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C APÍTULO 1

Histórico e Evolução da Educação


Especial Inclusiva

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo,


você terá os seguintes objetivos de aprendizagem:

33 Conhecer a história da educação especial.

33 Compreender a mudança dos papéis da escola especial e


da escola regular.

33 Diferenciar as fases históricas da educação especial.

33 Distinguir as funções da escola especial e da escola


regular.
Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

Contextualização
Neste capítulo, você conhecerá um breve histórico da trajetória da
Educação Especial. Conhecer os caminhos e a evolução da Educação
Especial é importante, pois fará com que você reflita e compreenda os
vários enfoques atribuídos pela sociedade às pessoas com deficiência,
de acordo com os valores morais e éticos de cada época.

Além disso, este capítulo pretende esclarecer quanto aos modelos


de educação oferecidos às pessoas com deficiência, desde o período
em que eram preteridas no que se refere a qualquer forma de educação
escolar até os dias atuais, em que as políticas garantem a todos o direito
à educação na escola regular.

Por último, você refletirá sobre as funções da escola especial, cujo


ensino não é mais substitutivo da escola regular. Isto porque a escola
especial recebeu novos papéis após a implementação de leis que
garantem a inclusão de todos na escola regular, principalmente o de
cooperar com a educação inclusiva.

Trajetória da Educação Especial: da


Exclusão à Inclusão Escolar
Antes de conhecer o modelo de educação inclusiva, hoje almejada
nas escolas de todo o país, é importante saber que a mesma se
derivou de uma longa trajetória historicamente produzida. Em outras
palavras, a Educação Inclusiva é fruto de mudanças históricas que
foram constituídas socialmente. Para entender a gênese histórica desse
modelo, é essencial que você faça uma análise das acepções e práticas
que a ele servem de base.

Embora os fenômenos históricos aconteçam de forma não-linear,


ou seja, não ocorram de maneira contínua, no que concerne à história
da Educação Especial, conforme Sassaki (1997), esta pode ser dividida
em quatro fases: exclusão, segregação ou separação, integração e
inclusão. Ressaltamos que, por se tratar de mudanças de paradigmas,
essas fases não ocorreram ao mesmo tempo para todos os grupos
sociais, já que cada população tem seu próprio momento cultural e
histórico. Em relação a isso, Sassaki (1997, p. 16) nos explica que

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Educação Especial e Inclusão Escolar

A sociedade, em todas as culturas, atravessou diversas fases


no que se refere às práticas sociais. Ela começou praticando
a exclusão social de pessoas que – por causa das condições
atípicas – não lhe pareciam pertencer à maioria da população.
Em seguida, desenvolveu o atendimento segregado dentro
de instituições, passou para a prática da integração social
e recentemente adotou a filosofia da inclusão social para
modificar os sistemas sociais gerais (grifos no original).

Entretanto, não podemos pensar nas fases mencionadas por Sassaki


(1997) desvinculadas de seus momentos históricos, pois as mesmas
foram norteadas por políticas públicas que enfatizavam as visões de
mundo concebidas em tais momentos. Além disso, as quatro fases se
referem às práticas sociais. Portanto, a educação, que é uma dessas
práticas, está diretamente atrelada a essas mudanças. Dessa forma,
quando falarmos em exclusão, segregação, integração e exclusão nesse
texto, estaremos nos referindo ao acesso à educação.

O modelo de exclusão, se comparado com os demais – da


segregação, da integração e da inclusão –, foi o que predominou por
mais tempo no que diz respeito à história social das pessoas com
deficiência. Nessa fase, era natural pensar em abandono e, até, na morte
dos “débeis”, pois dessa forma, o sujeito deficiente não contaminaria o
resto da sociedade. Essa maneira de pensar modificou-se à medida que
o Cristianismo se difundiu, gerando o pressuposto de que o deficiente é
um indivíduo dotado de alma e que, portanto, necessita ser socorrido.

Esse reconhecimento da deficiência aos poucos transformou a fase


de exclusão em fase de segregação ou separação, quando ocorreu a
institucionalização da deficiência.

Institucionalização da deficiência: significa, neste caso, oferecer


ensino às pessoas com deficiência em locais especializados, fora das
escolas regulares.

