de textos e propostas; o livro “de fio a pavio” e a escolha
consciente e criteriosa seja do livro, seja de partes e textos de livros e de outros
impressos, para compor, de maneira harmônica, um projeto de ensino situado. Sugerem-
se dois conjuntos de critérios de escolha e seleção para uso de textos impressos: o das
necessidades de ensino e o das possibilidades de aprendizagem. Conclui-se lembrando
uma meta central para a formação cidadã hoje, para a qual concorrem as adequadas
seleção e abordagem de textos e impressos, que é a da capacidade de discriminar e
avaliar discursos hegemônicos na globalização, de maneira a fazer escolhas éticas entre
discursos.

Escrita, livro e escola – uma relação muito antiga


Mesmo antes da revolução de Gutenberg – a invenção da escrita impressa – a
escrita sempre foi um dos principais instrumentos de comunicação da escola. A escola
sempre foi um espaço de circulação das “letras”, um espaço letrado.
Com a reprodutibilidade alcançada pela impressão de livro e de outros suportes, a escola
também passa a ser um dos principais espaços de circulação do livro. O livro escolar,
entretanto, ao longo da História, passou por diversas mudanças.
O pesquisador Alain Choppin (1992), dedicado ao estudo do livro escolar,
distingue quatro grandes tipos de livros escolares, organizados de acordo com sua

2
ROJO. Roxane. Livro em Sala de Aula: modo de usar. Materiais didáticos: escolha e uso. Programa
Salto para o Futuro. Boletim 14. Agosto de 2005. Disponível em
http://www.alemdasletras.org.br/biblioteca/material_formadoras/Salto_para_o_futuro_Praticas_de_leitura
_e_escrita.pdf.

10
função no processo de ensino-aprendizado: - Os manuais ou livros didáticos, quer dizer,
“utilitários da sala de aula” (p. 16), obras produzidas com o objetivo de auxiliar no
ensino de uma determinada disciplina, por meio da apresentação de um conjunto
extenso de conteúdos do currículo, de acordo com uma progressão, sob a forma de
unidades ou lições, e por meio de uma organização que favorece tanto usos coletivos
(em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula);
- Os livros paradidáticos ou para-escolares, obras complementares “que têm por
função resumir,intensificar ou aprofundar” (p. 17) conteúdos específicos do currículo de
uma disciplina, seja por meio de uma utilização individual em casa, seja por meio de
uma utilização orientada pelo professor, na escola, como ocorre no Brasil2. Na tradição
brasileira, esse tipo de livro escolar abarca, prioritariamente, obras que aprofundam ou
enriquecem um conteúdo específico de uma disciplina (o tema da escravidão ou da vida
cotidiana no Brasil Colônia, por exemplo) ou que se voltam para a formação do leitor
(como os títulos de literatura infantil, em geral, apresentados nos catálogos de editoras
como obras “paradidáticas”);
- Os livros de referência, como dicionários, Atlas e gramáticas, destinados a
servir de apoio aos aprendizados, ao longo da escolarização;
- As edições escolares de clássicos, que reúnem, de modo integral ou sob a
forma de excertos, “as edições de obras clássicas (gregas, latinas, estrangeiras ou em
língua materna), abundantemente anotadas ou comentadas para o uso em sala de aula”
(p. 16) 3.
Nos meus tempos de estudante na Educação Básica, os impressos que havia em
sala de aula – não tão abundantes como hoje em dia – eram, principalmente, as obras de
referência (mapas, Atlas, dicionários e gramáticas – latinos, portugueses, franceses) e
uma edição escolar de autores clássicos da literatura brasileira e portuguesa – uma
coletânea ou antologia4. Na verdade, comprávamos as antologias, dicionários, e mesmo,
quando possível, enciclopédias e gramáticas. Atlas e mapas ficavam trancados em
grandes gaveteiros das estantes da biblioteca da escola e o professor os requeria quando
necessários para sua aula. A biblioteca escolar era grande e bem fornida de obras
clássicas e de divulgação, entretanto o acesso do aluno a ela não era livre, nem
tampouco freqüente. Os livros estavam nas casas dos alunos.
Por esta época, os livros ou manuais didáticos, tais como os conhecemos hoje, e
os livros paradidáticos sequer existiam. É somente com a reforma da grade curricular e

11
da educação da década de 70 do século passado que o perfil e a circulação do livro
escolar começa a mudar. Segundo Clare (2002, s/p), a situação começa a se transformar
ainda na década de 60, quando se firma o processo de democratização de acesso da
população à escola, em conseqüência de um novo modelo econômico. Trata-se de novas
condições sociopolíticas. Com a ditadura militar, a partir de 1964, passa-se a buscar o
desenvolvimento do capitalismo, mediante expansão industrial. A proposta educacional,
agora, passa a ser condizente com a expectativa de se atribuir à escola o papel de
fornecer recursos humanos que permitam ao Governo realizar a pretendida expansão
industrial.
Com a ampliação do acesso da população à escola pública, muda o perfil não
somente econômico, mas também cultural, tanto do alunado como do professorado. Não
é mais uma escola pública destinada apenas aos filhos das elites, mas as camadas
populares passam a ter assento nas salas de aula. O novo perfil cultural do alunado
acarreta heterogeneidade nos letramentos, nos falares dos alunos. Os esforços das
escolas em adequarem-se à nova realidade têm impactos visíveis na qualidade do ensino
e no perfil do livro escolar. Também o perfil sociocultural, econômico e profissional dos
docentes sofre alteração, com a ampliação das redes. A profissão de professor começa a
desprestigiar-se, a perder autonomia, a deslocar-se nos espaços sociais: antes, uma
profissão que conferia status às moças de classe média e alta; agora, a ascensão social
para os que pertencem à classe mais pobre da sociedade (Clare, 2002, s/p).
É por esta época que começa a surgir o livro didático e, depois, os paradidáticos,
tais quais os conhecemos hoje. De certa maneira, esses manuais didáticos trazem para si
uma soma do que antes era a aula do professor e a consulta do aluno a obras de
referência e a antologias. Na disciplina de Língua Portuguesa, esse fenômeno é bastante
visível – as instruções do livro se combinam (ou entram em conflito) com as do
professor na aula e os antigos dicionários, a gramática e a antologia encontram-se hoje
espalhados pelas páginas dos volumes do livro didático.
Com a mudança de perfil do alunado, sobretudo no que diz respeito ao perfil
socioeconômico, o livro deixa de estar na casa do aluno e passa a se sediar na escola.
Por outro lado, os Programas nacionais de distribuição do livro incrementam seu
alcance, de maneira a poder prover, progressivamente, um número cada vez maior de
escolas e de estudantes com os acervos necessários.

12
Hoje, podemos dizer, ao contrário, que os tipos de livro escolar mais presentes
em sala de aula são os manuais didáticos e os livros paradidáticos, além de, mais
recentemente, por meio da distribuição do PNLD, os dicionários5.
Atualmente, esses livros não são os únicos impressos que circulam nas escolas.
Revistas (de divulgação científica e outras) e grandes empresas jornalísticas colocam à
disposição das escolas doações de assinaturas permanentes de periódicos jornalísticos
(revistas, jornais de grande circulação).
Finalmente, a revolução eletrônica – com a multiplicação dos meios de
comunicação de massa, como a televisão e o vídeo – e a revolução digital, trazendo a
crescente importância dos computadores e da Rede Internet para a circulação e
distribuição da informação, também ampliaram os veículos de circulação da escrita para
muito além dos limites dos livros.Hoje, as escolas mais equipadas contam com TV,
vídeo e computadores – em algumas delas, conectados – que permitem novos acessos à
informação escrita ou oralizada, a partir de novos veículos. Todas essas mudanças
acarretam impactos importantes para a escolha e uso de materiais didáticos e
paradidáticos e veículos de informação na escola contemporânea.

Livros didáticos contemporâneos – um brevíssimo perfil


Como vimos em outros Programas desta série, a capacidade governamental de
avaliação, compra e distribuição do livro escolar no Brasil de hoje ampliou-se muito.
Além de avaliar e comprar e, ainda, distribuir livros didáticos das principais disciplinas
acadêmicas (infelizmente, exceto Língua Estrangeira) ao conjunto dos alunos da rede
pública de Ensino Fundamental brasileira, por meio do PNLD – o que, por si só, já
atinge números astronômicos6, dada a proporção continental do país e a universalização
recente das matrículas –, atualmente o Governo Federal ainda investe, no mesmo
PNLD, na compra e distribuição de dicionários; por meio do PNBE, na renovação e
ampliação de acervos das bibliotecas escolares e, ainda, inicia a extensão do direito ao
livro escolar, por meio do PNLEM, ao Ensino Médio, por enquanto nas disciplinas de
Língua Portuguesa e Matemática. Para 2006, o PNLEM atenderá a todo o país.
Uma das iniciativas importantes nesses Programas governamentais foi a
instituição da avaliação dos livros que serão comprados, em todas as áreas do
conhecimento. As pesquisas das décadas de 70 e 80 do século passado, a respeito do
livro escolar, constantemente denunciavam a baixa qualidade e a condução ideológica

13
destes materiais. Instituída a avaliação, a qualidade desses materiais melhorou
enormemente e o cuidado com os projetos gráfico-editoriais intensificou-se, tendo
impacto no tratamento dos textos e das imagens veiculadas nos livros.
São muitos os manuais didáticos, dicionários, obras de referência e livros
paradidáticos propostos hoje para a escolha dos professores e todos eles apresentam
níveis de qualidade necessários ao bom desenvolvimento dos projetos de ensino-
aprendizagem em que o professor está envolvido. Mas isso coloca uma questão
relevante para os professores:
Como escolher e utilizar em sala de aula livros e impressos que não entrem em
conflito ou contradigam os projetos de ensino-aprendizagem dos professores? Que
sejam adequados às necessidades e possibilidades do alunado e da comunidade escolar?

Livros e outros impressos em sala de aula – três modos de usar


Discute-se hoje, na análise do livro didático, se este é um suporte de textos ou
um gênero de discurso. Já explico: a visão do livro didático como um suporte ou veículo
de textos variados (Marcuschi, 2004; Soares, 1999), encara o LD como um livro
(suporte) – uma brochura de papel em certo formato, com certo tipo de cobertura, com
resmas costuradas e coladas na lombada – que reúne em si uma certa distribuição de
textos e imagens de diversos tipos – textos expositivos e instruções do autor do livro;
outros documentos (históricos, por exemplo); imagens, como reproduções de
fotografias, de pinturas, mapas, gráficos, infográficos; textos de campos variados, como
o literário, o publicitário, o jornalístico, o da divulgação científica etc. Quase algo como
uma coletânea variada ou um arquivo.
Quem vê o livro como um gênero discursivo (Bunzen, 2005; Bunzen & Rojo, no
prelo) admite a presença deste conjunto de textos “migrados”7 de outros campos da vida
social, mas encara o livro como um discurso do autor, a partir de um projeto didático
autoral, dirigido a certos professores e a certo alunado, a certo tipo de projeto de ensino-
aprendizagem e não a outro, e que implica uma posição do autor sobre o que ensinar,
como ensinar, a quem ensinar, para que e quando etc. Este projeto autoral é, inclusive,
responsável pela seleção deste ou daquele “conjunto de textos migrados” de outros
campos da vida social.
Esta questão, embora pareça coisa apenas de pesquisadores, tem impacto na
escolha e, sobretudo, no uso do livro em sala de aula. Se eu encaro o livro como um

14
acervo de textos, ou um arquivo de textos, como faz crer a definição do livro como
suporte, posso retirar deste e de outro arquivo qualquer, como quiser e de acordo apenas
com meu projeto de ensino – se houver – os textos/imagens necessários para dar suporte
a meu projeto de ensino naquele momento. Não preciso me preocupar com a
compatibilidade destes arquivos com meu projeto de ensino. Preciso apenas ter
condições logísticas de reprodução destes textos/imagens – retroprojetor, xerox – ou
que o aluno tenha o livro em mãos, para poder dar minhas aulas. O uso do livro escolar
por parte do professor como arquivo é o que acontece com freqüência nas escolas,
quando os alunos não dispõem cada um do livro para uso próprio, como foi o caso do
Ensino Médio até agora. Uma das decorrências deste tipo de uso do livro é o alto índice
de cópia de questões ou instruções da lousa nessas aulas, tomando parte preciosa do
escasso tempo escolar.
Nada em contrário à autonomia e à supremacia do projeto de ensino situado no
contexto e na comunidade escolar de cada professor. Ao contrário8. Mas quando e se
este projeto de ensino existe. Muitas vezes o que se dá é uma prática didática
cristalizada na tradição e na vivência de um dado professor, descontextualizada da
realidade da comunidade escolar, que, ao tratar o livro como arquivo, ignora também o
projeto didático autoral.
Como bem definia Choppin (1992, p. 16), no início deste texto, os manuais ou
livros didáticos são “utilitários da sala de aula”, ou seja, obras produzidas com o
objetivo de auxiliar no ensino de uma determinada disciplina, que favorecem tanto usos
coletivos (em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula).
Este é um segundo problema: se o professor trata o livro didático como um
arquivo, retirando textos e partes que lhe interessam de obras variadas e ignorando o
projeto autoral, mas solicita dos alunos que estudem, em sala de aula, em casa, para
aulas ou provas, usando o livro adotado, podem ocorrer projetos de ensino em conflito
(por exemplo, diferentes visões de como se fazer História), que induzirão o aluno a erro,
do ponto de vista da proposta escolhida pelo professor.
Tratar o livro didático como um discurso do autor (num gênero didático) é, ao
contrário, tanto na escolha do livro como no uso, levar em conta o projeto do autor, no
que diz respeito à seleção dos conteúdos, assim como no que tange à metodologia de
ensino adotada. Em seguida, comparar seu próprio projeto de ensino situado com o
projeto do autor, para ver se são compatíveis. E aí, são necessários critérios, tanto para

15
adotar um livro para os próximos 3 anos naquela comunidade escolar como para
selecionar textos e atividades no livro e em outros impressos e veículos variados
(paradidáticos, obras de referência, coletâneas, jornais, revistas, vídeos, Internet etc).
Quais seriam esses critérios?
Gostaria de propor aos professores duas ordens de critérios: as necessidades de
ensino e as possibilidades de aprendizagem. Na ordem das necessidades de ensino,
encontra-se, principalmente, o projeto de ensino situado do professor (ou,
preferencialmente, do grupo de professores) para aquela comunidade escolar: Para este
alunado, o que se deve ensinar, para atingir metas determinadas? Para esta comunidade
escolar – que incorpora, por exemplo, alunado de favelas em São Paulo ou Rio de
Janeiro ou que está situada em zona rural do Centro-Oeste –, quais metas de ensino
foram eleitas? E, a partir delas, quais conteúdos são importantes para atingir essas
metas? Que tipos e níveis de letramento são necessários para que esta comunidade
alcance para a vida cidadã nesta comunidade? Que textos devem, então, ser
selecionados e trazidos para os alunos? Esta obra contempla esses conteúdos e textos?
Como complementá-la, a partir de outros impressos?
Na ótica das possibilidades de aprendizagem do alunado, algumas questões já
mencionadas são também importantes: Que conhecimentos, valores, atitudes e tipos e
níveis de letramento estes alunos já trazem? Quais são importantes no projeto de ensino
do professor? O que será preciso ensinar e aprender nesta coletividade? Como se
organizam o tempo e o espaço escolar de que se dispõe (número e tempo de aulas,
número e tipo de alunos por sala, disposição da sala, existência de biblioteca,
laboratório, salas ambientes etc.)? Com que recursos tecnológicos é possível contar
(retroprojetor, xerox, vídeo, computador, Internet etc.)? É possível contar com
professores de outras disciplinas para atingir estas metas? Que obra/trechos de obras
interessantes podem ser selecionadas para atingir estas metas, em face destas restrições?
Como é possível complementar esta obra a partir de outros impressos e recursos9?
Para finalizar, provisoriamente, esta discussão, quero lembrar de uma meta geral
na formação cidadã do alunado no Brasil de hoje – que envolve, de maneira crucial, os
textos, impressos e livros que circulam em sala de aula e, correspondentemente, os tipos
e níveis de letramento que buscamos que nossos alunos construam –, que é o fato de
que, no mundo altamente semiotizado da globalização, saber situar os discursos a que
somos expostos e recuperar sua situacionalidade social (quem escreveu, com que

16
propósito e ideologia, onde foi publicado, quando, quem era o interlocutor projetado
etc.) – é importantíssimo para fornecer artifícios para os alunos aprenderem, na prática
escolar, a fazer escolhas éticas entre os discursos que circulam à sua volta. Isso
possibilita aprender a problematizar o discurso hegemônico da globalização e os
significados antiéticos que, nele, desrespeitem a diferença, o pluralismo e a democracia.

Referências Bibliográficas
BATISTA, A. A. G. (2003). A avaliação dos livros didáticos: Para entender o Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD). In: R. H. R. Rojo & A. A. G. Batista (orgs.) O
Livro Didático de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental: Letramento escolar e
cultura da escrita, pp. 25-67. Campinas: Mercado de Letras.
BUNZEN, C. S. (2005). Livro didático de Língua Portuguesa: um gênero do discurso.
Dissertação de Mestrado. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas.
BUNZEN, C. S. & R. H. R. Rojo (no prelo). Livro didático de Língua Portuguesa como
gênero do discurso: autoria e estilo. In: E. Marcuschi & M. G. Costa Val (orgs.) O livro
didático de Língua Portuguesa – Letramento, inclusão e cidadania. A sair por: Belo
Horizonte: Autêntica/CEALE.
CHOPPIN, A. (1992). Les manuels scolaires: historie et actualité. Paris : Hachette
Éducation.
CLARE, N. A. V. (2002). 50 anos de ensino de Língua Portuguesa (1950-2000). Anais
do VI Congresso Nacional de Lingüística e Filologia, Cadernos do CNLF, Série VI:
Leitura e Ensino de Línguas, s/p. http://www.filologia.org.br/vicnlf/anais/ caderno06-
05.html, acessado 12/01/2005.
MARCUSCHI, L. A. (2004). Gêneros e suporte: a identidade de gênero no livro
didático. Apresentação no II Simpósio de Estudo dos Gêneros Textuais (SIGET). União
da Vitória, Paraná.
RAZZINI, M. P. G. (2000). O Espelho da Nação: A Antologia Nacional e o ensino de
Português e de Literatura (1838-1971). Tese de Doutorado. Campinas: IEL/UNICAMP.
RIBEIRO, V. M. (org.) (2003) Letramento no Brasil – Reflexões a partir do INAF
2001. São Paulo: Global.
SOARES, M. B. (1999). A escolarização da literatura infantil e juvenil. In: A.
Evangelista et al. (orgs.). A escolarização da leitura literária. Belo Horizonte: Autêntica.

Notas
1. Prof.ª Dr.ª do Departamento de Lingüística Aplicada do Instituto de Estudos de
Linguagem IEL/UNICAMP. Consultora dessa série.
2. O programa de aquisição e distribuição de livros para o Ensino Fundamental do
estado de São Paulo, por exemplo, como vimos, possibilita ao professor a escolha de
livros didáticos e de paradidáticos e obras de referência. Na maior parte das vezes,
porém, a utilização de paradidáticos é feita para complementar o trabalho pedagógico
apoiado pelo livro didático.
17
3. Definições retiradas de Batista (2003).
4. “A permanência da Antologia Nacional no currículo de Português nas séries iniciais
do curso secundário, até a década de 1940, reforça a longevidade deste modelo clássico
e beletrista de ensino da língua nacional, em que autores e textos eram considerados
sobretudo ‘paladinos da linguagem’.[…] Desta maneira, nos primeiros cinqüenta anos
de sua existência, a Antologia Nacional não só influenciou o ‘bem falar’ e o ‘bem
escrever’ de muitas gerações de brasileiros, como também lhes forneceu a formação
literária nacional” (Razzini, 2000, p. 243).
5. Pesquisas recentes, como as do INAF - ver Ribeiro (org.), 2003 - mostram que os
livros distribuídos diretamente aos alunos e os consumíveis – livros de alfabetização ou
cartilhas e dicionários – são dos mais presentes nas casas dos brasileiros (juntamente
com livros religiosos), mesmo dos brasileiros analfabetos.
6. “Entre 1994 e 2004, o PNLD adquiriu, para utilização nos anos letivos de 1995 a
2005, um total de 1,026 bilhão de unidades de livros, distribuídos para uma média anual
de 30,8 milhões de alunos, matriculados em cerca de 172,8 mil escolas. Nesse período,
o PNLD investiu R$ 3,7 bilhões. Pelo PNLD 2006 Dicionários serão atendidas mais de
478 mil salas de aula de quase 139 mil escolas públicas de 1ª a 4ª séries do Ensino
Fundamental, beneficiando mais de 16,9 milhões de alunos. Para isso, o FNDE vai
adquirir cerca de 490 mil acervos, cada um com 10 dicionários, que serão utilizados
coletivamente pelos alunos em sala de aula.” (Retirado do site
do FNDE,
http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=/livro_didatico/livro_didatico.html#d
dosesta, em 30/05/2005)
7. Marcuschi, 2004.
8. A pior forma de uso do livro é aquela em que o professor perde autonomia e
abandona seu próprio projeto de ensino em favor daquele livro, executando com seus
alunos as instruções do autor, de “fio a pavio”.
9. Neste ponto, uma das questões importantes hoje é a inclusão nas salas de alunos
portadores de necessidades especiais, particularmente os cegos, cujo atendimento com
obras e textos traduzidos em Braille é hoje, sabemos, ainda altamente insuficiente. Este
é um problema, a meu ver, insolúvel por meio da tradução de cada livro ou impresso em
Braille. Quero apostar, num futuro breve, nas soluções computacionais para a questão
das necessidades especiais: presença de computadores dotados de acesso universal nas
salas; ensino paralelo dos alunos para uso das máquinas; tradutores automáticos de texto
ao Braille por meio de softwares; livros e textos digitais.

CAPÍTULO 2

18
O LUDICO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS3

Eliene de Oliveira1
Marcia do Socorro Rodrigues2
Rejanete Silva e Souza3
André Rodrigues Guimarães4

Introdução
O objetivo deste trabalho é investigar se as práticas lúdicas desenvolvidas na
Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos com os adultos estão respeitando
a realidade desses alunos, visto que a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma
modalidade de ensino com especificidades que precisam ser consideradas no cotidiano
escolar.
Um outro fator inquietante que motivou a pesquisa foi averiguar se o lúdico
auxilia na construção de representações e significados por parte dos discentes. Assim,
buscamos compreender como a realidade colocada através das brincadeiras e jogos é
percebida pelos jovens e adultos, fazendo a interação entre sua real situação e os
conhecimentos sistematizados que são trabalhados na escola.
Neste processo, almejando um ensino-aprendizagem emancipatório, superador
da educação tradicional, é que vislumbramos que as vivências lúdicas estejam
efetivamente presentes na sala de aula, contribuindo para a compreensão e
enriquecimento da realidade de vida dos alunos jovens e adultos.
Para desenvolver a temática, o trabalho está estruturado em duas partes. Inicialmente
fazemos uma breve abordagem teórica referente à temática ludicidade na EJA,
abordando principalmente questões que envolvem a importância e a necessidade de
aulas direcionadas com dinâmicas e jogos que possam envolver, divertir e, ao mesmo
tempo, ensinar e formar novas aprendizagens. Em seguida enfoca-se o resultado da
pesquisa de campo, na qual verificamos pontos relevantes quanto à utilização do lúdico
na EJA. A análise exposta nesta comunicação foi feita numa perspectiva qualitativa,
para melhor percebermos a realidade específica da escola pesquisada, sem intenção de
generalizar os resultados.

3
OLIVEIRA, Eliene; RODRIGUES, Marcia do Socorro; SOUZA, Rejanete Silva; GUIMARÃES, André
Rodrigues. O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos. Disponível em:
http://alb.com.br/arquivomorto/edicoes_anteriores/anais16/sem01pdf/sm01ss04_08.pdf.
19
Ao final fazemos nossas considerações enfatizando que é significativo aos
docentes o envolvimento em busca de novas metodologias que atendam e desperte o
interesse a motivação dos educandos.

A ludicidade e suas contribuições na formação do aluno da EJA


Ao longo da história da educação brasileira pouco se fez em prol de um ensino
de qualidade para os jovens e adultos. É somente a partir de 1940 que no Brasil começa-
se a pensar em uma educação voltada a estas camadas populares, as quais tomaram
maior evidencia a partir de 1960.
Neste cenário Freire propunha uma concepção de educação libertadora, a qual
almeja, a partir das experiências vividas cotidianamente pelo aluno, a constituição de
um processo emancipador na qual a leitura está intimamente vinculada à transformação
social com a superação da opressão. Neste sentido, ressalta-se a necessidade de respeitar
os saberes dos educandos, suas realidades, pois impor “a eles a nossa compreensão em
nome da sua libertação é aceitar soluções autoritárias como caminhos para liberdade”
(FREIRE, 2003, p. 27).
As propostas de Freire visam uma educação popular, conscientizadora, na qual a
leitura de mundo precede a leitura da palavra. Entretanto, contrariamente à esta
perspectiva, em 1967 foi lançado o MOBRAL (Movimento Brasileiro de
Alfabetização), que se expandiu para todo país. Este programa levava o educando a
apenas decifrar letras e, muito precariamente, a leitura e a escrita. De um modo geral,
mesmo após a extinção do Mobral e com os sucessivos programas governamentais para
atender a EJA, percebemos que ainda são fortes as influências de perspectivas limitadas
de educação nesta modalidade de ensino.
Deste modo, para reverter este quadro, seria preciso envolver os alunos em um
processo de ensino norteado por práticas que possibilite a inclusão educacional e social.
Para tal, os trabalhos educativos com jovens e adultos devem estar alicerçados com
práticas que desenvolvam a permanência do educando na escola, permitindo o seu
desenvolvimento em múltiplas dimensões e fazendo com o mesmo se prepare para
novos desafios que surgem.
Assim sendo, o lúdico passa a constituir-se em uma possibilidade de um novo
olhar para os jovens e adultos, na qual esses alunos que não tiveram oportunidades
educacionais na idade própria e retornaram à escola na tentativa de superar o tempo

20
perdido, possam encontrar na escola um ambiente prazeroso, descontraído e de
satisfação pessoal. É neste contexto que a escola de jovens e adultos pode tornar-se para
os educandos um espaço privilegiado de formação com metodologias divertidas e
dinamizadas, desfrutando de momentos prazerosos ao mesmo tempo construindo um
conhecimento escolar agradável.

A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e


não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do
aspecto lúdico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal,
social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para
um estado interior fértil, facilita os processos de socialização
comunicação, expressão e construção do conhecimento (SANTOS,
1997, p 12).

Numa concepção lúdica, a linguagem oral e escrita deve ser considerada como
forma de interação para externar pensamentos ou para apropriação de conhecimentos.
Desse modo, poderemos através de jogos, brincadeiras, montagens e produções dos
alunos criar um ambiente alfabetizador significativo e concreto. Além disso, a descrição
de objetos práticos pode ajudar o aluno no desenvolvimento de variadas dimensões
(ética, estética, artística, afetiva etc.).
Neste processo é importante lembrar que a leitura crítica da realidade
proporciona um novo fazer pedagógico reconhecendo que a alfabetização está
associada, sobretudo as mudanças que queremos implementar na sociedade. Ou seja,
concebemos que a educação deve ser “vista como um dos meios capazes de
proporcionar à classe trabalhadora um saber que seja instrumento de luta, a fim de que
possa de forma consciente, renascer enquanto homens e com eles uma nova escola”.
(VALE, 2001, p. 46).
Ressalta-se, que é preciso respeitar os níveis de compreensão dos alunos da EJA
valorizando a sua realidade para que se efetive o processo de ensino aprendizagem. Isto
deve ser feito sem imposição, pois ninguém sabe tudo, cada um tem intrínseco o seu
conhecimento pautado em suas convicções e experiências vividas. Assim sendo, o
trabalho com a ludicidade, para além da recreação, deve envolver a sensibilidade e a
descoberta de um novo sentido para a leitura e a escrita, vislumbrando o
desenvolvimento pleno da capacidade do sujeito.
Se observarmos atentamente a dinâmica de alfabetização evidenciada por Freire
(BRANDÃO, 1981) perceberemos o trabalho com gravuras, desenhos, imagens que
21
estão sempre em contato com as formas lúdicas. Através das fichas com gravuras, os
alunos irão tendo noção das palavras que fazem parte do seu vocabulário. Esta tomada
de consciência possibilita aos docentes e discentes a criação de novas estratégias de
ensino presentes na cotidianidade do fazer pedagógico.
Desta forma é importante redimensionar através das atividades lúdicas os
conteúdos a serem trabalhados na EJA, modificando atitudes e comportamentos
facilitando a aprendizagem, e tornando-a significativa. Paralelamente a essa utilização
existem duas questões preponderantes. Primeiramente a utilização de atividades lúdicas
com novas metodologias de ensino com perspectiva de um novo olhar para o currículo
da EJA. Isso será necessário para efetivar a construção do conhecimento junto à
vivência e a capacidade criadora dos alunos.
Em segundo lugar deve-se verificar que a educação de hoje precisa acompanhar
as inovações e aproveitar a ludicidade em benefício de todos, garantindo a integração na
sociedade como agentes mais críticos e criativos, só assim o aluno terá mais facilidade
de expressar sua afetividade, emoções e até mesmo integrar-se ao grupo de forma
consciente e crítica.
Nesta perspectiva, é preciso romper com o ensino tradicional que discrimina,
exclui e trata com inferioridade e incapacidade os jovens e adultos, que também fazem
parte da nossa sociedade precisando apenas ser reconhecidos e valorizados como
indivíduos com cultura e personalidade própria. Entretanto, ao pensar sobre a utilização
do lúdico na EJA é preciso considerar que esta modalidade possui suas especificidades
as quais devem ser respeitadas. Não podemos mais ver a EJA como uma extensão do
ensino regular ou com atividades meramente recreativas que não são usadas para
implementar novas práticas e sobretudo criar um ambiente de integração entre
professores e aluno.
O lúdico não pode nem deve ser usado simplesmente para passar o tempo, como
se não tivesse nenhum valor pedagógico. Ao contrário essas atividades devem envolver
os alunos para o trabalho coletivo, é através das atividades lúdicas como jogo e
brincadeiras que o adulto poderá indagar transformar e expressar suas vontades
Neste sentido, Haidt (2003, p. 176) enfatiza que além dessas questões “o jogo
tem um valor formativo porque contribui para a formação de atitudes sociais: respeito
mutuo, solidariedade, cooperação, obediência à regras, senso de responsabilidade
iniciativa, pessoal e grupal”.

22
Uma outra questão a considerar é a concepção de formação humana contínua, segundo a
qual todos, educadores e educandos, são eternos aprendizes, trocando e inovando suas
experiências e aumentando a perspectiva de permanência desses alunos na escola.
Assim a escola deve constituir se em um espaço de troca de experiências, onde a
ludicidade auxiliam o professor na sua prática.

A ludicidade na EJA: caminhos para formação da cidadania na escola


Para verificar como vem sendo utilizado o lúdico na Educação de Jovens e
Adultos (EJA) na Escola Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos, realizamos no mês de
outubro de 2006, uma pesquisa com abordagem qualitativa. Para tanto, foram realizadas
entrevistas estruturadas com duas docentes e aplicados questionários fechados com vinte
discentes. Especificamente os questionários nos auxiliaram a perceber quais as
perspectivas que os educandos têm a respeito da utilização do lúdico na sua formação
escolar.
a) A necessidade do lúdico como apoio para as novas práticas pedagógicas
A utilização de jogos na educação de jovens e adultos estimula os alunos para
uma participação ativa na prática escolar, envolvendo-os em trabalhos bem elaborados e
tornando-os independentes para perceberem seus potenciais, enquanto agentes
participativos. Assim, quanto mais vivências lúdicas tiverem esses alunos maiores serão
as suas participações em sala de aula, favorecendo até mesmo ao professor para que
tenha um envolvimento maior com seus alunos com momentos prazerosos e
descontraídos.
Isto é significativo, pois a aprendizagem só ocorre quando o aluno participa
ativamente do processo de construção e reconstrução do conhecimento. Nesta
construção os procedimentos didáticos devem ajudar o aluno a incorporar novas formas
de aprender e desenvolver-se.
Tanto os professores quanto os alunos investigados, de um modo geral,
compreendem que o lúdico torna as atividades escolares mais atrativas e descontraídas.
Constatou-se também que as professoras reconhecem a possibilidade de estabelecer,
com utilização dos jogos, uma ligação entre o que o aluno já sabe e aquilo que ele ainda
precisa alcançar. Conforme demonstra Freire (1996) a tarefa do educador é desafiar o
educando a pensar criticamente a partir de seu mundo imediato e não lhe impor um
mundo alheio.

23
Neste contexto, as professoras ao elaborarem atividades lúdicas se mostraram
comprometidos com a realidade dos alunos, estimulando e trabalhando esses com novos
procedimentos didáticos. Para elas, através do jogo a aprendizagem acontece de forma
natural, com envolvimento e a participação ativa dos alunos, tornando a sala de aula um
lugar onde se constrói conhecimento e não apenas se transfere informações.

Através do jogo há um maior interesse do aluno em brincar e


aprender mais rápido estimula a memória, eles acham interessantes. E
também você tem a oportunidade de conhecer melhor os alunos
interagir com eles, proporcionando a eles atitudes e valores ético
através dos jogos essas atitudes são desenvolvidas sem obrigação de
forma consciente, coletiva, com justiça e igualdade, sem
discriminação (Professora A).

Mesmo com todos os entraves e dificuldades encontradas para efetivação e


implementação de novas práticas, fica evidente que as professoras dentro das suas
limitações estão procurando implementar suas aulas com atividades prazerosas. Porém,
apesar de todos os benefícios que a ludicidade trás para sala de aula, percebemos que as
professoras ainda utilizam os jogos esporadicamente, em atividades eventuais,
trabalhando geralmente jogos matemáticos, de montagem de letras, algumas construções
e outros.
Além destas questões já expostas, outro aspecto significativo mencionado pelas
professoras refere-se à melhoria do relacionamento e da amizade que envolve a presença
do lúdico no contexto escolar. O valor da ludicidade é visível quando possibilita o
relacionamento entre aluno e professores, que acabam criando um elo de respeito e
companheirismo.
Por outro lado, os alunos reconhecem que a ludicidade torna-os mais receptivos
aos assuntos trabalhados. Isto demonstra que os jovens da EJA percebem o valor dos
jogos e brincadeiras na sala de aula como um recurso pedagógico que os favorece em
suas aprendizagens. Os alunos afirmam que os jogos fazem com que eles aprendam
coisas novas, ativam a sua mente e estimulam o aprendizado, porque os deixam mais
extrovertidos e relaxados.
Os educandos acrescentam que gostam de tudo que envolve a ludicidade, tanto
os jogos como as brincadeiras, dramatizações, músicas e as dinâmicas que ajudam a
resolver problemas e construírem novas concepções e também de jogos da memória,
quebra-cabeça, montagem, dominó, baralho e gincanas educativas. Isso é fundamental,
24
pois demonstra que os educadores aos poucos estão internalizando e incorporando a
necessidade de novas concepções de educação voltadas para adequação de um ensino
significativo.
b) Contribuições da formação lúdica do professor para trabalhar na EJA
A formação continuada do educador da EJA também contribui para sua melhor
atuação em sala de aula, pois possibilita um repensar de suas ações, para que através da
troca de experiência com outros educadores ele seja capaz de melhorar a sua prática,
afastando-se um pouco da rotina massacrante das aulas tradicionais e incorporando por
meio da ludicidade a satisfação de compartilhar com o outro o saber.

Entendemos que o educador é um mediador, um organizador do


tempo, do espaço, das atividades [...] na construção do conhecimento.
È ele quem cria e recria sua proposta pedagógica e para que ela seja
concreta, critica dialética, este educador deve ter competência técnica
para fazê-la (SANTOS, 1997, p. 61).

Compreendendo esta questão, a formação continuada foi apontada pelas


docentes como uma das condições básicas para termos um ensino diferenciado em
nossas escolas. As práticas lúdicas ajudam os educadores na formação do educando,
valorizando o homem em sua condição de pessoa humana que necessita também do
lazer que muitas vezes é negado pela falta de tempo e de oportunidade.
Por outro lado sabemos que só a formação do educador não é o bastante para
termos um ensino público de qualidade, é preciso assimilação desta prática por todos
que fazem parte da escola. A formação do educador também depende do seu esforço
próprio, não podendo contentar-se apenas com a sua formação inicial. É preciso
reconhecer-se com ser inacabado, que sempre esta aprendendo.
Estas considerações evidenciam a necessidade de uma política permanente e
específica para a EJA, que entre outras questões considere a formação inicial e
continuada dos profissionais da educação.

Considerações Finais
A especificidade da EJA exige que busquemos analisar e propor práticas
educativas condizentes com a realidade socialmente excludente em que vivemos.
Repensar a educação de adultos apresenta-se como um desafio para aqueles que se
propõe na construção de uma educação emancipadora, que considere o ser humano em

25
todas as suas dimensões. Neste processo, as atividades lúdicas representam um caminho
para implementarmos uma pedagogia mais humana, fraterna e libertadora.
Na pesquisa que realizamos pudemos constatar que os educadores investigados
dizem utilizar a ludicidade em sua prática pedagógica, reconhecendo a sua importância
no seu fazer pedagógico para implementação da aprendizagem dos alunos. Entretanto,
verificamos que essas atividades ainda acontecem de forma esporádica que muitas vezes
não chegam a motivar todos os educandos precisando ser mais bem planejada e
adequada à realidade de todos e com maior freqüência.
E neste processo, o professor precisa assumir a crença no poder de
transformação que o lúdico pode trazer para a educação e o brincar deve ser visto como
um potencializador do desempenho do educador que sabe e gosta de brincar, que eleva e
respeita o potencial de cada indivíduo. Para tanto é preciso repensar nossas práticas,
adequando as ações pedagógicas para promover o exercício da cidadania e também
perceber que a sala de aula constitui-se em um espaço com diferentes vivências que
podem ser aproveitadas para estimular os alunos facilitando e dinamizando as aulas.
O desafio então é usar esses recursos didáticos com responsabilidade e
maturidade saindo do discurso para efetivação do processo de mudança do ato de
aprender e ensinar voltados para as necessidades dos alunos da EJA. Isso pode dar-se a
partir da mudança de postura de alguns professores que ainda insistem nas aulas
conteudistas sem motivação, sendo isso um desafio que a escola precisa superar.
Outro aspecto a ser acrescentado é que com as atividades lúdicas o professor
promove a auto-estima e favorece o desenvolvimento da linguagem, pois alguns alunos
têm dificuldades de comunicar-se e através dos jogos e brincadeiras as idéias fluem com
naturalidade. Assim, é possível compreender o outro, amar e sentir-se aceito pelos
colegas respeitando e compartilhando seus anseios, suas dúvidas e desejos. Para Freire,
“a alegria necessária à atividade educativa é a esperança. A esperança de que professor e
alunos juntos podem aprender ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente
resistir aos obstáculos” (1996, p. 80).
De um modo geral, os alunos têm boa receptividade às atividades lúdicas
utilizadas no processo de ensino aprendizagem, porém alguns apresentam críticas a
certas atividades que “são infantis”. Assim, o desafio não estar somente na introdução
do lúdico na EJA, mas acima de tudo, compreender as especificidades que esta
modalidade exige.

26
Para concretização destas questões as docentes investigadas apontam um
elemento basilar para a realização de práticas lúdicas que respeitem a EJA: sua
formação permanente. Deste modo, é evidente a necessidade de construirmos uma
política educacional permanente para jovens e adultos. Somente assim, poderemos
efetivamente construir uma educação plena e que possibilite uma formação
emancipadora para todos.

Referências Bibliográficas

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é o método Paulo Freire. São Paulo:


Brasiliense, 1981.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, 6ª
ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
__________. A importância do ato de ler. 45ª ed. São Paulo: Cortez, 2003.
HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de Didática Geral: O uso de jogos (cap.9). 7 ed.
São Paulo: Ática, 2003.
SANTOS, Santa Marli Pires dos. O lúdico na formação do Educador. 6ª ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.
VALE, Ana Maria do. Educação popular na escola pública, 3ª ed. São Paulo: Cortez,
2001.