Escola Especial
não foi criada para A fase de segregação ficou caracterizada pela retirada das pessoas
segregar as pessoas com deficiência de suas comunidades de origem e pela manutenção
com deficiência,
das mesmas em instituições residenciais segregadas ou em escolas
e sim para dar a
especiais, situadas longe da localidade de suas famílias. Em outras
oportunidade de
ensino que o sistema
palavras, as pessoas com deficiência tiveram acesso à educação, mas
regular negava a de forma segregada.
essas pessoas.
Foi nessa época, mais especificamente no século XIX, que a
escola especial passou a exercer um papel importante para as pessoas

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

com deficiência, pois, segundo Beyer (2005, p. 14), essas escolas


“integraram, pela primeira vez, as crianças com deficiência no sistema
escolar”. Diferentemente do que imaginamos, a Escola Especial não
foi criada para segregar as pessoas com deficiência, e sim para dar a
oportunidade de ensino que o sistema regular negava a essas pessoas.
Sobre a escola especial, Glat (1998, p. 11) explica que

Tradicionalmente o atendimento aos portadores de


deficiências era realizado de natureza custodial e
assistencialista. Baseado em um modelo médico, a
deficiência era vista como uma doença crônica e o deficiente
como um ser inválido e incapaz, que pouco poderia contribuir
para a sociedade, devendo ficar ao cuidado das famílias ou
internado em instituições ‘protegidas’, segregado do resto da
população.

Em relação ao exposto por Glat (1998), Beyer (2005, p. 15) adverte


que “as escolas especiais foram importantes historicamente, mas
uma solução transitória não tem ou não deve ter caráter permanente”.
Dessa forma, é essencial termos consciência da importância histórica
da Educação Especial, como um meio de acesso à educação pelas
pessoas com deficiência. No entanto, precisamos estar cientes de que
foi uma solução passageira.

Note: Na citação de Beyer (2005), aparece o termo “integraram”.


Cabe lembrar que a integração mencionada por Beyer (2005) é diferente
da fase de integração em escolas regulares, pois, apesar de as pessoas
com deficiência estarem integradas em um sistema de ensino, esse
sistema funcionava separado do convívio social.

O processo de desinstitucionalização teve início com as mudanças


socioeducacionais que ocorreram nos anos de 1970, dando um novo
rumo à educação de pessoas com deficiência.

Desinstitucionalização: foi o processo que marcou a transferência


gradual das pessoas com deficiência das instituições especiais para as
escolas regulares.

A Comissão de Warnock, que aconteceu em Londres, em 1978, deu


o seu apoio ao princípio da integração para alunos com necessidades
educacionais especiais, distinguindo três formas principais de integração,
que descreveu como: situacionais, em que unidades ou turmas especiais
se encontram ligadas a escolas do ensino regular; sociais, nas quais
os alunos da unidade convivem com as outras crianças e, se possível,

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Educação Especial e Inclusão Escolar

partilham atividades organizadas fora da sala de aula; e funcionais, nas


quais aqueles que têm necessidades educacionais especiais assistem
às aulas da escolaridade regular em regime de tempo inteiro ou de
tempo parcial. (RELATÓRIO WARNOCK, 1978).

Nos anos subsequentes à publicação do Relatório Warnock


(1978), tornou-se claro que seriam necessárias alterações substanciais
no pensamento que se refere às três dimensões citadas, ou seja,
situacionais, sociais e funcionais. A insatisfação com uma interpretação
estreita da integração enquanto problema da minoria, na qual o sucesso
significava adequar uma criança a um sistema que não fora concebido
tendo em conta as suas necessidades, conferiu um impulso significativo
a uma mudança na utilização da terminologia, passando a ser usado o
termo inclusão em vez de integração. Diferente da proposta da integração
que almejava modificar os alunos até que pudessem se encaixar no
perfil das escolas regulares, a inclusão visa que a escola se molde para
atender as necessidades de cada aluno. Além disso, o termo inclusão
implica o reconhecimento de que todos estão abrangidos, ou seja, o
princípio da prática educativa inclusiva se aplica a todos os alunos.