Notas
1.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.
2.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.
3.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.
4.Professor de Fundamentos da EJA/UNIFAP e Mestrando em Desenvolvimento
Regional pela UNIFAP.

TEXTO COMPLEMENTAR

LUDICIDADE COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO4

4
ALMEIDA, Anne. Ludicidade como instrumento pedagógico. Disponível em:
http://www.cdof.com.br/recrea22.htm. Acesso em 30.05.2014.

27
Profª. Esp. Anne Almeida1

O lúdico tem sua origem na palavra latina "ludus" que quer dizer "jogo". Se se
achasse confinado à sua origem, o termo lúdico estaria se referindo apenas ao jogar, ao
brincar, ao movimento espontâneo. A evolução semântica da palavra "lúdico",
entretanto, não parou apenas nas suas origens e acompanhou as pesquisas de
Psicomotricidade. O lúdico passou a ser reconhecido como traço essencial de
psicofisiologia do comportamento humano, de modo que a definição deixou de ser o
simples sinônimo de jogo.
As implicações da necessidade lúdica extrapolaram as demarcações do brincar
espontâneo, passando a necessidade básica da personalidade, do corpo e da mente. O
lúdico faz parte das atividades essenciais da dinâmica humana, caracterizando-se por ser
espontâneo funcional e satisfatório. Sendo funcional: ele não deve ser confundido com o
mero repetitivo, com a monotonia do comportamento cíclico, aparentemente sem alvo
ou objetivo. Nem desperdiça movimento: ele visa produzir o máximo, com o mínimo de
dispêndio de energia.
Segundo Luckesi, lúdicas são aquelas atividades que propiciam uma experiência
de plenitude, em que nos envolvemos por inteiro, estando flexíveis e saudáveis. Para
Santin, são ações vividas e sentidas, não definíveis por palavras, mas compreendidas
pela fruição, povoadas pela fantasia, pela imaginação e pelos sonhos que se articulam
como teias urdidas com materiais simbólicos. Assim, elas não são encontradas nos
prazeres estereotipados, no que é dado pronto, pois estes não possuem a marca da
singularidade do sujeito que as vivencia.
Na atividade lúdica, o que importa não é apenas o produto da atividade, o que dela
resulta, mas a própria ação, o momento vivido. Possibilita a quem a vivencia momentos
de encontro consigo e com o outro, momentos de fantasia e de realidade, de
ressignificação e percepção, momentos de autoconhecimento e conhecimento do outro,
de cuidar de si e olhar para o outro, momentos de vida.
Uma aula com características lúdicas não precisa ter jogos ou brinquedos. O que
traz ludicidade para a sala de aula é muito mais uma "atitude" lúdica do educador e dos
educandos. Assumir essa postura implica sensibilidade, envolvimento, uma mudança

28
interna e não apenas externa, implica não somente uma mudança cognitiva, mas,
principalmente, uma mudança afetiva. A ludicidade exige uma predisposição interna, o
que não se adquire apenas com a aquisição de conceitos, de conhecimentos, embora
estes sejam muito importantes. Uma fundamentação teórica consistente dá o suporte
necessário ao professor para o entendimento dos porquês de seu trabalho. Trata-se de ir
um pouco mais longe ou, talvez melhor dizendo, um pouco mais fundo. Trata-se de
formar novas atitudes, daí a necessidade de que os professores estejam envolvidos com
o processo de formação de seus educandos. Isso não é tão fácil, pois, implica romper
com um modelo, com um padrão já instituído, já internalizado.
A escola tradicional, centrada na transmissão de conteúdos, não comporta um
modelo lúdico. Por isso é tão frequente ouvirmos falas que apóiam e enaltecem a
importância do lúdico estar presente na sala de aula, e queixas dos futuros educadores,
como também daqueles que já se encontram exercendo o magistério, de que se fala da
importância da ludicidade, se discutem conceitos de ludicidade, mas não se vivenciam
atividades lúdicas. Fala-se, mas não se faz. De fato não é tão simples uma
transformação mais radical pelas próprias experiências que o professor tem ao longo de
sua formação acadêmica.
Como bem observa Tânia Fortuna, em uma sala de aula ludicamente inspirada,
convive-se com a aleatoriedade, com o imponderável; o professor renuncia à
centralização, à onisciência e ao controle onipotente e reconhece a importância de que o
aluno tenha uma postura ativa nas situações de ensino, sendo sujeito de sua
aprendizagem; a espontaneidade e a criatividade são constantemente estimuladas.
Podemos observar que essas atitudes, de um modo geral, não são, de fato, estimuladas
na escola. Para Jucimara: "as atividades lúdicas permitem que o indivíduo vivencie sua
inteireza e sua autonomia em um tempo-espaço próprio, particular. Esse momento de
inteireza e encontro consigo gera possibilidades de autoconhecimento e de maior
consciência de si".
São lúdicas as atividades que propiciem a vivência plena do aqui-agora,
integrando a ação, o pensamento e o sentimento. Tais atividades podem ser uma
brincadeira, um jogo ou qualquer outra atividade que possibilite instaurar um estado de
inteireza: uma dinâmica de integração grupal ou de sensibilização, um trabalho de
recorte e colagem, uma das muitas expressões dos jogos dramáticos, exercícios de
relaxamento e respiração, uma ciranda, movimentos expressivos, atividades rítmicas,

29
entre outras tantas possibilidades. Mais importante porém, do que o tipo de atividade é a
forma como é orientada e como é experienciada, e o porquê de estar sendo realizada.
Enquanto educadores, damos ênfase às metodologias que se alicerçam no
"brincar", no facilitar as coisas do aprender através do jogo, da brincadeira, da fantasia,
do encantamento. A arte-magia do ensinar-aprender (Rojas, 1998), permite que o outro
construa por meio da alegria e do prazer de querer fazer. O jogo e a brincadeira estão
presentes em todas as fases da vida dos seres humanos, tornando especial a sua
existência. De alguma forma, o lúdico se faz presente e acrescenta um ingrediente
indispensável no relacionamento entre as pessoas, possibilitando que a criatividade
aflore.
Por meio da brincadeira a criança envolve-se no jogo e sente a necessidade de
partilhar com o outro. Ainda que em postura de adversário, a parceria é um
estabelecimento de relação. Esta relação expõe as potencialidades dos participantes,
afeta as emoções e põe à prova as aptidões testando limites. Brincando e jogando, a
criança terá oportunidade de desenvolver capacidades indispensáveis a sua futura
atuação profissional, tais como atenção, afetividade, o hábito de permanecer
concentrado e outras habilidades perceptuais psicomotoras. Brincando a criança torna-se
operativa.
Observamos que quando existe representação de uma determinada situação
(especialmente se houver verbalizado) a imaginação é desafiada pela busca de solução
para problemas criados pela vivência dos papéis assumidos. As situações imaginárias
estimulam a inteligência e desenvolvem a criatividade. O ato de criar permite uma
Pedagogia do Afeto na escola, permite um ato de amor, de afetividade cujo território é o
dos sentimentos, das paixões, das emoções, por onde transitam medos, sofrimentos,
interesses e alegrias. Uma relação educativa que pressupõem o conhecimento de
sentimentos próprios e alheios que requerem do educador a disponibilidade corporal e o
envolvimento afetivo, como também, cognitivo de todo o processo de criatividade que
envolve o sujeito-ser-criança. A afetividade é estimulada por meio da vivência, a qual o
educador estabelece um vínculo de afeto com o educando. A criança necessita de
estabilidade emocional para se envolver com a aprendizagem. O afeto pode ser uma
maneira eficaz de se chegar perto do sujeito e a ludicidade, em parceria, um caminho
estimulador e enriquecedor para se atingir uma totalidade no processo do aprender.

30
Percebemos em Machado (1966) o ressaltar do jogo como não sendo qualquer
tipo de interação, mas sim, uma atividade que tem como traço fundamental os papéis
sociais e as ações destes derivadas em estreita ligação funcional com as motivações e o
aspecto propriamente técnico-operativo da atividade. Dessa forma destaca o papel
fundamental das relações humanas que envolvem os jogos infantis.
Entender o papel do jogo nessa relação afetiva-emocional e também de aprendizagem
requer que percebamos estudos de caráter psicológico, como mecanismos mais
complexos, típicos do ser humano, como a memória, a linguagem, a atenção, a
percepção e aprendizagem. Elegendo a aprendizagem como processo principal do
desenvolvimento humano enfocamos Vygotsky (1984) que afirma: a zona de
desenvolvimento proximal é o encontro do individual com o social, sendo a concepção
de desenvolvimento abordada não como processo interno da criança, mas como
resultante da sua inserção em atividades socialmente compartilhadas com outros.
Atividades interdisciplinares que permitem a troca e a parceria. Ser parceiro é sê-lo por
inteiro. Nesse sentido, o conhecimento é construído pelas relações interpessoais e as
trocas recíprocas que se estabelecem durante toda a vida formativa do indivíduo.
Machado (1966) salienta, que a interação social implica transformação e contatos
com instrumentos físicos e/ou simbólicos mediadores do processo de ação. Esta
concepção reconhece o papel do jogo para formação do sujeito, atribuindo-lhe um
espaço importante no desenvolvimento das estruturas psicológicas. De acordo com
Vygtsky (1984) é no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva.
Segundo o autor a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades
da vida real, tanto pela vivência de uma situação imaginária, quanto pela capacidade de
subordinação às regras.
A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser
vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a
aprendizagem; o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa
saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de
socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento.
A formação do sujeito não é um quebra-cabeça com recortes definidos, depende da
concepção que cada profissional tem sobre a criança, homem, sociedade, educação,
escola, conteúdo, currículo. Neste contexto as peças do quebra-cabeça se diferenciam,
possibilitando diversos encaixes.

31
Negrine (1994) sugere três pilares que sustentariam uma boa formação
profissional, com a qual concordamos: a formação teórica, a prática e a pessoal, que no
nosso entendimento, a esta última preferimos chamá-la de formação lúdica
interdisciplinar. Este tipo de formação é inexistente nos currículos oficiais dos cursos de
formação do educador, entretanto, algumas experiências têm-nos mostrado sua validade
e não são poucos os educadores que têm afirmado ser a ludicidade a alavanca da
educação para o terceiro milênio.
A formação lúdica interdisciplinar se assenta em propostas que valorizam a
criatividade, o cultivo da sensibilidade, a busca da afetividade, a nutrição da alma,
proporcionando aos futuros educadores vivências lúdicas, experiências corporais que se
utilizam da ação do pensamento e da linguagem, tendo no jogo sua fonte dinamizadora.
Quanto mais o adulto vivenciar sua ludicidade, maior será a chance deste profissional
trabalhar com a criança de forma prazerosa, enquanto atitude de abertura às práticas
inovadoras. Tal formação permite ao educador saber de suas possibilidades e limitações,
desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do
brinquedo para a vida da criança. Percebemos com isso que se o professor tiver
conhecimento e prazer, mais probabilidade existirá de que os professores/aprendizes se
utilizem desse "modelo" na sua sala de aula. Nóvoa (1991) afirma que o sucesso ou
insucesso de certas experiências marcam a nossa postura pedagógica, fazendo-nos sentir
bem ou mal com esta ou aquela maneira de trabalhar na sala de aula.
Ao sentir que as vivências lúdicas podem resgatar a sensibilidade, até então
adormecida, ao perceber-se vivo e pulsante, o professor/aprendiz faz brotar o
inesperado, o novo e deixa cair por terra que a lógica da racionalidade extingue o calor
das paixões, que a matemática substitui a arte e que o humano dá lugar ao técnico
(Santin, 1990), permitindo o construir alicerçado no afeto, no poder fazer, sentir e viver.
Poder vivenciar o processo do aprender colocando-se no lugar da criança, permitindo
que a criatividade e a imaginação aflorem através da interdisciplinaridade enquanto
atitude. A intersubjetividade se mostre por meio do afeto e da alegria de poder liberar o
que cada sujeito (professor) traz consigo mesmo e quanto pode contribuir com o outro.
Segundo Snyders (1988) o despertar para o valor dos conteúdos das temáticas
trabalhadas é que fazem com que o sujeito aprendiz tenha prazer em aprender.
Conteúdos estes despertados pelo prazer de querer saber e conhecer. Devemos despertá-
los para, com sabedoria, podermos exteriorizá-los na nossa vida diária. A alegria, a fé, a

32
paz, a beleza e o prazer das coisas estão dentro de nós.
Por entender e concordar com o autor percebemos que se o professor não aprende com
prazer não poderá ensinar com prazer.
É isso que procuramos fazer em nossa prática pedagógica, dando ênfase à
formação lúdica: ensinar e sensibilizar o professor-aprendiz para que, através de
atividades dinâmicas e desafiadoras, despertem no sujeito-aprendiz o gosto e a
curiosidade pelo conhecimento. Curiosidade que segundo Freire (1997) é natural e cabe
ao educador torná-la epistemológica.
Tudo se decide no processo de reflexão que o professor leva a cabo sobre sua
própria ação (Nóvoa, 1995). O homem da ciência e da técnica perdeu a felicidade e a
alegria de viver, perdeu a capacidade de brincar, perdeu a fertilidade da fantasia e da
imaginação guiadas pelo impulso lúdico (Santin, 1994). Que a sala de aula seja um
ambiente em que o autoritarismo seja trocado pela livre expressão da atitude
interdisciplinar (Fazenda, 1994). Que as aulas sejam vivas e num ambiente de inter-
relação e convivência (Masseto, 1992).
A formação lúdica possibilita ao educador conhecer-se como pessoa, saber de
suas possibilidades, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância
do jogo e do brinquedo para a vida da criança, do jovem e do adulto (Santos, 1997;
Kishimoto, 1999). A afetividade como sustentáculo significativo e fundamental de uma
pedagogia que se alicerça na arte-magia interdisciplinar do ensinar-aprender (Rojas,
1998).
Sala de aula é um lugar de brincar se o professor consegue conciliar os objetivos
pedagógicos com os desejos do aluno. Para isso é necessário encontrar equilíbrio
sempre móvel entre o cumprimento de suas funções pedagógicas e contribuir para o
desenvolvimento da subjetividade, para a construção do ser humano autônomo e
criativo. Credita ao aluno, isto é, 'a sua ação, à parte de responsabilidade no
desenvolvimento. Mesmo procurando fazer sua parte, o professor e a escola
dão/respeitam a possibilidade de que outra coisa aconteça. Como tão bem afirma Tânia
Fortuna: brincar na sala de aula é uma aposta.

Referências Bibliográficas
VYGOTSKY, L.S. (1993) Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes.

33
FORTUNA, Tânia Ramos. Formando professores na Universidade para brincar. In:
SANTOS, Santa Marli P.dos (org.). A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes,
2001, p.116.
FAZENDA, I. C. (1995) A Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa.
Campinas/SP, Papirus.
MORIN, E. (1999). Amor, Poesia e Sabedoria. Lisboa: Instituto Piaget.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Educação, ludicidade e prevenção das neuroses futuras:
uma proposta pedagógica a partir da Biossíntese. In: LUCKESI, Cipriano Carlos (org.)
Ludopedagogia - Ensaios 1: Educação e Ludicidade. Salvador: Gepel, 2000.

Notas
1 A profª. Esp. Anne Almeida é licenciada em Educação Física Pelas Faculdades
Montenegro - Ibicaraí, Bahia. Especialista em Educação Física Escolar pela
Universidade Salgado de Oliveira – RJ. Professora da Rede Estadual em Itabuna Bahia,
Colégios: Eraldo Tinoco Melo e Colégio Modelo - Luis Eduardo Magalhães. Docente
das Faculdades Montenegro nos cursos de Educação Física e Pedagogia. A Almeida -
Disponível: http://www. cdof. com. br/recrea22. htm. …, 2006 - cdof.com.br

CAPÍTULO 3

34
DEUSES E MONSTROS5

Educar é substantivamente formar. Divinizar ou


diabolizar a tecnologia é uma forma altamente
negativa e perigosa de pensar errado. (PAULO
FREIRE, 2002, p.37).

De acordo com Ferreira e Junior (1986), o inventor Thomas Edison, após suas
primeiras experiências com máquinas de projeção, já anunciava a possibilidade de que
os filmes chegariam a substituir os livros didáticos. Os primeiros cineastas já
produziram muitos filmes educativos com caráter instrucional.6 Com a invenção do
projetor portátil, concomitante à praticidade dos filmes não-inflamáveis inventados por
Eastman Kodak, foi possível uma maior penetração do cinema nas escolas. De acordo
com Belloni e Subtil (2002) essa questão começa a ganhar maior visibilidade a partir da
Segunda Guerra Mundial quando, nos Estados Unidos da América, começa-se a utilizar
recursos audiovisuais na educação tendo em vista a grande eficiência do uso desses
recursos, principalmente retroprojetores, projetores e filmes educativos para
treinamentos de homens para a guerra. No período pós Segunda Guerra Mundial,
algumas empresas se firmaram no ramo de produções educativas como a Encyclopaedia
Britannica Films, Coronet e Walt Disney, que se dedicou a produções de vídeos sobre
animais e fenômenos da natureza.
Louro (2000) afirma que no século XX o cinema passou a ser uma das formas
culturais mais significativas. Ao que foi inicialmente surgido como mais uma
modalidade de lazer, em pouco tempo passou a ser encarado como uma importante
instância formativa com representações de gênero, etnias, classes, dentre outras sendo
legitimadas ou marginalizadas.
A educação sempre foi alvo de inúmeros debates, experiências e reformas no
intuito de transformá-la. Acompanhada de um pensamento que percebe a educação
como o principal veículo de transformação social, algumas destas tentativas visavam,
dentre outras coisas, a expansão, qualificação e a modernização do ensino. No Brasil,

5
Esse capítulo é parte da dissertação de Mestrado intitulada Cinema e educação: uma reflexão sobre a
formação dos educadores na/para a linguagem audiovisual de Adriana Marques Ferreira (Capítulo 02).
Juiz de Fora, 2009.
Filme norte-americano (1998) dirigido por Bill Condon. Título original: Gods and Monsters.
6
De acordo com Ferreira e Júnior (1986), o primeiro filme de caráter realmente educativo foi produzido
por Oskar Messter para a Marinha Alemã, em 1897.
35
essas iniciativas vieram no bojo da tentativa de construção de um país também moderno
e progressista.
A década de 1920 representou um marco das lutas por uma grande reforma da
educação. Em 1930, subseqüente às idéias consolidadas nas Conferências Nacionais de
Educação foi criado o então denominado Ministério da Educação e Saúde Pública.
Neste momento, com o anseio de modernização e progresso do país, afirmava-se a
ideologia do grupo da Escola Nova que ensejava principalmente pelo ensino público,
obrigatório e laico.
A proposta de utilização do cinema como aliado educativo veio a partir das
idéias renovadoras de utilizá-lo como recurso e aliado da educação moderna, seja como
propaganda do país ou como auxiliar da educação na formação dos cidadãos. Dentre os
primeiros defensores da utilização do cinema na educação podemos citar Fernando de
Azevedo que, já na década de 1920, será mentor de reformas educacionais que, entre
outras medidas, incluirão o cinema como proposta de ensino.
Como possível portador de uma ideologia nacionalista, a contribuição do cinema
se daria principalmente no que se refere à “formação” da nação. Os filmes trariam
grandes benefícios para o cidadão e cumpririam o papel de apresentar aos brasileiros o
seu próprio país. Assim, apresentariam a geografia do Brasil, os monumentos históricos,
os heróis nacionais e até mesmo a origem das raças.
Este projeto de consolidação de uma nação, de acordo com Catelli (2004) se
caracterizava por uma modernização conservadora já que o cinema era concebido como
uma obra da elite. Portanto, como a arte e a cultura eram direitos reservados
exclusivamente a esta elite os novos meios de comunicação tinham como função
irradiar uma cultura elaborada “de cima”, ou, no caso da cultura popular, ao menos
selecionada por profissionais especializados.
Até então se conhecem algumas experiências locais que incentivam a utilização
do cinema como recurso didático. Em 1927, no Rio de Janeiro, foi criada uma
“Commissão de Cinema Educativo”. Esse pensamento também fez parte da reforma
educacional do Distrito Federal realizada em 1928 por Fernando de Azevedo. Durante o
Estado Novo, este projeto de transformar o cinema em um grande veículo educativo e
de integração nacional será levado à frente pelo poder político.
Foi em 1935 que, Edgard Roquette-Pinto encaminhou ao então Ministro da
Educação, Gustavo Capanema, um projeto de criação de um Instituto de Cinematografia