A figura 1, elaborada por Beyer (2006), ilustra as quatro fases


mencionadas nos parágrafos anteriores: exclusão, segregação ou
separação, integração e exclusão.

Figura 1 - Os processos de exclusão, separação e


integração e inclusão sob a ótica de Beyer (2006)
Fonte: Beyer (2006, p. 279).

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

A figura 1 contém círculos e “pontinhos” que, conforme a legenda,


representam, respectivamente, o ensino tanto na escola regular quanto
na escola especial e as pessoas com necessidades especiais e as ditas
normais. Com essa figura, Beyer (2006) procurou esclarecer quanto aos
diferentes momentos históricos que marcaram as ações do sistema de
ensino.

Vamos entender melhor a figura 1?

Na fase de exclusão, as pessoas com necessidades especiais não


estão inseridas em nenhum tipo de instituição de ensino. Isto significa
que, nessa fase, as pessoas com deficiência estavam excluídas de
todos os tipos de educação.

Na fase de segregação ou separação, as pessoas com


necessidades especiais estão inseridas em escolas especiais e as
pessoas ditas normais, no ensino regular. Podemos compreender então
que, nessa fase, foram criadas as primeiras instituições de ensino para
pessoas com deficiência, mas que ficavam separadas do convívio
social.

Na fase de integração, as pessoas com necessidades especiais


estão na mesma instituição de ensino que as pessoas ditas normais, mas
em grupos separados. Isto quer dizer que as pessoas com deficiência
tinham acesso à mesma escola que as pessoas ditas normais, mas
frequentavam classes separadas.

Note: Será que podemos considerar que a segregação e a integração


são formas de exclusão? Sim. A segregação pode ser considerada uma
forma de exclusão, pois, apesar de os alunos com deficiência estarem
em uma instituição de ensino, esta era separada das escolas comuns, ou
seja, os alunos estavam excluídos do ensino regular. Da mesma forma,
podemos considerar que a integração seja uma forma de exclusão, já
que os alunos, mesmo incluídos na escola regular, ficam excluídos dos O modelo de
grupos de alunos ditos normais. inclusão requer
mais da escola do
Finalmente, na fase de inclusão, as pessoas com necessidades que o modelo de
especiais estão inseridas na mesma escola e no mesmo grupo das integração, pois
pessoas ditas normais. Com isso, podemos compreender que o modelo prevê um ensino que
de inclusão requer mais da escola do que o modelo de integração, pois abranja todos em
prevê um ensino que abranja todos em uma mesma classe dentro de uma mesma classe
uma mesma escola. dentro de uma
mesma escola.

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Educação Especial e Inclusão Escolar

Atividade de Estudos:

Você considera que a escola como está configurada atualmente


está preparada para se encaixar nos moldes do paradigma da inclusão?
Aproveite este momento de reflexão e responda de acordo com as
experiências vivenciadas em sua realidade, justificando sua resposta.
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Independente de sua resposta, podemos considerar que novos


projetos requerem mudanças e que isso não é diferente quando tratamos
do ambiente educacional. Na próxima seção, discutiremos sobre as
mudanças que a última fase – inclusão – trouxe para as escolas, tanto
especiais quanto regulares.

Romeu Kasumi Sassaki, o qual citamos no início desta seção,


é consultor e atua há 43 anos na promoção e na inclusão social de
pessoas com deficiência. Leia um trecho da entrevista concedida por
Sassaki na qual aborda o tema que estamos estudando. Essa entrevista
está disponível no site www.educacaoonline.pro.br.

Fala-se muito também na integração do portador de deficiência.


Existe diferença entre inclusão e integração?

Sim, existe, embora ambas constituam formas de inserção. A prática


da integração, principalmente nos anos sessenta e setenta, baseou-
se no modelo médico da deficiência, segundo o qual tínhamos que
modificar (habilitar, reabilitar, educar) a pessoa com deficiência para
torná-la apta a satisfazer os padrões aceitos no meio social (familiar,
escolar, profissional, recreativo, ambiental). Já a prática da inclusão,
incipiente na década de oitenta, porém consolidada nos anos noventa,
vem seguindo o modelo social da deficiência, segundo o qual a nossa
tarefa é a de modificar a sociedade (escolas, empresas, programas,
serviços, ambientes físicos etc.) para torná-la capaz de acolher todas
as pessoas que, uma vez incluídas nessa sociedade em modificação,
poderão ter atendidas em suas necessidades, comuns e especiais.

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

Que tipo de ação o Senhor sugere no sentido de tomar eficaz a


inclusão do aluno com deficiência na escola regular?

As ações são de vários tipos e devem ser, em sua maioria,


implementadas simultaneamente. Será necessária uma ampla e
contínua campanha de esclarecimento do público em geral, das
autoridades educacionais e dos alunos das escolas comuns e especiais
e de seus familiares. Serão imprescindíveis os treinamentos dos
atuais e futuros professores comuns e especiais. Esses treinamentos
deverão enfocar os conceitos inclusivistas (autonomia, independência,
empowerment, equiparação de oportunidades, inclusão social, modelo
social da deficiência, rejeição zero e vida independente), a Declaração
de Salamanca, os preceitos constitucionais brasileiros pertinentes ao
direito à educação no ensino regular, os princípios da inclusão escolar,
os procedimentos em sala de aula e as atividades extracurriculares
que constituem as melhores práticas de ensino-aprendizagem já
comprovadas por escolas inclusivas bem-sucedidas. Durante e após
os treinamentos, deverá ser garantido aos professores o seu acesso
à literatura (livros, manuais, apostilas, relatórios e outros materiais
impressos e/ou audiovisuais) sobre educação inclusiva. Deverá também
ocorrer uma série de modificações nos ambientes escolares e nos
materiais de ensino-aprendizagem, além de mudanças nos critérios de
avaliação do rendimento escolar e de promoção nas séries.

Onde se encontram as principais resistências no sentido de se


conseguir uma efetiva inclusão?

Tanto no âmbito escolar como em outros setores, as principais


resistências têm como origem o desconhecimento e/ou as informações
equivocadas a respeito do paradigma da inclusão. Quanto à inclusão
escolar, as resistências estão presentes entre as autoridades
educacionais de todos os níveis, entre os professores comuns e
especiais e entre famílias e alunos com e sem deficiências.

Uma das grandes barreiras a serem derrubadas está nos


preconceitos em relação ao tema. Como o Senhor vê o problema?

Os preconceitos em relação à inclusão poderão ser eliminados


ou, pelo menos, reduzidos por meio das ações de sensibilização da
sociedade e, em seguida, mediante a convivência na diversidade
humana dentro das escolas inclusivas, das empresas inclusivas, dos
programas de lazer inclusivo. Resultados já existem que comprovam
a eficácia da educação inclusiva em melhorar os seguintes aspectos:
comportamentos na escola, no lar e na comunidade; resultados

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Educação Especial e Inclusão Escolar

educacionais; senso de cidadania; respeito mútuo; valorização das


diferenças individuais e aceitação das contribuições pequenas e grandes
de todas as pessoas envolvidas no processo de ensino-aprendizagem,
dentro e fora das escolas inclusivas.

Atividade de Estudos:

1) Sugiro a você que aponte os aspectos mais interessantes da


entrevista de Sassaki e comente sobre eles.
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2) Diferencie, com suas palavras, as fases de exclusão, segregação


ou separação, integração e inclusão.
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Escola Regular e Escola Especial:


Reinterpretando Papéis
A Escola Especial
deve trabalhar de Na seção anterior, vimos que as escolas especiais surgiram para
forma cooperativa com oferecer ensino às pessoas com deficiência, já que estas, até o final da
as escolas regulares década de 1980, não tinham o direito de frequentar as escolas regulares.
e auxiliar no processo Nesse sentido, as escolas especiais inicialmente possuíam um caráter
de inclusão de alunos substitutivo do ensino regular. Você pode estar se perguntando: Se todos
com necessidades os alunos devem estar incluídos nas escolas regulares, qual o papel
especiais da escola especial nesse processo? As escolas especiais deixaram de
existir?