36
Educativa. Funcionou, assim, de 1936 a 1966, o Instituto Nacional do Cinema
Educativo (INCE). Criado no governo Getúlio Vargas e influenciado pelo movimento
da Escola Nova, a função do INCE era documentar as atividades científicas e culturais
realizadas no país para difundi-las, principalmente, na rede escolar. Seu objetivo era
editar filmes educativos populares e escolares. O cinema, visto como uma tecnologia
ligada ao progresso científico das sociedades modernas, insere-se na concepção que
define os meios de comunicação de massa como capazes de difundir a cultura para a
população, percebida como ainda em formação e deficiente culturalmente. O
pensamento de Getúlio Vargas era de que as distâncias regionais, políticas, territoriais e
econômicas eram um obstáculo ao crescimento nacional e o cinema, na sua visão, era
capaz de aproximar os diferentes núcleos de pessoas dispersas no território da
República. Sendo assim, o cinema poderia representar um instrumento de mudança
social e de modernização da sociedade, tanto pelas vias da técnica como da ciência. O
cinema ainda seria um facilitador na educação do povo, já que não era preciso
necessariamente estar alfabetizado para compreender as mensagens veiculadas.
Deste Instituto fez parte, como diretor, o cineasta Humberto Mauro. As idéias de
Humberto Mauro compartilhavam com os princípios que orientaram a criação do INCE,
concordando com as teses defendidas por Roquette-Pinto sobre a eficiência dos meios
de comunicação como ferramentas na educação do povo.
Neste período, a produção cinematográfica no Brasil era muito escassa. De
acordo com Franco (2004), em 1929, dos 1477 filmes liberados pela censura, 1268 eram
norte-americanos e apenas 38 eram brasileiros. Esta situação marcava um modelo de
importação de cultura e demonstrava que a indústria cinematográfica brasileira não
estava se beneficiando com o processo de industrialização do país. A influencia da
cultura norte-americana era visível e muito desta cultura era passada aos brasileiros
através do cinema. Portanto, era necessário o incentivo estatal ao cinema educativo e,
principalmente, nacionalista. O INCE, então, foi responsável por um processo de
aumento da produção nacional, pois contabilizava a produção de cerca de 30 filmes por
ano, o que era um número muito expressivo para a realidade da época.
No entanto, o INCE foi passível de muitas críticas no que se refere à qualidade
dos filmes exibidos, sobre as intenções políticas a que eles estavam vinculados e
também ao seu uso meramente instrucional ou ilustrativo. Apesar do reconhecimento do
cinema como importante recurso educacional, era necessário mantê-lo sob controle,

37
sempre cabendo às elites letradas conduzir o que seria veiculado pelo cinema, com o
intuito de espalhar a cultura nacional para as massas “incultas”. O cinema era, então,
considerado um poderoso aliado do ensino curricular e uma eficiente ferramenta para
inculcar noções como moralidade, higiene e trabalho, condizentes com uma moral
social e católica. O sujeito nacional seria aquele que, através do seu trabalho, auxiliaria
o crescimento da nação, e, assim, exerceria o seu patriotismo. Desta forma, os jovens
espectadores, dos filmes do INCE, aprendiam lições positivas sobre o trabalho manual.
Meninos apareciam trabalhando com a madeira, tendo treinamentos físicos enquanto as
meninas executavam tarefas domésticas, como costura e culinária. (ROSA, 2006). E,
sempre felizes, sorrindo, por estarem contribuindo com a pátria.
Os filmes produzidos pelos INCE também foram muito criticados no que diz
respeito à falta de uma orientação pedagógica em sua produção. Na pesquisa realizada
por Marília Franco sobre esses filmes ela pôde ao observar a falta dessa linha
pedagógica que desse ênfase a algum tipo de ensino ou que valorizasse alguma
abordagem. Sobre isso, Franco (2004) diz o seguinte:

Encontrei de tudo: geografia, música, medicina, educação rural,


documentação cientifica e industrial, história, literatura, registros
documentais. A análise do material preservado levou-me a constatação
de que não havia uniformidade didática. Sequer era clara a articulação
com os programas de ensino então vigentes. Neste caso fez falta o
educador para orientar a “linha editorial” (p.31)

Na verdade, o interesse pela dimensão educativa do cinema sempre foi alvo de


estudos e discussões. Favaretto (2002) coloca que as décadas de 1950 e 1960 foram um
período marcado por vários estudos, principalmente, psicopedagógicos. Isto se deve ao
fato de haver, naquele momento, uma ampla penetração do cinema norte-americano no
Brasil. Portanto, percebiam-no como um influenciador, ou até mesmo indutor dos
comportamentos das crianças e adolescentes com vistas ao chamado american way of
life, ou seja, o jeito americano de ser. Ao autor chama atenção para o fato de, nesta
época haver um grande número de estudos publicados sobre o tema. Diz ele:

Ao lado de um documento da Unesco com recomendações sobre os


cuidados que deveriam cercar a aproximação das crianças e
adolescentes do cinema, saíram no Brasil vários textos em revistas
especializadas. Por exemplo: ‘A criança e o cinema’, de Samuel
Pfromm Neto, ‘Cinema e saúde mental’, de J. Carvalho Ribas, ‘
Aspectos pedagógicos da influência do cinema sobre a criança e o
38
adolescente’, de Enzo Azzi. Inclui-se aí um interessante artigo de
Paulo Emílio Salles Gomes, ‘Inocência do cinema’[...]. Descartando o
que era considerada a influência maléfica do cinema, Paulo Emílio
destaca a sua relação com os problemas sociais nele configurados
através de uma singular experiência cultural. (FAVARETO, 2002,
p.10)

O INCE existiu até 1966 quando foi integrado ao Inc – Instituto Nacional de
Cinema transformando-se no DFC – Departamento do filme cultural. Pode-se afirmar
que o INCE foi a experiência mais sólida de cinema educativo no Brasil. E, mesmo com
todas as críticas – demasiadas pertinentes – não há como negar que o material
produzido pelo INCE possui um grande registro da história e da cultura brasileira.
Nas décadas seguintes, principalmente devido ao aumento dos meios de
comunicação de massa, o interesse da compreensão das relações entre cinema e
educação permanecia, mas, de acordo com Favaretto (2002), houve um
redirecionamento do interesse dedicado ao cinema educativo devido a dois fatores: ao
destaque dado aos problemas colocados pelas novas tecnologias, no âmbito da pesquisa,
do ensino e do saber, e a necessidade de transformação do processo educativo tanto nos
níveis institucionais quanto no nível pedagógico, levando em consideração as demandas
sociais e a produção industrial.
Belloni e Subtil (2002) afirmam que, no Brasil, o fortalecimento da inclusão dos
audiovisuais como recursos didáticos correspondem às reformas de ensino
implementadas na década de 1970. Neste momento, prevalecia o modelo tecnicista que
considerava que o ensino se tornava eficiente a partir do momento em que se aplicavam
métodos e técnicas instrucionais. Os processos educacionais estavam próximos ao
modelo de organização do trabalho típicas do modelo fordista de produção industrial.
Tal visão tecnicista considera tais materiais como “muletas pedagógicas”, ou seja, um
instrumento sobre o qual se apóia o professor para dar conta de transmitir o conteúdo da
forma mais eficaz possível. A partir dos anos 80 surgiram inúmeras críticas a tais
modelos tecnicistas e, com estas críticas, o modelo vigente também foi posto em
discussão. Dizem as autoras:

Na visão tecnicista, que considera esses materiais “muletas


pedagógicas”, escamoteia-se o fato de que eles são carregados de
historicidade, são fontes de emoção, de idéias e de conhecimentos e
que estão colocados na trama comunicacional – desencadeada no ato
pedagógico – como mediadores no processo de produção dessa
comunicação que envolve professores e alunos. Portanto, para além da
39
simples transferência de informação, a relação estabelecida é a de
elaboração e transformação de idéias, sentimentos, atitudes e sentidos
entre esses sujeitos com o uso dos objetos midiáticos. (p.69)

No entanto, ao se rejeitar o modelo tecnicista de educação, também foram


descartados os meios técnicos. Tal fato foi determinante para que a escola deixasse de
utilizar os avanços tecnológicos que ocorreram no campo da comunicação e da
informação, processos que Belloni e Subtil consideram como “matérias-primas da
educação” (2002, p.60). Hoje, o crescimento das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC) aliado a programas como, por exemplo, o Programa TV Escola 7,
criado em 1996, ou o mais recente DVD Escola8 de 2006, têm acentuado o interesse
pelos meios de comunicação e seus usos, aliados à tecnologia, na educação. Tal
crescimento possibilita uma ampliação no que diz respeito ao uso de variados
instrumentos tecnológicos, trazendo a televisão, o vídeo, e, mais recentemente o DVD e
os computadores para dentro da prática pedagógica.
Não há como negar a necessidade de se trabalhar com o audiovisual como uma
importante ferramenta pedagógica. Cabe ressaltar que o trabalho com o cinema
educativo não deve se restringir ao uso de filmes produzidos para este fim, mas sim se
deve aproveitar o potencial educativo de toda e qualquer produção sem que, no entanto,
isso signifique sua mera didatização ou uma escolarização das mídias, e nem mesmo
que o cinema vire instrumento de alienação e propaganda de idéias e regimes. Até
mesmo Roquete-Pinto já afirmava que o verdadeiro cinema educativo era o cinema
espetáculo, o cinema da vida integral (FRANCO, 2004). A tomada de consciência das
infinitas possibilidades educativas deste tipo de linguagem não deve pender para um
lado meramente instrumental de sua utilização, o que seria reduzir em muito seu
potencial, estético, artístico e político.
Apesar do reconhecimento por parte de educadores, governo e sociedade, da
necessidade de utilização dos recursos audiovisuais nas escolas, o que se percebe é que
eles ainda dividem opiniões: ou são considerados Deuses – soluções para todos os

7
O Programa TV Escola equipou as escolas públicas com um kit tecnológico composto por antena
parabólica, televisão em cores, receptor de satélite, videocassete, estabilizador de voltagem e fitas
cassetes. Os equipamentos que compõem o kit tecnológico foram adquiridos pela escola por intermédio
da Secretaria de Educação do Estado ou pelo Município, com recursos do BIRD e do salário-educação
administrados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) do MEC.
8
Foram enviados a 50 mil escolas públicas de ensino básico (pré-selecionadas usando alguns critérios
com base no censo INEP/2004) um aparelho de reprodução de DVD e uma caixa com 50 mídias DVD,
contendo, aproximadamente, 150 horas de programação produzida pela TV Escola.
40
problemas, sendo a maior ferramenta contra o marasmo em que a escola se encontra –,
ou são considerados Monstros – grandes vilões capazes de subverter as mentes mais
pacíficas, estimulando o consumo desenfreado e a violência.
As concepções que se referem aos meios de comunicação – cinema,
computador, televisão etc. – como responsáveis por destruir consciências ou por trazer-
lhes esclarecimentos, já são muito apresentadas e discutidas por educadores e teóricos,
sejam da área da comunicação ou da educação.
As opiniões são divergentes e, por isso, trazer imagens para a sala de aula e/ou
criticar e analisar as imagens recebidas seria uma boa forma de se garantir o direito de
escolha e de pensamento diante delas. Umberto Eco em seu livro Apocalípticos e
Integrados (1979), reúne argumentos a favor e contra a chamada comunicação de massa
e vai além de questioná-la como sendo algo estritamente bom ou mau. De modo geral,
os argumentos contra dizem respeito à críticas a um certo caráter conformista que
teriam esses meios, que seguiriam a lógica de uma economia baseada no consumo e
ainda se sujeitariam a influência persuasiva da publicidade.Os argumentos em prol da
comunicação se apegam a possibilidade da democracia de acesso aos bens culturais, já
que difundem uma grande quantidade de obras a baixo preço e ainda proporcionam
entretenimento.
Martín-Barbero (2001) coloca que a escola encarna e prolonga um regime de
saber que a comunicação do texto impresso instituiu, tanto que seu principal meio de
informação ainda é o livro didático. O avanço intelectual, no seu entendimento,
caminha paralelo ao progresso da leitura e exclui quem desvia desse padrão. E é assim
que a escola reproduz a relação do fiel com a sagrada escritura que a Igreja instaurou há
tempos atrás. Daí a antiga desconfiança da escola com a imagem, pois ela é polissêmica
e não pode ser controlada como o texto escrito.
Dizem Belloni e Subtil (2002):

Computadores, videogames, telefones celulares, TV a cabo e toda a


parafernália técnica que nos cerca e nos constitui vão transformando
rapidamente as estruturas simbólicas e os sistemas de significação.
Nesse meio ambiente novíssimo (ecologia cognitiva? ciberespaço?
cibercultura? sociedade da informação? da imagem? o saber?, a escola
aparece como um lugar estranho com sua fixação na oralidade e nos
meios impressos.(p.69-70).

41
A origem dessa posição se deve ainda a uma grande reação contra a idéia de
uma passagem da cultura do livro para a cultura audiovisual. No entanto, uma coisa não
elimina a outra. Para Babin e Kouloumdjian (1989), deve haver uma mixagem entre as
duas culturas, uma interpenetração entre as duas linguagens afirmando que não estamos
em um período de exclusão, mas sim de mistura. Um nascimento significa também uma
promessa de uma outra coisa que a educação deveria compreender e desenvolver.
Assim, questionam: “como guardar o essencial da aquisição de Gutemberg e, ao
mesmo tempo, assumir os novos modos e valores da linguagem audiovisual? É este o
desafio que a sociedade precisa aceitar”. (p.75)
A escola, muitas vezes, coloca como culpadas pela crise da leitura as
tecnologias, que são postas como sedutoras e malignas, poupando-a de questionamentos
sobre a reorganização do mundo das linguagens e escritas. Para Martín-Barbero
(2001), o modo como circula o saber é uma das mais profundas mutações na sociedade.
Assim, reivindicar a presença da cultura audiovisual não é desmerecer a cultura letrada,
mas sim desmontar sua pretensão de ser a única a ser considerada como tal em nossa
sociedade. É necessário compreender as tecnologias como cultura e não como meros
artefatos tecnológicos.
A expansão das grandes mídias nos anos 50 transformou nossos modos de
aprender e comunicar. O que é importante hoje é saber que tipo de cultura está
nascendo entre crianças e jovens, após um longo período de expansão e adensamento da
televisão, do cinema, do computador e de uso de diferentes aparelhos eletrônicos.
Segundo Babin e Kouloumdjian (1989) seria possível definir linguagem audiovisual
“como um modo particular de comunicação, regido por regras originais, resultando da
utilização simultânea e combinada de variados documentos visuais e sonoros”.(p.40).
No mundo atual a nova geração de indivíduos já nasce imersa em um meio
impregnado por toda essa tecnologia. Ela não conhece um mundo onde não exista
internet, filmes, animações de última geração, videogames etc. Por isso, o homem da
geração audiovisual raciocina, age, fala e possui uma atitude diferenciada perante a
sociedade, com relação à hábitos e comportamentos, de maneira diferente da geração
que teve que se adaptar gradativamente conforme foram ocorrendo as mudanças na
sociedade.
De acordo com Martín-Barbero (2001), realizando uma comparação com o
flâneur de Walter Benjamin, que vagava pelas ruas de Paris experenciando os novos

42
hábitos e costumes urbanos, estamos vivendo uma geração de flaneurs virtuais que não
consideram as mídias como apenas um meio de informação e conhecimento, mas como
uma grande rua movimentada onde podem transitar livremente. E, assim, anuncia:

Ao sensorium moderno que W. Benjamin viu emergir passeando pelas


avenidas das grandes cidades, os jovens articulam hoje as
sensibilidades pósmodernas das tribos efêmeras que se movem pela
cidade fendida ou das comunidades virtuais, cibernéticas. (p.50)

Portanto, ao lidar com esse meio é necessário reconfigurar nossos sentidos de


tempo, distância e espaço, já que a composição audiovisual não é linear, não é didática;
ela mistura som, palavra e imagem e sua interpretação é altamente subjetiva. Portanto, é
impossível compreender os esboços da nova cultura se não tentarmos compreender os
traços característicos dessa linguagem que está se instaurando.
Louro (2000) afirma que: “distintas relações do sujeito com a imagem fílmica
pode ocorrer: acolhida, ruptura, conformidade, resistência, critica ou imprevisíveis
combinações dessas e de outras respostas. Nesse processo de interação com a imagem
há sempre um investimento de emoções” (p.424). Para Babin e Kouloumdjian (1989),
diferentemente da linguagem escrita, que seria capaz de desenvolver maior capacidade
de análise, de rigor e de abstração, a linguagem audiovisual utiliza múltiplas atitudes
perceptivas, solicitando constantemente a presença da imaginação e dando à afetividade
um caráter primordial de mediação entre o produto audiovisual e o espectador. Para os
autores, o audiovisual efetua uma elaboração intelectual que possui diferentes fases no
mecanismo presente no ato de compreendê-lo. A primeira fase denominada estímulo-
sensação age sobre a personalidade do indivíduo e se refere ao choque inicial provocado
pela mistura de som, palavra e imagem. A segunda fase, da emoção fundamental, seria a
responsável pelos sentimentos iniciais, como uma pré-orientação da percepção ou do
conhecimento. A terceira fase se refere à elaboração do sentido, ou seja, o ato de
compreender, de fazer comparações tirando o foco apenas da emoção e do sentimento.
E, finalmente, a última fase, a da distância e reflexiva e crítica, seria aquela em o
indivíduo faria uma análise do vivido, estabelecendo conceitos e fazendo reflexões
críticas sobre o conteúdo visualizado. Podemos constatar, a partir destas informações
que este processo é extremamente subjetivo, portanto, ligação entre o conteúdo
intelectual e a afetividade é essencial à linguagem audiovisual eletrônica.

43
Mas, como definir esse conceito de tonalidade afetiva? É um elemento
sutil e fundamental que pertence particularmente à todas as
palavras,ações, imagens e músicas da linguagem audiovisual. Não há
palavras precisas para definir essa alma das coisas, essa base comum
de uma obra que faz com que se diga ser ela unificada, mesmo que
alguns elementos sejam disparatados.(1989, p.110).

A escola hoje tem a tarefa de educar essa nova geração da tecnologia. A grande
questão que se faz presente diz respeito a como introduzir essas tecnologias no currículo
escolar e na formação humana em um contexto social dominado por imagens. Assim,
uma reflexão que nos permita ampliar nossa compreensão dos processos educativos
evidenciando sua relação com a comunicação, com a arte, e com a política é
indispensável.
A linguagem cinematográfica também possui suas próprias características. É
necessário considerar as particularidades do cinema quanto a sua natureza e recursos
expressivos. O cinema, ao apresentar visualmente as imagens já as interpreta e participa
ativamente de seu conteúdo, portanto, é uma estrutura que por si só já apresenta uma
forma lógica e política.
Almeida (2004) diz que:

Quando se usa a expressão “linguagem cinematográfica” está se


procurando aproximar o entendimento do cinema ao que já se presume
entender de algo já conhecido: a língua. [...] O filme, como um texto
falado/escrito, é visto/lido.[...] O significado de um texto/filme é o
todo, amálgama desse conjunto de pequenas partes, em que cada uma
não é suficiente para explicá-lo, porém todas são necessárias e cada
uma só tem significação plena em relação a todas as outras. (p.28-29)

Assim, o cinema levado para a escola pelo educador, com finalidades


pedagógicas, deve ser compreendido como texto, já que este comunica conteúdos
através de posicionamentos e intenções. Assim, como tal, precisa ser lido ou
decodificado por seu espectador. O suporte do texto no cinema é a imagem em
movimento que utiliza meios expressivos particulares que caracterizam a arte
cinematográfica. Nesse sentido, Almeida (2005) coloca que apesar das imagens no
cinema não serem símbolos exatamente da mesma forma que damos às palavras e à
língua, estas imagens também participam da mesma relação social e simbólica. Desta
forma, os espectadores são ligados às imagens que conferem reconhecimento e sentido
ao filme. “Daí ser possível falar de uma linguagem visual e de uma educação visual”.