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

Após a implantação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional – Educação Especial, Lei nº 9.394/96, a qual previu, no art.
58, parágrafo I, que, quando necessário, haveria “[...] serviço de apoio
especializado, na escola regular, para atender a peculiaridades da
clientela de educação especial” (BRASIL, 2008) –, as escolas especiais
ficaram encarregadas de assumir um novo papel na educação:
trabalhar de forma cooperativa com as escolas regulares e auxiliar no
processo de inclusão de alunos com necessidades especiais. Dessa
forma, as escolas especiais não deixaram de existir, mas assumiram
uma nova tarefa diante das pessoas com deficiência ou síndrome.

Deficiência ou Síndrome: É importante destacar que deficiência e


síndrome são duas patologias diferentes. Uma pessoa com síndrome
pode ter uma deficiência, mas isso não é uma regra e vice-versa.

De que forma isso vai acontecer?

A escola especial, serviço de apoio especializado ou atendimento


educacional especializado, passará a oferecer serviços diferentes
do proporcionado pelo ensino escolar, tendo como função atender
às peculiaridades dos alunos com necessidades especiais, estando
disponível como complemento, e não como substitutivo do ensino
regular. Mantoan (2004) nos lembra de que, no Ordenamento Jurídico
Brasileiro, o atendimento prestado pela escola especial “existe para
complementar e não para substituir o ensino escolar comum e para que
os alunos com deficiência tenham acesso e frequência à escolaridade,
em escolas comuns”. Isto significa que a escola especial deve
complementar o ensino regular, oferecendo suporte tanto para os
alunos com deficiência ou síndrome quanto para as escolas regulares.

Quando falamos em suporte aos alunos com deficiência ou


síndrome, não nos referimos à aula de reforço ou a atendimentos que
preencham as lacunas deixadas pela escola regular. Segundo Batista
(2006, p. 17), o suporte existe “[...] para que os alunos possam aprender
o que é diferente do currículo do ensino comum e que é necessário para
que possam ultrapassar as barreiras impostas pela deficiência”. Por
exemplo, quando um aluno com deficiência visual é incluído na escola
regular, o atendimento especializado da escola especial, além de outras
atividades, pode ensinar o Braille. Dessa forma, o aluno terá acesso à
linguagem escrita, podendo participar das atividades na escola regular
que, por sua vez, adaptará o material didático e as avaliações para o
Braille.

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Educação Especial e Inclusão Escolar

O suporte oferecido pela escola especial às escolas regulares pode


acontecer de várias maneiras. Uma delas é a orientação oferecida aos
professores e aos gestores educacionais por profissionais itinerantes
que esclarecem sobre como garantir a permanência e a aprendizagem
de todos os alunos. Sobre isso, Mantoan (2003, p. 55) argumenta que
“Não adianta, contudo, admitir o acesso de todos às escolas, sem
garantir o prosseguimento da escolaridade até o nível que cada aluno
for capaz de atingir”. Neste sentido, podemos considerar que a inclusão
não termina na garantia de matrícula aos alunos com deficiência ou
síndrome, mas também requer a garantia da continuidade do aluno na
escola.

No tocante à itinerância, Mantoan (2003, p. 87) chama a atenção


para o seguinte:

O professor itinerante/especialista tende a acomodar o


professor comum, tirando-lhe a oportunidade de crescer,
de sentir a necessidade de buscar soluções e não aguardar
para que alguém de fora venha regularmente, para resolver
seus problemas. Esse serviço reforça a idéia de que os
problemas de aprendizagem são sempre do aluno e de que
O professor itinerante só o especialista consegue removê-lo com adequação e
tem o papel de orientar eficiência.
os profissionais das
escolas regulares quanto A autora nos alerta que, ao contrário do que muitos pensam, os
à inclusão de seus alunos, professores itinerantes não estão na escola para resolver os problemas
e não de assumir as dos professores regentes e acomodá-los, mas para auxiliá-los, criando
responsabilidades do a autonomia necessária para desenvolver um trabalho inclusivo.
professor comum. (MANTOAN, 2003). Conforme já mencionamos, o professor itinerante
tem o papel de orientar os profissionais das escolas regulares quanto
à inclusão de seus alunos, e não de assumir as responsabilidades do
professor comum.

Ante o exposto, perguntamos: qual o papel da escola regular diante


do modelo de inclusão?

Assim como a escola especial, a escola regular também deve


reinterpretar seu papel diante do paradigma da inclusão, assumindo as
responsabilidades impostas pelas leis e modificando seu sistema de
acordo com as orientações propostas pelas políticas de inclusão. Nos
próximos capítulos, discutiremos mais atentamente as questões legais
e teóricas que embasam a inclusão de pessoas com deficiência nas
escolas regulares.

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

Atividade de Estudos:

1) Complete o quadro a seguir de acordo com o que você estudou


a respeito das características das escolas especiais e das escolas
regulares.

2) De que forma a escola especial pode cooperar com a escola


regular para promover a inclusão dos alunos com deficiência ou
síndrome? Crie uma situação para exemplificar sua resposta.
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Sugiro que você leia a entrevista intitulada “Inclusão é o privilégio


de conviver com as diferenças” que Mantoan concedeu ao site www.
novaescola.com.br. Nessa entrevista, a educadora comenta sobre a
importância de conviver com as diferenças na escola.

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Educação Especial e Inclusão Escolar

INCLUSÃO É O PRIVILÉGIO DE CONVIVER COM AS DIFERENÇAS


Maria Teresa Eglér Mantoan

O que é inclusão?

É a nossa capacidade de entender e reconhecer o outro e, assim, ter


o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas diferentes de nós.
A educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para
o estudante com deficiência física, para os que têm comprometimento
mental, para os superdotados, para todas as minorias e para a criança
que é discriminada por qualquer outro motivo. Costumo dizer que estar
junto é se aglomerar no cinema, no ônibus e até na sala de aula com
pessoas que não conhecemos. Já inclusão é estar com, é interagir com
o outro.

Que benefícios a inclusão traz a alunos e professores?

A escola tem que ser o reflexo da vida do lado de fora. O grande


ganho, para todos, é viver a experiência da diferença. Se os estudantes
não passam por isso na infância, mais tarde terão muita dificuldade de
vencer os preconceitos. A inclusão possibilita aos que são discriminados
pela deficiência, pela classe social ou pela cor que, por direito, ocupem
o seu espaço na sociedade. Se isso não ocorrer, essas pessoas serão
sempre dependentes e terão uma vida cidadã pela metade. Você não
pode ter um lugar no mundo sem considerar o do outro, valorizando
o que ele é e o que ele pode ser. Além disso, para nós, professores, o
maior ganho está em garantir a todos o direito à educação.

O que faz uma escola ser inclusiva?

Em primeiro lugar, um bom projeto pedagógico, que começa pela


reflexão. Diferentemente do que muitos possam pensar, inclusão é
mais do que ter rampas e banheiros adaptados. A equipe da escola
inclusiva deve discutir o motivo de tanta repetência e indisciplina, de os
professores não darem conta do recado e de os pais não participarem.
Um bom projeto valoriza a cultura, a história e as experiências anteriores
da turma. As práticas pedagógicas também precisam ser revistas. Como
as atividades são selecionadas e planejadas para que todos aprendam?
Atualmente, muitas escolas diversificam o programa, mas esperam
que no fim das contas todos tenham os mesmos resultados. Os alunos
precisam de liberdade para aprender do seu modo, de acordo com as
suas condições. E isso vale para os estudantes com deficiência ou não.

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

Como está a inclusão no Brasil hoje?

Estamos caminhando devagar. O maior problema é que as redes de


ensino e as escolas não cumprem a lei. A nossa Constituição garante
desde 1988 o acesso de todos ao Ensino Fundamental, sendo que alunos
com necessidades especiais devem receber atendimento especializado
preferencialmente na escola, que não substitui o ensino regular. Há
outra questão, um movimento de resistência que tenta impedir a
inclusão de caminhar: a força corporativa de instituições especializadas,
principalmente em deficiência mental. Muita gente continua acreditando
que o melhor é excluir, manter as crianças em escolas especiais, que
dão ensino adaptado. Mas já avançamos. Hoje todo mundo sabe que
elas têm o direito de ir para a escola regular. Estamos num processo de
conscientização.