44
(ALMEIDA, 2005, p.65). Da mesma forma estranha quando reflete que os programas e
teorias de alfabetização não se apercebam da necessidade de uma “alfabetização” de
imagens e sons (ALMEIDA, 2004).

O problema que se coloca ao homem ‘audiovisual’ não é


essencialmente diverso ao problema que enfrentava o homem da
cultura escrita, ou da tradição oral: no plano das relações com seu meio
físico, social, ele precisa reagir, adaptar-se com a maior eficiência
possível para atingir, através de processos clássicos ou novos, a melhor
acomodação entre as exigências desse meio e as suas próprias
enquanto organismo social, psicológico, sociológico.(BABIN E
KOULOUMDJIAN, 1989, p.76).

Tanto a escola quanto a família mantêm com a mídia uma estreita relação e essa
se torna hoje uma espécie de disseminadora e (re) produtora de cultura. Assim, contribui
para que se construa, na sociedade atual, a identidade dos indivíduos que se tornam
consumidores dessas tecnologias. Por isso, tanto a família quanto a escola possuem
responsabilidade na formação dos indivíduos no intuito de diminuir os efeitos da
influência de modelos sociais e econômicos padronizados para que estes não sejam
consumidos sem se tornarem passíveis de questionamentos.
Para Belloni (2002), os objetivos da educação para as mídias dizem respeito à
formação do usuário ativo, crítico e criativo diante de todas as tecnologias de
informação que, por sua vez, possuem dupla função: a de ferramenta pedagógica e
objeto de estudo. Para a autora, a educação para as mídias é educação para a cidadania,
um instrumento indispensável à democratização de oportunidades educacionais e do
acesso ao saber e, conseqüentemente, da redução das desigualdades sociais.
Pode-se dizer que um dos problemas centrais da escola é um certo arcaísmo.
Mesmo com as novas linguagens colocadas em prática, hoje em dia a escola ainda
insiste nos códigos disciplinares e nas matrizes de pensamento dominantes. A escola
quer preparar o aluno para um mundo que não existe mais. A clássica sala de aula com o
professor a frente do quadronegro é anacrônica. Hoje a situação é diferente. Além dos
livros e papéis, temos recursos inimagináveis em outras épocas. Assim, a incorporação
das tecnologias audiovisuais no processo educacional pode prenunciar o
reconhecimento de novas formas de conhecimento e organização da escola. Porém, não
se trata de apenas substituir um por outro modo de lidar com o conhecimento, já que
mesmo com a utilização de tecnologias podem-se reproduzir práticas educacionais

45
tradicionais. O que se torna indispensável em uma pedagogia que considere esses novos
modos de compreender é o reconhecimento da necessidade de se abarcar de forma
eficiente todos os tipos de linguagens, sejam elas escrita, oral ou audiovisual.
Sendo, então, o cinema um sistema de linguagem, devemos nos questionar sobre
as possibilidades de abordagem para que seja construído um diálogo produtivo entre o
filme e o espectador. O filme é composto por uma série de elementos próprios que
abrem ao emissor um enorme potencial de possibilidades comunicativas que não estão
sujeitas a apenas um tipo de linguagem. Assim, ele chega até ao espectador que é
atingido por essas várias possibilidades comunicativas passadas pelas mensagens
filmadas.

Referências bibliográficas
ALMEIDA, Milton José. Imagens e sons: a nova cultura oral. São Paulo: Cortez, 2004.

BABIN, Pierre; KOULOUMDJIAN, Marie-France. Os novos modos de compreender:


a geração do audiovisual e do computador. São Paulo: Edições Paulinas, 1989.

BELLONI, Maria Luiza (org.). A formação na sociedade do espetáculo. Edições


Loyola: São Paulo, 2002.

CATELLI, Rosana Elisa. O Instituto Nacional de Cinema Educativo: o cinema como


meio de comunicação e educação. IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa Intercom -
PUC-RS. 30 de agosto a 03 de setembro de 2004. Disponível em: <
http://reposcom.portcom.intercom.org.br/dspace/bitstream/1904/17718/1/R0258-1.pdf>
Acesso em: 05 de novembro de 2007

ECO, Umberto. Apocalípticos e Integrados. São Paulo, Perspectiva, 1979.

FAVARETTO, Celso. Prefácio. In: SETTON, Maria da Graça Jacintho (org.). A


Cultura da Mídia na escola: ensaios sobre cinema e educação. Editora Annablume,
2004.

FERREIRA, Oscar Manuel de Castro; JUNIOR, Plínio Dias da Silva. Recursos


audiovisuais no processo ensino-aprendizagem. São Paulo: EPU, 1986.

FRANCO, Marília. Você sabe o que foi o INCE? In: SETTON, Maria da Graça
Jacintho (org.). A Cultura da Mídia na escola: ensaios sobre cinema e educação.
Editora Annablume, 2004.

LOURO, Guacira Lopes. O cinema como Pedagogia. In: Louro et al (org.) 500 anos de
educação no Brasil. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2000.

46
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Os exercícios do ver: Hegemonia audiovisual e ficção
televisiva. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2001.

ROSA, Cristina. O Cinema Educativo através dos discursos de Mussolini e Vargas.


Data de publicação: 26 de Janeiro de 2006. Disponível em:<<
http://www.mnemocine.com.br/cinema/anpuh2005/anpuh2005i.htm>> Acesso em: 14
de outubro de 2007.

CAPÍTULO 4

47
MÍDIA E EDUCAÇÃO: O USO DAS NOVAS TECNOLOGIAS NO ESPAÇO
ESCOLAR9
Gilza Maria Leite Dorigoni10
João Carlos da Silva11

Introdução
As reflexões em torno do assunto mídia e educação vem sendo aprofundadas há
várias décadas dado a constatação de sua influência na formação do sujeito
contemporâneo e da necessidade em explorar o assunto diante do rápido
desenvolvimento das novas tecnologias de informação e comunicação.
Ao falarmos propriamente sobre mídia, faz-se necessário reportarse à sua
complexidade, ao situá-la como produto que se desenvolveu a partir dos anos de 1940,
no contexto da ordem industrial. Nesta época, a concentração econômica e
administrativa aliada ao desenvolvimento tecnológico estabelecia semelhança estrutural
ao cinema, rádio e revistas.
Tradicionalmente a sociedade atribuiu a instituições escolares à
responsabilidade na formação da personalidade do indivíduo tendo em vista a
transmissão cultural e do conhecimento acumulado historicamente. A educação para as
mídias como perspectivas de um novo campo de saber e de intervenção vem se
desenvolvendo desde os anos de 1970 no mundo inteiro com o objetivo de formar
usuários ativos, criativos, críticos de todas as tecnologias de informação e
comunicação.
No que se refere à área educacional, a mídia esteve sempre presente na
educação formal, porém, não raras vezes, sofreu certa resistência, em relação a sua
aplicação na escola. Porém, o impacto social causado pela penetração da tecnologia de
informação e comunicação (TIC) nos últimos anos, ocasionou intensas transformações
nas principais instituições sociais. A família foi invadida pela programação televisiva
em seu cotidiano, a Igreja se rendeu ao caráter de espetáculo da TV, a escola que

9
DORIGONI, Gilza Mª Leite & SILVA, João Carlos da Silva. Mídia e Educação: o uso das novas
tecnologias no espaço escolar. Cascavel – PR. Disponível em:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1170-2.pdf.
10
Licenciada em pedagogia pela UNIOESTE-PR. Pós-graduada em administração e planejamento de
sistemas educacionais e de instituições educacionais/UNIPAR. Professora do programa do
desenvolvimento educ. PDE/SEED–Pr. E-mail: gilzadorigoni@seed.pr.gov.br
11
Doutor em História, filosofia da educação/UNICAMP. Professor UNIOESTE, Campus Cascavel.
Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação UNICAMP. Membro do Grupo de Pesquisa
HISTEDBR – História, Sociedade e Educação – GT – Cascavel – PR E-mail: jcsilva05@terra.com.br
48
pressionada pelo mercado utiliza a informática com um fim em si, e a essas influências
se associa à Internet, com intensa possibilidade de uso.
Mediante esse quadro caberia uma indagação: a escola pública deveria
incorporar as tecnologias de informação e comunicação em suas práticas pedagógicas?
Porém, torna-se relevante acrescentar que a abordagem aqui discorrida, não trata da
negação dos suportes midiáticos, ao contrário, enfoca entre outros contrapontos suas
influências e necessidades de inserção no processo pedagógico. Desta forma, a partir do
objeto em estudo, pretende-se suscitar discussões sobre o processo
ensino/aprendizagem, também no sentido de esclarecer se a falta de direcionamento
para a utilização dos meios de comunicação pode influenciar negativamente na
aprendizagem da criança e do adolescente. Assim, o que prende é compreender a
influência dos meios de comunicação sobre o trabalho escolar a partir das relações entre
mídia e educação.

Elementos históricos sobre a mídia


Ao longo do século XX, especialmente entre os anos de 1940 e 1970, o telefone,
o cinema, o rádio, as revistas e a televisão constituíam-se em um sistema, que o
desenvolver-se, transformou-se em aparato de última geração ao integrar outros
avanços tecnológicos mais recentes como telefones celulares, TV interativa e a Internet.
Tais aparatos foram sendo produzidos e vinculados com a totalidade, estabelecendo
uma intima relação com os objetivos da industrialização.
O avanço tecnológico se colocou presentes em todos os setores da vida social, e
na educação não poderia ser diferente, pois o impacto desse avanço se efetiva como
processo social atingindo todas as instituições, invadindo a vida do homem no interior
de sua casa, na rua onde mora, nas salas de aulas com os alunos, etc. Desta forma, os
aparelhos tecnológicos dirigem suas atividades e condicionam seu pensar, seu agir, seu
sentir, seu raciocínio e sua relação com as pessoas.
Diante dessa realidade, delineiam os desafios da escola sobre esse tema na
tentativa de responder como ela poderá contribuir para que crianças e jovens se tornem
usuários criativos e críticos dessas ferramentas, evitando que se tornem meros
consumidores compulsivos de representações novas de velhos clichês (BELLONI,
2005, p.8). Contanto que essa atuação ocorresse no sentido de amenizar ou até mesmo

49
eliminar as desigualdades sociais que o acesso desigual a essas máquinas estão
gerando, tal fato poderia se tornar um dos principais objetivos da educação.
No tocante ao ensino, uma das formas a se contemplar, dentre muitas sugeridas
para a educação para as mídias, seria estudar, aprender e ensinar a história, a criação, a
utilização e a avaliação das mídias como artes plásticas e técnicas, analisando como
estão situados na sociedade, seu impacto social, suas implicações, a participação e a
modificação do modo de percepção que elas condicionam o papel do trabalho criador e
o acesso às mídias.
Para aplicação dessa forma de ensino/aprendizagem abordando a mídia, é
necessário evitar o deslumbramento, assumir a criticidade, abandonar práticas
meramente instrumentais, excluir a visão apocalíptica que favorece o conformismo e
não a reflexão.
Desde a década de 1950, teóricos chamam a atenção para a caracterização da
sociedade pela tecnificação crescente nos mais variados setores sociais. Já havia
preocupações no sentido de que os meios de comunicação constituíam uma escola
paralela onde as crianças e os adultos estariam encantados e atraídos em conhecer
conteúdos diferentes da escola convencional. Desta forma foram sendo analisados os
efeitos do impacto da tecnologia na sociedade e na educação. A partir desses impactos,
alguns autores como Friedmann e Pocher (1977) apontam que as tecnologias são mais
do que meras ferramentas a serviço do ser humano, elas modificam o próprio ser,
interferindo no modo de perceber o mundo, de se expressar sobre ele e de transformá-
lo, podendo também levá-lo em direções não exploradas encaminhando a humanidade
para rumos perigosos.
Adorno e Hokheimer teorizam sobre os meios de comunicação ao considerarem
que esses passam a ser apenas negócios com fins comerciais programados para a
exploração de bens considerados culturais, denominando-os “Indústria Cultural”.
O termo “indústria cultural” foi explicado como mais propício que o termo “cultura de
massa”, disseminado pelos donos dos veículos de comunicação, ao justificarem que a
cultura surge de forma espontânea, brota das massas, do povo.
Segundo Adorno (1999, p.8), a indústria cultural ao aspirar à integração vertical
de seus consumidores, não apenas adapta seus produtos ao consumo das massas, mas,
em larga medida, determina o próprio consumo. Sendo assim, o interesse da indústria
cultural nos homens é mantê-los como consumidores ou empregados reduzindo sua

50
humanidade, confirmando desta forma seu papel de portadora da ideologia dominante.
Desta maneira, sendo aliada da ideologia capitalista, falsifica as relações entre os
homens e do homem com a natureza, contribuindo para o que Adorno trata como
antiiluminismo, contrário ao Iluminismo que objetivava a liberdade, o abandono do
medo e a exclusão do mundo da magia e dos mitos.
Com o iluminismo esperava-se a instauração da soberania do homem sobre a
técnica e a ciência, mas o progresso da dominação técnica tornou-se o novo engano,
vitimando o homem mesmo depois de ter sido liberto do medo mágico que o
acompanhava.
Sabemos que o poder da técnica pelo homem não o levou a libertação do medo,
somente transferiu sua ansiedade e apreensão do mágico, do mítico, para o medo do
novo, do avanço desenfreado da ciência e dos efeitos em sua vida, perpetuando sua
insatisfação no sentido humanitário.
Bacon (1979) difundia idéias que divergiam das diretrizes do Iluminismo, ele
desprezava os adeptos da tradição, da credulidade, a omissão da dúvida, o receio de
contradizer e a tendência de se satisfazer com conhecimentos parciais. Para Bacon,
poder e conhecimento são sinônimos. O que importa não é aquela satisfação que os
homens chamam de verdade, mas sim, o proceder eficaz, no desempenho e no trabalho,
nas descobertas dos fatos particulares anteriormente desconhecidos que possam equipar
melhor a vida.
No mundo do iluminismo, a mitologia foi sucumbida, mas a dominação se
apresenta sob forma de alienação do homem com respeito aos objetos dominados e com
o enfeitiçamento dos homens em seus relacionamentos sociais e do homem consigo
mesmo. Antes, os fetiches estavam sob a lei da igualdade. Agora, a própria igualdade se
converte em fetiche (ADORNO, 1999, p.33).
Assim, o homem é condicionado ao sentido econômico que dá as mercadorias
valores que interferem e decidem a sua existência, estabelecendo o caráter de fetiche
sobre a vida em sociedade. Desta forma são inculcados no indivíduo normas e
comportamentos considerados únicos, decentes e racionais pela cultura de massa ou
indústria cultural.
Portanto, é o princípio do si mesmo que evidencia o trabalho social do indivíduo
na sociedade burguesa que restitui a uns o capital acrescido, a outros a força para o
mais trabalho. Assim, o indivíduo vai se moldando cada vez mais ao processo de

51
autoconservação decorrente da divisão burguesa do trabalho, concomitante com o
envolvimento ao aparato técnico. Sobre essa questão, vale reportar às reflexões de
Paolo Nosella (2006), embasado nos métodos de Marx que salienta que o trabalho
burguês é historicamente determinado sendo interação dos homens entre si e com a
natureza, assim, o trabalho que deveria ser a manifestação de si tornou-se perdição de
si. Assim, faz-se necessário que se inverta esse processo recuperando o trabalho com o
sentido de libertação plena do homem.
O processo de dominação imbicado na historia em seu aspecto cíclico, perpassa
por um retrocesso antropológico em suas etapas primitivas, condicionando os instintos
por uma opressão maior. A força que perfaz a dominação sobre os sentidos proporciona
a uniformização da função intelectual, a resignação do pensar à produção da
humanidade, desencadeia um processo de empobrecimento do pensar e da experiência.
Desta forma, quanto mais o aparato social econômico e científico for refinado e
complexo a serviço do qual o corpo fora destinado pelo sistema de produção, ocorre o
empobrecimento das vivências que esse corpo é capaz.
Portanto, esse regredir das massas hoje pode ser traduzido sob o olhar do novo,
é a ciência elaborada em alta tecnologia ou tecnologia de ponta, que incapacita o
homem de ouvir o que nunca foi ouvido, de palpar com as próprias mãos o que nunca
foi tocado; uma nova forma de opressão, que supera a opressão mítica já vencida. No
transcorrer do caminho que vai da mitologia à logística, o pensar perdeu o elemento da
reflexão sobre si e hoje a maquinaria estropia os homens mesmo quando os alimenta
(Adorno & Horkheimer, 1999, p.56).
A rapidez da disseminação da Internet pelo mundo, em relação a outras mídias.
Enquanto o rádio levou 38 anos para atingir um público de 50 milhões nos Estados
Unidos, o computador levou 16 anos, a televisão, 13 anos e a Internet levou apenas
quatro anos para alcançar a marca de 50 milhões de Internautas.
Mediante o que foi exposto, reflexões a cerca do assunto devem ser
implementadas, contudo, o potencial educacional que as TIC oferecem não pode ser
negado, mas precisa ser integrado efetivamente na escola, principalmente na rede
pública de escolarização, já que pode servir como mais uma possibilidade para a
construção da cidadania plena. Para tanto, faz-se necessário estabelecer como propósito
a utilização da produção multimídia de forma a desenvolver o potencial crítico sem

52
negar o papel de consumidores que somos, mas sob forma consciente, salientar a nossa
função de emissores e receptores do saber e da informação.

Mídia e escola
Para efetivar a aplicação das tecnologias de informação e comunicação na
escola, após a constatação de sua importância e necessidade, é preciso criar
conhecimentos e mecanismos que possibilitem sua integração à educação evitando o
deslumbramento ou o uso indiscriminado da tecnologia por si e em si. Portanto, é
imprescindível enfatizar o cunho pedagógico em detrimento das virtualidades técnicas,
fugindo do discurso ideológico procedente da indústria cultural.
Entretanto, a perspectiva que se abre no campo educacional, indo do livro e do
quadro de giz à sala de aula informatizada ou on-line, leva o professor a uma
perplexidade, despertando insegurança frente aos desafios que representa a
incorporação dos TIC ao cotidiano escolar. Talvez sejamos ainda os mesmos
educadores, mas certamente, nossos alunos já não são os mesmos, “estão em outra”
(BABIN, 1989).
Neste cenário de constante e acelerado processo tecnológico que desde os anos
80 tomou novas proporções com equipamentos projetados para armazenar, processar e
transmitir informações de forma mais rápida e cada vez mais acessível em termo de
custos, vislumbrando uma maior possibilidade de utilização para todos, presencia-se
questões sobre a informatização e o acesso à Internet permeando ainda as discussões
dos que acreditam em uma sociedade mais justa e igualitária, necessitando abordar
aspectos sobre as condições sociais, políticas e econômicas da vida e do trabalho,
entrelaçados com as condições culturais.
Contudo, escolas públicas vêm sendo equipadas com computadores conectados
à Internet através de Programas do governo federal e estadual. Porém, somente esse
fato garantiria a melhoria de qualidade no processo de ensino/aprendizagem? Pedroso
(2002) afirma que enquanto não forem criadas possibilidades através de substancial
mudança na estrutura do ensino continuaremos na situação de dependência e servidão.
No entanto, o computador e sua capacidade técnica podem sob forma contraditória, ser
usado no sentido da democratização, humanização, transformando as desigualdades
existentes na sociedade.