A escola precisa se adaptar para a inclusão?

Além de fazer adaptações físicas, a escola precisa oferecer


atendimento educacional especializado paralelamente às aulas
regulares, de preferência no mesmo local. Assim, uma criança cega,
por exemplo, assiste às aulas com os colegas que enxergam e, no
contraturno, treina mobilidade, locomoção, uso da linguagem braile e
de instrumentos, como o soroban, para fazer contas. Tudo isso ajuda na
sua integração dentro e fora da escola.

Como garantir atendimento especializado se a escola não


oferece condições?

A escola pública que não recebe apoio pedagógico ou verba tem


como opção fazer parcerias com entidades de educação especial,
disponíveis na maioria das redes. Enquanto isso, a direção tem que
continuar exigindo dos dirigentes o apoio previsto em lei. Na particular, o
serviço especializado também pode vir por meio de parcerias e deve ser
oferecido sem ônus para os pais.

Estudantes com deficiência mental severa podem estudar em


uma classe regular?

Sem dúvida. A inclusão não admite qualquer tipo de discriminação,


e os mais excluídos sempre são os que têm deficiências graves. No
Canadá, vi um garoto que ia de maca para a escola e, apesar do
raciocínio comprometido, era respeitado pelos colegas, integrado
à turma e participativo. Há casos, no entanto, em que a criança não
consegue interagir porque está em surto e precisa ser tratada. Para

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Educação Especial e Inclusão Escolar

que o professor saiba o momento adequado de encaminhá-la a um


tratamento, é importante manter vínculos com os atendimentos clínico
e especializado.

A avaliação de alunos com deficiência mental deve ser


diferenciada?

Não. Uma boa avaliação é aquela planejada para todos, em que o


aluno aprende a analisar a sua produção de forma crítica e autônoma.
Ele deve dizer o que aprendeu, o que acha interessante estudar e
como o conhecimento adquirido modifica a sua vida. Avaliar estudantes
emancipados é, por exemplo, pedir para que eles próprios inventem
uma prova. Assim, mostram o quanto assimilaram um conteúdo. Aplicar
testes com consulta também é muito mais produtivo do que cobrar
decoreba. A função da avaliação não é medir se a criança chegou a um
determinado ponto, mas se ela cresceu. Esse mérito vem do esforço
pessoal para vencer as suas limitações, e não da comparação com os
demais.

Um professor sem capacitação pode ensinar alunos com


deficiência?

Sim. O papel do professor é ser regente de classe, e não especialista


em deficiência. Essa responsabilidade é da equipe de atendimento
especializado. Não pode haver confusão. Uma criança surda, por
exemplo, aprende com o especialista libras (língua brasileira de sinais)
e leitura labial. Para ser alfabetizada em língua portuguesa para surdos,
conhecida como L2, a criança é atendida por um professor de língua
portuguesa capacitado para isso. A função do regente é trabalhar os
conteúdos, mas as parcerias entre os profissionais são muito produtivas.
Se na turma há uma criança surda e o professor regente vai dar uma
aula sobre o Egito, o especialista mostra à criança com antecedência
fotos, gravuras e vídeos sobre o assunto. O professor de L2 dá o
significado de novos vocábulos, como pirâmide e faraó. Na hora da aula,
o material de apoio visual, textos e leitura labial facilitam a compreensão
do conteúdo.

Como ensinar cegos e surdos sem dominar o braile e a língua


de sinais?

É até positivo que o professor de uma criança surda não saiba


libras, porque ela tem que entender a língua portuguesa escrita. Ter

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

noções de libras facilita a comunicação, mas não é essencial para a


aula. No caso de ter um cego na turma, o professor não precisa dominar
o braile, porque quem escreve é o aluno. Ele pode até aprender, se
achar que precisa para corrigir textos, mas há a opção de pedir ajuda ao
especialista. Só não acho necessário ensinar libras e braile na formação
inicial do docente.
O professor pode se recusar a lecionar para turmas
inclusivas?