53
Mas a utilização da informática é vista como reacionária e conservadora tendo
em vista o desemprego tecnológico e o descomprometimento dos educadores com a
democracia. Em razão da péssima remuneração dos professores, duvidosas formações,
da baixa qualidade de ensino no ensino fundamental e médio e a semialfabetizaçao dos
alunos, incluindo em países considerados 1º do mundo, levam a crer que esse fenômeno
de descomprometimento coma educação seja um fenômeno mundial.
Enfatizando a importância dos meios de comunicação e das tecnologias de
informação que se concretiza fortemente em todos os âmbitos da vida social, trazendo
conseqüências para os processos culturais, comunicacionais e educacionais, vale
lembrar que uma das instituições que demonstra grande dificuldade em absorver as
transformações nos modos de aprender em decorrência do avanço tecnológico atual é a
escola, que devido à rapidez desses avanços e ter intrínseco em seu bojo dependências
com instituições maiores, não assimilou outras formas tecnológicas comunicacionais e
já se depara com a informatização, suas linguagens multimídias e suas potencialidades
interativas.
A sociedade contemporânea sob a forma de produção industrial tem sua base na
racionalidade instrumental regida por regras técnicas operacionais em que tudo é
planejado, medido, racionalizado. Assim organizada essa sociedade tomou proporção
tal que atingiu todos os setores da vida do indivíduo, se adentrando no espaço e no
tempo livre do trabalhador, atingindo-o até mesmo em sua consciência sujeita às regras
provenientes das exigências técnicas da produção industrial.
Com suas regras clássicas e científicas, o Capitalismo estabelece em seu
discurso tecnocrático uma ideologia que insistentemente tenta legitimar uma falsa
consciência do mundo. Essa ideologia dominante influencia comportamentos humanos,
acabando por legitimá-la.
Assim, já no século XIX, pensadores como Durkheim e Marx convergiam suas
constatações de que o homem e sua consciência são produtos da sociedade. Por ser o
homem um ser social é fruto de sua sociedade, é o resultado desta sociedade. Desta
forma, o homem é considerado criador e criatura, pois ao longo de sua evolução, foi
criando e adaptando instrumentos para facilitar suas relações com os homens e com a
natureza, desenvolvendo seus sentidos, sua ação e aquilo que é específico do homem, a
capacidade de criar.

54
Impregnados pela ideologia do poder, tanto a família quanto a escola e outras
instituições sociais, influenciam para a conformação e adaptação às normas
dominantes, ao mesmo tempo em que transmitem aos homens os conhecimentos
técnicos acumulados pelas gerações antecessoras, desenvolvendo habilidades para
adaptação ao sistema social econômico. Dessa maneira, essas características vão
modelando o processo de socialização, a formação de novas gerações e a transmissão
cultural. Neste contexto, a formação da personalidade do indivíduo passa a ser tarefa de
instituições e de especialistas como: psicólogos, orientadores educacionais, médicos,
assistentes sociais. E a escola divide com a mídia a responsabilidade na socialização
dos jovens e crianças.
Portanto, o controle social é exercido sob múltiplas formas e através de
instituições entre as quais a escola e a mídia. A escola perpetua assim sua função como
Aparelho Ideológico do Estado, dividindo agora esse intento com a mídia que assume a
liderança sobre essa função. Nesse cenário atual, escola é vista apenas como mais uma
entre as muitas agências especializadas na produção e disseminação da cultura. No
processo geral de transmissão da cultura e no processo de socialização das novas
gerações, a escola vem perdendo terreno e prestígio em concorrência com as diferentes
mídias.
Enquanto o mundo se apresenta cada vez mais aberto e com máquinas que
lidam com o saber e com o imaginário, a escola ainda se estrutura em tempos e espaços
pré-determinados, fechada ignorando as inovações. Em decorrência da velocidade dos
avanços tecnológicos e sua interferência no trabalho e na vida de todos, a escola se
encontra em crise. A escola que tem como ideal preparar as pessoas para vida, para
cidadania e para o trabalho, deve-se então questionar, sobre qual contexto social se
reportar já que este está em permanente modificação.
Desta forma a escola e todo sistema educacional tende a funcionar com outros
tempos e em múltiplos espaços diferenciados, com a presença de todos os novos
elementos tecnológicos da informação e comunicação. Assim, sobre a resistência e a
não completude em relação às tecnologias na educação, Pretto e Pinto (2006),
consideram como sendo uma das características peculiares do momento
contemporâneo. Segundo os autores, é a busca pela a estabilidade e do equilíbrio, tendo
a instabilidade como elemento fundante.

55
Diferentemente de tempos não muito distantes, hoje os educandos dispõem de
muitos meios de informação. O aluno hoje tem acesso muito mais rápido e fácil às
informações do que nós e nossos pais. Para estabelecer um parâmetro de analise, basta
lembrar que a televisão brasileira começou no ano de 1950, mais precisamente em 18
de setembro. Foi nesse dia histórico que a TV Tupi fez sua primeira transmissão. Os
computadores são mais recentes. Foi em julho de 1980 que a IBM lançou o primeiro
PC (abreviação em inglês de computador pessoal). A Internet já existia desde a década
de 1970 para fins militares, migrando a seguir para grandes universidades. No entanto,
foi entre 1989 e 1991 que o inglês Tim Berners-Lee inventou a World Wide Web
(WWW) e popularizou a rede. (BUSSACARINI, 2005).
Torna-se evidente e compreensivo através desse paralelo o sentido de resistência
gerado pela instabilidade que acelerado processo tecnológico ocasiona no meio
educacional.
Desta maneira, os meios de comunicação de massa, e em especial a
televisão, que penetra nos mais recônditos cantos da geografia,
oferecem de modo atrativo e ao alcance da maioria dos cidadãos uma
abundante bagagem de informações nos mais variados âmbitos da
realidade. Os fragmentos aparentemente sem conexão e assépticos de
informação variada, que a criança recebe por meio dos poderosos e
atrativos meios de comunicação, vão criando, de modo sutil e
imperceptível para ela, incipientes, mas arraigadas concepções
ideológicas, que utiliza para explicar e interpretar a realidade
cotidiana e para tomar decisões quanto a seu modo de intervir e reagir
(SACRISTÁN; GÓMEZ, 1996, p.25).

Nesse sentido, é que se torna imprescindível a utilização destes meios na escola,


para oportunizar uma reflexão das ideologias que servem a cultura dominante, sendo
que as relações sociais, bem como os meios de comunicação que transmitem
informações, estão a serviço desta cultura . Segundo Kalinke:

Os avanços tecnológicos estão sendo utilizados praticamente por


todos os ramos do conhecimento. As descobertas são extremamente
rápidas e estão a nossa disposição com uma velocidade nunca antes
imaginada. A Internet, os canais de televisão a cabo e aberta, os
recursos de multimídia estão presentes e disponíveis na sociedade.
Estamos sempre a um passo de qualquer novidade. Em contrapartida,
a realidade mundial faz com que nossos alunos estejam cada vez mais
informados, atualizados, e participantes deste mundo globalizado
(1999, p.15).

56
Entretanto, no limiar deste século, as grandes maiorias dos profissionais da
educação ainda não se vêem preparados para o enfrentamento de metodologias que
utilizem esses recursos tecnológicos. Desta forma, muitas explicações têm sido dadas
para justificar esta resistência, no entanto, tornam-se premente que o professor propicie
aos alunos elementos de emancipação com a utilização destes aparatos como
ferramentas pedagógicas.
A dificuldade escolar está hoje entre os problemas mais estudados e discutidos
do sistema educacional. Porém, às vezes, a busca pelo culpado do fracasso se torna
mais relevante do que a causa do mesmo. Sob a ótica da Psicopedagogia o ser humano
é cognitivo, afetivo e social e sua autonomia é estabelecida à medida que se
compromete com o seu social em redes relacionais. Segundo Bossa (1994), a
Psicopedagogia, inicialmente teve como pressuposto, que as pessoas que não
aprendiam tinham um distúrbio qualquer.
Hoje, o que se propõe é investigar e entender a aprendizagem com base no
diálogo entre várias disciplinas. Os profissionais que atendiam essas pessoas eram os
médicos, em primeira instância, e em segunda instância, psicólogos e pedagogos que
pudessem diagnosticar os déficits. Os fatores orgânicos eram responsabilizados pelas
dificuldades de aprendizagem, na chamada época “patologizante”. A criança ficava
rotulada, e a escola e o sistema a que ela pertencia se eximiam de suas
responsabilidades, jogando o foco do problema na criança. Concebendo esse rótulo à
criança, passa-se a não perceber em quais circunstâncias ela apresenta tais dificuldades.
A sociedade do êxito educa e domestica. Seus valores e mitos relativos à
aprendizagem muitas vezes levam muitos ao fracasso. Segundo Fernandes (2001), em
nosso sistema educacional, o conhecimento é considerado conteúdo, uma informação a
ser transmitida. As atividades visam à assimilação da realidade, e não possibilitam o
processo de autoria do pensamento.
Alicia Fernándes define como “autoria”, o processo e o ato de produção de
sentidos e de reconhecimento de si mesmo como protagonista ou participante de tal
produção. O caráter informativo da educação também se apresenta na utilização do
livro didático, quando o aluno é levado a memorizar conteúdos e não a pensá-los.
Assim afirma Fernándes: “É preciso distinguir aquilo que é próprio da criança, em
termos de dificuldades, daquilo que ela reflete em termos do sistema em que se insere”
(FERNANDES, 2001, p.91).

57
Assim, considerando as variedades de fatores que interferem no processo
ensino-aprendizagem, e que esta ocorre num vínculo entre subjetividades, propõe-se
compreender tais fatores na tentativa de amenizar os problemas enfatizando a utilização
dos meios tecnológicos como mais uma possibilidade de suporte metodológico.

O uso pedagógico da Internet


A origem da Internet se deu a partir de 1969 com a Guerra Fria quando os
Estados Unidos solicitou a Advanced Research Projects Agency (ARPA) uma rede de
computadores que pudessem ter seu funcionamento mesmo com a quebra de conexão.
Surgiu então a rede das redes.
Desde 1980, os computadores pessoais e o desenvolvimento de técnicas
computacionais como os jogos simulados fazem surgir o computador como extensão
das capacidades cognitivas humanas que ativam o pensar, o criar e o memorizar.
Segundo Pretto e Costa Pinto, essas máquinas não estão mais apenas a serviço do
homem, mas interagindo com ele, formando um conjunto pleno de significado. A partir
de 1995, a Internet se expandiu com um grandioso poder de expressão a nível
individual e coletivo ampliando em larga escala o número de usuários.
A Internet é um meio que poderá conduzir-nos a uma crescente
homogeneização da cultura de forma geral e é, ainda, um canal de construção do
conhecimento a partir da transformação das informações pelos alunos e professores. As
redes eletrônicas estão estabelecendo novas formas de comunicação e de interação onde
a troca de idéias grupais, essencialmente interativas, não leva em consideração as
distâncias físicas e temporais. A vantagem é que as redes trabalham com grande
volume de armazenamento de dados e transportam grandes quantidades de informação
em qualquer tempo e espaço e em diferentes formatos.
Os professores estão sendo convocados para entrar neste novo processo de
ensino e aprendizagem, nesta nova cultura educacional, onde os meios eletrônicos de
comunicação são a base para o compartilhamento de idéias e ideais em projetos
colaborativos. A utilização pedagógica da Internet é um desafio que os professores e as
escolas estarão enfrentando neste século, que pode apresentar uma concepção
socializadora da informação.
A Internet tem cada vez mais atingido o sistema educacional e as escolas. As
redes são utilizadas no processo pedagógico para romper as paredes da escola, bem

58
como para que aluno e professor possam conhecer o mundo, novas realidades, culturas
diferentes, desenvolvendo a aprendizagem através do intercâmbio e aprendizado
colaborativo.
Com o rápido crescimento do processo de globalização, vários problemas estão
afetando muitos países ao mesmo tempo. Questões como inflação, meio-ambiente, têm
preocupado diferentes autoridades em todo o mundo. E também, com o assustador
crescimento do conhecimento, torna-se impossível para o aluno e o professor
dominarem tudo. Assim, o trabalho em equipe e a Internet oferecem uma das mais
excitantes e efetivas formas para capacitar os estudantes ao processo colaborativo e
cooperativo e, ainda, desenvolver a habilidade de comunicação.
Aprendizagem colaborativa é muito mais significativa quando os estudantes
podem trabalhar com alunos de outras culturas, podendo entender e perceber novas e
diferentes visões de mundo, ampliando, assim, seu conhecimento. Os estudantes
trabalhando como colaboradores em projetos dentro ou fora das escolas podem medir
coletar, avaliar, escrever, ler, publicar, simular, comparar, debater, examinar, investigar,
organizar, dividir ou relatar os dados de forma cooperativa com outros estudantes.
Porém, é importante lembrar que os professores devem trabalhar com metas comuns e
que a colaboração em sala de aula é o primeiro passo em direção à cooperação global.

Considerações finais
Diante das reflexões que permeiam o assunto caracterizado, evidencia-se a
urgência em se efetivar a implementação das novas tecnologias no bojo da escola
pública incorporando-as aos recursos metodológicos que propiciam a aprendizagem.
Com esse fim, busca-se assegurar que a escola se remeta a sua necessária função
no mundo do capitalismo que é garantir a apreensão da totalidade de pensamento
através do domínio teórico, utilizando-se dos aparatos tecnológicos como ferramentas
de emancipação, proposta pelo surgimento da mídia no século XVIII, mas que no
século XX tornou-se um meio de dominação e controle social.
Considerando a importância do fenômeno comunicacional na sociedade mundial
e o acelerado processo tecnológico que abrange os mais variados setores da
convivência humana, o que se propõe é uma escola contextualizada, que se situe na
dinâmica dos novos processos de ensino e aprendizagem colaborativa, com o uso da

59
Internet como mecanismo de desenvolvimento, de criticidade, de colaboração mútua
que transforma as informações em conhecimentos sistematizados.
Para que esse intento se concretize, os educadores precisam coordenar este
processo, incorporando as mídias aos encaminhamentos pedagógicos deixando de
defender-se da inovação.
Com o intuito de colocar o homem no centro da historia, analisando o impacto
que as novas tecnologias vêm causando na sociedade, e a evidência que a mídia é
imprescindível aos rumos educacionais oferecendo valiosas perspectivas para atingir o
conhecimento satisfatório, insere esse estudo como pretensa contribuição ao
desenvolvimento da educação.

Para refletir:
1. O que entendemos por mídia e educação e indústria cultural?
2. Qual é a importância que nós professores atribuímos ao uso do computador na
escola?
3. Qual a relação que podemos estabelecer entre indústria cultural e escola?
4. Que influencia que a mídia exerce no meio educacional?
5. Qual a sua opinião sobre o acesso indiscriminado a Internet por crianças e
adolescentes sem encaminhamento ou acompanhamento de pais e (ou)
professores?
6. Qual o seu ponto de vista sobre a inserção da Internet nos encaminhamentos
pedagógicos?
7. Quais fatores você considera importante para a incorporação da mídia e suas
tecnologias na realização do trabalho didático?

Referências Bibliográficas
ADORNO, Theodor W. Adorno: vida e obra. Coleção Os Pensadores. São Paulo:
Editora Nova Cultura Ltda., 1999.
ALVES, Gilberto Luiz. A produção da escola pública contemporânea.
Campinas, SP: Autores Associados, 2005.
BACON, Francis. Novum organum ou verdadeiras indicações acerca da
interpretação da natureza. 2.ed. São Paulo: Victor Civita, 1979.
BELLONI, Maria Luiza. O que é Mídia-Educaçao. 2.ed. Campinas, SP: Autores
Associados, 2005. (Coleção polêmica do nosso tempo, 78).

60
FERNANDEZ, Alicia. Os idiomas do aprender: análise de modalidades ensinantes em
famílias, escolas e meios de comunicação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.
FERRETTI, Celso João (org). Novas tecnologias, trabalhos e educação. Petrópolis:
RJ, Vozes, 1994.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Artigo: Fundamentos Científicos e técnicos da relação
trabalho e educação no Brasil de hoje.
GARCIA, Paulo Sérgio. A Internet como nova mídia na educação. Disponível em:
<http://www.geocities.com/Athens/Delphi/2361/intmid.htm>. Acesso em: 21 dez.2007.
KALINKE, Marco Aurélio. Para não ser um professor do século passado. Curitiba:
Gráfica Expoente, 1999.
LEITE, Márcia. A Influência da Mídia Educação. Revista Mídia e Educação.
Disponível em: <http://www.tvebrasil.com.br/educacao/artigos>. Acesso em:
15 dez./2000
NOSELLA, Paolo. Trabalho e Perspectivas de Formação dos
Trabalhadores: para além de uma formação politécnica. Disponível em:
http://PDE.pr.gov.br. Acesso em: 20 nov./2007
PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar: histórias de
submissão e rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.
PEDROSO, Leda Aparecida; BERTONI, Lucia Mara. Indústria Cultural e
Educação: reflexões críticas. Araraquara: JM, 2002.
PRETTO, Nelson. PINTO, Cláudio da Costa. Tecnologias e Novas educações. Revista
Brasileira de Educação, v.11, n. 31, jan/abr. 2006.
PUCCI, Bruno; MEDEIROS, Fabiana S.F. Indústria Cultural e Educação. In
BERTONI, Luci Mara: Vaidergorn, José. Indústria Cultural e educação (ensaios,
pesquisas, formação). 1o ed, Araquara: JM, 2003
PUCCI, Bruno (org). Teoria Crítica e Educação: a questão da formação Cultural na
Escola de Frankfurt. Petrópolis, RJ: Vozes; São Carlos, SP: EDUFISCAR, 1994, 2a
edição
SACRISTÁN, J. Gimeno; GÓMEZ, A.I. Pérez. Compreender e transformar o
Ensino. Porto Alegre: Artmed, 1998.
TOSCHI, Mirza Seabra; RODRIGUES, Maria Emília de Castro. Infovias e Educação.
Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v.29, no 2, jul/dez. 2003.
VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
Aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2006.

61
CAPÍTULO 5

PRINCIPAIS RECURSOS DIDÁTICOS ANALISADOS NO ENSINO DE


GEOGRAFIA DO BRASIL12

Inêz de Deus Neiva Brandão13; Márcia Cristina de Oliveira Mello


Universidade Estadual Paulista – Campus Experimental de Ourinhos
FAPESP

Eixo temático: Situación y perspectivas de la enseñanza-aprendizaje de la Geografía en


América Latina

Os recursos didáticos são elementos auxiliares para os professores no processo de


ensino e aprendizagem. Para que o professor utilize tais recursos, é necessário
considerar uma estrutura teórico-metodológica, sendo esta planejada e executada de
acordo com a realidade escolar e do aluno. Neste contexto, os professores podem ser
surpreendidos por questões como: em que momento da aula aplicar-se-á o recurso
didático? Por que utilizar tal recurso em detrimento de outro? Como utilizar
determinado recurso didático? Como planejar? Qual(is) recurso (s) pode (m) ser
utilizado (s) como auxílio no conteúdo? Enfim, questões que devem ser respondidas no
planejamento das aulas para uma execução contingente com os objetivos propostos. Por
esta razão, o professor de Geografia reconhecendo seu papel de mediador no processo
de ensino e aprendizagem, deve procurar meios que promovam tal processo de modo
eficiente, sendo os recursos didáticos um caminho a ser considerado. O objetivo deste
trabalho consistiu em investigar as atuais tendências em relação às metodologias de
ensino de Geografia difundidas pelos livros paradidádigos brasileiros, tendo como viés
principal os recursos didáticos, considerando as técnicas tradicionais e as introduzidas
pelas novas tecnologias. Partindo desta perspectiva, os resultados forneceram um
panorama geral da estrutura metodológica difundida por autores brasileiros e apontaram
novas alternativas e possibilidades de materiais e suas aplicações, de modo a facilitar a
aprendizagem e o diálogo entre professores e alunos. A metodologia fundamentou-se
em pesquisa bibliográfica, sendo consultados livros remissivos e publicações periódicas
de acordo com o tema e a lógica dos conteúdos propostos pelo currículo do ensino de
Geografia no Brasil. Os resultados preliminares apontam que à luz da bibliografia
especializada tais estudos concentram-se mais em explorar as técnicas de aplicação de
tal ou qual recurso, ou sua importância na relação ensino-aprendizado, nem sempre
apresentando um panorama da utilização real dos mesmos in loco, bem como eles se
concentram no tema cartográfico, havendo uma lacuna nos demais temas,

12
BRANDÃO, Inêz de Deus Neiva; MELLO, Márcia Cristina de Oliveira. Principais recursos didáticos
analisados no ensino de geografia do Brasil. 14º EGAL- Encuentro de Geógrafos da America Latina.
Peru, 2013. Disponível em: http://www.egal2013.pe/wp-content/uploads/2013/07/Tra_In%C3%AAz-de-
Deus-Neiva-Brand%C3%A3o-M%C3%A1rcia-Cristina-de-Oliveira-Mello.pdf
13
Bolsista de Iniciação Científica – FAPESP – Processo número??
62
principalmente na Geografia Humana. Esta realidade será explicada através do breve
histórico do ensino de Geografia no Brasil, e o atual foco na cartografia escolar.