Não, mesmo que a escola não ofereça estrutura. As redes de ensino


não estão dando às escolas e aos professores o que é necessário
para um bom trabalho. Muitos evitam reclamar por medo de perder o
emprego ou de sofrer perseguição. Mas eles têm que recorrer à ajuda
que está disponível, o sindicato, por exemplo, onde legalmente expõem
como estão sendo prejudicados profissionalmente. Os pais e os líderes
comunitários também podem promover um diálogo com as redes,
fazendo pressão para o cumprimento da lei.

Há fiscalização para garantir que as escolas sejam inclusivas?

O Ministério Público fiscaliza, geralmente com base em denúncias,


para garantir o cumprimento da lei. O Ministério da Educação, por
meio da Secretaria de Educação Especial, atualmente não tem como
preocupação punir, mas levar as escolas a entender o seu papel e a lei
e a agir para colocar tudo isso em prática.

Atividade de Estudos:

Sugiro a você que aponte os aspectos mais interessantes da


entrevista de Mantoan e comente sobre eles.
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Educação Especial e Inclusão Escolar

Sugerimos que você assista ao filme “O oitavo dia”. O filme retrata a


época em que pessoas com deficiências ou síndromes eram deixadas por
suas famílias em instituições separadas do convívio social. Além disso,
o filme trata do preconceito existente no contato e no relacionamento de
pessoas com deficiência com pessoas ditas normais.

Sinopse: Um homem com


Síndrome de Down cuja mãe morreu
e um ocupado homem de negócios,
divorciado e sem a posse dos filhos
que não querem mais vê-lo. Os dois
acabam desenvolvendo uma amizade
especial quando se encontram
acidentalmente.

O OITAVO DIA. Direção de Jaco


van Dormael. França: Polygram /
Europa Carat Home Vídeo, 1996. 1
filme (118 min), legendado.

Algumas Considerações
Caro(a) pós-graduando(a)! Neste capítulo, você conheceu a história
da educação especial, antes mesmo de seu surgimento. Da mesma
forma, compreendeu a mudança dos papéis da escola especial frente
aos desafios da inclusão escolar. Em suma, refletimos sobre:

• as quatro fases da inclusão escolar: exclusão, segregação ou


separação, integração e inclusão;

• a diferença entre as propostas de integração e de inclusão


escolar;

• as mudanças requeridas pela inclusão escolar tanto nas escolas


regulares quantos nas escolas especiais;

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Capítulo 1 Histórico e Evolução da Educação Especial Inclusiva

• o antigo papel das escolas especiais, que era acolher e oferecer


ensino às pessoas com deficiência ou síndrome;

• a atual função das escolas especiais, ou seja, oferecer suporte


às escolas regulares para promover a inclusão de todos;

• o desafio lançado às escolas regulares, isto é, receber, acolher e


ensinar a todos os alunos.

Referências

BATISTA, Cristina Abranches Mota. Educação inclusiva: atendimento
educacional especializado para a deficiência mental. 2. ed. Brasília:
MEC – SEESP, 2006.

BEYER, Hugo Otto. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com


necessidades educacionais especiais. Porto Alegre: Mediação, 2005.

______. Educação inclusiva ou integração escolar? Implicações


pedagógicas dos conceitos como rupturas paradigmáticas. In:
Ensaios Pedagógicos. Brasília: MEC – SEESP, 2006. p. 277- 280.

BRASIL. Educação Especial, legislação. Disponível em:


<www.mec.gov.br> Acesso em: 15 out. 2008.

GLAT, Rosana. A integração social dos portadores de deficiência:


uma reflexão. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1998.

MANTOAN, Maria Teresa Égler.. Inclusão escolar: O que é? Por quê?


Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003.

______. O direito à diferença nas escolas – questões sobre a inclusão


escolar de pessoas com e sem deficiências. Revista Educação
Especial, Santa Maria, n. 23, 2004. Disponível em:
<www.ufsm.br/ce/revista>. Acesso em: 22 out. 2007.

RELATÓRIO WARNOCK. Special educational needs report of


commite of enquiry into the education of handicapped children
and young people. Londres: Her Magestys Office, 1978.

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Educação Especial e Inclusão Escolar

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade


para todos. 3. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

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