Palavras-chave: Recursos didáticos; livros paradidáticos; Geografia; Ensino


aprendizagem; práticas de ensino de Geografia.

1. BREVE HISTÓRICO DO ENSINO DE GEOGRAFIA NO BRASIL E A


ATUAL ÊNFASE EM ESTUDOS CARTOGRÁFICOS

O ensino de Geografia no Brasil recebeu influências de duas correntes


europeias. A alemã estabeleceu a Geografia descritiva e sistemática, tendo seus
principais precursores Alexander von Humboldt, focando seus estudos através de
comparações e relações entre diversas escalas da paisagem, com o método empírico e
indutivo; Karl Ritter define a Geografia como o estudo de sistemas naturais, o qual
analisa arranjos individuais, sendo estes últimos os lugares específicos, sua análise
compara tais lugares em escala regional; e Ratzel com a antropogeografia, que
considera as influencias14 do meio natural sobre o homem, formando sociedades
distintas culturalmente e economicamente a partir dos recursos disponíveis para suprir
as necessidades humanas15.
Já a corrente francesa, baseada em estudos de Vital de La Blache, que a
princípio criticou os estudos de Ratzel e estabeleceu uma relação entre homem e
paisagem, diferente do autor alemão. La Blache define o objeto da Geografia como a
relação entre homem e meio, sendo que o primeiro além de ser influenciado pelo
segundo, também transforma a paisagem de acordo com suas necessidades, através do
método empíricoindutivo, este autor explica os fenômenos somente através da
observação direta destes, classificando-os de forma tipológicas16. Além de La Blache,

14
Segundo Moraes (1983), os estudos de Ratzel não foram essencialmente deterministas, e sim, os seus
discípulos radicalizaram seus pensamentos e criaram a escola determinista. Também deve-se destacar a
escola ambientalista baseada na Antropogeografia de Ratzel.
15
Nesta perspectiva, Ratzel conceitua “espaço vital” como a expansão do território, tendo por finalidade
satisfazer tais necessidades humanas, assim, para manter o domínio e sua expansão territorial, o conceito
de Geopolítica está intimamente relacionado sobre sua proposta de ação do Estado sobre o espaço.
(MORAES, 1983).
16
A partir de seus estudos Vidal de La Blache estabeleceu a doutrina que fundou a escola francesa: o
Possibilismo. Nele a região torna-se papel essencial de análise geográfica, diferentemente de Ratzel, que
estabelece relações causais, La Blache concebe os fenômenos naturais e humanos de forma mútua, uma
vez que eles estão interpostos. Desta forma, La Blache estabelece um método de estudo científico
dividido em três partes, que é seguido até nos dias atuais: análise física, formas de ocupação humana e
por último, a integração entre ambas. (FERREIRA; SIMÕES, 1986).
63
podemos citar outros autores franceses que se desdobraram a partir da proposta
lablaciana, tais como C. Vallaux, Comte e Sorre (MORAES, 1983).
Tais correntes consideradas na perspectiva da Geografia Moderna, foram
fundamentais para responderem “o que existe em tal lugar”, tendo como perspectiva a
diferenciação do espaço e a relação entre homem e meio (FERREIRA; SIMÃO, 1986).
Em 1837, a disciplina de Geografia escolar foi incluída no currículo escolar de forma
explícita no Brasil, no Colégio Pedro II, situado no Rio de Janeiro. A princípio, tal
disciplina pautava-se somente na metodologia Positivista, de cunho tradicional, isto é,
centralizada na descrição e memorização de conteúdos, tais como a cosmografia e a
astronomia, os quais não condiziam com a realidade dos alunos. Ainda não havia, nesta
época, estudos sistemáticos sobre didática em Geografia. Somente no início do século
XX, destacou-se o professor Carlos Miguel Delgado de Carvalho, de influência
francesa, como um dos principais introdutores da didática em Geografia no âmbito
escolar.
No ensino superior, a Geografia somente foi estabelecida no currículo na década
de 1930, nas principais capitais brasileiras, tais como São Paulo, Rio de Janeiro e
Salvador. A partir deste momento, a metodologia Moderna se expandiu, pois os
primeiros professores universitários eram estrangeiros que seguiam a corrente alemã
ou francesa e, posteriormente brasileiros começaram a realizar a pós graduação nestes
países supracitados. Podemos citar entre os primeiros precursores do ensino superior de
Geografia no Brasil Jean Tricart, Pierre Deffontaines e Pierre Monbeing.
A princípio, havia uma forte dicotomia entre o que era ensinado na escola e na
academia, permanecendo inalterada entre as décadas de 1940-50. É importante salientar
que no período pós II Guerra Mundial, a Cartografia recebeu contribuições
tecnológicas, tais como a aerofotogrametria e o sensoriamento remoto. Este marco foi
importante para ressaltar a Geografia como ciência prática (exercida pelos bacharelados
em Geografia), pois contribuiu no aperfeiçoamento de métodos de aquisição de dados
para a elaboração de mapas.
O período da ditadura militar que perpassa as décadas de 1960-80, foi marcada,
a princípio, pela exaltação do patriotismo, o qual deveria ser difundido pela mídia e,
principalmente, nas disciplinas de História e Geografia na escola. A Geografia deveria

64
dilacionar estudos acríticos, meramente descritivos, exaltando o Estado-nação, o
formato do território brasileiro e suas potencialidades.17
Em meados da década de 1970 há o início da tentativa de ruptura com a
Geografia Tradicional ensinada nas salas de aula. Esta ocorre quando a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei nº 5692/71) promoveu a junção curricular
de Geografia e História substituindo-as pela disciplina de Estudos Sociais, sem
questionar as teorias e os fundamentos epistemológicos particulares de cada disciplina.
Na década de 1980, a Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) e a
Associação Nacional de Professores Universitários de História (ANPUH), analisaram e
questionaram os Estudos Sociais como disciplina, e conseguiram sua remoção da grade
curricular nos ensinos de primeiro e segundo graus da época. Os objetivos dos membros
dessas associações eram inserir as disciplinas de Geografia e História no ensino de
forma a qualificar a aprendizagem, através de metodologias condizentes com suas
particularidades. Entre as décadas de 1980 e 1990, foram produzidas propostas
curriculares em parceria com as universidades, esta realidade, conhecida como
"movimento de renovação curricular", possibilitou um estudo sobre o conteúdo
curricular na disciplina de Geografia de acordo com sua finalidade educacional
(PONTUSCHKA et al 2007).
Segundo estudos de Cavalcanti (2008, p. 21-22), o movimento buscava
denunciar a neutralidade do pensamento geográfico, principalmente as ideologias
difundidas pelo Estado através do ensino. Tal rompimento procurava uma reformulação
teórica no ensino partindo da Geografia crítica, porém, a referida autora ressalta que
nem todos os discursos deste período tiveram base filosófica, política e ideológica
marxista, e sim, havia também antimarxistas e uma pluraridade no discurso geográfico
que se convergiam quanto ao descontentamento nas práticas de ensino.
É importante destacar a transição que o ensino de Geografia perpassa neste
momento de sua história, como destaca Cavalcanti (2008, p. 23):

Mais do que localizar e descrever elementos da natureza, da população


e da economia, de forma separada e dicotomizada, propunha-se uma
nova estrutura para esse conteúdo escolar, que tivesse como
pressupostos o espaço e as contradições sociais, orientando-se pela
explicação das causas e decorrências das localizações de certas
estruturas espaciais.

17
Sobre o assunto vide OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. (Org.). Para onde vai o ensino de geografia?
5ª ed. São Paulo: Contexto, 1994.
65
A partir da década de 1980, apesar da crise deste movimento sociopolítico, o
marxismo contribuiu no reforço da fundamentação pedagógica-didática, na busca de
métodos de ensino que auxiliaram o aluno a pensar criticamente no contexto do início
da globalização.
Assim, ampliam-se os estudos sobre ensino de Geografia que se intensificam nas
duas últimas décadas do século XX e, no início do século XXI, há encontros,
congressos e simpósios tanto sobre teoria da Geografia acadêmica quanto em didática
em Geografia.
É a partir desses estudos com levantamento de informações (entrevistas,
aplicação de recursos didáticos, análise de processo de ensino e aprendizagem, entre
outros), que foi possível indicar as principais teorias a serem abordadas na prática do
ensino de Geografia, entre elas se destacam: o lugar como escala de referência do
cotidiano do aluno, que auxiliará na compreensão do mundo, articulando, assim, o local
com o global; discutir temas socioespaciais, tais como questões etnicas e exclusão
social; desenvolver a linguagem cartográfica nos alunos; promover a educação
ambiental dando a atual importância da preservação da natureza no contexto da
globalização; incorporar diferentes linguagens, tais como música, vídeos, fotografias,
websites, entre outros, com a finalidade de auxiliar o aluno na compreensão dos
conteúdos, neste caso encontram-se os recursos didáticos (CAVALCANTI, 2008).
É também a partir dos estudos sobre as práticas docentes e suas principais
dificuldades que foi possível diagnosticar que a cartografia é o principal conteúdo em
que os professores possuem dificuldade em mediar no processo de ensino-
aprendizagem dos alunos. Neste quesito, Archela (2000) destaca que o índice na
publicação científica no campo da cartografia e ensino teve uma elevação gradativa,
principalmente após o primeiro Colóquio de Cartografia para Crianças, que ocorreu em
1995. Tal colóquio objetiva a troca de experiências e a busca de novos desafios à
ciência cartográfica escolar. Através de tais encontros e suas posteriores publicações,
possibilitaram a difusão e atual valorização da cartografia no ensino de Geografia no
Brasil.
Neste ínterim a cartografia escolar está se aperfeiçoando, principalmente devido
às novas tecnologias que subsidiam a produção de materiais didáticos e possibilitam
diferentes meios de aplicação. Atualmente, a cartografia escolar busca englobar

66
aspectos tanto das ciências humanas quanto das ciências da linguagem, uma vez que a
junção de ambas são elementares para a compreensão e alfabetização cartográfica.
Assim, a cartografia, torna-se importante em discussões sobre os conteúdos de
ensino da Geografia, pois dela pode-se localizar elementos através de representações,
sejam elas através de mapas analógicos, digitais ou mentais. Esta pluralidade de meios
de representar o espaço possibilita a comunicação com os demais temas geográficos
(escala, meio ambiente, e questões sociais), valorizando e incentivando ainda mais a
pesquisa na área do ensino, e consequentemente, nas práticas pedagógicas em sala de
aula.

2. RECURSOS DIDÁTICOS NO ENSINO DE GEOGRAFIA


Para familiarizarmos com o elemento principal deste estudo, conceituaremos
recursos didáticos como o conjunto de materiais que, ao serem utilizados para fins
pedagógicos, buscam uma melhor mediação de conhecimento de conteúdos com os
alunos, podendo ser todo tipo de objeto material (giz, livro didático, maquete, globo
terrestre, entre outros) ou imaterial (tonalidade da voz e expressões corporais); os
recursos didáticos modernos são formados por componentes eletrônicos e
computacionais (FISCARELLI, 2008).
Assim, para compreendermos as principais tendências ideológicas, Fiscarelli
(2008) sustenta que há discurso e saberes perante a utilização de recursos didáticos que
não condizem com a realidade praticada em sala de aula. Ela analisa o discurso dos
órgãos políticos (Proposta Curricular do Estado de São Paulo e Proposta Curricular
Nacional), dos livros didáticos dos principais autores de manuais de didática,
consagrados nos cursos de licenciatura desde a metade do século XX, tais como os de
Nérici (1959), Mattos (1971) e Turra et al. (1975). Em tal estudo, a autora conclui que
há uma ideologia empregada pela política educacional paulista que incentiva o
professor a utilizar os recursos didáticos, principalmente os relacionados às novas
tecnologias. Para efetivar esta ideologia, são realizados cursos de capacitação com a
finalidade do professor realizar atividades lúdicas em sala de aula, pois o principal
problema na utilização dos recursos didáticos é adaptá-los aos temas propostos pela
disciplina.
Quanto à expectativa de utilização de recursos didáticos pelo professor, a autora
infere que há receio destes na questão da viabilidade, adaptação ao conteúdo e à

67
realidade escolar. Para a prática em sala de aula, o professor necessita de maior preparo
e eficiência, pois assim como o recurso pode ajudar, ele também pode atrapalhar o
docente se ele não souber utilizá-lo corretamente.
Por fim, os estudos sobre os recursos didáticos ganham maior destaque nas
décadas de 1980-1990, sendo este um elemento enfatizado por grande parte dos autores
deste referencial teórico em estudo. Devemos assim, buscar esta qualidade, seja através
de práticas pedagógicas renovadoras ou na busca de outros meios de estímulo à
motivação de aprendizagem dos alunos, como a utilização de recursos didáticos.
A seguir abordaremos os estudos sobre recursos didáticos no ensino de
Geografia no Brasil, consagrados pelos principais pesquisadores sobre cada recurso. É
importante salientar que foram desconsiderados os livros didáticos, paradidáticos e
literários, por serem temas muito abrangentes e demasiadamente estudados, e também
por não abrangerem a proposta neste estudo, isto é, que considere somente recursos
didáticos que possibilite uma abordagem através do método intuitivo, o qual haja a
participação ativa entre o sujeito e o objeto de estudo.

2.1 Globo Terrestre


Segundo estudos de Schäffer et al (2005), o globo terrestre tem sido um recurso
didático relegado, esquecido e pouco compreendido pelos professores, sendo muitas
vezes um elemento meramente decorativo, principalmente nas salas ambientes. Este
recurso tem suma importância nos temas que englobam orientação, leitura de mapas,
origem das situações de tempo, variação do horário na superfície terrestre, fluxo
espaciais (comércio, transporte e informações) e também em análise de questões
geopolíticas.
As principais vantagens em apresentar este recurso em sala de aula é que com
ele há a aproximação da real forma do planeta Terra; possibilita mostrar de forma total
os elementos físico-geográficos; mostram de forma total as divisões políticas dos
países; traz a rede de coordenadas geográficas sem distorções; possibilita a simulação
dos movimentos da Terra (dia-noite, estações do ano, fuso horário e eclipses); além de
suscitar indagações e despertar curiosidade àqueles que a manuseia (SCHÄFFER et al,
2005).
Uma das principais dificuldades em utilizar este recurso é a escola, por muitas
vezes ser muito pequena, dificultando a apresentação de informações e detalhamento.

68
Também está na impossibilidade de aproximação, visualização e manuseio deste com o
aluno, pois este material, muitas vezes, não há em abundância na escola. Por esta razão,
é importante que tenha na escola um exemplar com vários globos, mesmo que seja em
tamanho reduzido, para que todos os alunos possam manuseá-lo.
É importante também verificar os elementos encontrados nos globos terrestres,
para que possam ser explorados todos os componentes que este recurso possui como
destacado em Schäffer et al. (p. 34, 2005):

[…] (a) rede de coordenadas, com identificação do Meridiano de


Greenwich e da linha do Equador; (b) a escala, geralmente impressa
junto à legenda; (c) legenda, destacando símbolos não-convencionais
e, via de regra, colocada sobre áreas oceânicas; (d) arco de meridiano
em que aparecem os valores da latitude ; e (e) um círculo ou calota,
em geral de plástico, sobre o Pólo Norte e onde há marcação para
leitura das horas.

Agora, apresentamos algumas atividades organizadas por Schäffer et al (2005) e que


podem ser realizadas em sala de aula, de acordo com a realidade escolar.
• Procurar no globo, lugares citado no texto (trabalhado em sala de aula); discutir a
localidade e tempo de deslocamento, continente pertencente, etc.
• Discussão sobre globos em propagandas (ideologia).
• Foto tradicional da escola (formatura) do aluno ou responsável deste, que tenha o globo
simbolizando o ingresso no mundo culto e letrado. Discutir o tema.
• Confecção de bandeiras. Observar o significado de cores e símbolos.
• Aluno analisar uma bandeira de um país por ele escolhido.
• Questionar cores e símbolos da legenda do globo.
• Diferenciar, com os alunos, o globo antigo (século XVI) com o globo atual.
• Confecção do globo antigo com itinerário de navegações; explicar as dificuldades
(tempo, tecnologia, investimento).
• Leitura prévia sobre grandes navegações. Cada grupo seleciona um filme e elabora
textos que relacione o início das navegações com conhecimentos do cotidiano dos
alunos: drogas, DSTs, preconceito, amizade, criatividade, doenças
por falta de vitamina, etc. E dizer a importância do globo no contexto histórico do
filme.
• Construção de um globo com folhas de jornal; desenhar linha do Equador, meridiano e
trópicos; consultar bibliografia de bases militares dos EUA no mundo; discutir
geopolítica com os alunos.
• Desenho de proporção e redução de um objeto.
69
• Escolher dois países, cada aluno, e diferenciar as áreas no globo e no mapa.
• Venda de um produto: escolher três rotas aéreas mais rápidas de um continente para
outro; descrição da rota utilizando pontos cardeais; medir em um barbante as três rotas
em um globo terrestre.
• Alunos entrevistarem duas pessoas com visões diferentes sobre o surgimento do planeta
Terra; questionar com os alunos as limitações da ciência e da religião.
• Em dupla, elaborar roteiro de viagem para cidades sagradas, escolhendo e justificando o
itinerário dos atrativos turísticos através do globo terrestre.
• Maquete sobre o sistema solar (trabalhar proporção, estudo prévio sobre o tema com os
alunos, e elaboração de um glossário); os alunos utilizarão a maquete para explicar
cada tema escolhido por eles.
Segundo Almeida e Passini (2004), os conhecimentos e habilidades de localização,
orientação e representação contribuem para a compreensão da totalidade do espaço,
sendo o princípio para que o aluno construa a noção de espaço, codificando e depois
decodificando as representações gráficas presentes nos mapas.

2.2 Bússolas
As bússolas, apesar de muitas escolas não possuírem, é um recurso de fácil
acesso, podendo ser confeccionado pelos alunos e professores, ou comprados por preços
acessíveis à comunidade escolar.
As bússolas podem ser utilizadas no processo de ensino-aprendizagem de
conceitos, como norte magnético, orientação, rosa dos ventos, paralelos e meridianos,
além de exemplificar e relacionar com fatos históricos que perpassam as grandes
navegações e a importância da orientação daquela época e atualmente.
Neste contexto, concordamos com Castellar (2011, p. 126), ao constatar que,

O trabalho com orientação, como a localização do norte geográfico e a


identificação dos lugares a partir da rosa dos ventos, auxilia-os
[alunos] a compreender pontos fixos e não fixos da ordenação de um
território, e também no entendimento da variação de critérios de
regionalização.

Fica claro nesta ideia que, além dos conteúdos de orientação, o professor pode
abordar aspectos político-territorial, sendo elemento constituinte da localização do
indivíduo no espaço, já que utilizamos de pontos de referências que são social e
historicamente identificáveis, para que possamos nos localizar em determinados
espaços.
70
Uma avaliação que pode ser feita, utilizando este recurso, é pedir para os alunos
realizarem a trajetória de um ponto a outro dentro da escola, anotando em uma folha os
pontos cardeais e a quantidade de passos, estipulando duas a três chegadas, e numa
outra folha os lugares onde se espera que o usuário chegue. Com isto, trocam-se as
folhas entre os alunos e observa se os alunos souberam utilizar este instrumento para se
localizarem. É uma atividade de envolve aprendizagem mútua, uma vez que os alunos
possam auxiliar uns aos outros no percurso.
Com as atividades desenvolvidas tendo a bússola como viés de aprendizagem,
estima-se que os alunos a entenderão fenômenos complexos com maior facilidade,
principalmente os relacionados à dinâmica interna da Terra, o qual possui muitos
elementos abstratos, pois se há interesse, os alunos aguçam a vontade de compreender,
além de ser uma atividade lúdica que os alunos não esquecerão tão facilmente.

2.3 Jogos
Os jogos em sala de aula destacam o aluno como principal precursor do
conhecimento, e esta transmissão se faz de modo interativo entre o objeto de ensino e o
sujeito, permitindo a troca de ideias, hipóteses e constatações através de resoluções de
problemas (SILVA, 2006).
Considerando os jogos como instrumentos do “brincar-aprendendo”, Vygotsky
(1998) afirma que eles são situações imaginárias, que conduzem a certos
comportamentos da criança, eliminando a possibilidade de ações, devido ao
cumprimento das regras, assim, esta ação está unida ao prazer, uma vez que a satisfação
das regras é realizada, tornando-se uma ação imaginativa. Tornar prazeroso este aspecto
é importante para o desenvolvimento da criança, nos aspectos morais e de convívio em
sociedade.
Em escala local, Breda (2011) realizou estudos sobre recursos didáticos,
descrevendo e analisando sua confecção e aplicação em algumas escolas estaduais e
municipais do município de Ourinhos/SP. A autora aborda quatro jogos principais: jogo
da memória, dominó, quebra-cabeça e o jogo de tabuleiro.

2.4 Maquetes
A respeito do uso da maquete em sala de aula, estudos de Simielli (1990) e
Almeida; Passini (2004), reforçam que a maquete possibilita ao aluno a construção de
noções espaciais através da visualização, em modelo reduzido, de representações
71
bidimensional (mapas) para um tridimensional (maquetes), simplificando noções
abstratas que os alunos ainda estão desenvolvendo cognitivamente de acordo com suas
faixas etárias.
Para Almeida e Passini (2004), nos anos iniciais do ensino fundamental II, o
qual há a introdução da linguagem cartográfica para os escolares, deve-se ater maior
atenção quanto aos procedimentos metodológicos, enfocando o espaço vivido por este,
como por exemplo, a sala de aula, a quadra da escola, a escola em si, o bairro, enfim,
partindo de uma escala menor para uma maior.
Há atividades no intuito de estimular a percepção de um referencial topológico
entre os alunos nas séries iniciais (ALMEIDA; PASSINI, 2004) e, a posição, direção,
concentração, quantidade e demais informações que extrapolem a visualização da
maquete, que podem ser trabalhados pelo professor, principalmente entre os 9° anos e
ensino médio, tais como a dinâmica hidrográfica, clima, vegetação, as atividades
agrícolas e as demais relações econômico-sociais que a elas abarcam (SIMIELLI,
1990).
Uma metodologia de ensino com o intuito de aprendizagem que envolva a
construção de relações espaciais projetivas e euclidianas pelos alunos, abordando
aspectos de lateralidade (esquerda e direita), referência e orientação é abordada por
Almeida (2001), sendo um estudo desenvolvido para as séries iniciais (1° ao 6° ano do
ensino fundamental). Através da confecção de maquetes por grupos de alunos, eles
representam a sala de aula, de acordo com a proporção de carteiras, cadeiras e demais
elementos que esta pode conter. A sala de aula foi escolhida por representar um lugar
de convívio conhecido pelos alunos e professor, podendo este último determinar os
avanços e limitações dos alunos. Com a confecção das maquetes da sala de aula, foi
possível trabalhar com eles a visão vertical, escala proporção, legenda, e a posição dos
alunos na sala de aula, a princípio sem a utilização da maquete e, posteriormente,
utilizando a maquete, sendo um elemento essencial na preparação para a leitura das
coordenadas geográficas. Assim, o uso da maquete da sala de aula, “[…] projeta o
observador fora do contexto espacial no qual ele se insere, permitindo-lhe estabelecer,
inicialmente, relações espaciais topológicas entre a sua posição e a dos elementos da
maquete” (ALMEIDA, 2001, p. 78).
Neste ínterim, espera-se que a abordagem seja analisada de acordo com as
necessidades da prática docente, em vista dos objetivos traçados pelos conteúdos em

72
sala de aula, os anos escolares e faixas etárias dos alunos, e as disponibilidades de
recursos e maquetes já disponíveis no âmbito escolar que poderão incorporar a fase de
execução desta pesquisa.

2.5 Fantoches
Segundo Silva (2011), a utilização de fantoches pelas crianças é um meio de
introduzir nas séries iniciais do ensino fundamental II (5º e 6º ano), temas da Geografia
relacionadas à realidade dos alunos, através de oficinas da narração de histórias ou a
representação de teatro de fantoches exercidos pelos próprios alunos. A referida autora
analisa a construção do conhecimento por meio da contribuição da epistemologia
genética, desenvolvido por Piaget, destacando que o fantoche pode ser um instrumento
facilitador no processo cognitivo, na passagem do egocentrismo para o operatório
concreto, em crianças entre 11 e 13 anos de idade. Com a confecção e manipulação dos
fantoches, a autora concluiu que foi possível trabalhar o conceito de espaço, lugar e
orientação, a fim de descentralizar do aluno de sua visão egocêntrica.
Em estudos que abordam a utilização de peça de teatro com fantoches para o
ensino de Geografia, são desenvolvidos pelo projeto “Colóide”, desenvolvido junto ao
Curso de Geografia da UNESP – Ourinhos/SP, que realiza atividades com os alunos de
forma lúdica, entre tais atividades está o teatro de fantoches como viés no
ensinoaprendizagem de conceitos que englobam o solo, tais como conservação do solo,
erosão e voçoroca (PEREIRA, 2011). Outra consideração a ser salientada é a
possibilidade de interação com o público espectador, a fim de juntos criarem
mecanismos para resolverem situações de degradação do solo, como no caso da
voçoroca.
Assim, no aspecto de utilização de fantoches como recurso didático, deve ter
claro qual a abordagem e método a ser utilizado. Este recurso tem maior utilização nas
séries iniciais do ciclo II do fundamental, devido à faixa etária e ao desenvolvimento
cognitivo desta faixa etária, porém, isto não impossibilita sua utilização nas séries
posteriores, desde que siga objetivos de acordo com o desenvolvimento cognitivo dos
alunos.

73
2.6 Softwares educativos
No final do século XX e início do XXI, a tecnologia digital tornou-se acessível
aos usuários. Na Geografia, tal recurso tem sido pesquisado principalmente pela
cartografia escolar, no manuseio de mapas interativos e/ou dinâmicos. Também há a
confecção com os alunos de blogs e o manuseio de jogos online, que oferecem
diferentes temáticas possíveis a serem trabalhadas, além da cartografia, tais como
planejamento urbano, formas de relevo, dinâmica espacial, educação ambiental, entre
outros.
Há diferentes softwares distribuídos gratuitamente, confeccionados por
diferentes universidades, como a “Geoideia” desenvolvido pela Universidade Federal
Fluminense, além de sites como o IBGE teen voltado para o público juvenil. Assim, é
necessário que o professor busque o conhecimento sobre estas tecnologias e planeje
atividades e avaliações diferenciadas com este recurso.
Para o professor menos familiarizado com esta tecnologia, os slides oferecem
uma dinâmica de apresentação, podendo ser utilizado como recurso educativo. Ele
estabelece uma sequencia linear com efeitos e animações que são incorporados através
de sons, vídeos e animações (RAMOS, 2005). Com esta tecnologia informacional, os
alunos podem entender dinâmicas da Terra que necessita de maior interatividade e
abstração, que podem ser facilitadas através deste recurso.
Acreditamos que, a inserção da informática no meio escolar é um elemento que
deve ser explorado pelo professor, pois os alunos estão familiarizados com este recurso,
e no ensino de cartografia, poderá facilitar na aprendizagem da linguagem cartográfica.

2.7 Cinema
Segundo Napolitano (2009), o cinema em sala de aula, principalmente de ficção
e documentário, estando vinculado à indústria cultural, pode ser utilizado em sala de
aula pelo professor na abordagem de temas antes e/ou depois do filme. Para tanto, o
professor deve planejar suas atividades, de adequando ao currículo e à faixa etária dos
alunos.
Sobre o planejamento das atividades, o autor supracitado enfatiza três aspectos:
a organização na exibição do filme, verificando se ele ainda é acessível, se a sala de
vídeo é adequada (iluminação, barulho externo, vídeo e TV em perfeito estado de
utilização); adequação com o currículo e/ou conteúdo, afim de que o aluno elabore

74
textos, faça leituras complementares e desperte criticidade e; adequação com a faixa
etária do aluno, podendo o professor retirar partes que necessitem de censura, também
neste último aspecto deve-se atentar à etapa de aprendizagem escolar.
As faixas etárias são divididas de acordo com os ciclos de ensino. Assim,
esperasse que os alunos do fundamental II desenvolvam uma observação linear dos
fatos. Os alunos nesta faixa etária são agitados e questionadores, por esta razão, os
filmes que mais despertam curiosidade e gera interesse são aventura (podendo o
professor, neste caso, trabalhar com filmes históricos), e os filmes de ficção científica
(sendo trabalhadas as diversas superações de técnicas e tecnologias, de forma
cronológica e linear). Nas atividades planejadas, o professor pode estruturar um roteiro
prévio, com questões objetivas e relatório simplificado.
Nos alunos do ensino médio, é interessante destacar na íntegra a análise de
Napolitano (idem, p. 27): “[…] aumento da interdependência grupal, maior interesse
pelo sexo oposto, redefinições identitárias, questionamento do sentido existencial da
vida e do mundo, primeiras exigências de vida civil”.
Pela razão de que alguns alunos podem estar em conflito existencialista, é
importante que o professor trabalhe este aspecto em sala de aula. O aluno nesta faixa
etária possui capacidade de abstração, permitindo uma abordagem mais profunda, com
roteiro de análise mais elaborado, afim de que o aluno reflita sobre étnicos, sociais e
psicológicos, que serão fundamentais no processo de formação da personalidade. Sobre
documentários, o autor enfatiza que o professor deve ter olhar crítico e questionável
sobre o conteúdo destes, analisando a fonte produtora, os financiadores e os produtores
(diretor e escritor) a fim de abordar o cunho ideológico, podendo utilizar outro
documentário que contraste com a mesma abordagem.
Por fim, autor elenca atividades categorizadas a partir de um referencial de
filmes, que não cabe aqui desmembrá-los, mas sim, destacá-los como uma fonte de
pesquisa a ser considerado pelo professor ao utilizar tal recurso como auxílio do
conteúdo geográfico.

2.8 Estudo do meio


O estudo do meio é uma atividade realizada fora do ambiente da sala de aula,
podendo ser a observação no bairro, num parque próximo ou distante da escola, em
museus, etc. O estudo do meio favorece o recorte, a análise e a conceituação da

75
paisagem, observada de acordo com objetivos que podem englobar uma escala que
perpassa do local para o global, inter-relacionando os aspectos físicos e sociais que
resultam na paisagem historicamente (re) construída, além de singularizar as
particularidades da totalidade (SERPA, 2006).
O estudo a campo possibilita a interdisciplinaridade e propiciar abordar temas
transversais como prática da cidadania. Outro aspecto que pode ser estudado são as
categorias geográficas (espaço, território, paisagem e lugar), por serem conceitos
complexos, poderão ser observados a campo em diferentes olhares e pontos de vista
sobre cada categoria.
É importante que haja um estudo prévio sobre a área de estudo, para que os
alunos observem as peculiaridades e a constatação dos dados observados levantados. E,
após o campo haja a discussão e a sistematização dos dados antes e após o campo, para
que não ocorra, como salientado por Claval (2004) citado por Serpa, (2006, p. 16):

A descrição de paisagens urbanas tais como as descobrimos


percorrendo a cidade dá ideia das etapas de sua evolução, mas não
explica seu papel, não mostra do que a cidade vive, não permite
compreender seus problemas. Passemos do olhar do visitante à
perspectiva vertical daquele que dispõe de mapas, fotografias aéreas e
pesquisas sobre os hábitos de deslocamentos dos citadinos. A cidade
deixa de aparecer como um caleidoscópio. Tudo se torna claro.

Nesta perspectiva, as atividades devem ser realizadas de acordo com os


conhecimentos prévios dos alunos e, posteriormente, uma análise sobre as atividade
realizadas no campo, tendo como intuito ampliar os conhecimentos dos alunos a partir
da experinência vivenciada, correlacionando a teoria com a prática.
.
2.9 Fotografias
As fotografias são instrumentos que podem auxiliar o aluno na compreensão das
mudanças na paisagem, que ocorre, sobretudo, com a expansão da ocupação humana, e
as diferentes técnicas que o homem utiliza sobre o espaço. A análise fotográfica aguça a
percepção da paisagem de forma cronológica, seja através da assimilação entre fotos ou
entre estas com a realidade imediata.
Neste sentido, pode-se trabalhar também o conceito de lugar com os alunos, uma
vez que há a possibilidade de utilização de fotografias da escola, do bairro, ou do
município, em diferentes épocas. Esta atividade motiva os alunos, principalmente por
76
reconhecerem referenciais do espaço observados nas fotografias. Além disso, o estudo
do município é importante, porque nele estão delimitados todos os aspectos do espaço
próximos dos alunos, sendo elementos expressos pelas condições sociais, econômicas e
políticas, formando uma totalidade na particularidade desta escala, podendo ser
expandida para as demais escalas geográficas (CALLAI, 2003).
Outra atividade de fácil acesso aos alunos, e com devido planejamento do
professor, é resgatar a história de parentes dos alunos, amigos ou vizinhos, que saliente
a mudança da paisagem no bairro e/ou município dos alunos. Assim, com o conteúdo e
conceitos prévios adquiridos em sala de aula, o professor pode juntamente com os
alunos, estabelecer perguntas prévias, e estes realizarem a campo (dentro de casa com
os pais, ou na casa de parentes, vizinhos e amigos) as entrevistas. É importante também
que eles busquem fotografias que retratem esta mudança na paisagem do local em
estudo. Em sala de aula, os alunos apresentam os dados obtidos e os expõe para os
demais alunos, a fim de que haja o diálogo entre eles, e o professor resgate os conceitos
já trabalhados em sala de aula anteriormente.
A fotografia é um recurso de fácil acesso, e muito pouco utilizada pelos
professores. Se ela for bem direcionada, o professor facilitará a compreensão da
dinâmica espacial pelo aluno e/ou despertar nele a identidade com o espaço ao qual ele
se sociabiliza.

2.10 Mostruário de rochas, minerais e solos


Sobre este recurso didático há pouca bibliografia no quesito de ensino em
Geografia, apesar de ser um material de fácil acesso e com ampla exploração em sala de
aula.
Um estudo peculiar sobre a utilização de rochas, minerais e solos no conteúdo de
geologia, que engloba os estudos geográficos, está no artigo de Moreno (2007), nesta
pesquisa, as rochas, minerais e solos se destacam pela possibilidade do contato direto do
aluno com o conteúdo estudado, despertando maior interesse destes pela Geografia
Física e sua inter-relação com os aspectos sociais. Para complementar o conteúdo, foi
agregado conhecimentos sobre impactos ao meio ambiente e socioeconômicos, tais
como contaminação da água pelo mercúrio, a importância do Aquífero Guarani, e os
tipos de solos e suas relações com a agricultura.

77
Devemos destacar que a autora conclui afirmando a importância da motivação
dos alunos devido uma abordagem dos conteúdos de modo diferenciado, que foi
sistematizado considerando a pesquisa sobre o lugar vivenciado por eles, em escala
local e regional.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se concluir que os estudos no campo do ensino em Geografia relacionam-
se diretamente com a crescente pesquisa no campo de recursos didáticos, especialmente
os que facilitem a mediação entre professor e aluno na busca do conhecimento. Esta
constatação reforça a necessidade de questionarmos as práticas escolares atuais,
principalmente porque o ensino Tradicional ainda predomina, reforçando uma
Geografia desconexa em seus conteúdos.
Nos levantamentos bibliográficos sobre os recursos didáticos no campo de
ensino da disciplina de Geografia, os autores abordaram, com maior ênfase, a temática
cartográfica, por considerarem a dificuldade da transposição didática dos professores e
por esta ser importante para os estudos do campo geográfico. Assim, observamos que há
uma lacuna perante os demais temas, além da questão da interdisciplinaridade com as
demais disciplinas escolar.
Também devemos considerar os novos meios tecnológicos na difusão da
informação digital, facilitando o acesso à pesquisa produzida em colaboração entre
universidades e escolas, que facilitam o acesso aos artigos publicados nos encontros,
congressos e colóquios no ensino de Geografia. Tal meio de informação pode auxiliar
os docentes escolares na busca de metodologias diferenciadas.
Espera-se que este estudo seja base para a averiguação de tais lacunas
supracitadas, com a finalidade de explorar e difundir conhecimentos sobre práticas
escolares e técnicas que auxiliem no processo de ensino-aprendizagem dos alunos.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

______. ______. Araraquara: Junqueira & Martins Editoras, 2008.


______. O estudo do município ou a geografia nas séries iniciais. In:
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos (Org.). Geografia em sala de aula: práticas e
reflexões. 4 ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003, p. 77-82.

78
ALMEIDA, Rosângela Doin de. Do desenho ao mapa: iniciação cartográfica na
escola. São Paulo: Contexto, 2001.
ALMEIDA, Rosângela Doin de; PASSINI, Elza Yasuko. O espaço geográfico: ensino
e representação. 13. ed. São Paulo: Contexto, 2004.
ARCHELA, Rosely Sampaio. Análise da Cartografia Brasileira: bibliografia da
cartografia na Geografia no período de 1935-1997. Tese, 2000. p. 168, v. 1.
BREDA, Thiara Vichiato. O olhar espacial e geográfico na leitura e percepção da
paisagem municipal: contribuições cartográficas e do trabalho de campo no estudo do
lugar. 2010. 1. v. 90 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado – Geografia)
Universidade Estadual Paulista, Ourinhos, 2010.
CALLAI, Helena Copetti. Estudar o lugar para compreender o mundo. In:
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos (Org.). Ensino de Geografia: práticas e
textualizações no cotidiano. 3. ed. Porto Alegre: Mediação, 2003, p. 83-134.
CASTELLAR. Sonia Maria Vanzella. A cartografia e a construção do conhecimento
em contexto escolar. In: ALMEIDA, Rosângela Doin de. Novos rumos da cartografia
escolar: currículo, linguagem e tecnologia. São Paulo: Editora Contexto, 2011.
CAVALCANTI, Lana de Souza. A Geografia escolar e a cidade: ensaios sobre o
ensino de geografia para a vida urbana cotidiana. Campinas: Papirus, 2008.
FERREIRA, Conceição Coelho; SIMÕES, Natércia Neves. A evolução do
pensamento geográfico. Lisboa: Gradiva. 1986.
FISCARELLI, Rosilene Batista de Oliveira. Material didático: discurso e saberes.
2004. 202f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual Paulista,
Araraquara, 2004.
MORAES, Antonio Robert. Geografia: pequena história crítica. 2a edição. São Paulo:
Editora Hucitec. 1983.
NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. 4. ed. 2. reimpressão.
São Paulo: Contexto, 2009.
PEREIRA, Aline Natasha; PERUSI, Maria Cristina; COSTA, Renata Correia. O teatro
de fantoche como recurso facilitador da relação ensino-aprendizagem em
geografia. In: XI Encontro de Práticas de Ensino em Geografia, 2011, Goiânia/GO. XI
Encontro de Práticas de Ensino em Geografia: A produção do conhecimento e a
pesquisa sobre o ensino de geografia, 2011.
RAMOS, Carlos da Silva. Visualização cartográfica e cartografia multimídia:
Conceitos e tecnologias. São Paulo: Editora UNESP, 2005.
SCHÄFFER, Neiva Otero et al. Um globo em suas mãos: práticas para a sala de aula.
2. ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005.
SERPA, Ângela. O trabalho de campo em Geografia: uma abordagem
teóricometodológica. Boletim Paulista de Geografia. São Paulo, n. 84, p. 07-24, 2006.
SILVA, Karen Roberta Soares da. Geografar, alfabetizar com fantoches, é só começar!
2011. 110 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2011.
SILVA, Luciana Gonçalves da. Jogos e situação-problema na construção das noções
de lateralidade, referência e localização espacial. In: CASTELLAR, Sônia Maria
79
Vanzella. Educação geográfica: teorias e práticas docentes. São Paulo: Editora
Contexto, 2006.
SIMIELLI, Maria Elena Ramos (et al). Do plano ao tridimensional: a maquete como
recurso didático. Boletim Paulista de Geografia. São Paulo, n° 70, p. 17-30, 1990.
VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente - O desenvolvimento
dos Processos Psicológicos Superiores. Organizadores Michael Cole [et al.]; tradução
José Cipola Neto, Luis Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 6.ed. São
Paulo: Editora Martins Fontes, 1998.

80

Você também pode gostar